"As coisas encobertas pertencem ao nosso Deus, mas as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que observemos todas as palavras desta lei."
Deuteronômio 29:29

Capítulo e Verso Comentário Adventista > Mateus
Mt.1:1 1. Livro da genealogia de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão.

Livro da genealogia. [A genealogia de Jesus Cristo, Mt.1:1-17= Lc.3:23-38. Comentário principal: Mt, Lc]. Este é o título que Mateus dá para o registro genealógico de Jesus, disposto nos v. 1 a 17; e é traduzido como “genealogia”, “livro da genealogia”, “livro da natividade”,“linhagem” ou “registro de nascimento”. As palavras introdutórias de Mt.2:1 favorecem o ponto de vista de que Mateus possivelmente quisesse que esse título abrangesse a narrativa dos eventos que antecederam o nascimento de Jesus (Mt.1:18-25). Ao escrever um relato da vida de Jesus dirigido primeiramente a leitores judeus de nascimento (ver p. 272, 275), Mateus começa em estilo judaico típico ao dar a linhagem familiar de Jesus. Pelo fato de que a vinda do Messias era tema de muitas profecias, ele mostra que Jesus de Nazaré é de fato aquele a respeito de quem Moisés e os profetas testemunharam. Visto que o Messias nasceria da descendência de Abraão (Gn.22:18; Cl.3:16), o pai da nação judaica, e de Davi, fundador da linhagem real (Is.9:6-7; Is.11:1; At.2:29-30), Mateus apresenta evidência de que Jesus satisfaz as condições de descendente desses dois homens ilustres.

Sem essa evidência, as afirmações de Jesus de ser o Messias de nada valeriam, e todas as provas adicionais poderiam ser descartadas sem serem examinadas (cf. Ed.2:62; Ne.7:64). Na época em que Mateus escreveu seu relato, é provável que fosse possível verificar a genealogia de Jesus comparando-a com registros públicos existentes. Grande parte dela (v. Mt.2:12) poderia ser comparada com listas do AT (1Cr.1:34; 1Cr.2:1-15; 1Cr.3:5; 1Cr.3:10-19). O fato de que, até onde se sabe, nenhum contemporâneo de Mateus, nem mesmo os inimigos declarados da fé cristã, tenha contestado a validade dessa linhagem familiar é um testemunho excelente que favorece a genuinidade da lista genealógica.

Jesus. Do gr. lesous, equivalente ao heb. Yehoshua, “Josué” (ver At.7:45; Hb.4:8, em que Lucas e Paulo se referem a Josué como lesous, “Jesus”). Em geral se entende que este nome significa “Yahweh é salvação” (ver Mt.1:21). Alguns eruditos sugerem a tradução: “Yahweh é generosidade”. O nome original de Josué (ver vol. 2, p. 155), Oseias, foi mudado para Jehoshua (ver com. de Nm.13:16). Josué é uma abreviação de Jehoshua. Quando o aramaico substituiu o hebraico como o idioma comum dos judeus, após o cativeiro babilônico, o nome se tornou Yeshua, forma transliterada para o grego como lesous. Yeshua era um nome comum entre os judeus na época do NT (ver At.13:6; Cl.4:11), em harmonia com o costume hebraico de escolher nomes com significado religioso (ver também com. de Mt.1:21). Hoje os nomes servem apenas como identificação, mas nos tempos bíblicos o nome de um filho era escolhido com todo cuidado porque representava a fé e a esperança dos pais (ver PR, 481), as circunstâncias do nascimento da criança, suas características pessoais ou estava relacionado a sua missão na vida: principalmente quando o nome era designado por Deus.

O nome Jesus está repleto de lembranças históricas e vislumbres proféticos. Assim como Josué tinha conduzido Israel à vitória na terra prometida, assim também Jesus, o capitão de nossa salvação, veio para abrir os portões da Canaã celestial. Contudo, Jesus não é só o autor de nossa salvação (Hb.2:10), Ele também é “Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão” (Hb.3:1). O sumo sacerdote, que voltou do cativeiro babilônico (ver com. de Ed.2:2), se chamava Josué (Zc.3:8; Zc.6:11-15). Assim como Oseias (nome idêntico no hebraico ao Oseias de Nm.13:16), que amou uma esposa indigna e buscou em vão ganhar suas afeições e finalmente a comprou de volta no mercado de escravos (Os.1:2; Os.3:1-2), Jesus veio para libertar a raça humana da escravidão do pecado (Lc.4:18; Jo.8:36).

Cristo. Do gr. Christos, tradução do heb. Mashiach (ver com. de SI.2:2), “Messias”, que significa “Ungido” ou “o Ungido”. Antes da ressurreição, nos quatro evangelhos, em geral, Jesus é chamado de “o Cristo”, o que torna o termo um título, em vez de um nome próprio. Após a ressurreição, o artigo definido geralmente desaparece e “Cristo” se torna tanto nome como título. Na época do AT, o sumo sacerdote (Ex.30:30), o rei (2Sm.5:3; 1Sm.24:6) e, às vezes, os profetas (1Rs.19:16) eram “ungidos” ao serem consagrados ao serviço sagrado. Cada um deles era chamado de mashiach, “ungido” (Lv.4:3; 1Sm.24:6; 1Cr.16:21-22). Nas profecias messiânicas o termo veio a ser aplicado especificamente ao Messias, que, como profeta (Dt.18:15), sacerdote (Zc.6:1:1-14) e rei (Is.9:6-7) tinha sido ordenado para ser o redentor (Is.61:1; Dn.9:25-26). Como profeta, veio para representar o Pai perante os homens, como sacerdote, ascendeu para representar os homens perante o Pai, e como rei liberta aqueles que creem nEle, não apenas do poder do pecado nesta vida, mas também do reino do pecado – e reinará sobre eles no reino da glória.

Christos vem de chrio (gr. “esfregar”, “massagear”, “ungir”). No NT, diz-se que Cristo foi “ungido” (Lc.4:18; At.4:27; At.10:38; Hb.1:9). Usados juntos (como em Mt.1:18; Mt.16:20; Mc.1:1), os dois nomes “Jesus” e “Cristo” constituem uma confissão de fé na união das naturezas divina e humana em uma pessoa, na crença de que Jesus de Nazaré, Filho de Maria, Filho do homem, é de fato Cristo, o Messias, o Filho de Deus (ver At.2:38; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51; ver com. de Mt.1:23; Jo.1:1-3; Jo.1:14; Fp.2:6-8; Cl.2:9).

Filho de Davi. Essa era a designação popular empregada por governantes (Mt.22:42; Mc.12:35; Lc.20:41) e pelo povo comum (Mt.9:27; Mt.12:23; Mt.15:22; Mt.20:30-31; Mt.21:9; Mc.10:47-48; Lc.18:38-39; Jo.7:42) para se referir ao esperado Messias. Seu uso como título messiânico indica a compreensão das profecias que prediziam que o Messias descenderia de Davi. Para um povo cansado do jugo romano, implicava também a restauração de seu reino à independência e prosperidade do reinado ilustre de Davi. O próprio Davi tinha entendido que a promessa de um filho que se assentaria no seu trono (2Sm.7:12-13; Sl.132:11) seria cumprida por aquele que libertaria Israel (At.2:29-30; ver com. de Dt.18:15). Repetidas vezes os profetas do passado falaram isso do Messias (ls.9:6-7; Is.11:1; Je.23:5-6). Vez após vez, escritores do NT aplicam o título “descendente de Davi” a Cristo (Rm.1:3; 2Tm.2:8). Como Filho de Davi, Jesus Se tornou herdeiro tanto do trono de Davi quanto das promessas messiânicas dadas a ele.

Filho de Abraão. Dentre os heróis da fé, Abraão se destacou como “amigo” de Deus (Tg.2:23; 2Cr.20:7; ls.41:8). Por causa de sua fidelidade (ver Gl.3:7; Gl.3:9), Abraão foi escolhido para se tornar o pai do povo de Deus. A promessa de que em sua descendência todas as nações da terra seriam abençoadas era, segundo Paulo, uma clara previsão messiânica (Gn.22:18; Gl.3:16). Em harmonia com seu esforço para convencer os judeus de que Jesus era o Messias, de forma apropriada e intencional, Mateus faz remontar a genealogia de Cristo a Abraão, ao passo que Lucas, ao escrever para cristãos gentios, considerou essencial traçar a genealogia de Cristo até o pai da raça humana. Mostrar que Jesus descendeu de Abraão e, portanto, podia ser considerado como possível herdeiro das promessas feitas a ele, era o suficiente para o propósito de Mateus (ver com. de Jo.8:35; Jo.8:39; sobre as diferenças entre as listas de Mateus e de Lucas, ver com. de Lc.3:23).

Mt.1:2 2. Abraão gerou a Isaque; Isaque, a Jacó; Jacó, a Judá e a seus irmãos;

Abraão gerou a Isaque. Com exceção de variações devido à transliteração de nomes hebraicos para o grego e de algumas omissões intencionais (ver com. de v. Mt.1:8; Mt.1:11; Mt.1:17), a genealogia de Mateus, de Abraão a Zorobabel, concorda com listas similares do AT (ver 1Cr.1:28; 1Cr.1:34; 1Cr.2:1; 1Cr.2:4-5; 1Cr.2:9-12; 1Cr.2:15; 1Cr.3:15-19; Rt.4:18-22). Não há registros com os quais se comparar os nomes do período intertestamentário de Zorobabel a Cristo.

Judá. Ver com. de Gn.29:35. Paulo afirma: “é evidente que nosso Senhor procedeu de Judá” (Hb.7:14).

Seus irmãos. Mateus faz referência aos outros filhos de Jacó, talvez com a intenção de relembrar aos judeus de outras tribos que Jesus, da tribo de Judá, era Salvador deles também.

Mt.1:3 3. Judá gerou de Tamar a Perez e a Zera; Perez gerou a Esrom; Esrom, a Arão;

A Perez e a Zera. Filhos de Tamar com Judá (ver com. de Gn.38:6-30). Tamar, provavelmente uma cananeia (ver Gn.38:2; Gn.38:6), era nora de Judá.

Tamar. É exceção, e não a regra, encontrar nomes de mulheres nas listas genealógicas hebraicas. Mesmo assim, Mateus se refere a elas de forma passageira e não específica como elos genealógicos. O fato de se omitirem nomes de mulheres honradas como Sara e Raquel sugere que as quatro mulheres mencionadas foram talvez incluídas devido a circunstâncias incomuns. É provável que Tamar, Raabe, Rute e Bate-Seba fossem gentias. Nisso estão implícitos uma reprovação ao exclusivismo judaico e um tácito reconhecimento de que Jesus pertence aos gentios bem como aos judeus. Com exceção de Rute, escândalos estavam ligados aos nomes dessas mulheres. Um historiador meramente humano poderia ter escolhido passar por alto esses nomes, temendo que a honra do Messias fosse manchada. Contudo, Mateus cita em específico o Mestre dizendo aos fariseus que não veio “chamar justos, e sim pecadores [ao arrependimento]” (Mt.9:13). Pode ser que Mateus, como publicano, e, por isso, às vezes classificado na mesma categoria de mulheres pecadoras (ver Mt.21:31-32), encontrasse em seu coração um lugar para outros que em geral eram considerados párias da sociedade.

Mt.1:4 4. Arão gerou a Aminadabe; Aminadabe, a Naassom; Naassom, a Salmom;

Sem comentário para este versículo.

Mt.1:5 5. Salmom gerou de Raabe a Boaz; este, de Rute, gerou a Obede; e Obede, a Jessé;

Salmom. Ver Rt.4:20; 1Cr.2:11. Salmom era parente próximo de Calebe e Efrata (1Cr.2:9-11; 1Cr.2:19; 1Cr.2:24) e de Belém (cujo pai é outro “Salma”, ver 1Cr.2:50-51; 1Cr.2:54), portanto, de uma família que se estabeleceu em Belém-Efrata (ver 1Cr.2:24; 1Cr.2:51; Mq.5:2; ver com. de Gn.35:19). Alguns comentaristas sugerem que Salmom pode ter sido um dos espias enviados por Josué à cidade de Jericó antes de Israel cruzar o Jordão (Js.2:1). Algumas vezes contesta-se que Raabe, de Jericó, seja a Raabe esposa de Salmom porque as gerações que Mateus alista entre Salmom e Davi são poucas demais para abranger o intervalo entre a Raabe de Jericó e o tempo de Davi. Mas essa objeção não é necessariamente válida, pois: (1) Mateus omite em outras partes de forma intencional alguns dos ancestrais de Jesus (ver com. dos v. Mt.1:8; Mt.1:11; Mt.1:17) e, seguindo o autor de Rute, possivelmente tenha feito isso em seu evangelho; (2) é provável que Raabe fosse jovem quando se casou (ver Js.6:23), mas Boaz não era jovem quando se casou com Rute (Rt.3:10), e Jessé era idoso quando Davi nasceu (1Sm.17:12-14).

Raabe. Ver vol. 2, p. 446; ver também com. de Rt.1:1; Rt.2:1. Parece haver pouca razão para se duvidar de que essa seja a Raabe cananeia, meretriz de Jericó que protegeu os espias hebreus enviados à cidade antes de sua conquista (Js.2; ver com. de Mt.6:23). É a única pessoa mencionada na Bíblia com este nome, e o gr. Rhachab de Mateus é uma transliteração exata do heb. rahab (a “Raabe” de SI.87:4; Sl.89:10; Is.51:9 é do heb. rahab, que é um nome simbólico para o Egito). Além disso, o fato de Raabe ser mencionada pelo nome, contrariamente à regra comum de não se mencionar mulher nas listas genealógicas, sugere que Mateus tinha alguma razão especial para incluí-la. Seja como for, a Raabe de Js.2 tem um lugar de honra entre os heróis da fé (Hb.11:31) e Tiago se refere a ela como um exemplo de fé em ação (Tg.2:25).

Rute. Moabita que acompanhou Noemi no regresso de Moabe a Belém (ver Rt.4:18-22; 1Cr.2:3-15). Sua devoção a Noemi (Rt.1:16) e sua simpatia não têm comparação nos registros de nenhuma época.

Mt.1:6 6. Jessé gerou ao rei Davi; e o rei Davi, a Salomão, da que fora mulher de Urias;

Rei Davi. Mesmo sob a monarquia hebraica o governo de Israel era, ao menos em princípio, uma teocracia (DTN, 737, 738; ver vol. 4, p. 14). Como governante supremo, Deus buscou direcionar a política nacional por meio de Seus embaixadores, os profetas. Davi respondeu à liderança divina e buscou manter um espírito de verdadeira humildade perante o Senhor. Ao ser reprovado por uma atitude errada, manifestou genuíno arrependimento. Reconheceu sua culpa, buscou o perdão e se propôs a novamente obedecer à voz do Senhor (2Sm.12:1-13; 2Sm.24:10; 2Sm.24:17; SI.51:4; Sl.51:10-11). Foi o coração contrito de Davi que tornou possível a Deus exaltá-lo e torná-lo próspero (ver 1Rs.3:6; 1Rs.8:25; Is.57:15; Mq.6:8).

Salomão. O segundo filho de Bate-Seba, nascido depois de Davi ter se arrependido sinceramente e sido perdoado (2Sm.12:13-24; 1Rs.1:11-40).

Mt.1:7 7. Salomão gerou a Roboão; Roboão, a Abias; Abias, a Asa;

Sem comentário para este versículo.

Mt.1:8 8. Asa gerou a Josafá; Josafá, a Jorão; Jorão, a Uzias;

Josafá. Ou, Jeosafá (1Rs.22:41-43, AA). Variações na ortografia do nome são comuns na Bíblia. A maior parte das variações em listas genealógicas se deve ao fato de que os nomes no texto grego de Mateus são grafados seguindo a LXX. Os tradutores da AA simplesmente transliteraram os nomes gregos, em vez de usarem os nomes hebraicos dos quais os gregos eram uma transliteração. Certos personagens também eram conhecidos por nomes diferentes. Assim, Jeoaquim (2Rs.24:6) também era chamado de Jeconias (1Cr.3:16; Mt.1:1), com base no texto grego.

Jorão, a Uzias. Mateus omite os nomes de três reis sucessivos de Judá entre Jeorão e Uzias (ou Azarias; ver 1Cr.3:11-12), a saber: Acazias, Joás e Amazias. Essa omissão dificilmente foi acidental, pois a genealogia original, apresentada repetidas vezes no AT, era bem conhecida.

Tampouco poderia ser erro de copista (ver com. de Mt.1:17). Talvez tenha sido propósito de Mateus reduzir os 19 nomes desde Salomão até Jeoaquim para 14, a fim de que correspondesse ao número de gerações desde Abraão até Davi (v. Mt.1:17). Também se sugeriu que Mateus considerou esses três os menos dignos de figurar na genealogia de Jesus. Acazias, Joás e Amazias foram os sucessores imediatos de Atalia, filha de Acabe e Jezabel, e esposa de Jorão (2Cr.22-25). Atalia introduziu oficialmente o culto a Baal no reino do sul (ver com. de 2Rs.11:18), assim como fez sua mãe no reino do norte (ver 1Rs.16:31-32). Acazias, Joás e Amazias praticaram o mal (2Cr.22:3-4; 2Cr.24:17-18; 2Cr.25:14), pelo menos na última parte de seus reinados.

Mt.1:9 9. Uzias gerou a Jotão; Jotão, a Acaz; Acaz, a Ezequias;

Acaz. Ver 2Rs.16.

Ezequias. Um dos bons reis de Judá. Contudo, seu filho Manassés se empenhou durante seu longo e ímpio reinado à tarefa de anular as reformas feitas por seu pai. Contudo, Manassés se arrependeu quase ao fim de sua vida.

Mt.1:10 10. Ezequias gerou a Manassés; Manassés, a Amom; Amom, a Josias;

Amom, a Josias. Depois dos reinados ímpios de Manassés (2Rs.21:1-18) e Amom (2Rs.21:19-26), Josias (2Rs.22:1-23:28), bisneto de Ezequias, e o último dos bons reis de Judá, ascendeu ao trono. Dos 20 governantes que reinaram no reino do sul por um período de 345 anos, uma minoria serviu ao Senhor. Em marcante contraste, 20 reis que representaram dez dinastias reinaram no reino do norte por um período de 209 anos, mas nenhum deles permaneceu fiel ao Senhor.

Mt.1:11 11. Josias gerou a Jeconias e a seus irmãos, no tempo do exílio na Babilônia.

Jeconias. Aqui ocorre a segunda omissão da lista de Mateus (ver com. do v. Mt.1:8). Jeconias (ou Joaquim, 2Rs.24:6), filho de Jeoaquim, era na verdade neto de Josias (1Cr.3:15-16). Alguns sugerem que o acréscimo de Joaquim à lista resultaria numa divisão mais simétrica das gerações mencionadas em Mt.1:17 (ver com. a li) e que Mateus pode originalmente ter incluído o nome de Jeoaquim, mas que este se perdeu de forma acidental mais tarde, devido à sua semelhança com Joaquim. Existe evidência textual (ver p. 136) para inserir o nome Jeoaquim entre Josias e Jeconias.

Seus irmãos. Se Jeoaquim fosse incluído (ver com. acima), então, os “irmãos” se refeririam a irmãos de sangue: Joacaz e Zedequias (ver com. de 1Cr.3:15). De outro modo, a expressão “seus irmãos” seria menos específica. Três dos filhos de Josias: Joacaz, Jeoaquim e Zedequias reinaram sobre Judá, mas um era pai de Jeconias, e os outros dois, tios.

No tempo do exílio na Babilônia. Assim termina a segunda divisão da genealogia de Jesus em Mateus (ver com. do v. Mt.1:17). O período abrangido trata da monarquia desde sua fase áurea com Davi e Salomão até sua dissolução e o período sombrio da história judaica: o cativeiro babilônico. Entre Davi e Salatiel, Lucas alista seis elos genealógicos a mais que Mateus (ver Lc.3:27-31). Levando-se em conta as quatro omissões feitas por Mateus (ver com. do v. Mt.1:8 e “Jeconias” na página anterior) resta uma diferença de apenas dois antepassados, isso pode simplesmente indicar que a linha ancestral seguida por Lucas continha duas gerações a mais que a linhagem real seguida por Mateus. Essa diferença é bem possível num período de cinco séculos. Entre Davi e Jesus, um período de cerca de mil anos, Lucas alista 15 gerações a mais do que Mateus, o que indica mais omissões da parte do último.

Mt.1:12 12. Depois do exílio na Babilônia, Jeconias gerou a Salatiel; e Salatiel, a Zorobabel;

Jeconias gerou a Salatiel. De acordo com a profecia de Jeremias (Je.22:30), Jeconias morreria sem filhos, mas em seguida se explica o significado disso: “nenhum dos seus filhos prosperará, para se assentar no trono de Davi”. Vários filhos de Jeconias, incluindo Salatiel, são alistados em 1Cr.3:17-18. É possível que um ou mais desses o tenham acompanhado a Babilônia (ver com. de Je.22:28). Jeconias era um jovem de 18 anos quando foi levado cativo (ver 2Rs.24:8). Com a morte de Nabucodonosor, 37 anos depois, ele foi liberto da prisão e “passou a comer pão na sua presença [de Evil-Merodaque] todos os dias da sua vida” (2Rs.25:29), recebeu uma pensão regular do tesouro real e desfrutou o favor do rei, aparentemente, pelo resto de sua vida (ver com. de 2Rs.25:27-29).

Salatiel, a Zorobabel. Ver com. de Lc.3:27. Em cumprimento do decreto de Ciro, com o qual se cumpriram os 70 anos de cativeiro, Zorobabel conduziu cerca de 50 mil judeus de volta a Jerusalém (ver com. de Ed.2:2).

Mt.1:13 13. Zorobabel gerou a Abiúde; Abiúde, a Eliaquim; Eliaquim, a Azor;

Sem comentário para este versículo.

Mt.1:14 14. Azor gerou a Sadoque; Sadoque, a Aquim; Aquim, a Eliúde;

Sem comentário para este versículo.

Mt.1:15 15. Eliúde gerou a Eleazar; Eleazar, a Matã; Matã, a Jacó.

Matã, a Jacó. Nada mais se sabe das oito pessoas alistadas entre Abiúde e Matã (v. Mt.1:13-15) do que seus nomes, sendo que nenhum deles é mencionado novamente na Bíblia. Essas oito gerações abrangem cinco séculos. Mateus pode ter omitido alguns nomes aqui a fim de que a terceira seção de sua genealogia correspondesse às duas primeiras (ver com. de Mt.1:17; Ed.7:5). Isso poderia ser possível pelas seguintes razões: (1) o número de gerações alistadas dificilmente parece proporcional à duração do tempo; (2) Lucas alista para esse período nove gerações a mais do que Mateus; (3) Mateus omite quatro nomes da segunda seção de sua genealogia (ver com. dos v. Mt.1:8; Mt.1:11). Sugeriu-se que os nomes “Matã”, em Mateus, e “Matate”, em Lucas (Lc.3:24), seriam ambos variações do nome “Mateus” (não o evangelista), e que os dois nomes “Matã” e “Matate” na realidade indicam a mesma pessoa. Se for esse o caso, Jacó (Mt.1:15-16) e Eli (Lc.3:23) seriam irmãos. Assim, presume-se que Eli não teve herdeiros homens e adotou José, seu sobrinho, como seu filho e herdeiro legal (cf. com. de Lc.3:27). O objetivo disso é comprovar que José é verdadeiramente “filho de Eli”, como em Lc.3:23, bem como filho de Jacó, conforme está relatado em Mateus. De acordo com outra teoria, Jacó se casou com a viúva sem filhos de seu irmão Eli, em harmonia com a lei do levirato (Dt.25:5-10). José, o primeiro filho nascido dessa união, seria na verdade filho de Jacó mas, legalmente, filho e herdeiro de Eli. Ambas as sugestões, originalmente feitas por alguns pais da igreja primitiva, baseiam-se em suposição, portanto, não estão livres de questionamento (o problema é abordado com mais detalhes no com. de Lc.3:23).

Mt.1:16 16. E Jacó gerou a José, marido de Maria, da qual nasceu Jesus, que se chama o Cristo.

José, marido de. Com cuidado, Mateus evita alarmar que José “gerou” a Jesus. A relação entre José e Jesus não era de pai e filho, mas de padrasto e filho de sua esposa. O termo “gerou” que une todas as gerações até esse ponto desaparece, e com isso Mateus enfatiza o nascimento virginal.

Maria. Do gr. Maria, Mariam na LXX, do heb. Miryam. Como José, Maria era da casa de Davi (DTN, 44; cf. At.2:30; At.3:23; Rm.1:3; 2Tm.2:8), pois só por meio dela Jesus podia ser descendente segundo a carne, da linhagem de Davi (Rm.1:3; SI.132:11). O fato de que a “parenta” de Maria (Lc.1:36) era “das filhas de Arão” (Lc.1:5) de forma alguma requer que Maria fosse da tribo de Levi e não da tribo de Judá (sobre a palavra traduzida como “parenta”, ver com. de Lc.1:36). Parece que Maria passou seus primeiros anos em Nazaré (Lc.1:26). Isabel, sua parente, era esposa de Zacarias (Lc.1:36). Maria também tinha familiares em Caná, vila próxima a Nazaré (ver Jo.2:1; Jo.2:5; DTN, 144, 146). A ideia de que o nome de sua mãe era Ana se baseia exclusivamente na tradição. Maria foi grandemente favorecida pelo Senhor e bendita entre as mulheres (Lc.1:28; Lc.1:42).

Desde a primeira promessa de um Libertador, que seria da “semente” da mulher (Gn.3:15; Ap.12:5, ARC), mães devotas de Israel esperavam que seu primogênito pudesse ser o prometido Messias (DTN, 31). Essa honra grandiosa e única foi dada a Maria. Sem dúvida Maria foi escolhida em primeiro lugar porque, no tempo apontado, (Dn.9:24-27; MC 1:15; Cl 4:4) seu caráter refletia com mais perfeição os ideais divinos de maternidade do que a de qualquer outra filha de Davi. Ela pertencia à seleta minoria que “esperava a consolação de Israel” (Lc.2:25; Lc.2:38; Mc.15:43; Hb.9:28). Foi essa esperança que purificou sua vida (cf. 1Jo.3:3) e a qualificou para seu papel sagrado (PP, 308; PR, 245; DTN, 69). Toda mãe entre o povo de Deus hoje pode cooperar com o Céu como fez Maria (DTN, 512), e pode, em certo sentido, consagrar seus filhos a Deus (ver com. de Lc.2:52).

Da qual. Como em português, no original grego, essa expressão está no feminino singular, tornando “Maria” o antecedente e excluindo José como o pai natural de Jesus. Mas, ao se casar com Maria, José se tornou o pai legal, embora não literal, de Jesus (ver Mt.13:55).

Mt.1:17 17. De sorte que todas as gerações, desde Abraão até Davi, são catorze; desde Davi até ao exílio na Babilônia, catorze; e desde o exílio na Babilônia até Cristo, catorze.

Todas as gerações. A partir do registro, pode-se notar que Mateus omite ao menos quatro nomes que teria incluído se fosse sua intenção prover uma genealogia completa (ver com. dos v. Mt.1:8; Mt.1:11). Pode ter havido outras omissões nessa parte da lista que abrange o período intertestamentário, pois, de Abraão a Cristo, inclusive, Lucas alista 56 nomes, ao passo que Mateus alista 41 (ver com. de Mt.1:15). Portanto, com “todas as gerações”, Mateus claramente se refere àquelas que alistou, e não a todos os antepassados de Cristo que de fato viveram e podiam ter sido incluídos numa lista completa. É possível que o número de nomes na segunda e terceira seções da genealogia tenha sido ajustado de modo a corresponder com o número de nomes da primeira seção. Mateus pode ter adotado uma lista abreviada, numericamente simétrica, para ajudar a recitá-la de memória. No AT, há listas abreviadas como, por exemplo, a de Esdras (ver com. de Ed.7:1; Ed.7:5). Mas é evidente que essa genealogia abreviada foi considerada prova suficiente de que Esdras era descendente de Arão, num tempo em que foi negado a outros entrar para o sacerdócio porque não poderiam dar prova aceitável de sua linhagem (Ed.2:62; Ne.7:64).

O filósofo judeu Filo e o historiador judeu Josefo, ambos praticamente contemporâneos de Jesus, deram genealogias abreviadas que evidentemente consideraram adequadas para provar sua ascendência. Hoje quando um árabe informa sua ascendência, menciona alguns nomes importantes, sendo que seu propósito não é fornecer a lista completa, mas simplesmente estabelecer sua linhagem. A divisão da genealogia de Jesus em três no livro de Mateus é historicamente sólida, pois cada seção constitui um período distinto na história judaica. No primeiro, de Abraão a Davi, a nação hebraica era essencialmente patriarcal; durante o segundo, era monárquica; e no terceiro, os judeus passaram pelo domínio de potências estrangeiras.

São catorze. Três divisões, cada uma composta de 14 gerações, somariam 42 em vez das 41 gerações alistadas por Mateus. Essa aparente discrepância foi explicada de várias formas. Alguns propõem que o nome Jeconias fosse contado duas vezes, como o último nome no segundo grupo e o primeiro no terceiro grupo. Outros sugerem que Mateus originalmente alistou o nome Jeoaquim entre os de Josias e Jeconias (ver com. do v. Mt.1:11).

Até Cristo. Literalmente, “até o Cristo” (ver com. do v. Mt.1:1). Mateus faz referência a Cristo dentro da perspectiva histórica como o Messias da profecia.

Mt.1:18 18. Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: estando Maria, sua mãe, desposada com José, sem que tivessem antes coabitado, achou-se grávida pelo Espírito Santo.

O nascimento. [O nascimento de Jesus Cristo, Mt.1:18-25; Lc.2:1-7. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 211]. Mateus menciona apenas algumas circunstâncias que envolveram o nascimento de Jesus, o necessário para mostrar que Sua primeira vinda era o cumprimento das profecias do AT (ver v. Mt.1:22). Em harmonia com o propósito de seu evangelho, Mateus, em contraste com Marcos e Lucas, omitiu muito do que poderia nos interessar sobre a vida de Jesus, a fim de que pudesse se concentrar nos ensinos do Mestre (ver p. 178, 179).

Maria, Sua mãe. Jesus nasceu “em semelhança de carne pecaminosa” (Rm.8:3). Maria necessitava tanto da salvação de seus pecados como qualquer outro filho ou filha de Adão (Rm.3:10; Rm.3:23). Há “um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm.2:5).

Desposada com José. Isto é, noiva ou comprometida com ele. Tanto Maria como José viviam em Nazaré (Lc.1:26-27; Lc.2:4), “a sua cidade” (Lc.2:39), embora, como descendentes de Davi, considerassem Belém como lar de sua família (ver DTN, 66). O fato de terem encontrado alojamento em Belém somente com dificuldade sugere que nenhum deles tinha parentes próximos vivendo ali naquele tempo. José e Maria pertenciam à casa e à linhagem de Davi (Mt.1:20; Lc.1:26-27; Lc.2:4; ver com. de Mt.1:16). Provavelmente fossem membros do pequeno grupo que com afinco estudava as profecias e ansiava a vinda do Messias (DTN, 44, 47, 98). Sendo assim, sabendo que o tempo estava próximo, eles, como outros membros desse grupo, sem dúvida oraram para que Deus apressasse a vinda do Messias (ver Lc.2:25-26; Lc.2:38). Parece que José era viúvo quando se casou com Maria. Ele tinha pelo menos outros seis filhos (Mt.12:46; Mt.13:55-56; Mc.6:3; DTN, 90, 321; são mencionados quatro irmãos e um número não especificado de irmãs), todos provavelmente mais velhos que Jesus (DTN, 86, 87; ver com. de Mt.1:25).

Sem que tivessem [...] coabitado. Mateus já indicou que José não era o pai de Jesus (v. Mt.1:16). Aqui, ele reafirma o fato. Durante o período de noivado, a noiva e o noivo estavam ligados legalmente como marido e mulher, embora não vivessem juntos (Dt.22:23-24). O compromisso constituía um relacionamento legal, uma aliança solene que poderia ser quebrada apenas por meios legais, isto é, pelo divórcio (ver Mishnah, Gittin, 8.9, ed. Soncino, Talmude, p. 389; Kiddushin, 3:7, 8, ed. Soncino, Talmude, p. 318, 320).

Achou-se grávida. Ver com. de Lc.1:26-38. O anjo tinha aparecido a Maria depois de seu compromisso de casamento (Lc.1:26-27), mas antes da concepção (Lc.1:31; Lc.1:35). Aparentemente José só soube da visita do anjo a Maria depois. O anjo apareceu a José quando ele já sabia que Maria estava grávida (Mt.1:18; Mt.1:20).

Pelo Espírito Santo. O Espírito Santo é representado como o agente por meio do qual o poder divino criador e doador de vida é exercido (cf. Gn.1:2; Jó.33:4; Jo.3:3-8; Rm.8:11). O papel do Espírito Santo no nascimento de Jesus está mais claro no evangelho de Lucas do que no de Mateus (Lc.1:35). Foi por meio do Espírito Santo que “o Verbo Se fez carne” (Jo.1:14) e que o Filho de Maria pôde ser chamado de “Filho de Deus” (ver com. de Lc.1:35). Numa tentativa de não aceitar Jesus como o Messias, os judeus diziam que Ele era um filho ilegítimo (Jo.8:41; Jo.9:29). Mas é digno de nota que os maiores eruditos judeus hoje reconhecem isso como pura invenção. Joseph Klausner, por exemplo, diz que “não há fundamento histórico para a tradição de que Jesus era filho ilegítimo” (Jesus of Nazareth, 36). A encarnação de Jesus é um milagre sublime e insondável. Ele era “em forma de Deus” (Fp.2:6; Jo.1:2), adorado pelas hostes celestiais e que Se assentava no trono do universo. Porém, como Rei da glória, escolheu “entregar o cetro nas mãos de Seu Pai” (DTN, 22, 23), para que pudesse “por um pouco” ser feito “menor que os anjos” (Hb.2:7-8), “em semelhança de homens” (Fp.2:7). Mais tarde, novamente, receberia “toda a autoridade” (Mt.28:18), seria “entronizado em meio à adoração dos anjos” (AA, 38), e coroado “de glória e de honra” (Hb.2:7; ver também Is.52:13-15). Porém, o mistério da encarnação não é maior que o mistério do amor que a originou (Jo.3:16; Rm.5:8; Gl.2:20; 1Jo.4:9). O “mistério da piedade” é o grande mistério de todos os tempos (1Tm.3:16; ver com. de Fp.2:7-8; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51).

Mt.1:19 19. Mas José, seu esposo, sendo justo e não a querendo infamar, resolveu deixá-la secretamente.

Justo. Do gr. dikaios, que pode descrever alguém correto, como observador de regras e costumes, ou justo, em harmonia com o que é certo. No NT, dikaios é em geral usado no sentido amplo de harmonia com o padrão divino. Assim, Zacarias e Isabel (Lc.1:5-6), Simeão (Lc.2:25) e José de Arimatéia (Lc.23:50) são todos descritos como dikaios. A esposa de Pilatos se referiu a Jesus como um homem “justo”, do gr. dikaios (Mt.27:19). Do ponto de vista judaico, um homem “justo” era um observador rigoroso das leis de Moisés e das tradições rabínicas. Como resultado, José pode ter questionado se seria moralmente correto se casar com alguém que aparentava ser adúltera.

Não a querendo. José foi misericordioso para com a suposta culpada. Ele não queria trazer sobre Maria mais vergonha e sofrimento. A suposta ofensa era contra si mesmo. Ele poderia legalmente “deixá-la” declarando apenas que ela não o agradava (Mt.19:3; Mt.19:8; Mc.10:4), sem mencionar o motivo.

Infamar. O fato de José ter procurado poupar Maria da vergonha e de um julgamento público mostra sua integridade, bem como sua consideração para com ela.

Resolveu deixá-la secretamente. Ou, “resolveu desmanchar o contrato de casamento” (NTLH). Desde o período do compromisso, ambas as partes estavam ligadas legalmente uma à outra e só podiam se separar pelo divórcio (ver com. de Mt.1:18; Mt.5:27).

Mt.1:20 20. Enquanto ponderava nestas coisas, eis que lhe apareceu, em sonho, um anjo do Senhor, dizendo: José, filho de Davi, não temas receber Maria, tua mulher, porque o que nela foi gerado é do Espírito Santo.

Um anjo. Provavelmente Gabriel, que já tinha aparecido a Zacarias (Lc.1:11; Lc.1:19) e a Maria (ver com. de Lc.1:19).

Em sonho. Lucas (Lc.1:26-38) dá a entender que o anjo apareceu a Maria visivelmente, não num sonho ou em visão: “entrando o anjo aonde ela estava” (v. Lc.1:28). No entanto, para José, o anjo se manifestou num sonho enquanto ele meditava sobre o problema que o perturbava. Sonhos inspirados são um dos meios que Deus usa para revelar Sua vontade aos seres humanos (Nm.12:6; Jl.2:28; Gn.20:3; Gn.31:11; Gn.31:24; Gn.41:1).

Filho de Davi. É óbvio que José sabia que pertencia à linhagem real. Ele até podia ter sido herdeiro do trono de Davi, como pode indicar a genealogia de Mateus.

Não temas. Ele não devia hesitar ou questionar a virtude de Maria. Como um homem “justo” (v. Mt.1:19), José não precisava temer que ao tomar para si Maria ele estivesse se desviando do que era correto. Na verdade, Deus requeria esse ato de fé.

Mulher. Do gr. gune, que significa (1) mulher em geral (Mt.9:20; Mt.13:33), (2) uma esposa (Mt.14:3; Mt.18:25), (3) uma mulher desposada (Gn.29:21, LXX; Dt.22:23-24, LXX; cf. Ap.21:9). Neste caso, evidentemente, indica-se a terceira opção.

Mt.1:21 21. Ela dará à luz um filho e lhe porás o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos pecados deles.

Ela dará à luz. O anjo não contou a José que sua “mulher” lhe daria um filho, como disse a Zacarias sobre João (Lc.1:13). Jesus nasceria como “o Filho de Deus”, não de José (Lc.1:35), mas desde o momento do nascimento de Jesus, José deveria ser como Seu pai. Como as outras crianças, Jesus seria beneficiado pela companhia, direção e proteção de um pai.

E lhe porás o nome. José teria o privilégio de dar o nome a seu “Filho”, ato que em geral se considerava prerrogativa do pai (ver Lc.1:59-63). Maria também participaria (Lc.1:31). Os nomes das crianças judias eram oficialmente dados uma semana após o nascimento, no oitavo dia, quando se realizava o rito da circuncisão (Lc.2:21).

Jesus. Ver com. do v. Mt.1:1.

Ele salvará. O nome Jesus significa “Yahweh é salvação” (ver com. do v. Mt.1:1). A palavra traduzida como “Ele” é enfática, como se o anjo tivesse dito: “é Ele quem salvará”. Desde a Antiguidade ecoava a promessa “Eis aqui estou” (Sl.40:7; Zc.2:10; Hb.10:7). Por séculos o povo hebreu – o povo de Deus – tinha esperado pela vinda de seu Libertador. Vindo “a plenitude do tempo” (Cl.4:4), surgiu aquele que cumpriria essas expectativas (ver com. de Jo.1:14).

Dos pecados deles. O pecado tinha encarcerado a humanidade (Rm.6:16; 2Pe.2:19; Is.42:7). Cristo veio para desprender as cadeias, abrir as portas da prisão e libertar os cativos da sentença de morte (Is.61:1; Rm.7:24-25). Ele veio para nos salvar de nossos pecados, não nos nossos pecados. Ele veio não só para nos salvar de pecados realmente cometidos, mas de nossas tendências em potencial que conduzem ao pecado (Rm.7:5-23; 1Jo.1:7; 1Jo.1:9). Ele veio para nos redimir de “toda iniquidade” (Tt.2:14), incluindo toda a tendência hereditária e cultivada para o mal (DTN, 671). Cristo não veio para salvar Seu povo do poder de Roma, como os judeus ansiavam, mas do poder de um inimigo muito maior. Ele não veio para restaurar o reino a Israel (At.1:6), mas para restaurar o domínio de Deus no coração humano (Lc.17:20-21). Cristo não veio em primeiro lugar para salvar as pessoas da pobreza e da injustiça social (Lc.12:13-15), como muitos defensores do evangelho social afirmam, mas do pecado, a causa fundamental da pobreza e da injustiça.

Mt.1:22 22. Ora, tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que fora dito pelo Senhor por intermédio do profeta:

Tudo isto aconteceu. Todo aspecto importante da vida e missão de Jesus – Sua natureza, Seu nascimento, os eventos de Sua vida e mais especialmente Seu sofrimento e morte – foram preditos pelos profetas (ver DTN, 242, 820). Não apenas isso, mas todo ato de Sua vida foi realizado em cumprimento de um plano que existia desde a eternidade. Antes que Ele viesse à Terra esse plano estava diante dEle em todos os seus detalhes, e cada evento tinha sua hora certa (DTN, 147, 451; ver com. de Dt.18:15; Lc.2:49).

Para que se cumprisse. Esta expressão é característica de Mateus (ver Mt.2:15; Mt.2:17; Mt.2:23; Mt.4:14; Mt.8:17; Mt.12:17; Mt.13:35; Mt.21:4; Mt.26:54; Mt.26:56; Mt.27:9; Mt.27:35). É uma construção grega que pode indicar tanto propósito ou simplesmente resultado. Essa frase também pode ser traduzida como “por isso se cumpriu”. Mateus usa essa construção de ambas as formas, e o contexto deve determinar a tradução. As previsões sobre Cristo foram feitas de modo sobrenatural; seu cumprimento aconteceu em grande parte de forma natural, até onde foi possível ver, mas sempre por meio de eventos ordenados por Aquele que “tem domínio sobre o reino dos homens” (Dn.4:17; DTN, 147; ver com. de Lc.2:49). Algumas coisas aconteceram, não para cumprir a profecia, mas em cumprimento da profecia. O sentido da afirmação de Mateus “para que se cumprisse”, seria portanto traduzido de forma mais apropriada como “em cumprimento de” (ver com. de Dt.18:15).

Mt.1:23 23. Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e ele será chamado pelo nome de Emanuel (que quer dizer: Deus conosco).

A virgem. De forma direta e indireta Mateus e Lucas dão evidências que confirmam a verdade do nascimento virginal: (1) ambos afirmam que Jesus nasceu do Espírito Santo (Mt.1:18; Mt.1:20; Lc.1:35); (2) declaram que Maria daria “à luz um filho” que não seria filho de José (ver com. de Mt.1:21), mas “Filho de Deus” (Lc.1:35); (3) Maria permaneceu virgem “enquanto ela não deu à luz um filho”, Jesus (Mt.1:25); e (4) Maria afirmou para o anjo que era virgem (Lc.1:34). Assim, o nascimento virginal de Jesus é plenamente confirmado, mesmo sem a palavra “virgem”, e mesmo que Mateus nunca tivesse usado essa palavra nesse contexto. Mateus e Lucas, ao escreverem inspirados por Deus, não teriam relatado a história do nascimento virginal se isso não tivesse sido verdade. Eles sabiam bem como os líderes judeus tinham zombado de Jesus por causa das circunstâncias misteriosas que envolviam seu nascimento, e que, repetindo essa história, estavam dando aos críticos mais oportunidade para ridicularizar o fato (ver DTN, 715). Não pode haver dúvidas de que Mateus aqui usa “virgem” no sentido estrito da palavra, em referência a Maria como uma jovem casta, solteira (ver com. de Is.7:14, em que se aborda a objeção de que a profecia de Isaías sobre a concepção virginal se aplicava apenas a uma situação local em seus dias).

Sob a direção do Espírito Santo, Mateus aplica a previsão de Isaías a Cristo, e ao fazer isso usa a palavra parthenos, que significa estritamente “virgem” (sobre Is.7:14 ver Problems in Bible Translation, p. 151-169). Por rejeitarem todos os milagres, críticos atuais da Bíblia em geral descartam a ideia do nascimento virginal, por considerá-la fora de questão para uma mente esclarecida. Argumentam que apenas Mateus e Lucas o mencionam no NT. Enfatizam que nem os evangelhos de Marcos (que se presume ser o primeiro dos evangelhos), nem o de João, escrito para confirmar a divindade de Jesus, ou mesmo Paulo, o grande teólogo do NT, fazem referência ao assunto. Assim, os críticos concluem que Marcos não sabia coisa alguma de Maria como uma virgem e que João e Paulo consideravam a ideia fantasiosa demais para ser mencionada. Todos esses argumentos são baseados no silêncio e por isso nada provam. Mateus e Lucas se referem à virgindade de Maria como um detalhe do relato do nascimento; e, visto que nem Marcos nem João o registram, não há razão para se referir a esse detalhe particular. O mesmo se dá com Paulo, que enfatiza a encarnação, a união do divino com o humano como o grande fato central implícito no nascimento de Jesus. Como o meio pelo qual se deu a encarnação, o nascimento por meio de uma virgem é em certo sentido incidental diante da verdade maior.

O conceito paulino da divindade de Jesus Cristo é completamente consistente com o nascimento de uma virgem (ver Fp.2:6-8; Cl.1:16; Hb.1:1-9). Com exceção da encarnação, crucifixão e ressurreição, Paulo não se refere a quase nada a respeito dos detalhes da vida de nosso Senhor e toma esses três eventos simplesmente como um fato histórico. Os críticos destacam que os pagãos atribuíam a grandeza de homens como Alexandre, Pitágoras, Platão e Augusto César ao suposto fato de eles descenderem de deuses e por terem tido um nascimento virginal. Contudo, esse argumento não é mais válido do que dizer que a existência de moedas falsas e falsificações das grandes obras de arte provam que não há moedas nem obras genuínas. Se as declarações de Mateus e Lucas relativas ao nascimento virginal devessem ser descartadas como inverossímeis porque a verdade assim expressada transcende nosso conhecimento e experiência, muitas outras passagens dos evangelhos devem ser descartadas com base nessa mesma suposição. Se a mente humana se torna o padrão para determinar a confiabilidade das Escrituras, a Bíblia deixa de ser a Palavra de Deus aos homens e se transforma num documento meramente humano. Não se deve esquecer que todo o plano de salvação é um milagre, um “mistério” (Rm.16:25; Ef.1:9; Ef.3:9; Cl.1:27; Cl.2:2; Ap.10:7). Em primeiro lugar, é um mistério que Deus possa amar pecadores (Jo.3:16; Rm.5:8). É também um mistério que a sabedoria infinita pudesse traçar um plano no qual a graça se combinasse com a justiça (SI.85:10) a fim de satisfazer as justas reivindicações da santa lei de Deus e, ao mesmo tempo, salvar o pecador de seu castigo (Jo.3:16; Rm.6:23).

É um milagre que o ser humano, que naturalmente está em inimizade com Deus (Rm.8:7), possa viver em paz com Ele (Rm.5:1). É um milagre que Cristo possa libertar do reino do pecado e da morte alguém inclinado para o mal (Rm.7:24; Rm.8:1-2), e capacitá-lo a viver uma vida perfeita em harmonia com o caráter divino (Rm.8:3-4). É um milagre alguém poder nascer de novo (Jo.3:3-9); que alguém imperfeito (Rm.3:23) seja transformado (Rm.12:2) pela graça de Cristo em alguém perfeito (Mt.5:48) e se torne um filho de Deus (1Jo.3:1-3). O nascimento virginal, a vida perfeita, a morte vicária e a gloriosa ressurreição de Jesus são mistérios para a mente humana. A religião cristã não faz apologia aos grandes mistérios do plano da salvação, pois o amor redentor de Deus é em si o maior de todos os mistérios. A encarnação do Filho de Deus é o fato culminante de todos os tempos, a pedra angular da fé cristã. Sem o nascimento virginal não pode haver verdadeira encarnação, e sem a encarnação e o nascimento virginal a Bíblia se tornaria fábula e lenda, o cristianismo, um engano piedoso, e a salvação, uma miragem decepcionante (ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51).

Um filho. Isto é, por meio do Espírito Santo, como Lucas também testifica (Lc.1:35). “Vindo, porém, a plenitude do tempo” (Gl.4:4), Deus enviou Seu Filho ao mundo, preparando para Ele um corpo (Hb.10:5).

Emanuel. A transliteração grega do heb. ‘Immanu ’El, literalmente, “Deus conosco”. O Filho de Deus não só veio para habitar entre nós, mas também para Se identificar com a família humana (Jo.1:1-3; Jo.1:14; Rm.8:1-4; Fp.2:6-8; Hb.2:16-17; DTN, 23; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51; ver também com. de Jo.1:1-3; Jo.1:14). “Emanuel” era mais um título que descrevia a missão de Cristo do que um nome pessoal (cf. Js.9:6-7; 1Co.10:4).

Mt.1:24 24. Despertado José do sono, fez como lhe ordenara o anjo do Senhor e recebeu sua mulher.

Recebeu sua mulher. Ver v. Mt.1:18; Mt.1:20. Quando Deus falou, José agiu, sem dúvida ou demora. Nisso, talvez mais do que em qualquer outro aspecto do caráter de José, fica evidente por que ele se adequava para ser o protetor terreno de Maria e de seu filho Jesus. Ao levar Maria para sua casa, José agiu com fé. Algo como o anunciado pelo anjo era desconhecido na história da experiência humana, mas José cria que “para Deus tudo é possível” (Mt.19:26; Gn.18:14; Jó.42:2; Je.32:17; Zc.4:6; Lc.1:37; Rm.4:21). O papel de José era humilde, porém indispensável, e o fato de ter acatado prontamente as instruções do anjo fez uma enorme diferença, tanto para Maria como para a opinião pública.

Mt.1:25 25. Contudo, não a conheceu, enquanto ela não deu à luz um filho, a quem pôs o nome de Jesus.

Não a conheceu. A forma do verbo em grego não concorda com a tradição católica romana da virgindade perpétua de Maria, pois indica que ela foi virgem apenas até o nascimento de Jesus. Contudo, a palavra “enquanto” (do gr. heos) não é definitiva nem a favor nem contra a virgindade perpétua. O significado mais natural do v. 25 é que, embora Maria não vivesse com José como sua mulher antes do nascimento de Jesus, isso aconteceu depois (comparar com os empregos de heos na LXX, em Gn.8:7; 1Sm.15:35; 2Sm.6:23; Mt.5:26; Mt.12:20; Mt.18:30; Mt.22:44). Jesus tinha irmãos e irmãs, mas ao menos os irmãos eram mais velhos que ele. Talvez os filhos de José eram de um casamento anterior (ver com. de Mt.12:46). O fato de Jesus haver entregado sua mãe aos cuidados de João (Jo.19:27) pode indicar que Maria não tivesse outros filhos. Por outro lado, ela pode ter tido filhos que não estivessem em condições de cuidar dela ou que não simpatizavam com ela nem com Jesus (ver com. de Mt.1:18).

Seu filho, o primogênito (ACF). Há evidência textual (cf. p. 136) para a omissão da palavra “primogênito”. Porém, tal omissão de modo algum afeta a certeza de que Jesus foi o primogênito de Maria, pois esses mesmos manuscritos empregam essa palavra em Lc.2:7. Entre os judeus, o termo “primogênito” era usado com frequência num sentido técnico, legal. Como resultado do livramento dos primogênitos de Israel da décima praga do Egito, Deus reivindicou como Seus todos os primogênitos de Israel (Ex.13:2; Nm.3:13). No Sinai, a tribo de Levi foi aceita para o serviço do santuário no lugar do primogênito de todas as tribos, mas o Senhor exigiu que todo primogênito fosse redimido (Nm.3:45-46). Tecnicamente, o “primogênito” podia ser um filho único.

A quem pôs o nome de Jesus. Oficialmente dava-se nome aos filhos no oitavo dia de nascimento (Lc.2:21). Naquela época, Jesus foi registrado como filho de Maria e José (ver com. de Mt.1:1).

Mt.2:1 1. Tendo Jesus nascido em Belém da Judeia, em dias do rei Herodes, eis que vieram uns magos do Oriente a Jerusalém.

Tendo Jesus nascido. [A visita dos magos, Mt.2:1-12. Ver mapa, p. 212; gráficos, p. 224]. Mateus menciona brevemente o nascimento de Jesus (Mt.1:25) e omite outros incidentes relacionados a esse acontecimento, registrados por Lucas (Lc.1:26-2:40). Visto que Mateus enfatiza Jesus como o Messias da profecia do AT, ele demonstra que de fato Jesus cumpriu todas as profecias (ver com. de Mt.1:22). Ele menciona, como introdução, eventos relacionados com a infância de Jesus que tinham sido profetizados e que indicavam o reinado do Messias (ver Mt.1:1; Mt.1:6; Mt.1:17; Mt.1:23; Mt.2:2; Mt.2:6; Mt.2:15; Mt.2:17-18; Mt.2:23). Por outro lado, Lucas, ao escrever principalmente para os gentios (ver com. de Lc.1:3), enfatiza que Jesus, o Filho de Deus (v. Lc.1:32; Lc.1:35; Lc.1:76), cresceu e viveu como homem entre os homens, a fim de que pudesse ser o Salvador de todos (Lc.2:10; Lc.2:14; Lc.2:31-32). Este Comentário adota a posição de que o nascimento de Jesus ocorreu no outono do ano 5 a.C. (ver p. 236, 237; ver também gráficos, p. 224).

Belém. Literalmente, “casa do pão”. Seu nome anterior, Efrata (Gn.48:7), significa “fertilidade” (ver com. de Gn.35:19). A região de Belém, com suas colinas e seus vales cobertos de vides, figueiras, oliveiras e campos de cereais, provavelmente era, em parte, o celeiro da Judeia. Essa região estava cheia de memórias para o povo judeu do tempo de Cristo, assim como para os cristãos de hoje. Foi nesse lugar que Rute colheu espigas nos campos de Boaz (Rt.2-4) e onde Davi cuidou dos rebanhos de seu pai (1Sm.16:1; 1Sm.16:11; 1Sm.17:15). Também foi onde Samuel ungiu Davi como rei (1Sm.16:13; ver com. de Gn.35:19; Rt.3:3; Rt.4:1; ver também mapa, p. 327).

Da Judeia. Belém da Judeia é distinta da Belém da Galileia, uma vila cerca de 11 km a noroeste de Nazaré (Js.19:15).

Herodes. Isto é, Herodes, o Grande (ver p. 26-30).

Magos. Do gr. magoi, que designava homens de diferentes classes cultas. A palavra “magos” vem dessa raiz. Entretanto, esses “magos” não eram magos no sentido como hoje se entende essa palavra. Eles eram nobres de nascimento, educados, ricos e influentes. Eram os filósofos, os conselheiros do reino, instruídos em toda sabedoria do antigo Oriente. Os “sábios” que foram em busca do Cristo recém-nascido não eram idólatras; eram homens retos e íntegros (DTN, 59, 61). Eles estudavam as Escrituras hebraicas e ali encontraram uma clara exposição da verdade. Em particular, as profecias messiânicas do AT chamaram sua atenção e, entre elas, as palavras de Balaão: “uma estrela procederá de Jacó” (Nm.24:17). É provável que também conhecessem e entendessem a profecia de tempo de Daniel (Dn.9:25-26), e chegaram à conclusão de que a vinda do Messias estava próxima (ver p. 48-50). Na noite do nascimento de Cristo, uma luz misteriosa apareceu no céu e se tornou uma estrela brilhante que persistia no céu ocidental (ver DTN, 60). Impressionados com seu brilho, os magos consultaram outra vez os rolos sagrados. Ao buscarem compreender o significado dos escritos sagrados, foram instruídos em sonho a partir em busca do Messias. Como Abraão, não sabiam em princípio para onde estavam indo, mas seguiram a estrela. A tradição de que havia apenas três magos surgiu do fato de que eles deram três presentes a Cristo (Mt.2:11), mas isso não tem base bíblica. Uma lenda interessante, porém sem valor, lhes atribui os nomes de Gaspar, Baltazar e Melchior. A ideia infundada de que eram reis vem de Is.60:3 (cf. Ap.21:24; sobre a extensão da influência judaica no mundo romano do tempo de Cristo, ver p. 46-50).

Do Oriente. Os judeus consideravam as regiões do norte da Arábia, Síria e Mesopotâmia como “oriente”. Assim, Harã estava na “terra do povo do Oriente” (Gn.29:1; Gn.29:4). No tempo do êxodo, o rei de Moabe chamou Balaão de Arã [isto é, da Síria], dos montes do Oriente (Nm.23:7; ver com. de Nm.22:5). Isaías falou de Ciro, o persa, como o justo do Oriente (Is.41:2) e “ave de rapina desde o Oriente” (Is.46:11). Alguns imaginam que os magos eram da mesma região de Balaão (ver DTN, 59, 60), cuja pátria foi identificada como o vale de Sajur, entre Alepo e Carquemis, próximo do Eufrates (ver com. de Nm.22:5; ver também PP, 438, 439). Se fosse assim, sua jornada até Belém seria cerca de 650 km e levaria de duas a três semanas de viagem ininterrupta em montaria ou talvez um mês caminhando. Tendo em vista o fato de que eles viajavam à noite para se guiarem pela estrela (DTN, 60), pode ser que a viagem tenha durado ainda mais tempo. Contudo, o ponto de partida pode ter sido ainda mais distante no leste, o que tornaria a distância ainda maior.

Jerusalém. Finalmente, a longa viagem os levou até o topo do monte das Oliveiras, a leste de Jerusalém. Talvez pouco antes do amanhecer a estrela desapareceu (DTN, 60), e logo a abóbada de mármore reluzente e os muros do templo sagrado refletiram a luz de um novo dia. O fato de os magos terem sido guiados a Jerusalém em vez de a Belém (DTN, 61) é um indício do propósito divino de que sua visita fosse um meio de chamar a atenção dos líderes da nação para o nascimento do Messias (ver v. Mt.2:3-6). A atenção e o interesse do povo foram despertados ao saberem da missão dos magos, e então buscaram estudar as profecias. Os líderes judeus se ofenderam com o fato de os magos serem gentios e se recusaram a crer que Deus passaria por alto os hebreus e Se comunicaria com pagãos (ver DTN, 62, 63). Herodes se enfureceu com a aparente indiferença dos sacerdotes e escribas (v. Mt.2:3-4) e considerou que a visita dos sábios poderia estar relacionada de algum modo a um complô contra sua vida (DTN, 61, 62).

Mt.2:2 2. E perguntavam: Onde está o recém-nascido Rei dos judeus? Porque vimos a sua estrela no Oriente e viemos para adorá-lo.

Recém-nascido Rei dos judeus. A pergunta indica que os sábios não eram judeus; do contrário teriam dito “nosso rei”. Parece que se reconhecia que o rei Salvador esperado pelas nações vizinhas surgiria na Judeia (ver com. do v. Mt.2:1). Ao entrarem em Jerusalém, os sábios foram em primeiro lugar ao templo, sobre o qual a estrela tinha desaparecido da vista, mas encontraram apenas ignorância, surpresa, temor e desdém (DTN, 60, 61).

Sua estrela. Essa estrela não era uma conjunção de planetas, como imaginaram alguns, nem uma nova [fenômeno astronômico], como sugeriram outros. A “estrela” que apareceu na noite do nascimento de Cristo era um “longínquo grupo de anjos resplandecentes” (DTN, 60; v. Mt.2:7). Os magos foram levados a interpretar esse fenômeno incomum como o cumprimento da profecia de Balaão acerca da estrela de Jacó (Nm.24:17; ver DTN, 60).

Oriente. Do gr. anatole, que significa, literalmente, “surgimento”. A palavra traduzida por “oriente” no v. Mt.2:1 é anatolai, plural de anatole. No grego, anatole tem o artigo definido, ao passo que anatolai não. Essa diferença entre as duas expressões tem levado alguns a concluírem que no v. 2, Mateus não se refere ao oriente como a direção na qual se viu a estrela no céu ou como a designação do país do qual eram esses magos, mas em vez disso, ele usa anatole no seu sentido literal, “surgimento”. A frase pode ser traduzida como “porque vimos a Sua estrela surgir”, isto é, quando apareceu pela primeira vez. Essa parte do relato foi a que mais interessou a Herodes (v. Mt.2:7). É evidente que a outra interpretação: “porque vimos a Sua estrela no Oriente” também é possível.

Mt.2:3 3. Tendo ouvido isso, alarmou-se o rei Herodes, e, com ele, toda a Jerusalém;

Alarmou-se. A longa lista de atrocidades cometidas por Herodes, em especial, o assassinato de vários membros de sua família (por suspeitas de conspirações para matá-lo e usurpar seu trono) testifica de forma eloquente de seus sentimentos ao ouvir do nascimento dAquele destinado a ser o “rei dos judeus” (ver p. 48-50). A aparente relutância dos sacerdotes em divulgar informações sobre as profecias messiânicas, mencionadas sem dúvida pelos magos, fez Herodes suspeitar de que os sacerdotes conspiravam com os magos a fim de destroná-lo, talvez por meio de uma revolta popular. Além disso, é provável que o próprio Herodes soubesse da expectativa popular de um príncipe que nasceria na Judeia e que estava destinado a governar o mundo. Não só isso; parece que ele próprio se considerava o Messias e ansiava em segredo governar o mundo (ver Joseph Klausner, The Messianic Idea in Israel, 374).

Toda a Jerusalém. Não é de se surpreender que toda a cidade se alarmasse, pois seus habitantes sabiam do que Herodes era capaz. Temendo uma revolta popular, ele bem podia decretar a matança de centenas ou milhares do povo.

Mt.2:4 4. então, convocando todos os principais sacerdotes e escribas do povo, indagava deles onde o Cristo deveria nascer.

Os principais sacerdotes. Talvez o sumo sacerdote oficiante e os sacerdotes que já tinham exercido esse ofício, todos nomeados por Herodes e, mais tarde, depostos por ele. Durante seu reinado de cerca de 33 anos, Herodes nomeou um total de nove sumos sacerdotes para esse ofício sagrado, que originalmente deveria ser hereditário e vitalício (Ex.28:1; Ex.40:12-15; Lv.21:16-23; Nm.16:40; Nm.17; Nm.18:1-8; Dt.10:6). Simão, filho de Boeto, possivelmente, era sumo sacerdote nessa época (Antiguidades, xv.9.3), ou Matthias ou ainda Joazar, genro e filho de Boeto, respectivamente, que seguiram Simão em rápida sucessão (Antiguidades, xvii.4.2; 6.4; 13.1). Outros sugerem que os “principais sacerdotes” eram cheios dos 24 turnos (ver com. de Lc.1:5). Parece que o grupo reunido por Herodes era o dos homens instruídos da nação, que poderiam ter a informação que ele desejava.

Escribas. Estes homens com frequência são designados como intérpretes (Mt.22:35; Mc.12:28) ou “doutores da lei”, literalmente, “mestres da Lei” (Lc.5:17; Lc.5:21). Eram pessoas instruídas cujo dever era estudar, preservar, copiar, interpretar e explicar a Lei, ou os escritos sagrados (ver p. 43; ver com. de Mc.1:22).

Indagava. A forma do verbo, em grego, indica que Herodes indagou com persistência. Aparentemente os sacerdotes tentavam se evadir de uma resposta direta. Herodes teve que arrancá-la deles. É provável que os magos tivessem se referido ao estudo das Escrituras e, sendo assim, Herodes podia ter suposto que os doutores da lei devessem saber mais do que aparentavam. De modo nenhum eram tão ignorantes quanto pretendiam ser a respeito das profecias ou dos acontecimentos que indicavam seu cumprimento. Sem dúvida, sabiam da visão de Zacarias (Lc.1:22), do relato dos pastores (ver com. de Lc.2:17) e da profecia de Simeão (Lc.2:27-28; Lc.2:34-35). Contudo, o orgulho e a inveja fecharam as portas do coração deles para a luz, pois era evidente que Deus os havia passado por alto ao Se comunicar com incultos pastores e pagãos incircuncisos, como pensavam. Consideraram esses relatos como fanatismo e indignos de atenção (ver DTN, 62, 63).

Onde o Cristo deveria nascer. Herodes procurou se certificar do local do nascimento de Cristo e mais tarde quis saber dos magos o tempo (v. Mt.2:7).

Mt.2:5 5. Em Belém da Judeia, responderam eles, porque assim está escrito por intermédio do profeta:

Assim está escrito. A citação (v. Mt.2:6) dada pelos principais sacerdotes e escribas não concorda inteiramente com o texto hebraico de Mq.5:2 nem com a LXX. Parece ser uma paráfrase ou, possivelmente, a citação de um targum ou de uma passagem tal como a recordavam no momento. Em Jo.7:42, fica claro que o significado de Mq.5:2 era conhecido mesmo entre o povo.

Mt.2:6 6. E tu, Belém, terra de Judá, não és de modo algum a menor entre as principais de Judá; porque de ti sairá o Guia que há de apascentar a meu povo, Israel.

Principais. O texto hebraico de Mq.5:2 diz “milhares”, que também pode ser traduzido como “famílias”, isto é, as principais subdivisões familiares de uma tribo (ver com. de Ex.12:37; Mq.5:2).

Apascentar. Do gr. poimaino, “pastorear”. Isaías tinha predito que o Messias apascentaria seu rebanho como pastor (Is.40:11). Jesus Se referiu a Si mesmo como o “bom pastor” (Jo.10:11; Jo.10:14), Paulo O chamou de “o grande Pastor das ovelhas” (Hb.13:20), Pedro, de “o Supremo Pastor” (1Pe.5:4), e João, de “o Cordeiro” que “os apascentará” (Ap.7:17).

Mt.2:7 7. Com isto, Herodes, tendo chamado secretamente os magos, inquiriu deles com precisão quanto ao tempo em que a estrela aparecera.

Com precisão. Herodes exigiu informação específica. A referência é à exatidão da informação e não à diligência em obtê-la.

Quanto ao tempo. Herodes já tinha obtido a informação dos principais sacerdotes e escribas sobre onde Cristo nasceria (v. Mt.2:4-6). Ele então tentou saber dos magos quando se deu o nascimento.

Mt.2:8 8. E, enviando-os a Belém, disse-lhes: Ide informar-vos cuidadosamente a respeito do menino; e, quando o tiverdes encontrado, avisai-me, para eu também ir adorá-lo.

Enviando-os. Herodes cuidadosamente ocultou seus pensamentos atrás de uma aparência de interesse e simpatia. Ele esperava que os magos correspondessem à sua aparente bondade. A visita deles a Belém não provocaria suspeita e lhe permitiria ir adiante com seu propósito maligno sem alarmar o povo desnecessariamente. Os principais sacerdotes e escribas devem ter suspeitado da intenção de Herodes, pois conheciam sua atitude para com os que pretendiam lhe usurpar o trono.

Cuidadosamente. Ou, “com exatidão” (ver com. do v. Mt.2:7). Os magos deveriam buscar até encontrar o Messias e avisar sobre a descoberta.

Mt.2:9 9. Depois de ouvirem o rei, partiram; e eis que a estrela que viram no Oriente os precedia, até que, chegando, parou sobre onde estava o menino.

A estrela [...] os precedia. Ao partirem de Jerusalém ao entardecer, seguindo o costume de viajar à noite (ver com. do v. Mt.2:1), os magos tiveram sua fé renovada ao avistarem a estrela.

Mt.2:10 10. E, vendo eles a estrela, alegraram-se com grande e intenso júbilo.

Sem comentário para este versículo.

Mt.2:11 11. Entrando na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se, o adoraram; e, abrindo os seus tesouros, entregaram-lhe suas ofertas: ouro, incenso e mirra.

Na casa. Jesus então tinha pelo menos 40 dias (ver com. de Lc.2:22).

Prostrando-se. Atitude oriental comum para expressar respeito e reverência supremos a pessoas, ídolos e a Deus (ver Et.8:3; Jó.1:20; Is.46:6; Dn.3:7).

Adoraram. Apesar das decepções anteriores, os magos sabiam que essa criança era aquele em busca de quem tinham partido de tão longe.

Seus tesouros. Do gr. thesauroi, que significa “cofres” ou “baú de tesouro”, usados como recipientes para se guardar algo valioso ou “tesouros”. A palavra também é traduzida como “tesouros” em Mt.6:20 e em Cl.2:3. O singular (thesauros) denota um depósito, em Mt.13:52.

Ofertas. No Oriente, ninguém visitava um príncipe ou alto oficial sem levar um presente como um ato de homenagem (comparar com os presentes dados a José no Egito, Gn.43:11; a Samuel, 1Sm.9:7-8; a Salomão, 1Rs.10:2; e a Deus, SI.96:8).

Incenso. Uma resina de cor branca ou amarela clara obtida a partir de incisões na cortiça de árvores do gênero Boswellia. Tem gosto amargo, mas exala fragrância quando queimada como incenso. Era usada como ingrediente no incenso sagrado do santuário (Ex.30:8; Ex.30:34). Em geral, era importada da Arábia (Is.60:6; Je.6:20).

Mirra. Outra resina aromática muito cobiçada antigamente, amarga e levemente apimentada. Era obtida provavelmente a partir de uma pequena árvore, a Balsamodendron myrrha ou Commiflora myrrha, nativa da Arábia e África oriental. Era um dos ingredientes do óleo sagrado (Ex.30:23-25) e também era usada para se produzir perfumes (Et.2:12; SI.45:8; Pv.7:17), como calmante, misturado com vinho (Mc.15:23) e no embalsamento (Jo.19:39).

Mt.2:12 12. Sendo por divina advertência prevenidos em sonho para não voltarem à presença de Herodes, regressaram por outro caminho a sua terra.

Sem comentário para este versículo.

Mt.2:13 13. Tendo eles partido, eis que apareceu um anjo do Senhor a José, em sonho, e disse: Dispõe-te, toma o menino e sua mãe, foge para o Egito e permanece lá até que eu te avise; porque Herodes há de procurar o menino para o matar.

Em sonho. [A fuga para o Egito, Mt.2:13-15. Ver mapa, p. 212; gráfico, p. 224]. Foi a mesma maneira pela qual o anjo falou a José pela primeira vez (Mt.1:20).

Foge para o Egito. O Egito era outra província romana e estava além da jurisdição de Herodes. A fronteira tradicional era o Rio do Egito, 160 km a sudoeste de Belém. Nessa época, muitos judeus viviam no Egito, portanto, José não estaria completamente entre estranhos. Havia sinagogas nas cidades, e até mesmo templos judeus. Heliópolis (Om; cf. Gn.41:45; Gn.41:50; Gn.46:20) é o lugar para o qual, segundo a tradição, José e Maria fugiram em busca de segurança.

Mt.2:14 14. Dispondo-se ele, tomou de noite o menino e sua mãe e partiu para o Egito;

De noite. Sem dúvida, José obedeceu prontamente, talvez na mesma noite ou tão logo tenha feito os preparativos para a viagem. Os presentes dados pelos magos proveram os meios necessários para a viagem (DTN, 65).

Mt.2:15 15. e lá ficou até à morte de Herodes, para que se cumprisse o que fora dito pelo Senhor, por intermédio do profeta: Do Egito chamei o meu Filho.

Até à morte de Herodes. Ele morreu logo depois de ordenar a matança das crianças de Belém (DTN, 66), no ano 4 a.C. (ver p. 29, 30, 238), de uma enfermidade terrível e dolorosa.

Para que se cumprisse. Esta citação é do hebraico de Os.11:1. A LXX diz; “do Egito chamei seus filhos”. No contexto original de Oseias, as palavras desta profecia se referem à libertação do povo hebreu do Egito. Ao pedir a faraó que os libertasse, Moisés disse: “Assim diz o Senhor: Israel é Meu filho, Meu primogênito” (Ex.4:22; sobre a aplicação de Mateus das palavras de Os.11:1 a Cristo, ver com. de Dt.18:15).

Mt.2:16 16. Vendo-se iludido pelos magos, enfureceu-se Herodes grandemente e mandou matar todos os meninos de Belém e de todos os seus arredores, de dois anos para baixo, conforme o tempo do qual com precisão se informara dos magos.

Iludido. [A matança dos inocentes, Mt.2:16-18. Ver mapa, p. 212; ver gráfico, p. 224]. Eles o “enganaram”. Para Herodes, eles o tinham ludibriado. Herodes considerou isso um insulto e, sem dúvida, como mais uma prova de uma trama sinistra contra ele.

Matar todos os meninos. É provável que apenas os meninos. Críticos da exatidão do relato bíblico observam que Josefo, em seu longo registro das atrocidades cometidas por Herodes, não menciona a matança das crianças de Belém. Porém, estimou-se que numa aldeia cuja população provavelmente não excedesse 2 mil habitantes, incluindo arredores, teriam existido apenas cerca de 50 ou 60 crianças da idade indicada, e que somente a metade delas seriam meninos. Alguns estimam que fosse um número um pouco maior. Josefo pode ter considerado o incidente relativamente insignificante comparado com a longa lista de crimes mais terríveis cometidos por Herodes. Um ato como esse se ajusta bem ao caráter insensível de Herodes. Foi um dos últimos feitos de sua vida (DTN, 66). Além disso, se Josefo mencionasse esse ato cruel, teria de explicar os motivos que o impulsionaram, como faz com acontecimentos similares que relata. Isso poderia implicar uma análise das pretensões messiânicas de Jesus de Nazaré, um tema que, como judeu, ele deve ter escolhido evitar. E, visto que estava escrevendo uma apologia do judaísmo para os romanos, em especial para o imperador Vespasiano, evitaria mencionar qualquer coisa contrária a Roma (ver p. 62, 63, 81, 82).

Arredores. Literalmente, fronteiras.

Dois anos. Segundo o antigo sistema de computo oriental, ainda usado em algumas regiões, dizia-se que uma criança tinha “um ano de idade” no seu primeiro ano, isto é, entre seu nascimento e o ano seguinte; e “dois anos de idade” no seu segundo ano, mesmo que tivesse apenas alguns dias ou semanas de vida. Se os judeus da época de Cristo contavam a idade assim, segundo os anos do calendário, não é necessário supor que Jesus nasceu dois anos antes da morte de Herodes, ou mesmo que Herodes, a fim de assegurar seu objetivo, estabeleceu o limite de “dois anos” além do tempo indicado pelos magos (Mt.2:7). Uma criança nascida em qualquer momento do ano 5/4 a.C. teria “dois anos de idade” em 4/3 a.C., ano da morte de Herodes (quanto à data provável do nascimento de Jesus, ver p. 236-239).

Mt.2:17 17. Então, se cumpriu o que fora dito por intermédio do profeta Jeremias:

Então, se cumpriu. Ver Je.31:15 (sobre a aplicação original dessa profecia, ver com. de Je.31:15; sobre sua aplicação messiânica, ver com. de Dt.18:15).

Mt.2:18 18. Ouviu-se um clamor em Ramá, pranto, [choro] e grande lamento; era Raquel chorando por seus filhos e inconsolável porque não mais existem.

Ramá. Há diferença considerável de opinião quanto a identificação de Ramá. O AT menciona várias cidades com esse nome. Talvez deva ser identificada com Ramallah, em Efraim, cerca de 15 km a noroeste de Jerusalém (ver Nota Adicional a 1 Samuel 1; 1Sm.1:28). Esta cidade ficava próxima à fronteira entre as tribos de Efraim e Benjamim, neto e filho, respectivamente, de Raquel, esposa de Jacó.

Raquel chorando. As palavras de Jeremias se referem às amargas experiências dos cativos hebreus levados a Babilônia, em 586 a.C. (ver com. de Je.31:15). A morte de Raquel, em algum lugar próximo dali, no nascimento de Benjamim (Gn.35:18-20), torna a metáfora bem apropriada. Ela chamou seu filho de Benoni (ver Gn.35:18), que significa “filho da minha tristeza”. Inspirado, Mateus aplica as palavras de Jeremias à matança das crianças de Belém ordenada por Herodes (ver com. de Dt.18:15).

Mt.2:19 19. Tendo Herodes morrido, eis que um anjo do Senhor apareceu em sonho a José, no Egito, e disse-lhe:

Tendo Herodes morrido. [A volta do Egito, Mt.2:19-23 = Lc.2:39-40. Comentário principal: Mt, Lc. Ver p. 29, 30; mapa, p. 212; gráficos, p. 225, 231].

Mt.2:20 20. Dispõe-te, toma o menino e sua mãe e vai para a terra de Israel; porque já morreram os que atentavam contra a vida do menino.

Terra de Israel. Termo que se refere a toda a Palestina.

Já morreram. Alguns creem que o plural se refere a Herodes e a seu filho e herdeiro, Antípater (morto pouco tempo antes da morte de Herodes); outros incluem os soldados que participaram do massacre das crianças de Belém.

Mt.2:21 21. Dispôs-se ele, tomou o menino e sua mãe e regressou para a terra de Israel.

Sem comentário para este versículo.

Mt.2:22 22. Tendo, porém, ouvido que Arquelau reinava na Judeia em lugar de seu pai Herodes, temeu ir para lá; e, por divina advertência prevenido em sonho, retirou-se para as regiões da Galileia.

Arquelau. Em seu testamento, Herodes dividiu seu domínio em quatro partes, duas para Arquelau, uma para Antipas e uma para Filipe (ver p. 51-53). Arquelau foi o pior dos Filhos de Herodes. Sua tirania e incompetência levaram os judeus e os samaritanos a apelarem a Roma para que fosse retirado do trono, o que aconteceu em 6 d.C., no décimo ano de seu reinado. Augusto o baniu para Gália (França), onde morreu.

Porém. Do gr. de, “e” ou “mas”.

Em sonho. Este foi o terceiro sonho de José (ver Mt.1:20; Mt.2:13; Mt.2:19).

Retirou-se. Talvez José e Maria, ao compreenderem as profecias do Messias como o Filho de Davi, tiveram a intenção de se estabelecer em Belém.

Galileia. Transliteração do heb. Galil ou Gelilah, “círculo”, no sentido de “circuito” ou “distrito”. Sua população era uma mistura de judeus e gentios, e os preconceitos religiosos da maioria judia eram menos evidentes ali. Não havia grandes cidades nessa região. As pessoas viviam principalmente nas áreas rurais e vilas, ocupando-se dos afazeres comuns do dia a dia. Seus habitantes eram desprezados pelos residentes da província da Judeia, mais próspera (Jo.7:52; Mt.26:69; Jo.1:46). A partir do relato de Lucas (Lc.2:39), pode parecer que José e Maria retornaram imediatamente à Galileia depois da apresentação de Jesus no templo. Porém, Mateus deixa claro que a permanência no Egito ocorreu entre esses dois acontecimentos (ver com. de Lc.2:39). Não há razão válida para supor que os dois relatos sejam contraditórios (ver mapa, p. 327).

Mt.2:23 23. E foi habitar numa cidade chamada Nazaré, para que se cumprisse o que fora dito por intermédio dos profetas: Ele será chamado Nazareno.

Nazaré. Um pequeno vilarejo cerca de 100 km ao norte de Jerusalém, entre o extremo sul do mar da Galileia e o Mar Mediterrâneo, próximo ao local da atual em-Nasirah. É provável que a antiga vila estivesse situada na ladeira ocidental que se levanta de uma depressão cercada de montes. A depressão tem forma de pera, com mais ou menos um quilômetro e meio de largura. A ponta da pera indica o sul e se abre para um vale estreito e sinuoso que termina na ampla planície de Esdraelom. A vila ficava a cerca de 350 m acima do nível do mar, e cerca de 280 m acima da planície. Estava no território atribuído antigamente à tribo de Zebulom (ver ilustração, p. 549). Alguns chegaram à conclusão de que o nome Nazaré provém de uma raiz que significa “proteger” ou “guardar”, e lhe atribuem o significado de “torre de vigia”, uma descrição apropriada de sua localização que está no alto dos montes da Galileia.

Outros creem que provém de uma raiz cujo significado é “ramo” ou “broto”, que corresponderia à densa vegetação dos montes dessa região. A forma exata do nome original e seu significado são incertos. Essa é a primeira menção de Nazaré na Bíblia, o que pode indicar sua insignificância ou que fosse uma cidade nova. Josefo não a inclui numa lista de cerca de 200 cidades e vilas da Galileia. Era uma vila proverbial por sua impiedade, mesmo entre o povo da Galileia (ver com. de Lc.1:26). Do topo do monte acima da vila, pode-se ter uma vista magnificente em todas as direções. Cerca de 30 km a oeste estão as águas azuis do Mediterrâneo. Ao sul está a ampla e fértil planície de Esdraelom, com as montanhas de Samaria acima. Cerca de 10 km a leste está o monte Tabor e, além da depressão do Jordão, o planalto de Gileade. Ao norte estão as montanhas do Líbano e Anti-Líbano.

Dos profetas. O fato de não haver no AT profecia específica semelhante a esta tem levado estudiosos críticos da Bíblia a apontarem essa afirmação como um erro e, portanto, evidência de que Mateus não foi inspirado. Contudo, é digno de nota que, em casos anteriores em que Mateus cita uma profecia específica, ele fala do “profeta” (Mt.1:22; Mt.2:5; Mt.2:15; Mt.2:17). O uso do plural dessa palavra, neste caso, indica claramente referência, não a uma afirmação profética particular, mas a várias, que, juntas, levaram a essa conclusão (ver com. de Ed.9:11; Ne.1:8). Também é possível que Mateus tenha citado escritos inspirados que não foram incluídos no cânon das Escrituras.

Nazareno. Alguns sugerem que este nome deriva do heb. nazir, “nazireu”, que significa “separado”, e que a afirmação de Mateus originalmente dizia: “Ele será chamado nazireu” (ver com. de Nm.6:2). Mas isso é pouco provável. Além disso, Jesus obviamente não era um nazireu (Mt.11:19; Lc.7:33-34; Nm.6:2-4). A raiz mais provável é nasar, da qual deriva netser, um “ramo”, “rebento” ou “renovo”. Netser é traduzido como “renovo” em Is.11:1, uma profecia claramente messiânica. A palavra mais comum para “renovo” na profecia messiânica é tsemach (Je.23:5; Je.33:15; Zc.3:8; Zc.6:12). Portanto, é possível que a derivação de Nazaré de netser esteja correta, e que as profecias de Jesus como o “Renovo” poderiam apropriadamente ser aplicadas ao fato de que Ele cresceu na cidade de Nazaré (ver com. de Dt.18:15). Outros veem na afirmação de Mateus, com respeito a Cristo como um nazareno, uma referência à reprovação, em primeiro lugar, da cidade de Nazaré e, depois, de Jesus e Seus seguidores. A atitude popular para com Nazaré é evidente (Jo.1:46; Jo.7:52). O Messias seria “desprezado e o mais rejeitado entre os homens” (Is.53:3; ver também Sl.22:6-8). Jesus viria, não como um governante aclamado, mas como um homem humilde. Não seria sequer conhecido como um belemita, para desfrutar da honra de ser cidadão da cidade de Davi. Tanto essa quanto a solução anterior ao problema estaria de acordo com as Escrituras.

Mt.3:1 1. Naqueles dias, apareceu João Batista pregando no deserto da Judeia e dizia:

Naqueles dias. [A pregação de Joao Batista, Mt.3:1-10 = Mc.1:2-6 = Lc.3:1-14. Comentário principal: Mt, Lc. Ver gráfico, p. 227]. Isto é, quando Jesus “foi habitar numa cidade chamada Nazaré” (Mt.2:23). Jesus começou Seu ministério público com cerca de 30 anos (ver com. de Lc.3:23). Isso foi no outono de 27 d.C. (ver p. 239-245; DTN, 233; ver com. de Lc.3:1). João era cerca de seis meses mais velho que Jesus (ver com. de Lc.1:39; Lc.1:57), e é razoável pensar que tenha iniciado seu ministério cerca de seis meses antes do de Cristo. João deve ter começado na primavera do mesmo ano, talvez na época da Páscoa, quando multidões estariam chegando a Jerusalém ou partindo dali nas proximidades do local onde João estava pregando (ver p. 299; ver com. de Lc.3:1). As ilustrações que João usou em sua pregação indicam que o tempo da colheita (primavera) estava próximo (ver com. de Mt.3:7; Mt.3:12). “Naqueles dias” os judeus que viviam na Palestina, em especial na Judeia, estavam à beira de uma revolução. Desde a nomeação de procuradores romanos para governar a Judeia, em 6 d.C., após Augusto ter banido Arquelau (ver com. de Mt.2:22), a presença de oficiais e soldados romanos, o exercício da autoridade romana e o consequente afluxo de costumes pagãos resultaram numa revolta após outra. Milhares dos homens mais valentes de Israel tinham pagado com sangue o seu patriotismo. As condições eram tais que o povo ansiava por um líder forte que os livrasse do jugo cruel de Roma (ver p. 42).

João Batista. Sobre o significado do nome João, ver com. de Lc.1:13; e sobre sua juventude e seu preparo, ver com. de Lc.1:80. Jesus disse a respeito de João que, “entre os nascidos de mulher, ninguém é maior do que João” (Lc.7:28). Ele foi “muito mais que profeta” (ver com. de Mt.11:9). A influência que João exercia sobre o povo se tornou tão grande que Herodes Antipas, em princípio, hesitou fazer-lhe dano (Mt.14:1; Mt.14:5; Mc.11:32), e os líderes judeus não ousavam falar abertamente contra ele (Mt.21:26; Lc.20:6). Josefo fornece um relato vívido de João Batista que se assemelha muito ao dos evangelhos (Antiguidades, xviii.5.2).

Deserto da Judeia. Esta expressão em geral se refere aos montes áridos e escarpados entre o Mar Morto e as montanhas do centro da Palestina, uma região de pouca chuva e de poucos habitantes (ver mapa, p. 213). João passou grande parte de sua juventude no deserto (Lc.1:80). Seus pais provavelmente viviam em Hebrom ou perto dali, não muito longe dos limites ocidentais desse “deserto”. Na época do NT, o termo “deserto” foi usado para se referir tanto aos montes escarpados a oeste do Mar Morto como à parte sul do vale do Jordão. De acordo com Lc.3:3, João foi de lugar a lugar, acima e abaixo no vale do Jordão. Entre Jericó e o Mar Morto, o deserto da Judeia se encontrava com o do Jordão. Ao que tudo indica, o ministério de João começou nessas proximidades. Quando foi preso por Herodes Antipas, João devia estar no território de Herodes (provavelmente Pereia) e, segundo Josefo, foi aprisionado em Macaeros, a leste do Mar Morto (Antiguidades, xviii.5.2). Visto que o batismo era algo tão importante em seu programa evangelístico, João parece ter estado sempre próximo a um lugar com “muitas águas” (Jo.3:23). Isso talvez explique, ao menos em parte, por que ele realizou muito de seu trabalho em “toda a circunvizinhança do Jordão” (Mt.3:5; cf. DTN, 220). Na época do batismo de Jesus, João estava pregando e batizando em Betábara (Betânia, além do Jordão), não longe de onde Israel cruzou o Jordão (DTN, 132; ver com. de Jo.1:28; Js.2:1; Js.3:1; Js.3:16). Mais tarde, ele realizou sua obra em “Enom, perto de Salim” (Jo.3:23; ver mapa, p. 213; ver também mapa, p. 327).

Mt.3:2 2. Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus.

Arrependei-vos. Do gr. metanoeo, literalmente, “pensar de forma diferente depois”, “mudar de idéia”, “mudar de propósito”. Inclui muito mais que a confissão de pecados, embora isso certamente estivesse incluído na pregação de João (v. Mt.3:6). No sentido teológico, a palavra envolve não só mudança de pensamento, mas nova direção da vontade, uma mudança de propósito e atitude (ver com. de Mt.4:17).

Reino dos céus. Ver com. de Mt.4:17; Mc.1:15. Cristo deixou claro que o reino que estabeleceu em Seu primeiro advento não foi o reino da glória (ver DTN, 234). Esse viria apenas, disse Ele, “quando vier o Filho do Homem na Sua majestade e todos os anjos com Ele” (Mt.25:31). Contudo, Jesus admitiu perante Pilatos que Ele de fato era um “rei” (Jo.18:33-37); na verdade, esse foi Seu propósito ao vir a este mundo (Jo.18:37). Mas explicou que esse “reino” não era “deste mundo” (Jo.18:36). O reino que veio estabelecer não tem “visível aparência”, mas é uma realidade no coração daqueles que creem nEle e se tornam filhos de Deus (Lc.17:20-21; Jo.1:12; ver com. de Mc.3:14).

Mt.3:3 3. Porque este é o referido por intermédio do profeta Isaías: Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas.

Porque este é o referido. João declarou que ele era a “voz do que clama no deserto” (Jo.1:23; comparar com ls.40:3), e Jesus o identificou como o “mensageiro” profetizado por Malaquias (ver Mt.11:7-14; comparar com Ml.3:1).

Isaías. Ver Is.40:3. Esta citação foi extraída quase literalmente da LXX. Lucas cita os v. 3 e 4 no seu relato do ministério de João Batista (Lc.3:4-5; ver com. de Mc.1:2).

Voz. João representava apenas uma voz, mas ela ecoou através dos séculos, até os nossos dias. Como profeta, João foi a voz de Deus à sua geração, pois o profeta é alguém que fala por Deus (ver Ex.4:15-16; Ex.7:1; Ez.3:27). João era a voz de Deus anunciando a vinda do Verbo de Deus vivo e encarnado (Jo.1:1-3; Jo.1:14).

No deserto. Ver com. do v. Mt.3:1.

Preparai o caminho. João não só proclamou o estabelecimento do “reino dos céus” (v. Mt.3:2), mas anunciou a vinda iminente de seu rei. A figura de linguagem usada representa os preparativos que devem ser feitos antes da vinda do rei. Quando um monarca oriental queria visitar partes de seu reino ele enviava mensageiros aos lugares a serem visitados, anunciando sua visita e ordenando aos habitantes a se prepararem para sua chegada. Os habitantes de cada distrito deviam preparar o caminho pelo qual ele passaria, visto que pouco se fazia para conservar as estradas. Em algumas partes do Oriente ainda é costume reformar as estradas pelas quais um rei ou alguma pessoa importante vai transitar.

Endireitai as suas veredas. Visto que “o reino de Deus está dentro” daqueles que se tornam seus súditos (Lc.17:21), os preparativos devem obviamente ser feitos no coração deles. Portanto, João falou sobre endireitar as veredas do coração humano. É por isso que João pregou um “batismo de arrependimento” (Mc.1:4), literalmente, um “batismo de mudança de mente” (ver com. de Mt.3:2). Os altares do orgulho e poder humanos deveriam ser derrubados (Lc.3:5; DTN, 215).

Mt.3:4 4. Usava João vestes de pelos de camelo e um cinto de couro; a sua alimentação eram gafanhotos e mel silvestre.

Vestes. João não só dirigiu a atenção de seus ouvintes às mensagens dos profetas; ele usou vestes de profeta (2Rs.1:8; Zc.13:4; DTN, 102). Isso era um testemunho silencioso do fato de que nele o ministério profético, após um período de silêncio, foi então restaurado a Israel. Por meio de sua atitude e de suas vestes, João relembrava às pessoas os profetas do passado. As vestes simples de João também eram uma reprovação aos excessos da época, às “roupas finas” usadas “nos palácios reais” (Mt.11:8), e eram apropriadas à sua mensagem de revolta contra os males do mundo. O “reino” que João proclamava não era deste mundo (Jo.8:23); suas vestes refletiam desdém pelas coisas terrenas. Em harmonia com sua pregação, João viveu para o “reino” invisível. Sua aparência exterior era um reflexo da mensagem que proclamava. João era nazireu de nascimento (DTN, 102), e sua vida simples e sóbria estava de acordo com as exigências desse voto sagrado (ver Lc.1:15; Nm.6:3; Jz.13:4).

Contudo, não se deve concluir que ele era essênio (ver p. 41, 42), embora seu modo de vida fosse similar ao desse povo. Os essênios se separaram da sociedade e se tornaram ascetas. João passou tempo considerável sozinho no deserto, mas ele não era um asceta, pois de tempos em tempos se misturava com o povo, mesmo antes do início de seu período oficial de ministério (ver DTN, 102). É verdade que, naquela época, havia comunidades de essênios no “deserto da Judeia” (v. Mt.3:1), principalmente ao longo da costa oeste do Mar Morto (ver p. 41), mas não há evidência histórica de que João estivesse associado a essa seita rígida. Entretanto, observam-se notáveis semelhanças entre João e os essênios.

Pelos de camelo. Não pele de camelo, como imaginavam alguns, mas uma vestimenta de pelo tecida em tear (ver com. do v. Mt.3:4).

Cinto de couro. Talvez de pele de ovelha ou cabra, usado na cintura para prender a longa vestimenta exterior.

Alimentação. Do gr. trophe, “nutrição”, “alimento”, “víveres”, “pão”, “comida”, ou seja, alimento num sentido geral (Tg.2:15; Mt.6:25; Mt.10:10; At.2:46; At.27:33-38). Uma dieta sóbria é essencial para se ter vigor mental e discernimento espiritual, e um correto entendimento e prática das verdades sagradas da Palavra de Deus (DTN, 101). Essas qualidades eram essenciais para João, que veio “no espírito e poder de Elias” (Lc.1:17), e são essenciais para aqueles que levam a mensagem de Elias ao mundo hoje.

Gafanhotos. Do gr. akrides (Ver Nota Adicional a Mateus 3; Mt.3:17).

Mel silvestre. Provavelmente não a seiva de certas árvores, como imaginaram alguns, mas mel de enxames de abelhas selvagens depositado em árvores ocas ou talvez em rochas. Alguns beduínos ainda recolhem mel silvestre para vender.

Mt.3:5 5. Então, saíam a ter com ele Jerusalém, toda a Judeia e toda a circunvizinhança do Jordão;

Então, saíam. A forma do verbo grego indica ação continuada: o povo continuava saindo. As multidões continuavam indo ao Jordão para ver e ouvir João e para serem batizadas por ele. O fato de o povo continuar indo dá testemunho dos relatos emocionantes daqueles que já o tinham ouvido. O fato de eles estarem dispostos a deixar seu trabalho e caminharem quilômetros pelo deserto testemunha do poderoso magnetismo da mensagem que João proclamava.

Toda a judeia. O ministério de João, como o de Cristo, começou nas proximidades da Judeia, talvez para dar aos líderes judeus a primeira oportunidade de ouvir e aceitar a mensagem (Mc.1:5; cf DTN, 231, 232).

Toda a circunvizinhança. Gradualmente, à medida que a palavra era espalhada por aqueles que ouviam João, pessoas vinham de lugares ainda mais distantes (cf Lc.3:3). Também é evidente que o próprio João ia de lugar em lugar para alcançar pessoas em todas as partes (ver com. de v. Mt.3:1).

Mt.3:6 6. e eram por ele batizados no rio Jordão, confessando os seus pecados.

Batizados. Do gr. baptizo, “banhar”, “submergir”. Baptizo era uma palavra empregada para imersão de um tecido em tintura, e ao ato de submergir um recipiente para enchê-lo com água. Também era usado no sentido metafórico como referência a feridas sangrentas resultantes de uma luta. Na literatura antiga, Ésquilo “batizou” um homem na tintura vermelha de Sardes. Baptizo também era usado para designar alguém afundado em dívidas. O significado da palavra em si, junto com detalhes específicos da narrativa nos evangelhos, torna claro que o batismo de João era feito por imersão. No evangelho de João, destaca-se o fato de que João Batista “estava também batizando em Enom, perto de Salim, porque havia ali muitas águas” (Jo.3:23). Além disso, os 4 escritores dos evangelhos observam que a maior parte do ministério de João, se não todo, foi realizado nas imediações do rio Jordão (Mt.3:6; Mc.1:5; Mc.1:9; Lc.3:3; Jo.1:28). Se João não tivesse batizado por imersão, teria encontrado água suficiente em qualquer lugar da Palestina. Aparentemente, o mesmo se deu com o batismo cristão, pois na descrição do batismo do eunuco etíope observa-se que tanto o batizado quanto quem o batizou “desceram à água” e “saíram da água” (At.8:38-39).

Se o batismo por aspersão fosse permitido, o eunuco, em vez de esperar chegar até “certo lugar onde havia água” para pedir o batismo (v. At.8:36), podia ter oferecido a Filipe a água que carregava consigo. Além disso, apenas a imersão reflete com exatidão o simbolismo do rito batismal. Paulo ensina (Rm.6:3-11) que o batismo cristão representa a morte. Ser “batizado”, segundo Paulo, é ser batizado na morte de Cristo (v. Rm.6:3), ser “sepultados com Ele na morte pelo batismo” (v. Rm.6:4), ser “unidos com Ele na semelhança da Sua morte” (v. Rm.6:5) e ser “crucificado com Ele” (v. Rm.6:6). Paulo conclui: “assim também vós considerai-vos mortos para o pecado” (v. Rm.6:11). Obviamente, aspergir não é símbolo de morte e sepultamento. Paulo deixa claro o significado do que diz, apontando para o fato importante de que o sair das águas no batismo simboliza ser “ressuscitado dentre os mortos” (v. Rm.6:4). Está claro que os escritores do NT conheciam apenas o batismo por imersão. De acordo com fontes antigas, João Batista provavelmente não foi o primeiro a introduzir a prática do batismo. Os judeus antes seguiam a prática de batizar prosélitos ao judaísmo. Não se sabe ao certo quando a prática foi adotada, mas detalhes sobre o procedimento eram ponto de discussão entre a escola de Shammai e a de Hillel, no primeiro século d.C.

Visto que, naquela época, a prática estava aparentemente bem estabelecida, é muito provável que ela já fosse realizada em tempos pré-cristãos (ver Mishnah, Pesahim, 8.8, ed. Soncino, p. 490, 491; Talmude, Pesahim, 92a, ed. Soncino, Talmude, p. 491, 492; ver também Toseftah, Pesahim, 7.13; e Talmude de Jerusalém, Pesahim, 8.36b. 31, ambos citados em Strack e Billerbeck, Kommentar zum Neuen Testament, vol. 1, p. 103).Também é evidente que a forma do batismo de prosélitos era por imersão. Os regulamentos exigiam que todo o corpo fosse coberto com água (ver Talmude, 'Erubin 4.b, ed. Soncino, Talmude, p, 20; Yebamoth 47.a, 47.b, ed. Soncino, Talmude, p. 311, 312). Descobertas em Qumrân e no Cairo (ver p. 41, 42, 77-80) revelam que os membros da seita judaica, conhecida como essênios, batizavam-se diariamente por imersão, simbolicamente lavando seus pecados. Qumrân está no “deserto da Judeia”, onde João pregava. Certamente os judeus que iam até João no deserto entendiam o significado do rito e o consideravam um procedimento apropriado. Mesmo os representantes do Sinédrio enviados para interrogar João não questionaram o rito do batismo em si, mas apenas a autoridade de João para realizá-lo (ver Jo.1:19-28).

No NT, observa-se que o rito do batismo cristão é simplesmente um símbolo e não transmite a graça divina. A menos que a pessoa creia em Jesus Cristo (At.8:37; Rm.10:9) e se arrependa de seus pecados (At.2:38; At.19:18), o batismo não lhe servirá de nada. Em outras palavras, o rito em si não tem poder para salvar, sem a fé no coração do que é batizado. A partir dessa e de outras considerações fica claro que o batismo de crianças é sem sentido com respeito à salvação. O batismo tem significado somente se a criança tem idade suficiente para entender a salvação, a fé e o arrependimento. Embora os judeus reconhecessem o valor do batismo de prosélitos, o rito era destinado apenas a gentios convertidos ao judaísmo. O aspecto notável do batismo de João é que ele requeria o batismo dos próprios judeus, mesmo de seus líderes religiosos. Além disso, ele considerava que seu batismo era apenas preparatório para o batismo que seria ministrado por Cristo (Mt.3:11). A menos que os judeus aceitassem o batismo de João e o subsequente batismo do Espírito Santo por Jesus Cristo, eles não seriam melhores que os pagãos. O fato de descenderem de Abraão não lhes serviria de nada (Mt.3:9; Jo.8:33; Jo.8:39; Jo.8:53; Rm.11:21; Gl.3:7; Gl.3:29; Tg.2:21).

Confessando. Quando confessamos, Deus nos perdoa (1Jo.1:9). João Batista odiava todo tipo de pecado e mau proceder. Deus nunca envia mensagens para adular o pecador; isso seria fatal para a vida eterna. Um dos sinais de conversão genuína é o sincero arrependimento dos pecados e seu abandono. Da mesma forma, um dos sinais de que uma mensagem procede de Deus é quando aponta o pecado e chama ao arrependimento e à confissão. Assim era com os profetas de antigamente (ver ls.1:1-20; Is.58:1), assim era nos tempos do NT (Mt.3:7; Mt.23:13-33; Ap.2:5; Ap.3:15-18) e assim o é hoje (T3, p. 254). O batismo de João era um “batismo de arrependimento” (Mc.1:4); essa era sua característica mais marcante. Os pecados de Israel eram a raiz de todos os seus males no âmbito individual e nacional (Is.59:1-2; Je.5:25). Em vão buscavam o livramento dessas calamidades. Ansiavam e oravam pelo livramento do jugo romano, mas a maioria não conseguia entender que o pecado devia estar fora do acampamento para que Deus pudesse operar em favor deles (ver vol. 4, p. 17-20).

Mt.3:7 7. Vendo ele, porém, que muitos fariseus e saduceus vinham ao batismo, disse-lhes: Raça de víboras, quem vos induziu a fugir da ira vindoura?

Fariseus. Sobre fariseus e saduceus, ver p. 39, 40.

Raça de víboras. O próprio Cristo, mais tarde, usou a mesma linguagem ao se dirigir aos fariseus e saduceus (Mt.12:34; Mt.23:33). Eles se orgulhavam de ser filhos de Abraão (ver com. de Mt.3:9), mas não praticavam “as obras de Abraão” (Jo.8:39), portanto, eram filhos do diabo (v. Jo.8:44).

Quem vos induziu a fugir [...]? Eles não estavam buscando com sinceridade o arrependimento ao qual João chamava homens e mulheres como o único preparo consistente para o reino do Messias. Sendo assim, para que foram a João?

Ira. É possível que, inspirado, João estivesse antevendo as indescritíveis cenas de horror que acompanhariam a queda de Jerusalém nas mãos dos exércitos romanos em 70 d.C. – dias pelos quais Jesus disse às mulheres de Jerusalém que pranteassem (Lc.23:27-29) e aconselhou Seus discípulos a fugirem da cidade (Mt.24:15-21; Lc.21:20-24). Além, é claro, do grande dia da “ira” de Deus, o dia do juízo (Rm.1:18; Rm.2:5; Rm.2:8; Rm.3:5; Rm.5:9; Ap.6:17).

Mt.3:8 8. Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento;

Produzi. Ver com. do v. Mt.3:10. O fruto produzido revela o caráter interior (Mt.7:20; Mt.12:33). O teste da conversão é a transformação de vida. A prova da sinceridade dos fariseus e saduceus que buscaram o batismo de João seria a mudança radical de mente e conduta implícita na palavra “arrependimento” (ver com. de Mt.3:2). De nada vale mera profissão. O divino Viticultor espera com paciência o amadurecimento do fruto do caráter na vida daqueles que professam servi-Lo (ver Lc.13:6-9). Mas fruto “digno de arrependimento” (v. 8), isto é, que corresponda à confissão de arrependimento é o fruto do Espírito (ver Gl.5:22-23; 2Pe.1:5-7) que, sem a presença do Espírito na vida, não pode ser produzido. Longe da “videira” não pode haver fruto (Jo.15:4-5).

Arrependimento. Ver com. do v. Mt.3:2.

Mt.3:9 9. e não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão; porque eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão.

Não comeceis a dizer. Ou, “não comeceis a pensar”. O que importava era o fruto da fé na vida, e não o descender de Abraão (Jo.8:39; Gl.3:7; Gl.3:29). O fruto do qual João falava devia ser produzido na vida de cada indivíduo, e não se herdava de geração em geração (Ez.14:14; Ez.14:16; Ez.18:5-13). O essencial não era descender literalmente de Abraão, mas ser de sua linhagem espiritual, isto é, praticar suas obras.

Abraão. Os judeus pensavam que, por descenderem de Abraão, eram superiores aos demais povos. De acordo com o Talmude, um único israelita valeria mais perante Deus que todas as pessoas que já existiram ou existirão. Consideravam que isso podia substituir o arrependimento e as boas obras que João e Jesus requeriam. Desejavam as recompensas sem pagar o preço. De fato, substituíam com suas obras a fé de Abraão. Os judeus constantemente se jactavam de serem descendentes de Abraão (Jo.8:33; Jo.8:39). Ele era “a rocha” da qual foram cortados (Is.51:1-2). Mas “Deus não faz acepção de pessoas” e, “em qualquer nação, aquele que O teme e faz o que é justo Lhe é aceitável” (At.10:34-35). Só aqueles que imitam Abraão podem ter o privilégio de chamá-lo de pai (Gl.3:9).

Destas pedras. Havia abundância de pedras e rochas ao longo das margens do rio Jordão.

Filhos. No aramaico, idioma de João Batista, há um jogo de palavras: “pedras” são abenin, e “filhos” podem ser tanto benin, berin ou banim. Jesus usou uma expressão de sentido similar (Lc.19:40). Possivelmente, João quis dizer que seria mais fácil para Deus suscitar filhos de Abraão a partir daquelas pedras do que transformar o coração de pedra dos fariseus e saduceus em filhos espirituais de seu pai Abraão. Ou ele quisesse apenas dizer que os líderes não eram indispensáveis e que Deus poderia substituí-los transformando as pedras em seres humanos.

Mt.3:10 10. Já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo.

Já está posto. Parece significar que o machado estava posto ali pronto para ação, indicando que logo seria usado.

O machado. Símbolo de juízo.

Toda árvore. No AT, árvores com frequência simbolizam pessoas (ver Ez.17:22-24; Sl.1:3), e os ouvintes de João entendiam perfeitamente o que ele dizia. Como João, Cristo usou uma árvore para representar o povo de Israel (Lc.13:6-9; Ml.21:19-20).

Que não produz. Ver com. de Lc.13:6-9. Por meio do simbolismo de uma vinha que nada produzia, exceto “uvas bravas”, Isaías tinha mostrado o terno cuidado de Deus para com Seu povo e como este havia sido completamente rejeitado por não ter produzido uvas (Is.5:1-7; Mt.21:33-41).

Bom fruto. Somente alguém bom pode produzir uma colheita de bons hábitos, da qual se pode colher um bom caráter (ver Gl.5:22-23).

Cortada. Comparar com a parábola das uvas bravas (Is.5:1-7) e com a parábola de Cristo da figueira estéril (Lc.13:6-9). Na parábola de Jesus está implícito o fato de que Deus é longânimo, mas que, se Suas ofertas de misericórdia não são apreciadas, são finalmente retiradas. A nação judaica tinha praticamente chegado ao fim de seu tempo de graça e estava prestes a ser rejeitada como detentora única dos oráculos de Deus (ver vol. 4, p. 17-23).

Lançada ao fogo. Na literatura judaica, “fogo” era um elemento distintivo do juízo final.

Mt.3:11 11. Eu vos batizo com água, para arrependimento; mas aquele que vem depois de mim é mais poderoso do que eu, cujas sandálias não sou digno de levar. Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo.

Com água. [João dá testemunho de Cristo, Mt.3:11-12 = Mc.1:7-8 = Lc.3:15-17 = Jo.1:19-28. Comentário principal: Mt, Lc. Ver mapa, p. 213; gráfico, p. 225]. João deixou claro que seu batismo era apenas preparatório para a obra de Cristo.

Aquele que vem. João já tinha falado de sua missão como a de um arauto que anuncia a vinda do Senhor (v. Mt.3:3). “Aquele que vem”, ou “O que vem”, era uma expressão judaica comum para o Messias.

Depois de mim. Com referência a tempo, João era o “mensageiro” enviado “diante” da “face” do Senhor (Mc.1:2).

Mais poderoso do que eu. João mais tarde testemunhou a respeito de Cristo: “convém que Ele cresça e que eu diminua” (Jo.3:30). A pregação de João era tão cheia de poder que muitos criam que ele era o Messias. Até mesmo os líderes da nação foram forçados a considerar seriamente essa possibilidade (Jo.1:19-20). O próprio Cristo disse que “ninguém apareceu maior do que João Batista” (Mt.11:11). Apesar dessa aclamação pública, João sempre manteve o verdadeiro conceito de sua relação com Aquele que era “mais poderoso” do que ele. Bendito é aquele que tem êxito e popularidade e, contudo, permanece humilde aos próprios olhos.

Sandálias. Do gr. hupodemata, literalmente, “o que se ata embaixo”. Estas “sandálias” eram solas atadas sob os pés com tiras. Apenas os romanos usavam sapatos.

Não sou digno de levar. De acordo com Lucas, “não sou digno de desatar-lhe” (Lc.3:16). A frase de Mateus significa tirar as sandálias. Para um judeu, o sapato era a parte mais humilde da vestimenta. A expressão “sobre Edom atirarei a minha sandália” (Sl.60:8; Sl.108:9) significava completo desdém. Na presença de Deus, ordenou-se a Moisés que retirasse as sandálias (Ex.3:5). Comprar ou vender o necessitado por um par de sapatos (Am.2:6; Am.8:6) era colocar-lhe o preço mais baixo possível. Desatar as sandálias ou levá-las era a tarefa servil de um escravo. Ao afirmar que era indigno de fazer até isso para Cristo, João se colocava abaixo do nível de um escravo. Era como se João dissesse: “cujo escravo sou indigno de ser”. Esperava-se que os seguidores de um grande mestre realizassem muitos serviços pessoais para ele, mas segundo um ditado rabínico: “tudo que um escravo faz para seu amo, um aluno deve fazer por seu mestre, exceto tirar-lhe os sapatos” (Talmude, Kethuboth 96a, ed. Soncino, Talmude, p. 610).

Espírito Santo. Os judeus estavam familiarizados com esse termo. Davi orou: “nem me retires o Teu Santo Espírito” (Sl.51:11). Isaías disse que Israel contristou o “Espírito Santo” de Deus (Is.63:10-11), e que “o Espírito do Senhor Deus” estaria sobre o Messias (Is.61:1). João parece não ter enfatizado o batismo com o Espírito Santo (At.19:2-6; sobre o significado dessa expressão ver com. de Mt.1:18).

Fogo. Água e fogo são dois grandes agentes naturais purificadores, então é apropriado que ambos sejam usados para representar a regeneração do coração. De modo similar, são os dois agentes pelos quais Deus purificou, ou irá purificar, esta terra do pecado e dos pecadores (2Pe.3:5-7). Se os seres humanos com persistência se apegam ao pecado, serão por fim consumidos com ele. Quão melhor é permitir que o Espírito Santo realize a obra purificadora agora, enquanto ainda há graça! O ser humano será limpo do pecado ou destruído com ele. Paulo disse: “a obra de cada um o próprio fogo o provará” (1Co.3:13). Não se sabe ao certo em que sentido Cristo batizaria com fogo. Essa afirmação talvez se refira ao Pentecostes, quando os discípulos foram batizados com o Espírito Santo com a forma simbólica do fogo (At.2:3-4). Também pode se referir ao fogo dos últimos dias, como se pode entender pelo paralelismo de Mt.3:12 (ver com. do v. 12). Pode se referir à graça de Deus que purifica a alma, ou às provas de fogo que, segundo Pedro, os cristãos experimentariam (1Pe.4:12; Lc.12:49-50). Talvez as palavras de João Batista incluam mais do que um aspecto do simbolismo bíblico com relação ao fogo.

Mt.3:12 12. A sua pá, ele a tem na mão e limpará completamente a sua eira; recolherá o seu trigo no celeiro, mas queimará a palha em fogo inextinguível.

Pá. Do gr. ptuon, uma “peneira” com a qual se levantava o grão da eira e o lançava contra o vento para tirar a palha (ver com. de Rt.3:2). O grão caía no chão e a palha era levada pelo vento e, depois, queimada.

Limpará completamente. Do gr. diakatharizo. A ilustração é a de um fazendeiro que começa a limpar de um lado de sua eira e continua sistematicamente até o outro.

Recolherá o seu trigo. O processo de separar os justos dos ímpios acontece na “consumação do século” (ver Mt.13:30; Mt.13:39-43; Mt.13:49-50).

Queimará a palha. Como fazia com frequência o fazendeiro depois que o trigo era armazenado em segurança (comparar com o com. de Sl.1:4).

Inextinguível. Do gr. asbestos. Sem dúvida, João Batista baseou sua mensagem nas palavras de Malaquias (Ml.3:1-4; ver Mc.1:2). Cristo especificamente afirmou que João cumpriu a previsão de Malaquias (Ml.4:5; Mt.11:14; Mt.17:12). Quando João falou do “fogo inextinguível”, possivelmente, tinha em mente as palavras de Ml.4:1, em que no dia do Senhor, que “arde como fornalha”, todos os ímpios “serão como o restolho”. O fogo daquele grande dia, continua Malaquias, “os abrasará” tão completamente que “não lhes deixará nem raiz nem ramo” (Ml.4:1; Ml.3:2-3; ver Josefo, Guerra dos Judeus, ii.17.6). Longe de transmitir a ideia de um fogo que arde para sempre no qual os ímpios são atormentados eternamente, as Escrituras enfatizam o fato de que os ímpios são queimados tão completamente que nada restará deles. A ideia de um fogo do inferno que queima eternamente é estranha à Palavra de Deus, bem como ao caráter divino. As Escrituras dizem a respeito de Sodoma e Gomorra que “são postas para exemplo do fogo eterno, sofrendo punição” (Jd.1:7; 2Pe.2:6).

Mas o fogo que consumiu essas cidades ímpias se extinguiu há muito; elas não estão queimando hoje. Contudo, essas cidades são dadas como “exemplo” de como será o fogo dos últimos dias. De modo similar, Jeremias predisse que Deus acenderia um fogo nas portas de Jerusalém que consumiria até os palácios da cidade e que não se apagaria (Je.17:27). Isso se cumpriu literalmente poucos anos depois, quando Nabucodonosor tomou a cidade, em 586 a.C. (Je.52:12-13; Ne.1:3). É óbvio que o fogo não está queimando hoje. Assim como se consumia por completo a palha de uma eira na Palestina, e nada restava a não ser as cinzas, também os ímpios serão queimados com “fogo inextinguível” no último grande dia até que nada reste, senão cinzas (Ml.4:3). O salário do pecado é a morte (Rm.6:23), morte eterna, não vida eterna preservada por um Deus vingativo, no meio de um fogo que nunca se apaga. Aos justos se promete a vida eterna (Rm.2:7), e a morte dos ímpios será tão permanente quanto a vida dos justos (ver com. de Is.66:24).

Mt.3:13 13. Por esse tempo, dirigiu-se Jesus da Galileia para o Jordão, a fim de que João o batizasse.

Dirigiu-Se Jesus. [O batismo de Jesus, Mt.3:13-17 = Mc.1:9-11 = Lc.3:21-22 = Jo.1:32-34. Comentário principal: Mt, Lc. Ver mapa, p. 213; gráficos, p. 225]. Era outono de 27 d.C. e, possivelmente, João Batista já pregava havia cerca de seis meses (ver com. de Mt.3:1). O outono era a época de três festas importantes: (1) Festa das Trombetas ou Rosh Hashanah (ver vol. 1, p. 764; ver com. de Lv.23:24; Nm.29:1); (2) Dia da Expiação ou Yom Kippur (ver vol. 1, p. 760, 761, 764, 765; ver com. de Ex.30:10; Lv.16); e (3) Festa dos Tabernáculos (ver vol. 1, p. 765; ver com. de Ex.23:16; Lv.23:34). Na terceira festa, esperava-se que todos se apresentassem perante o Senhor em Jerusalém (Ex.23:14-17). Visto que Cristo foi batizado no outono, é razoável crer que isso se relacione com Sua ida a essa festa. A rota que os judeus seguiam, com frequência, entre a Galileia e Jerusalém ficava ao longo do vale do Jordão (ver com. de Lc.2:42). Se Jesus tomou essa estrada em sua viagem a Jerusalém, Ele passou próximo ao local onde João pregava e batizava em Betábara (provavelmente, “Betânia além do Jordão”), na Pereia, no lado oposto a Jericó (ver Jo.1:28; DTN, 132; ver com. de Mt.3:1). Quando Jesus ouviu sobre a mensagem proclamada por João, reconheceu Seu chamado (DTN, 109). Isso marcou o fim de sua vida privada em Nazaré e o início de seus três anos e meio de ministério público, do outono de 27 d.C. à primavera de 31 d.C. (DTN, 233; cf. At.1:21-22; At.10:37-40; ver com. de Mt.3:1-2).

Da Galileia para o Jordão. Ver com. de Mc.1:9. A distância do mar da Galileia até o Mar Morto é de aproximadamente 100 quilômetros.

A fim de que João O batizasse. Jesus tinha ouvido da mensagem de João enquanto ainda trabalhava na carpintaria em Nazaré (DTN, 109), então partiu para não mais voltar a seu trabalho ali.

Mt.3:14 14. Ele, porém, o dissuadia, dizendo: Eu é que preciso ser batizado por ti, e tu vens a mim?

Ele porém, O dissuadia. O grego pode ser traduzido como “O teria impedido”, “tentou impedi-Lo”. Embora Jesus e João fossem parentes, não se conheciam (DTN, 109; cf. Jo.1:31-33). João tinha ouvido sobre os acontecimentos relacionados ao nascimento e à infância de Jesus, e cria que Ele era o Messias (DTN, 109). Além disso, fora revelado a João que Cristo viria para ser balizado por ele, e que seria dado um sinal para identificá-Lo como o Messias (DTN, 110; cf. Jo.1:31-33).

Eu é que preciso. João foi impressionado com a perfeição do caráter dAquele que estava diante dele e com sua própria necessidade como pecador (DTN, 140, 111; cf. Is.6:5; Lc.5:8). Sempre que um pecador está na presença divina, primeiramente reconhece a majestade e perfeição de Deus e então tem a convicção da própria indignidade e necessidade do poder salvador de Deus. Quando o pecador percebe e reconhece sua condição de perdido, seu coração fica contrito e pronto para a obra transformadora do Espírito Santo (ver Sl.34:18; Sl.51:10-11; Sl.51:17; Is.57:15; Is.66:2). Onde não há primeiramente uma percepção da necessidade do Salvador, não há desejo pelo dom da graça que Deus tem a oferecer ao pecador arrependido. Consequentemente, não há nada que se possa fazer por ele (ver com. de Is.6:5).

E Tu vens a mim [...]? Face a face com Aquele que era mais poderoso que ele (v. Mt.3:11), João, com espírito de humildade e sentindo sua própria indignidade, não quis ministrar o “batismo de arrependimento para remissão de pecados” (Mc.1:4) para Aquele que não tinha pecado (ver Jo.8:46; 2Co.5:21; Hb.4:15; 1Pe.2:22). Não lhe parecia adequado batizar Jesus. Sem dúvida, João não compreendia plenamente o fato de que Jesus devia ser um modelo a todo pecador salvo pela graça.

Mt.3:15 15. Mas Jesus lhe respondeu: Deixa por enquanto, porque, assim, nos convém cumprir toda a justiça. Então, ele o admitiu.

Deixa. Isto é, “permita”. Ele não devia negar o pedido de Jesus para ser batizado, embora naquele momento isso pudesse parecer impróprio.

Assim, nos convém. Isto é, “é adequado”, “é apropriado”. Não era adequado ou apropriado batizar Jesus em reconhecimento de pecados pessoais, pois Ele não tinha pecados dos quais Se arrepender. Porém, como exemplo, era tanto adequado quanto apropriado que Ele aceitasse o batismo (ver DTN, 111).

Cumprir toda a justiça. Em Seu batismo, Jesus deixou de lado Sua vida privada. Ele já não era simplesmente um homem perfeito entre os homens. A partir de então, Ele daria início ao Seu ministério ativo e público como Salvador da humanidade. A submissão de Cristo ao batismo de João confirmou o ministério deste último e colocou sobre ele o selo da aprovação celestial. O batismo de Jesus como Sua unção para o ministério foi o cumprimento da profecia das 70 semanas de Daniel (ver com. de Dn.9:25).

Ele O admitiu. Isto é, João concordou com o pedido.

Mt.3:16 16. Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre ele.

Saiu logo da água. Ao sair imediatamente das águas do Jordão, Jesus Se ajoelhou às margens do rio em oração, para que o Pai Lhe desse uma prova de que aceitava a humanidade na pessoa de Seu filho e também para pedir pelo êxito de Sua missão (Lc.3:21; DTN, 111, 112).

Eis. Ou, “vê”, expressão comum em Mateus e Lucas. Em geral, é usada também para introduzir uma nova seção da narrativa ou para chamar atenção a detalhes do relato que o autor considerava especialmente importantes.

Que se Lhe abriram os céus. Por um momento, as portas do mundo invisível se abriram, como em outras ocasiões importantes (ver At.7:55-57).

E viu. Mateus e Marcos (Mc.1:10) observam que Jesus contemplou a descida visível do Espírito Santo; João diz que João Batista também testemunhou a manifestação divina (Jo.1:32-34). Lucas simplesmente a relata (Lc.3:21-22). Talvez alguns dos discípulos de João e pessoas piedosas cujas vidas estavam afinadas com o Céu também tenham percebido o fato (DTN, 112, 137). O restante da multidão reunida testemunhou apenas a luz celestial sobre a face do Salvador e sentiu a santa solenidade da ocasião. Essa manifestação da glória e da voz do Pai veio em resposta à oração do Salvador por força e sabedoria para realizar Sua missão. João também percebeu que esse era o sinal prometido, pelo qual ele reconheceria “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (ver Jo.1:29-34). Finalmente, a cena sublime fortaleceria a fé daqueles que a testemunharam e os prepararia para a proclamação pela qual João identificou o Messias, 40 dias depois.

O Espírito de Deus. Não há razão para se supor que a presença e influência do Espírito Santo não tinham acompanhado Jesus desde Seu nascimento. O que se observa em Seu batismo é uma unção especial com poder para cumprir a tarefa comissionada a Ele (At.10:38; ver com. de Lc.2:49), como predisse o profeta Isaías (Is.11:2-3). A obra do Espírito Santo no desenvolvimento do caráter deve se distinguir do dom do Espírito que habilita alguns para determinadas tarefas (1Co.12:4-11).

Como pomba. Isto é, em forma de pomba (DTN, 112), talvez semelhante às línguas de fogo no Pentecostes (At.2:3). A pomba era um símbolo empregado pelos rabinos para a nação de Israel. Artistas cristãos têm empregado a pomba como símbolo do Espírito Santo, sem dúvida, com base nesse fato.

Mt.3:17 17. E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.

Uma voz dos céus. Em três ocasiões durante a vida de Cristo a voz do Pai foi ouvida do céu dando testemunho de Seu Filho: em Seu batismo, na transfiguração (Mt.17:5; 2Pe.1:16-18), e ao sair do templo pela última vez (Jo.12:28).

Este é o Meu Filho amado. Ou, “Este é Meu Filho, o amado”. Também se encontra “Tu és” em vez de “Este é” (cf. Mc.1:11; Lc.3:22). Essa declaração combina as palavras e ideias do Sl.2:7 e de Is.42:1. De acordo com Mateus, o Pai, ao usar a terceira pessoa, aparentemente, dirige-Se a João e a algumas testemunhas (ver com. de Mt.3:16), ao passo que, segundo Marcos e Lucas, o Pai se dirige a Jesus diretamente (Mc.1:11; Lc.3:22). Alguns veem nessa diferença um erro no relato dos evangelhos (sobre esta e outras supostas discrepâncias, ver Nota Adicional 2 a seguir).

Em quem Me comprazo. Comparar com Is.42:1.

NOTA ADICIONAL 1 A MATEUS 3.

De acordo com Mt.3:4 e Mc.1:6 a alimentação de João Batista consistia de “gafanhotos [Do gr. akrides, plural de akris] e mel silvestre”. Não se sabe se com isso os escritores dos evangelhos quiseram dizer que João não comia nada mais, ou apenas que esses eram os principais alimentos de sua dieta. Também é possível que “gafanhotos e mel silvestre” fossem considerados a dieta diferenciada de um profeta, assim como as “vestes de pelo de camelo e um cinto de couro” indicavam que João Batista era sucessor dos profetas antigos (ver DTN, 102). João pode ter se alimentado de “gafanhotos e mel silvestre” apenas quando não havia outros alimentos disponíveis. Também pode ser que “gafanhotos e mel silvestre” representassem simplesmente os vários alimentos disponíveis no deserto e que a expressão fosse uma forma gráfica oriental para dar ênfase à sua vida solitária, sóbria, distante do convívio humano. Devido à palavra “gafanhoto” indicar um inseto, naturalmente se levanta a questão quanto a que alimento, além do mel, constituía a dieta de João. Em outras partes nas Escrituras e também na literatura grega contemporânea, a palavra akris sempre se refere a um inseto, o gafanhoto. Esse fato inegável levou a maioria dos comentaristas atuais a concluir que o relato sobre João Batista trata desse inseto. Também é fato que o gafanhoto fazia parte da dieta dos povos do antigo Oriente Médio. A lei de Moisés classifica certos tipos de gafanhotos como limpos (Lv.11:22), portanto, seriam permitidos na dieta de um judeu. Esses fatos levaram alguns comentaristas à conclusão de que akris em Mateus e Marcos deve ser compreendido como o inseto “gafanhoto”, em vez de uma espécie de árvore. No entanto, há muito tempo existe uma tradição difundida e persistente de que em Mateus e Lucas a palavra akris denota algo diferente de inseto. Sugeriram-se pequenos pássaros, caranguejos, lagostim, peras silvestres ou outras frutas, bolos, vagem de alfarrobas, etc. Em Diatessaron, de Taciano (ver p. 108), a palavra foi traduzida como “leite”, em vez de “gafanhotos”. Grande parte dessa discussão obviamente é apenas suposição, mas parece haver evidência linguística e antropológica para a vagem de alfarroba. A alfarrobeira (Ceratonia siliqua) é cultivada em grande quantidade na fronteira com o mar Mediterrâneo e é comum na Palestina. Seu fruto, que amadurece no final da primavera, é uma vagem com feijões e tem de 15 a 25 cm de comprimento. As vagens e feijões podem ser comidos crus, cozidos ou moídos como farinha de trigo. Podem ser secados e preservados por tempo indefinido. Embora não seja saborosa, a alfarroba tem valor nutritivo substancial e é, há muito, um artigo básico da dieta das classes mais pobres do Oriente Médio. A Toseftah (Maaseroth, 2.19, Talmude, p. 84) alista vagens de alfarroba como um tipo de alimento, e a Mishnah (Maaseroth, 1.3, ed. Soncino, Talmude, p. 256) especifica que, como alimento, devem ser dizimadas. O filho pródigo dava alfarrobas aos porcos (ver com. de Lc.15:16). Incidentalmente, na língua inglesa, a alfarroba é comumente conhecida como gafanhoto, e as vagens são chamadas popularmente de “pão de São João”. Diz-se que agricultores dão alfarrobas chamadas de “gafanhotos” como alimento para o gado. A seguir estão algumas evidências que favorecem a crença de que a alfarroba é o “gafanhoto” do qual se alimentava João Batista:

1. Evidências disponíveis indicam que o inseto gafanhoto é uma fonte pobre de alimento e que seria incapaz de sustentar a vida humana. De acordo com a Encyclopaedia of Religion and Ethics (verbete “gafanhoto”) de James Hastings, “o valor nutritivo do inseto gafanhoto é extremamente baixo e insuficiente, [mesmo] com mel, para sustentar a vida”. O fato de o “gafanhoto” que João comia aparentemente ter sido o elemento principal de sua dieta depõe contra o inseto e favorece o fruto da alfarrobeira. A inadequação do gafanhoto como alimento deve ser considerada um argumento válido de que a palavra akris indica outro tipo de alimento e não o inseto. É um fato interessante que os feijões da alfarroba foram alimento de muitos pobres em várias partes do Oriente Médio, e ainda o são. Antigamente, os judeus tinham um ditado que dizia: “quando um judeu tem que se servir de uma alfarroba, ele se arrepende” (Midrash Rabbah, sobre Lv.11:1, ed. Soncino, Talmude, p. 168). Não é irrelevante observar que João foi o grande pregador do arrependimento e que uma dieta de feijões de alfarroba e mel silvestre certamente seria apropriada para um pregador da justiça. Como já observado, a rigorosa dieta de João pode, assim como sua vestimenta rude, ter tido o propósito de caracterizá-lo na mente do povo como alguém semelhante aos profetas antigos.

2. Dentre os primeiros a questionarem a ideia de que a dieta de João incluía o inseto gafanhoto estavam os ebionitas, um grupo de judeus-cristãos da Síria cuja origem pode ser traçada a elementos judaizantes da época do NT. Como os essênios (ver p. 41), eram de certa forma ascéticos em suas tendências e defendiam a dieta vegetariana. Aparentemente, os ebionitas omitiram a menção de “gafanhotos” em Mt.3:4, embora Epifânio, escritor cristão do 4º século, afirme que eles substituíram egkrides, “bolos”, por akrides, “gafanhotos” (ver M. R. James, The Apocryphal New Testament, p. 9; H. A. W. Meyer. Commentary on the New Testament, sobre Mt.3:4). Não parece que os ebionitas receberam manuscritos do evangelho que dissessem egkrides, mas que devem ter feito essa substituição ou alteração em harmonia com seus princípios de alimentação. Todos os manuscritos bíblicos antigos trazem akrides.

3. Os pais da igreja grega, que supostamente tinham melhor entendimento do uso do grego bíblico do que escritores posteriores, estavam muito longe de concordar que akris em Mateus e Marcos significava o inseto conhecido como gafanhoto. Na verdade, a maioria deles parece ter pensado diferentemente. Por exemplo, muitos consideravam o akrides (ou akridas) dos evangelhos como equivalente a akrodrua, “frutas”, ou ponta de galhos de árvores ou ervas. Num sermão sobre a profecia de Zacarias, erroneamente atribuído a Crisóstomo (c. 400 d.C.), faz-se uma comparação entre Elias e João Batista na qual se diz: “um viveu nas montanhas, o outro passou o tempo no deserto; um foi alimentado por corvos, o outro comia gafanhotos de plantas [akridas botanon]”. A frase akridas botanon é traduzida para o latim como herbarum summitates, que quer dizer “extremidades” ou “brotos de plantas” (ver Migne, Patrologia Graeca, vol. 50, colunas 786, 787). Em outro sermão também atribuído a Crisóstomo, sobre João Batista, a expressão akridas ek botanon ocorre numa descrição de sua dieta e é traduzida para o latim como summitates plantarum, “brotos de plantas” (ibid., vol. 59, col. 762). Uma nota da tradução para o latim explica que a Vulgata Latina traz locustas para akrides, e acrescenta que com locustas a Vulgata quer dizer não só gafanhotos, mas também summitates plantarum, “pontas de plantas”. Uma nota do texto grego declara que Isidoro de Pelusiota e muitos outros escritores dão a mesma explicação para akrides. Isidoro de Pelusiota (c. de 425 d.C.) declara especificamente (Epístola 132) que “os gafanhotos que João comia não são o que algumas pessoas ignorantes imaginam, criaturas parecidas com besouros. Longe disso, pois na realidade são pontas [gr. akremones; latim summitates] de plantas ou árvores” (ibid., vol. 78 col. 270). Na Epístola 5, Isidoro outra vez fala do alimento de João como “pontas de plantas e folhas” (ibid., cols. 183, 184). Em seu comentário sobre Mateus (Mt.3:4), Teofilacto da Bulgária (c. 1075 d.C.) observa: “Alguns dizem que gafanhotos [akrides] são plantas, chamadas chifres pretos; outros [dizem que são] frutas silvestres de verão” (ibid., vol. 123, cols. 173, 174). Em Historia Ecclesiastica (i. 14) Callistus Nicephorus (c. 1.400 d.C.) diz que João “se retirou a lugares remotos, alimentando-se de partes de árvores” (ibid., vol. 145, col. 675, 676). Os autores gregos e seus tradutores latinos aparentemente entendem que os “gafanhotos” de Mt.3:4 fazem parte da dieta vegetariana. Não se pode dizer que o pensamento dos pais da igreja foi influenciado, como parece ter sido o dos ebionitas, por alguma hesitação em aceitar a ideia de que João Batista comeu alimento cárneo. Até onde se sabe, os pais da igreja não eram vegetarianos. Talvez seja mais difícil fornecer uma explicação válida para o consenso dos pais da igreja de que os akrides dos evangelhos designa algo diferente de gafanhotos (insetos), a menos que houvesse alguma base linguística ou indicação nos hábitos das pessoas que viveram nos primeiros séculos do cristianismo.

4. Parece que o nome “pão de São João”, dado ao fruto da alfarrobeira, foi introduzido em várias línguas europeias por peregrinos medievais que voltavam da Terra Santa. Por exemplo, em alemão, esse é o nome específico para essa fruta. De acordo com o Oxford English Dictionary, “St.-Johns-bread”, a expressão “pão de São João”, foi explicada num dicionário do inglês para o espanhol do ano 1.591, como sinônimo de “alfarroba”.

5. Thomas Kelly Cheyne, um eminente erudito da Bíblia, da virada do século 19 para o 20, defende que o alimento de João Batista consistia em alfarrobas e mel silvestre. Ele raciocinava que a palavra akrides, em todos os casos conhecidos de seu uso, significa especificamente “inseto”, que o inseto gafanhoto é comido desde antigamente, mas que “o senso comum, no entanto, nos diz que gafanhotos não teriam sido preferidos por João Batista como seu alimento habitual em lugar da nutrição que o solo poderia prover. Sua humildade não ignoraria o alimento comum da classe mais pobre, isto é, alfarrobas” (Encyclopaedia Bíblica, verbete “casca”).

6. A confusão quanto ao significado de akris nos evangelhos parece estar relacionada ao fato de que, em vários idiomas, a palavra “gafanhoto” designa tanto um tipo de inseto quanto uma espécie de árvore. A palavra inglesa locust vem do latim locusta, que originalmente denota uma lagosta ou crustáceo similar, e, mais tarde, devido à semelhança no formato, também representa o inseto gafanhoto. O verdadeiro gafanhoto é um inseto que pertence à família Acridiidae, termo derivado do latim que, por sua vez, deriva do gr. akrides. Ao explicar a aplicação do termo “gafanhoto” para a alfarroba e algumas outras árvores, o Oxford English Dictionary comenta: “O substantivo gr. akris, que apropriadamente indica o inseto, é empregado no Oriente para designar a alfarroba, devido à semelhança no formato; e, desde antigamente, muitos creem que os ‘gafanhotos’ de João Batista eram essas alfarrobas” (verbete “gafanhoto”). No árabe moderno, a palavra nabat, que designa o inseto gafanhoto, também se aplica ao fruto da alfarrobeira. A razão para se aplicar o termo “gafanhotos” a alfarrobas está no fato de que, no grego, são chamados de keratia, literalmente, “chifres pequenos”, nome que descreve seu formato, e que o tipo de gafanhoto chamado akris, da família Acridiidae, é “caracterizado por chifres pequenos” (Oxford English Dictionary, verbete “gafanhoto”). Essa semelhança no formato parece ser a base para o duplo significado da palavra “gafanhoto” na língua inglesa, bem como no grego e árabe coloquial. De acordo com a Encyclopaedia of Religion and Ethics, de James Hastings, verbete “gafanhoto”, “a semelhança [na língua inglesa] entre o inseto e a vagem é a razão para o nome”.

7. Não se pode dizer se o hebraico e o aramaico refletiram a semelhança. Contudo, pode-se notar que o heb. chagab, “gafanhoto”, é traduzido como akris pela LXX (ver Lv.11:22; Nm.13:33; 2Cr.7:13; Ec.12:5; Is.40:22). No hebraico da Mishnah, charub denota a alfarroba, e é equivalente ao árabe kharrub, do qual vem a palavra alfarroba, e ao gr. keratia. Alguns sugeriram que, na Palestina e na Síria, onde o aramaico era usado pelos cristãos, a forma consonantal ch-r-b pode em algum momento ter sido confundida com ch-g-b, devido a uma semelhança de som e grafia. De acordo com essa explicação, charub, “alfarroba”, se tornou chagab, “gafanhoto”, e essa substituição se refletiu no texto grego de Mt.3:4 e Mc.1:6. Alguns sugerem que o heb. cheryonim do texto massorético deve ser charubim e creem que 2Rs.6:25 se refere a alfarrobas (ver com. ali). Também sugerem que o heb. chereb, traduzido como “espada” em ls.1:20, deveria ser charub, “alfarroba”. No texto hebraico consonantal, as duas palavras são idênticas. A tradução então seria: “comerás a alfarroba”, que se ajusta bem ao contexto. Alguns imaginam que Mateus, sendo hebreu e tendo em mente charub, “alfarroba”, com seu nome coloquial chagab, “gafanhoto”, pode ter escolhido o gr. akris, “gafanhoto”, ao escrever. Também é possível que existisse no grego daquela época uma terminologia coloquial similar.

8. A partir do ponto de vista estritamente linguístico, o argumento favorece a correspondência de akris com o inseto. Mas, tendo em vista todas as evidências contrárias apresentadas, não há certeza de que essa seja a compreensão correta do termo de Mt.3:4 e Mc.1:6. A evidência disponível não garante uma conclusão dogmática quanto a que alimentos João comia. É digno de nota que Ellen G. White caracteriza João como vegetariano (T3, 62; CS, 72).

NOTA ADICIONAL 2 A MATEUS 3.

Em várias partes dos evangelhos, os escritores relatam as palavras de Cristo de maneira diferente. Também apresentam relatos distintos sobre certos temas, como por exemplo, a inscrição na cruz. Os céticos têm se valido dessas variações como prova de que os evangelhos não são confiáveis, ou até mesmo falsos e, assim, não teriam sido inspirados. Uma análise cuidadosa prova o contrário. Aqueles que escreveram os evangelhos, junto com outros seguidores de Cristo, consideravam-se testemunhas dos eventos da vida de nosso Senhor. Tudo foi baseado na veracidade de seu testemunho. Atualmente, num tribunal, se as testemunhas todas testificam precisamente o mesmo com respeito a um incidente, a conclusão é que estão mentindo. Por quê? Porque a experiência nos ensina que duas pessoas não veem um evento exatamente do mesmo modo. Um ponto impressiona uma testemunha, e outro ponto, outra. Pode ser que tenham ouvido exatamente as mesmas palavras ditas sobre o acontecimento, mas cada um as relata de forma um pouco diferente. Uma testemunha pode até relatar certas partes de um diálogo que a outra testemunha não relata. Mas, contanto que não exista clara contradição de ideias ou significado nas declarações diferentes, pode-se considerar que as testemunhas disseram a verdade. De fato, declarações aparentemente contraditórias podem com frequência se provar não contraditórias, mas complementares (ver com. de Mt.27:37; Mc.5:2; Mc.10:46). Observa-se que somente uma pessoa honesta pode se dar ao luxo de ter memória limitada. Aqueles que contam mentiras precisam decorar sua história para sustentá-la. A pessoa honesta pode não recontar sua história toda vez com as mesmas palavras – é quase certo que não o fará – mas sua consistência e harmonia internas são evidentes a todos. Além disso, tal história tem vida e reluz diante dos olhos porque quem a conta revive o espírito e o sentimento da situação. Mas, quando alguém conta e reconta uma história como um fonógrafo, o melhor que se pode dizer dele é que se tornou um tedioso escravo de uma mera forma de palavras e não apresenta um quadro vívido do que aconteceu realmente ou do que na verdade foi dito. E, se não formos bondosos, podemos até suspeitar de sua veracidade, ou ao menos estarmos certos de sua senilidade. A experiência e, principalmente, a experiência dos tribunais ao longo dos anos, leva à conclusão de que o verdadeiro testemunho não precisa e não deve ser uma cópia dos vários testemunhos de um fato, incluindo o testemunho do que foi dito num determinado evento. Portanto, a acusação de que os escritores dos evangelhos não são dignos de confiança porque seus relatos diferem se revela sem fundamento. Pelo contrário, esses escritores fornecem a prova mais clara de que não houve conspiração entre eles, que eles de forma independente relataram o que mais impressionou sua mente divinamente iluminada com respeito à vida de Cristo. Eles escreveram seus relatos mais ou menos diferentes em épocas e lugares diferentes. Contudo, não há dificuldade em se descobrir harmonia e unidade no que escreveram sobre incidentes e eventos, incluindo as palavras de nosso Senhor ou a inscrição na cruz (ver com. de Mt.27:37). À luz desses fatos, a acusação de que os diferentes relatos das palavras de Cristo provam que os evangelhos não foram inspirados parece absurda. Que garantia tem o cético para supor que, se fossem inspirados, teriam escrito ao pé da letra as palavras de nosso Senhor? Nenhuma. Palavras são meramente um veículo para expressar ideias e, infelizmente, a linguagem humana muitas vezes é inadequada para expressar plenamente a ideia de alguém. O fato de os escritores dos evangelhos apresentarem as palavras de nosso Senhor de formas diferentes não fornece em si uma prova de seu discernimento inspirado quanto ao alcance e intenções de Suas palavras? Cristo falava aramaico; os evangelhos foram escritos em grego. E não é verdade que diferentes eruditos podem fazer traduções fiéis dos escritos de determinado autor e ainda divergir nas palavras usadas? De fato, traduções demasiadamente literais em geral sacrificam algo da verdadeira ideia ou intenção da mente do autor original. Feitas as devidas adaptações, podemos aplicar aqui as palavras das Escrituras: “A letra mata, mas o espírito vivifica” (2Co.3:6). Há um espírito vivificante ao longo dos quatro evangelhos, um espírito que facilmente poderia ter sido sufocado ou apagado se os escritores se conformassem com o padrão artificial dos céticos e apresentassem quatro relatos idênticos. Deus inspirou Seus escritores milhares de anos antes de as técnicas de cópia terem sido inventadas.

Mt.4:1 1. A seguir, foi Jesus levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo.

A seguir. [A tentação de Jesus, Mt.4:1-11 = Mc.1:12-13 = Lc.4:1-13. Comentário principal: Mt; ver mapa, p, 213; ver também gráfico, p. 227]. Do gr. tote, palavra muito usada por Mateus. Ela ocorre em seu evangelho cerca de 90 vezes, seis vezes em Marcos e 14 em Lucas (ver Mt.2:7; Mt.3:13; Mt.4:1; Mt.4:5). Indica uma transição de pensamento e coloca o começo de uma nova seção da narrativa num ponto definido, que pode seguir imediatamente o incidente anterior.

Levado. O “deserto” ficava literalmente acima do rio Jordão, nos montes da Judeia ou da Pereia. Não se sabe o local exato da tentação.

Pelo Espírito. Desde o nascimento, Jesus esteve sob a direção e instrução do Espírito Santo (ver com. de Mt.3:16; Lc.2:52), mas, na ocasião de Seu batismo, o Espírito desceu sobre Ele em rica medida para Lhe conferir sabedoria e habilidade para Sua missão (At.10:38; At.1:8). Jesus “era guiado passo a passo pela vontade do Pai”, em harmonia com “o plano” que “jazia perante Ele, perfeito em todos os seus detalhes”, “antes de vir à Terra” (DTN, 147; ver com. de Lc.2:49). Marcos usa uma expressão ainda mais forte: “E logo o Espírito O impeliu para o deserto” (Mc.1:12).

Ao deserto. Segundo a tradição, o local da tentação fica nas montanhas escarpadas e áridas a oeste de Jericó, chamado a Quarantania, em alusão aos 40 dias que Jesus passou no deserto. O batismo ocorreu no Jordão, a leste de Jericó (ver com. de Mt.3:1), e o fato de Jesus ter voltado para lá no final dos 40 dias indica que o deserto da tentação não estava longe. Sendo assim, é bem possível que Jesus tenha se retirado à região deserta do monte Nebo, nas montanhas de Abarim, a leste do Mar Morto (ver com. de Nm.21:20; Nm.27:12; Dt.3:17). Foi das alturas do monte Nebo que “O Senhor lhe mostrou [a Moisés] toda a terra” (Dt.34:1-4; PP, 471-477), e pode ter sido do mesmo ponto, “um monte muito alto”, que o diabo apresentou a Cristo “todos os reinos do mundo” (Mt.4:8).

Para ser tentado. Do gr. peirazo, “tentar” (At.9:26 [NVI]; At.16:7; At.24:6), “testar”, tendo em vista um propósito bom (Jo.6:6; 2Co.13:5), e “testar” tendo em vista um propósito mau (Mt.19:3; Lc.11:16), particularmente no sentido de fazer uma pessoa pecar (1Co.7:5; 1Ts.3:5; Tg.1:13). Neste caso, emprega-se peirazo no último sentido. Jesus não convidou a tentação, nem Se colocou de forma consciente no terreno encantado do inimigo. Ele Se retirou para o deserto, para estar a sós com Seu Pai e meditar na tarefa que estava diante dEle. Jesus assumiu a natureza humana e, com ela, a possibilidade de ceder ao pecado (DTN, 117). Foi-Lhe permitido “que enfrentasse os perigos da vida em comum com todo ser humano, combatesse o combate como qualquer filho da humanidade o tem de fazer, com risco de fracasso e ruína eterna” (DTN, 49). Só assim poderia ser dito que “foi Ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hb.4:15).

De outro modo, se, como afirmam alguns, por ser divino, Jesus não pudesse ser tentado, então Sua tentação teria sido uma farsa. Foi por meio de Sua natureza humana que Ele experimentou a tentação (cf. DTN, 686). Se Sua experiência com a tentação tivesse sido em qualquer nível menos probante que nossas experiências, “Ele não estaria habilitado para nos socorrer” (DTN, 117; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51; ver também com. de Lc.2:40; Lc.2:52; Jo.1:14; Hb.4:15; Material Suplementar Ellen G. White, sobre Mt.4:1-11; Rm.5:12-19). Temos um representante diante do Pai que pode Se compadecer “das nossas fraquezas”, pois “foi Ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança”. Por isso somos convidados a nos aproximar do “trono da graça” a fim de “acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hb.4:15-16). Jesus sabe por experiência própria o que a humanidade pode suportar, e Ele prometeu restringir o poder do tentador, de acordo com nossa força individual, e nos dar livramento (1Co.10:13). O grande conflito pelo qual Cristo passou no deserto da tentação se repete dentro de cada coração humano. Sem provações — sem a oportunidade de escolher fazer o certo ou o errado — não há desenvolvimento do caráter. É resistindo à tentação que desenvolvemos poder para resistir ao pecado.

Pelo diabo. Do gr. diabolôs, de dia, “por meio de”, e ballo, “forçar”, como um adjetivo que significa “caluniador” e um substantivo, “calúnia”. Na LXX, diabolos traduz o heb. satan, “adversário” (ver com. de Zc.3:1). Quando se refere a Satanás, diabolos geralmente é utilizado com o artigo e, sem o artigo, quando se refere a pessoas “caluniadoras” (Jo.6:70; 2Tm.3:3; Tt.2:3). Há pessoas que afirmam não existir um diabo pessoal, mas as palavras diabolos, “caluniador”, e satan, “adversário”, se baseiam no conceito do diabo como um ser pessoal. Cristo “via Satanás caindo do céu como um relâmpago” (Lc.10:18). Somente um ser pessoal poderia desempenhar o papel de diabo do relato da tentação (Mt.4:1; Mt.4:5; Mt.4:8; Mt.4:11) e corresponder às demais declarações dos escritores do NT a seu respeito (Jo.13:2; Hb.2:14; Tg.4:7; 1Jo.3:8; Jd.1:9; Ap.2:10; Ap.20:2; Ap.20:7-10).

Mt.4:2 2. E, depois de jejuar quarenta dias e quarenta noites, teve fome.

Jejuar. A palavra assim traduzida é em geral empregada no NT para se referir à prática ritual de abstenção de alimento. Mas é óbvio que esse não foi um jejum ritual. Jesus foi censurado pelo fato de Seus discípulos não cumprirem com os jejuns prescritos pelos fariseus (Mt.9:14; Lc.5:33; Lc.18:12). Existe o perigo hoje, como havia nos tempos bíblicos, de considerar o jejum como um meio de ganhar mérito perante Deus — de se parecer digno aos olhos de Deus. Mas esse não é o tipo de jejum que Deus requer (ver Is.58:5-6; Zc.7:5). O jejum hoje deve ser feito com o objetivo de se obter clareza mental, o oposto do entorpecimento resultante de se comer demais. O discernimento espiritual da verdade e da vontade de Deus aumenta notavelmente quando se tem uma dieta sóbria, e algumas vezes, abstinência completa de alimento. O jejum nem sempre significa completa abstinência de todos os alimentos. Porém, Lucas observa que Jesus não comeu nada no deserto da tentação (Lc.4:2).

Quarenta dias. Comparar com jejuns similares feitos por Moisés (Ex.34:28) e Elias (1Rs.19:8). Tentativas de encontrar um sentido místico no número 40 são infundadas (ver com. de Lc.4:2).

Mt.4:3 3. Então, o tentador, aproximando-se, lhe disse: Se és Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães.

O tentador. O diabo sempre ataca nos momentos de maior fraqueza, pois é quando estamos mais propensos a falhar. Por essa razão, é de vital importância preservar as forças físicas, mentais e emocionais num alto nível de vitalidade e eficiência. Tudo o que enfraquece essas forças enfraquece nossa defesa contra os enganos do tentador. Trabalhar demais, não se exercitar, comer demais, ter uma dieta pobre, dormir mal ou qualquer outra coisa que diminua a percepção intelectual e o controle emocional tende a abrir caminho para o maligno. Abrigar pensamentos de desânimo, derrota ou ressentimento terá o mesmo efeito. Devemos concentrar os pensamentos e afeições nas coisas do alto (Cl.3:2) e preencher a mente com aquilo que é verdadeiro, honesto, puro e bom Fp.4:8). Devemos sujeitar o corpo às leis de nosso ser físico, pois é impossível apreciar plenamente as coisas eternas se violamos as leis naturais que governam nosso ser.

Aproximando-se. Foi um ser diabólico pessoal que se aproximou de Jesus; foi um ser diabólico pessoal que Jesus derrotou. No NT, não há o menor indício de que a tentação foi uma experiência subjetiva ocorrida exclusivamente na mente de Jesus, como alguns afirmam.

Se és. Satanás testemunhou o batismo de Jesus e ouviu a proclamação do Céu: “Este é o Meu Filho amado, em quem Me comprazo” (Mt.3:17; ver DTN, 116, 119). Segundo a aparência exterior, parecia haver razão para se duvidar da veracidade da proclamação. Pálido, cansado, extenuado e sumamente faminto (ver DTN, 137), Jesus não parecia ser o Filho de Deus. As palavras de Satanás “se és” confrontaram Jesus com a pergunta: “como você sabe que é o Filho de Deus?” Do mesmo modo, no jardim do Éden, foi propósito do tentador levar Eva a não crer nas palavras claras de Deus sobre a árvore do conhecimento do bem e do mal. Da mesma forma, Satanás se aproxima das pessoas hoje, tentando fazer com que não acreditem nas verdades claras contidas na Palavra de Deus. Apenas aquele cuja fé, como a de Jesus, se apoia firmemente no que “está escrito”, num claro “assim diz o Senhor”, será capaz de resistir aos enganos do diabo. Uma tentação sempre apresenta um desafio a alguma verdade claramente conhecida. Induz a supor que as circunstâncias justificam o abandono de algum princípio.

Filho de Deus. Um claro eco das palavras do Pai no Jordão, 40 dias antes (ver com. de Mt.3:17). Com insolente desprezo, Satanás se dirigiu Àquele contra quem tinha falado de forma tão desafiadora no Céu antes de ser expulso. De fato, Jesus parecia mais com um ser humano pronto para morrer do que com o Filho de Deus (DTN, 118, 137). As palavras de Satanás nessa ocasião foram, mais tarde, ecoadas pelos líderes judeus ao zombarem de Cristo na cruz (Mt.27:40; ver com. de Mt.1:23; Lc.1:35; Jo.1:1-3; Jo.1:14).

Manda. Em várias ocasiões foi pedido a Jesus que provasse ser Ele o verdadeiro Cristo, mediante a realização de milagres (Mt.12:38; Mt.16:1; Mc.8:11-12; Jo.2:18; Jo.6:30). Mas Ele Se recusou a fazer milagres quando desafiado. Em vez disso, todo milagre satisfazia alguma necessidade específica do povo a quem procurava ministrar. Era de se esperar que as forças e os elementos da natureza obedecessem às ordens de seu Criador (Mt.8:26; Jo.2:6-11), mas Jesus não recorreu ao poder dos céus para dispor de algo que não estivesse disponível para nós (ver p. 205, 206).

Estas pedras. Satanás provavelmente apontou para pedras que estavam no chão aos pés de Jesus, das quais algumas poderiam ter o formato do pão que se faz no Oriente. Satanás pode até ter pegado umas das pedras (cf. Lc.4:3) e oferecido a Jesus, assim como tomou do fruto da árvore proibida e o colocou nas mãos de Eva (PP, 55).

Pães. O pão, neste caso, representa as exigências materiais da natureza física humana. Representa a filosofia materialista de vida, que supõe que a vida do ser humano consiste na abundância de bens, e que ele vive só de pão. O apelo ao apetite foi a base do ataque aberto de Satanás ao Filho de Deus, assim como de sua aproximação a Adão e Eva no jardim do Éden. Muitas das tentações que acometem o ser humano são desse tipo. Em primeiro lugar, Satanás sabe que, ao tentar a natureza física do homem, tem mais probabilidade de êxito. Em segundo lugar, ele dirige as tentações às faculdades físicas debilitadas e degradadas do ser humano, pois sabe muito bem que por meio da natureza física, por meio dos sentidos, ele pode ter acesso a todo o ser. A natureza física deve estar constantemente sob o controle das faculdades da mente, da vontade e da razão, a fim de se evitar a ruína. O corpo é o meio pelo qual a mente se desenvolve, por meio do qual o caráter é formado (MH, 130). O que tornou real essa tentação foi o fato de que, como Filho de Deus, Jesus tinha poder para satisfazer Sua fome criando alimento. A tentação consistiu na sugestão de Satanás para que Cristo satisfizesse sua fome da forma errada, isto é, sem considerar a vontade do Pai. A proposta de Satanás insinuava que Deus era cruel ao deixar Seu Filho sozinho para sofrer de fome, ainda mais quando isso era totalmente desnecessário. Compare as tentações no deserto no início do ministério de Cristo com as do Getsêmani ao final (ver com. de Mt.26:38).

Mt.4:4 4. Jesus, porém, respondeu: Está escrito: Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus.

Respondeu. Ver com. de Jó.3:2.

Está escrito. A fé de Cristo em Deus e o conhecimento de Sua vontade estavam fundamentados nas Escrituras. Desde a infância, Cristo estudava as Escrituras com diligência e as conhecia intimamente (DTN, 70). Nisso estava o segredo de Sua força para resistir à tentação. É a fé que vence o mundo (1Jo.5:4), e ela se desenvolve por meio do estudo das Escrituras (Rm.10:17). Cristo afirma que obedecer à Palavra escrita de Deus tem mais valor e importância até mesmo do que realizar milagres. As citações que Cristo fez das Escrituras nessa ocasião foram todas extraídas de Deuteronômio.

Só de pão. O ser humano é mais do que um animal; suas necessidades mais urgentes não são físicas e materiais. Jesus afirmou: “Meu reino não é deste mundo” (Jo.18:36). Ao passo que, por um lado, Jesus defendia a importância vital de ajudar os necessitados de todas as formas possíveis (Mt.25:31-46), também deixou claro que isso não devia tomar o lugar da lealdade e da devoção a Ele pessoalmente como o Messias (Mt.26:11). É verdade que a justiça deve ser praticada, assim como amar a misericórdia (Mq.6:8) e ao próximo como a si mesmo (Mt.22:39). Mas também é um dever andar humildemente com Deus (Mq.6:8). A resposta de Cristo ao diabo é uma condenação da filosofia materialista de vida em todas as suas formas. A posse de coisas não é o propósito final da vida, nem sequer um objetivo desejável (ver Lc.12:15; ver com. de Jo.6:27-58).

Viverá o homem. Esta citação (Dt.8:3) era uma verdade que Cristo tinha revelado a Moisés 15 séculos antes. Quando acabaram as tentações, Jesus estava a ponto de morrer (DTN, 131). Satanás pode ter insinuado que Cristo morreria a menos que Se desviasse do que considerava ser Seu dever. Se assim era, com Sua resposta Jesus afirmou que era preferível morrer fazendo a vontade de Deus do que viver contrariamente a ela. É assim que Satanás tenta a muitos que buscam ser obedientes à vontade de Deus revelada. O que se propõe viver só de “pão” ou por esse “pão”, na verdade, não vive e, na melhor das hipóteses, está sentenciado à morte, pois “pão” sem Deus traz morte, e não vida. As primeiras palavras de Jesus declaram submissão completa e inquestionável à vontade do Pai conforme expressa na Palavra de Deus. Jesus aceitou a obrigatoriedade dessa Palavra (cf. Jo.15:10) e negou que as coisas materiais tivessem mais importância. As coisas espirituais têm valor e importância superior (ver com. de Mt.6:24-34; Jo.6:27).

Toda palavra. Jesus disse: “A Minha comida consiste em fazer a vontade daquele que Me enviou” (Jo.4:34). Jeremias falou de ter achado e comido as palavras de Deus e de terem sido para ele “gozo e alegria” ao seu coração (Je.15:16). Jó declarou: “as palavras da Sua boca prezei mais do que o meu alimento” (Jó.23:12, ABC). Jesus, o Verbo vivo (Jo.1:1-3), era “o pão vivo que desceu do céu” (Jo.6:48-51). Paulo falou de provar “a boa palavra de Deus” (Hb.6:5). Pedro se referiu ao “genuíno leite espiritual” (1Pe.2:2), por meio do qual o cristão deve crescer. Além disso, é de vital importância considerar toda a Palavra de Deus. O homem não tem a liberdade de escolher partes da Palavra de Deus que lhe agradam e rejeitar outras. Deus providenciou uma dieta espiritual balanceada para Seus filhos terrenos, e aqueles que comem apenas o que lhes agrada não podem esperar desfrutar uma experiência cristã saudável ou alcançar a maturidade cristã. Até os menores mandamentos de Deus (Mt.5:19) são indispensáveis para quem deseja entrar no reino dos céus.

Mt.4:5 5. Então, o diabo o levou à Cidade Santa, colocou-o sobre o pináculo do templo

Então. Em Lucas, a ordem da segunda e terceira tentações é diferente. Não se sabe qual foi a real ordem cronológica, mas há razão para se crer que as três tentações ocorreram na ordem dada por Mateus. Um estudo atento da natureza e do propósito de cada tentação leva à conclusão de que as três atingem um clímax quando Satanás leva Jesus a um “monte muito alto” (v. Mt.4:8) e Lhe mostra todos os reinos do mundo. Nas duas primeiras, conforme alistadas por Mateus, Satanás surge no papel de um anjo de luz, mas na terceira ele abertamente pede que Cristo o adore (v. Mt.4:9). É essa sugestão blasfema que, de acordo com Mateus, tem como resposta a ordem: “Retira-te, Satanás” (v. Mt.4:10). Em O Desejado de Todas as Nações, Ellen White comenta as três tentações na ordem dada por Mateus (ver DTN, 129; ver com. do v. Mt.4:9). A sequência de eventos apresentada em um dos evangelhos sinóticos com frequência difere da ordem dada nos outros. Deve-se observar que nenhum dos evangelistas afirma ter disposto a narrativa numa sequência estritamente cronológica (ver p. 276), e é evidente que nem todos fizeram isso (ver Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17).

Cidade Santa. Algumas moedas do período dos Macabeus têm a inscrição: “Jerusalém, a Santa”. O nome árabe para Jerusalém hoje é al-Quds, “a Santa”. É óbvio que o motivo de Satanás ter escolhido o templo como local para a segunda tentação não foi porque no deserto não houvesse montanhas altas e precipícios; deve ter havido outra razão. Pode ser que Satanás quisesse cercar de santidade a segunda tentação.

Pináculo. Do gr. pterugion, forma diminutiva que significa literalmente “asa pequena”. Alguns creem que representa a extremidade do templo. Um escritor grego posterior usa uma forma não diminutiva pterux para representar a extremidade de um edifício. Portanto, pterugion pode descrever uma pequena torre, um parapeito, um telhado inclinado ou pico. A palavra “pináculo” é do latim, pinnaculum, forma diminutiva de pinna, “asa”.

Templo. Do gr. hieron, termo usado para se referir a toda a área do templo e seus edifícios. O santuário em si, com o lugar santo e santíssimo, é chamado em grego de naos. Tanto hieron como naos são traduzidos como “templo” no NT.

Mt.4:6 6. e lhe disse: Se és Filho de Deus, atira-te abaixo, porque está escrito: Aos seus anjos ordenará a teu respeito que te guardem; e: Eles te susterão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra.

Se és. Ver com. do v. Mt.4:3. À primeira vista, não responder ao desafio de Satanás pareceria admitir da parte de Jesus que Ele não era o Filho de Deus. Ao resistir à primeira tentação, Jesus provou como Filho ser leal à vontade do Pai. Então, o tentador propôs que Ele provasse Sua lealdade e fé com um ato que supostamente daria prova conclusiva do fato.

Atira-Te abaixo. Certamente, advertiu Satanás, tal ato de fé em Deus seria uma demonstração suprema de que Jesus era de fato o Filho de Deus. Os rabis ensinavam que “quando o rei Messias Se revelar, então virá e se colocará sobre o teto do lugar santo” (Midrash, Pesiqtha Rabbathi). Se Jesus tivesse Se atirado, ninguém teria testemunhado o ato além de Satanás e dos anjos de Deus (1SG, 33).

Está escrito. Satanás interpreta e aplica de forma errada a passagem que apresenta a Jesus como razão para que Se desvie do dever. Ele manipula a Palavra de Deus de tal forma que faz com que pareça que ela aprova uma conduta pecaminosa; ele distorce seu sentido e a emprega enganosamente (cf. 2Co.4:2).

Aos Seus anjos ordenará. Satanás cita o Sl.91:11-12, mas omite as palavras “para que te guardem em todos os teus caminhos”. Talvez para obscurecer o fato de que a proteção divina nos está disponível apenas quando permanecemos nos caminhos de Deus. Satanás sabia bem que quando alguém se desvia do caminho estreito e reto deixa o terreno escolhido de Deus e passa a pisar no terreno encantado do inimigo. Mas Jesus Se recusou a deixar o caminho de estrita obediência à vontade do Pai.

Mt.4:7 7. Respondeu-lhe Jesus: Também está escrito: Não tentarás o Senhor, teu Deus.

Também está escrito. Satanás apresentou as palavras do Sl.91:11-12 fora de seu contexto (ver com. de Mt.4:6). A fim de mostrar o verdadeiro significado das palavras dessa passagem e provar que o diabo as tinha empregado de forma errônea, Jesus citou outra passagem (Dt.6:16), cujo contexto apresenta as circunstâncias sob as quais se pode reivindicar a bênção de Deus (ver v. Dt.6:17-25). Textos isolados de seu contexto com frequência dão lugar a interpretações distorcidas. Além disso, uma passagem deve ser compreendida em harmonia com todas as outras. A afirmação de que as Escrituras podem ser alteradas de modo a ensinar qualquer doutrina só é certa se esse princípio é violado. Quando se considera a Palavra de Deus como um todo, suas verdades são claras e harmoniosas.

Não tentarás. As palavras usadas por Cristo para frustrar o tentador foram originalmente ditas por Moisés com referência à primeira ocasião no deserto quando os filhos de Israel murmuravam por causa da falta de água (ver Ex.17:1-7). Deus tinha dado muitas evidências de que estava conduzindo Seu povo e que satisfaria todas as suas necessidades, como por exemplo, as maravilhas do poder divino demonstrado no Egito, o livramento dramático no Mar Vermelho e, mais tarde, o maná. Depois de ter recebido alimento, o povo prometeu humildemente que confiaria no Senhor (PP, 297). Contudo, pouco tempo depois, quando tiveram oportunidade de exercer fé, acusaram Moisés de querer matá-los a fim de se enriquecer com suas posses (Ex.17:1-4; PP, 297, 298). Apesar das evidências do cuidado divino para com suas necessidades, eles “tentaram ao Senhor, dizendo: Está o Senhor no meio de nós ou não?” (Ex.17:7). Colocaram Deus à prova; isto é, desafiaram-No a mostrar Seu poder divino.

O pecado consistiu em ir a Deus com espírito de exigência e ira impaciente, em vez de fé paciente e humilde. Recusavam-se a crer em Deus a menos que sua exigência fosse satisfeita. Foi com esse mesmo espírito que Satanás propôs que Cristo colocasse Seu Pai a prova. Em vez de aceitar pela fé o que o Pai proclamou no Jordão, quando afirmou que Jesus era o Filho de Deus, Satanás sugeriu que Jesus colocasse o Pai à prova para Se convencer de que realmente era assim. Contudo isso refletiria dúvida em vez de fé. Jamais devemos nos colocar desnecessária ou descuidadamente numa posição em que Deus tenha que fazer um milagre a fim de nos salvar dos resultados adversos de uma conduta tola. Não devemos esperar que Deus nos resgate quando sem necessidade nos precipitamos para o perigo. A maturidade na fé nos levará a viver em harmonia com o que Deus já nos revelou e, então, confiar nEle quanto ao restante.

Mt.4:8 8. Levou-o ainda o diabo a um monte muito alto, mostrou-lhe todos os reinos do mundo e a glória deles

Um monte muito alto. A Bíblia não revelou o local da terceira tentação. Alguns sugerem o monte Nebo, de cuja altura (880 m) Moisés avistou toda a terra prometida (Dt.34:1-4) e, então, em visão, o curso do plano de salvação através dos séculos (PP, 472-477).

Mostrou-Lhe. O diabo mostrou a Jesus “todos os reinos do mundo e a glória deles” (Mt.4:8) e isso aconteceu “num momento” (Lc.4:5). É inútil especular como Satanás pode ter sido capaz de apresentar a Jesus o colorido panorama que passava diante de Seus olhos. Colocando de lado seu disfarce de anjo dos reinos de glória, Satanás se apresentou diante de Cristo no papel de príncipe deste mundo (DTN, 129). Ele não tinha o direito a esse título, mas tomou de Adão e Eva o domínio que Deus lhes havia dado. Satanás afirmou ter substituído a Adão como governante legítimo deste mundo (ver Gn.1:28; Jó.1:6-7), mas governava como usurpador. Contudo, Cristo não contestou diretamente a reivindicação de Satanás, apenas negou que ele tivesse qualquer direito de ser adorado. Jesus Se referiu a Satanás como o “príncipe” deste mundo, em reconhecimento de seu governo de facto (Jo.12:31; Jo.14:30; Jo.16:11).

Do mundo. Do gr. kosmos, “mundo” ou “universo”, do ponto de vista de sua posição no espaço. Lc.4:5 diz oikoumene, palavra que ocorre também em Mt.24:14; Lc.2:1; At.11:28; At.17:6. Uma terceira palavra que é traduzida como “mundo” no NT é aion, “era” ou “mundo”, particularmente o mundo do ponto de vista de sequências de eventos no tempo (Mt.12:32; Mt.13:39; Mt.24:3; Mt.28:20; Lc.18:30).

E a glória deles. Satanás com eficiência escondeu o pior lado de seu reino, e apresentou apenas as glórias deslumbrantes da proeza humana. Ele ofereceu a Jesus o papel de Messias político, papel no qual a nação judaica O teria aceitado (ver Jo.6:15; ver com. de Lc.4:19).

Mt.4:9 9. e lhe disse: Tudo isto te darei se, prostrado, me adorares.

Tudo isto. Ver com. do v. Mt.4:8. Satanás de forma eficiente exercia controle sobre os assuntos religiosos e políticos do mundo (ver Lc.4:6). “Tudo isto” era, é claro, propriedade roubada, mas conquanto estivesse em suas mãos, Satanás propôs negociar com ela para vantagem própria. Cristo era o verdadeiro proprietário, e Seu domínio se baseava no fato de que Ele tinha feito “todas as coisas” (Jo.1:3). Ele nunca tinha abdicado de Seus direitos. Satanás sabia que Jesus tinha vindo para contestar suas pretensões e ofereceu entregar-lhe tudo sem luta, mas com algumas condições. O controle de Satanás da raça humana não era completo. Ainda havia alguns que não lhe eram fiéis. Ele percebeu o desafio implícito na natureza perfeita de Cristo.

Darei. Satanás fez parecer que Jesus teria tudo em troca de praticamente nada: “tudo isto” pelo preço ínfimo de Se prostrar uma vez diante de quem se colocava como legítimo proprietário. Era como se Satanás dissesse: “Você veio para obter o título de príncipe deste mundo, não foi? Aceite-o como um presente meu. Poder e honra podem ser Seus”. Em troca, tudo que Satanás pedia era que Jesus fosse leal a ele e não ao Pai. Ao recusar a proposta de Satanás, Cristo também rejeitou qualquer pacto profano entre igreja e estado. Cristo Se recusou interferir nas nações de Seu tempo. Seu único conselho sobre relações de igreja-estado foi “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Mt.22:21).

Se, prostrado, me adorares. No Oriente, ainda hoje, o ato de se prostrar é um sinal de absoluta submissão e homenagem. Essa proposta diabólica de que o Deus encarnado adorasse o diabo constitui o clímax da blasfêmia. As grandes questões em jogo e a ímpia ousadia da proposta pareciam representar o limite máximo da ingenuidade diabólica e sugerem que a ordem das três tentações no livro de Mateus representa a ordem cronológica, e não a de Lucas. Depois de ter dado esse passo tão audacioso, Satanás não tinha nada mais a oferecer.

Mt.4:10 10. Então, Jesus lhe ordenou: Retira-te, Satanás, porque está escrito: Ao Senhor, teu Deus, adorarás, e só a ele darás culto.

Retira-te. Chegou-se ao clímax. Satanás tinha tirado sua máscara e aparecido no seu verdadeiro papel. O príncipe deste mundo tinha ido a Cristo oferecendo satisfazer os anelos humanos: (1) suprir necessidades materiais próprias do bem-estar humano; (2) poder fazer o que quiser e desfrutar do privilégio da desobediência sem aceitar suas consequências; (3) orgulho e popularidade; e (4) poder e autoridade sobre os outros. O príncipe deste mundo foi a Cristo e não encontrou nEle nada que respondesse, sequer no mínimo grau, à tentação (ver Jo.14:30). O Filho de Deus, “em semelhança de carne pecaminosa, [...] condenou [...] na carne o pecado” (Rm.8:3), e se apenas formos a Ele com fé, se escolhermos não andar “segundo a carne, mas segundo o Espírito” (Rm.8:4), Ele irá, por Sua graça, nos capacitar a fazer isso. Se tão somente nos submetermos a Deus, também podemos resistir ao diabo, e ele fugirá de nós (ver Tg.4:7-8). Deus será para nós uma torre forte (Pv.18:10).

Satanás. Ver com. do v. Mt.4:1.

Ao Senhor, teu Deus, adorarás. Citação da LXX, de Dt.6:13. A crença de que alguém pode servir a dois senhores é um engano do diabo (ver Mt.6:24). Qualquer filosofia de vida que ofereça “tudo isto” e também o céu faz parte da doutrina do próprio diabo.

Darás culto. Jesus afirmou Sua lealdade ao princípio no que tange ao corpo, à mente e ao coração. Em Sua vida foi a vontade do Pai, e não a Sua própria, que guiou Suas escolhas em tudo (ver Mt.26:39).

Mt.4:11 11. Com isto, o deixou o diabo, e eis que vieram anjos e o serviram.

Com isto. Ver com. do v. Mt.4:1.

Com isto, O deixou. Não permanentemente, mas “até momento oportuno” (Lc.4:13). Mesmo desde a infância de Jesus, Sua vida foi “uma longa luta contra os poderes das trevas” (DTN, 71, 116; ver com. de Lc.4:2). O diabo tinha tentado a Cristo, mas não tinha poder de fazê-Lo pecar; e o mesmo acontece conosco. Suas mais terríveis tentações não têm poder sobre nós, a menos que consintamos em pecar (ver TS, 177). Quando resistimos ao diabo, ele foge de nós (Tg.4:7). Cristo saiu da batalha triunfante; e o diabo, como um inimigo derrotado.

Serviram. Quando se findaram as tentações, Jesus caiu exausto por terra. Seu rosto tinha a palidez da morte; parecia um moribundo (DTN, 131). Satanás tinha prometido o auxílio dos anjos mesmo sem considerar a vontade de Deus, mas Jesus recusou. Depois, os anjos vieram e O serviram. A certeza do amor do Pai e do apreço e da alegria de todo o Céu por Sua vitória devem ter confortado e fortalecido sobremaneira o Salvador.

Mt.4:12 12. Ouvindo, porém, Jesus que João fora preso, retirou-se para a Galileia;

Ora (AA). [Jesus volta para a Galileia, Mt.4:12-17 = Mc.1:14-15 = Lc.4:14-15. Comentário principal: Mt; ver mapa, p. 215; gráficos, p. 226, 228]. Nenhum dos três evangelhos sinóticos relata o que se conhece comumente como ministério inicial de Cristo na Judeia. Esse período se estendeu da tentação ao início do ministério na Galileia, isto é, desde a Páscoa de 28 até a de 29 d.C., com uma retirada temporária para Galileia, durante o inverno de 28 a 29 (ver Nota Adicional a Lucas 4; Lc.4:44; ver também gráfico, p. 226). A Bíblia não fornece explicação direta ao silêncio dos sinóticos sobre essa primeira fase do ministério na Judeia. Lucas fala do ministério de Jesus como se tivesse começado na Galileia (ver At.10:37-38). Algo do êxito desse ministério preliminar de Jesus na Judeia se deduz da reclamação dos discípulos de João de que “todos Lhe saem ao encontro” (Jo.3:26), e da resposta de João: “Convém que Ele cresça e que eu diminua” (Jo.3:30).

A despeito da aparente popularidade e êxito de Cristo (ver DTN, 181), Seu ministério na Judeia deu poucos frutos (DTN, 194, 245). Embora os breves comentários de João sejam toda a informação que se tem do que ocorreu durante esse período, fica claro que transcorreu um tempo considerável (cf. DTN, 214, 231). Evidentemente, ambos, João Batista e Jesus, estavam pregando na Judeia nessa época, e a popularidade de João estava pouco a pouco se voltando para Cristo (Jo.3:22-24; Jo.3:26; DTN, 178). Não demorou muito para que Seu poder sobre as multidões excedesse até mesmo o de João, que foi por um tempo maior do que o dos próprios governantes (DTN, 178, 181, ver com. de Jo.3:22; Jo.3:26; Jo.4:3). A rejeição de Jesus pelo Sinédrio após a cura em Betesda (Jo.5:16; Jo.5:18) resultou no término de Sua obra na Judeia e fez com que partisse para a Galileia, quando se deu o início formal de Seu ministério ali. Outro fator contribuinte foi a prisão de João Batista (Mt.4:12; Mc.1:14; ver com. de Jo.4:1).

Ouvindo, porém, Jesus. É interessante notar que a prisão de João Batista coincidiu aproximadamente com a rejeição de Jesus por parte dos líderes judeus e o fim de Seu ministério preliminar na Judeia (ver gráfico, p. 226), e que a morte de João ocorreu cerca de um ano mais tarde, pouco antes da crise que pôs um fim à obra de Cristo na Galileia (ver Mt.14:10-21; ver gráfico, p. 228). Foi a prisão de João, junto com Sua própria rejeição por parte dos líderes judeus, que levaram Jesus a Se retirar para Galileia e continuar Sua obra ali (ver Nota Adicional a Lucas 4; Lc.4:44).

Fora preso. Ver com. de Lc.3:19-20. Esta frase também pode ser traduzida como “foi entregue” (AA). Pode ser que os líderes judeus, com inveja da popularidade de João com o povo, tenham consentido com a prisão de João. Assim, eles poderiam se ver livres do profeta sem serem responsabilizados diante do povo. O fato de o Sinédrio ter denunciado Jesus publicamente quase que ao mesmo tempo (ver Nota Adicional a Lucas 4; Lc.4:44) indica uma estreita ligação entre os dois eventos. Assim, a ameaça do Sinédrio após a cura em Betesda (DTN, 213), sem dúvida, tinha o propósito de fazer com que Jesus interrompesse Sua obra pública.

Retirou-Se. Isto é, transferiu Seu campo de ministério para aquela região. Isso aconteceu na primavera de 29 d.C., após a Páscoa, e foi pelo menos a terceira vez, desde Seu batismo, que Jesus saiu da Judeia para a Galileia. A primeira vez em que partiu para Galileia foi no inverno de 27-28 d.C. (ver Jo.1:43) e a segunda, um ano depois, no inverno de 28-29 d.C. (ver com. de Jo.4:1-4). Após deixar a Judeia, depois da Páscoa de 29 d.C., Jesus não retornou para lá até a Festa dos Tabernáculos, no outono de 30 d.C. (DTN, 393, 395, 450-452). A saída de Jerusalém na primavera de 29 d.C. marca o início formal do que comumente se chama de o ministério na Galileia (DTN, 231, 232; MDC, 2). Longe das autoridades judaicas, que então planejavam matá-Lo, Jesus pôde prosseguir Sua obra com menos interferência. Ao conduzir Sua obra primeiramente na Judeia, Jesus propôs dar aos líderes judeus a oportunidade de aceitá-Lo como o Messias. Se tivessem feito isso, sem dúvida a nação judaica teria se unido a Ele e tido o privilégio de representá-Lo diante das nações do mundo, conforme o plano original previsto pelos profetas (ver vol. 4, p. 12-15).

Galileia. Ver com. de Mt.2:22. Longe de Jerusalém e menos sujeitos à influência dos líderes religiosos dali, os judeus da Galileia eram mais simples e menos preconceituosos. Eram menos influenciados pelo preconceito religioso do que seus compatriotas da Judeia. Eram mais fervorosos e sinceros e mais prontos para ouvir a mensagem de Cristo de forma imparcial. De fato, sua ânsia de ouvir o que Ele tinha a dizer tornou necessário, algumas vezes, que Jesus fosse de lugar após lugar, para que o entusiasmo provocado não fosse tão grande de modo a ser considerado pelas autoridades como uma ameaça à paz e à segurança da província.

Mt.4:13 13. e, deixando Nazaré, foi morar em Cafarnaum, situada à beira-mar, nos confins de Zebulom e Naftali;

Deixando Nazaré. Mateus não menciona qualquer coisa sobre a rejeição de Jesus por parte de Seus conterrâneos de Nazaré (ver com. de Lc.4:28-29). Imagina-se que seu silêncio com respeito a muitos incidentes relatados com mais detalhes por outros escritores dos evangelhos deva-se ao fato de ele ter se preocupado mais com os ensinamentos de Jesus do que com as coisas que Ele fez (ver p. 178, 179; sobre as circunstâncias que levaram Jesus a deixar Nazaré, ver com. de Lc.4:16-30).

Cafarnaum. O nome pode ter derivado das palavras heb. kafar, “vila”, e nachum, “Naum” e significar “a vila de Naum”. Alguns sugerem que Cafarnaum foi o lar do profeta Naum, mas sobre isso não existe confirmação. Acredita-se que a cidade ficava onde hoje é Tell Hum (alguns sugerem Khân Minyeh), na margem noroeste do mar da Galileia. Visto que esse grande lago estava 209 m abaixo do nível do mar Mediterrâneo, Cafarnaum tinha um clima agradável. Cafarnaum era o principal centro judaico da região (cf. Mt.11:23). Situada numa das principais estradas desde Damasco, com Tiro e Sidom ao norte, Jerusalém ao sul e o mar Mediterrâneo a oeste, Cafarnaum se tornou um importante posto alfandegário. Também havia comércio marítimo com Decápolis, ao sul do território de Filipe. Talvez Cafarnaum não fosse tão grande quanto Séforis, que, pelo menos antes da construção de Tiberíades, era a principal cidade da Galileia. Acredita-se que Cafarnaum não existia antes do exílio babilônico; ou que era uma vila insignificante, pois não é mencionada no AT. Cafarnaum formava um centro ideal de onde notícias dos ensinamentos e milagres de Jesus se espalhariam rapidamente a toda a Galileia e outras regiões.

A cura do filho de um oficial do rei (ver Jo.4:46-54) no inverno anterior (28-29 d.C., ver gráfico, p. 227) já tinha acendido uma luz em Cafarnaum (ver com. de Lc.4:23). O oficial do rei e toda sua família foram convertidos (DTN, 200) e, sem dúvida, espalharam as novas de Jesus e da cura do filho pela cidade, preparando o caminho para o ministério pessoal de Cristo. Jesus fez de Cafarnaum Seu lar e o centro de Suas atividades por aproximadamente um ano e meio. Pedro já seguia Jesus havia mais de um ano (cf. Jo.1:40-42) e parece que O recebia em seu próprio lar quando estava em Cafarnaum (ver Mc.1:29-31; Mc.2:1; DTN, 259, 267). Cafarnaum veio a ser conhecida como “Sua própria cidade” (Mt.9:1). Era a partir desse centro que Jesus saía para Suas viagens evangelísticas pelas cidades da Galileia.

A beira mar. Isto é, do mar da Galileia.

Zebulom e Naftali. As terras que a tribo de Naftali tinha herdado faziam limite com o mar da Galileia a oeste, ao passo que as de Zebulom ficavam ainda mais a oeste (ver Js.19:10-16; Js.19:32-40). Esses limites tribais havia muito tinham deixado de ser importantes. Mateus chama atenção para o fato de que o ministério de Jesus na Galileia se centralizava na área antes ocupada por essas tribos. Ele faz isso antes de citar Is.9:1-2 (ver Mt.4:15-16). Nazaré estava dentro dos antigos limites da tribo de Zebulom, e Cafarnaum, dos limites de Naftali.

Mt.4:14 14. para que se cumprisse o que fora dito por intermédio do profeta Isaías:

Para que se cumprisse. Ver com. de Mt.1:22. Trata-se de uma citação de Is.9:1-2, com poucas diferenças do hebraico e da LXX. Isaías escreveu quando os exércitos assírios estavam assolando a parte norte do reino de Israel, por volta de 734 a.C. Essas tribos estavam entre as primeiras que sofreram as implacáveis invasões assírias (ver 2Rs.15:29; 1Cr.5:26).

Mt.4:15 15. Terra de Zebulom, terra de Naftali, caminho do mar, além do Jordão, Galileia dos gentios!

Caminho do mar. Ver com. de Mt.4:13; Mc.2:14.

Além do Jordão. Ou, “do outro lado do Jordão”, isto é, dentro dos limites da terra prometida.

Galileia dos gentios! Depois da deportação das dez tribos para a Assíria, em 722 a.C., a região conhecida como Galileia (ver Is.9:1) foi habitada quase que exclusivamente por não judeus. Na época de Cristo muitos judeus tinham se estabelecido ali, resultando numa população mista de judeus e gentios.

Mt.4:16 16. O povo que jazia em trevas viu grande luz, e aos que viviam na região e sombra da morte resplandeceu-lhes a luz.

Jazia em trevas. As “trevas” eram a escuridão do cativeiro; a “luz” era seu livramento. Cristo veio como o grande libertador, que dissipa as trevas sinistras do cativeiro do pecado e proclama a gloriosa luz da verdade que torna o ser humano verdadeiramente livre (ver com. de Jo.1:5).

Grande luz. Isto é, Jesus, “a verdadeira Luz” (ver com. de Jo.1:4; Jo.1:7; Jo.1:9).

Sombra da morte. Desde a entrada do pecado, o ser humano tem vivido na “sombra da morte”. Jesus veio libertar aqueles “que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão por toda a vida” (Hb.2:15).

Resplandeceu-lhes a luz. A luz sempre foi símbolo da presença divina (ver com. de Gn.1:3). Jesus Se autoproclamou como a luz do mundo (Jo.8:12; Jo.9:5), cujos raios luminosos dissipam as trevas do pecado e da morte (ver com. de Mt.1:14).

Mt.4:17 17. Daí por diante, passou Jesus a pregar e a dizer: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus.

Daí por diante. Ver com. de Mt.4:12; Mc.1:15.

Passou Jesus a pregar. Isto é, na Galileia. A frase não implica necessariamente que essa tenha sido a primeira ocasião em que Jesus pregou. Seu ministério público já tinha um ano e meio (ver com. do v. Mt.4:12).

Arrependei-vos. Do gr. metanoeo (sobre o significado, ver com. de Mt.3:2). Os judeus consideravam o arrependimento como uma doutrina muito importante. Enfatizavam-no como pré-requisito à salvação pelo Messias. Os rabis tinham um ditado: “se os israelitas se arrependessem, o Messias filho de Davi viria imediatamente”. De acordo com seus ensinamentos, o arrependimento incluía tristeza pelo pecado, restituição assim que possível e resolução de não pecar outra vez (ver com. de Mt.3:2; Mt.5:2-3).

Está próximo. Ver com. de Mc.1:15.

O reino dos céus. Expressão usada exclusivamente por Mateus (31 vezes) no NT, de preferência ao termo mais comum “reino de Deus”, ao passo que os demais escritores do NT preferem esta última expressão, que é usada por Mateus apenas cinco vezes. O emprego de “céus” no lugar de “Deus” está em harmonia com o costume dos judeus da época de Cristo de evitar pronunciar o nome sagrado de Deus, da mesma forma como usavam as expressões “nome dos céus” no lugar de “nome de Deus”; “temor dos céus” por “temor de Deus”; “honra do céu” por “honra de Deus”, etc. (ver vol. 1, p. 149, 150). A expressão “reino dos céus” não ocorre no AT, embora a ideia esteja implícita nos escritos proféticos (Is.11:1-12; Is.11:35; Is.65:17-25; Dn.2:44; Dn.7:18; Dn.7:22; Dn.7:27; Mq.4:8). O “reino dos céus” ou “reino de Deus” constituía o tema dos ensinamentos de Jesus (Lc.4:43; Lc.8:1).

Ele iniciou muitas de Suas parábolas com a frase “O reino dos céus é como [ou 'é semelhante']” (ver Mt.13:24; Mt.13:31; Mt.13:33; Mt.13:44-45; Mt.13:47). Ele ensinou Seus discípulos a orar pela vinda do reino (Mt.6:10). Seu evangelho era as boas-novas do reino (Mt.4:23). Seus discípulos eram os “filhos do reino” (Mt.13:38). O Pai Se agradou em dar-lhes o reino (Lc.12:32), que herdariam (Mt.25:34). Os cristãos elevem dar ao reino o lugar mais importante de suas afeições e fazer dele o grande objetivo da vida (Mt.6:33). Quando Ele enviou os doze, os instruiu a “pregar o reino de Deus” (Lc.9:2; Lc.9:60). João proclamou a iminência do estabelecimento do reino dos céus (Mt.3:2). Jesus também declarou que o reino estava “próximo” (Mt.4:17) e instruiu Seus discípulos, quando os enviou a pregar, a levar a mesma mensagem (Mt.10:7).

O “reino dos céus” foi estabelecido no primeiro advento de Cristo. Jesus era o Rei e, aqueles que criam nEle, Seus súditos. O território do reino era o coração e a vida dos súditos. Obviamente, a mensagem que Jesus proclamava se referia ao reino da graça divina. Mas, como o próprio Jesus deixou claro, esse reino de graça era uma preparação para o reino da glória (ver DTN, 234; GC, 346, 347). Com respeito ao último, os discípulos perguntaram no dia da ascensão: “Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel?” (ver At.1:6). O reino da graça estava próximo nos dias de Cristo (Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.10:7), mas o reino da glória estava no futuro (Mt.24:33). Somente “quando vier o Filho do Homem na Sua majestade e todos os anjos com Ele” Se assentará “no trono da Sua glória” (Mt.25:31).

Mt.4:18 18. Caminhando junto ao mar da Galileia, viu dois irmãos, Simão, chamado Pedro, e André, que lançavam as redes ao mar, porque eram pescadores.

Jesus (ARC). [A vocação dos discípulos, Mt.4:18-22 = Mc.1:16-20 = Lc.5:1-11. Comentário principal: Lc]. Conforme evidência textual (cf. p. 136), “ele”.

Simão. Forma grega do heb. Shimon, Simeão. Nos dias de Cristo, muitos judeus tinham nomes gregos ou adotavam versões gregas para seus nomes hebraicos. Isso acontecia principalmente no caso dos judeus que viviam fora da Palestina. Mesmo ali, contudo, era conveniente ter um nome grego devido ao fato de que esse era o idioma comercial e intelectual do mundo na época (ver p. 11, 14, 15).

Pedro. Do gr. Petros, “uma pedra” ou “uma rocha” (ver com. de Mt.16:18), tradução do aramaico Kefa, palavra traduzida para o português como Cefas, que também significa “rocha” ou “pedra” (Jo.1:42; ver esboço biográfico de Pedro no com. de Mc.3:16).

André. Ver com. de Mc.3:18.

As redes. Do gr. amphiblestron, uma rede qualquer, em contraste com diktuon, termo geral para rede de pesca ou caça, ou sagene, “rede de arrasto” (ver com. de Mt.13:47).

Mt.4:19 19. E disse-lhes: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens.

Vinde após Mim. No sentido de se tornar um discípulo em tempo integral. Dali em diante, Pedro e André deviam ter como única ocupação ser aprendizes da escola de Jesus (ver com. de Lc.5:11).

Pescadores de homens. Ver com. de Lc.5:10.

Mt.4:20 20. Então, eles deixaram imediatamente as redes e o seguiram.

Sem comentário para este versículo.

Mt.4:21 21. Passando adiante, viu outros dois irmãos, Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, que estavam no barco em companhia de seu pai, consertando as redes; e chamou-os.

Tiago. Do gr. jakobos, equivalente ao nome Jacó (ver com. de Gn.25:26; Mc.3:17). Quando são mencionados juntos, Tiago e seu irmão João, como neste caso, Tiago é mencionado primeiramente com apenas uma exceção (Lc.9:28). Tiago era o mais velho (ver DTN, 292).

Zebedeu. Do gr. Zebedaios, o equivalente do heb. Zabday, que significa provavelmente “Yahweh deu”. Sua esposa talvez tenha sido Salomé (Mt.27:56; Mc.15:40; Mc.16:1).

João. Ver com. de Mc.3:17; sobre o significado do nome, ver com. de Lc.1:13. João era o mais jovem dos doze (DTN, 292).

Consertando. Isto é, preparando-as para a próxima pescaria.

Chamou-os. Ver com. de Mc.1:17.

Mt.4:22 22. Então, eles, no mesmo instante, deixando o barco e seu pai, o seguiram.

Deixando o barco. Ver com. de Lc.5:11.

Seu pai. Ver com. de Mt.4:21; Mc.1:20.

Então [...] O seguiram. Ver com. de Lc.5:11. Antes disso, pelo menos três dos quatro discípulos chamados para o discipulado de tempo integral tinham seguido Jesus de forma intermitente e voltado para suas atividades regulares como pescadores.

Mt.4:23 23. Percorria Jesus toda a Galileia, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e enfermidades entre o povo.

Percorria Jesus toda a Galileia. [Primeira Jornada pela Galileia: Jesus prega por toda a Galileia e cura muitos enfermos, Mt.4:23-25 = Mc.1:35-39 = Lc.4:42-44; Lc.6:17-19. Comentário principal: Mc]. Mateus nem sempre segue uma sequência cronológica estrita de eventos (ver p. 276). Ele tende a reunir os incidentes de acordo com a natureza deles, em vez de o tempo em que ocorreram. A narrativa de Mateus da cura da sogra de Pedro e dos doentes e aflitos que se reuniram à porta da casa de Pedro no findar do sábado em Mt.8:14-17 deveria ser inserida entre os v. Mt.4:22-23, a fim de se apresentar uma sequência cronológica. Isso fica evidente a partir do relato de Marcos que segue esta sequência de eventos: chamado junto ao mar, cura do endemoniado na sinagoga de Cafarnaum, eventos na casa de Pedro e começo da primeira viagem missionária pela Galileia (ver Mc.1:16-39). Mateus apresenta um breve resumo da primeira viagem missionária de Jesus às cidades, aldeias e povoados da Galileia durante o verão de 29 d.C. (ver com. de Mc.1:39). A forma do verbo traduzido por “percorria” indica uma viagem mais longa do que o breve relato dos sinóticos parece indicar. Segundo Josefo, a Galileia era uma região densamente povoada, com mais de 200 aldeias e povoados. O único incidente específico registrado dessa primeira viagem missionária é a cura de um leproso (Mt.8:2-4).

O evangelho. Esta é a primeira vez que a palavra “evangelho” ocorre no livro de Mateus (ver com. de Mc.1:1).

Doenças. Do gr. nossos, usado com frequência para se referir a enfermidades graves.

Moléstias (ARC). Do gr. malakia, termo geral para debilidade resultante de alguma doença. A palavra descreve doença física e mental, talvez menos severa do que nosos. As duas palavras, nosos e malakia, ocorrem juntas na LXX (Dt.7:15).

Mt.4:24 24. E a sua fama correu por toda a Síria; trouxeram-lhe, então, todos os doentes, acometidos de várias enfermidades e tormentos: endemoninhados, lunáticos e paralíticos. E ele os curou.

Fama. Do gr. akoe, “relato” (ver com. de Mc.1:28).

Síria. O sentido no qual Mateus usa o termo “Síria” não é totalmente claro. É possível que se refira a regiões além da Galileia, pois, mais tarde, no ministério de Cristo, pessoas das proximidades de Tiro e Sidom tinham ouvido falar de Jesus (Mt.15:21-22) e foram ouvi-Lo e ser curadas de suas enfermidades (Lc.6:17). Porém, o contexto, sugere que Mateus, neste caso, usa o termo “Síria” num sentido mais geral, para incluir Galileia como parte da Síria (geográfica ou politicamente), ou talvez para se referir às regiões mais ao norte da Galileia que faziam fronteira com a Síria (ver v. Mt.4:23; Mt.4:25). As duas últimas sugestões parecem mais prováveis, particularmente tendo em vista o fato de que aqueles que O buscavam em resposta ao que ouviam eram da Galileia, Decápolis, Judeia e Pereia (v. Mt.4:25). Nessa época, a Palestina pertencia à província romana da Síria.

Tormentos. Ou, “dores”.

Endemoninhados. Ver com. de Mc.1:23.

Lunáticos. Do gr. seleniazomai, palavra que ocorre no NT apenas aqui e em Mt.17:15. Dos sintomas dados em Mt.17:15, muitos concluem que seleniazomai significa “estar epilético”, mas pode ter tido conotações mais amplas.

Paralíticos. Do gr. paralutikos.

Mt.4:25 25. E da Galileia, Decápolis, Jerusalém, Judeia e dalém do Jordão numerosas multidões o seguiam.

Decápolis. Ver p. 34.

Mt.5:1 1. Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte, e, como Se assentasse, aproximaram-se os seus discípulos;

Vendo Jesus as multidões. [O sermão do monte. As bem-aventuranças, Mt.5:1-8:1 = Lc.6:20-49. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 215; gráfico, p. 228]. Ao que tudo indica, essas multidões eram as “numerosas multidões” de Mt.4:25 que seguiam Jesus depois de Sua primeira viagem missionária pelas cidades e vilas da Galileia. O Sermão do Monte foi feito provavelmente no fim do verão (MDC, 2, 45) do ano 29 d.C., por volta da metade de seus três anos e meio de ministério. Lucas claramente liga o Sermão do Monte à escolha e ordenação dos doze (Lc.6:12-20; cf. MDC, 3, 4), e preserva a sequência correta de eventos daquele dia notável: (1) a noite passada em oração, (2) a ordenação dos doze, (3) descida à planície, e (4) o sermão (ver DTN, 298). Ele omite apenas o fato de que Jesus “subiu [outra vez] ao monte”, detalhe fornecido em Mateus 5:1, e essa omissão leva alguns a pensarem que o sermão registrado em Lucas não foi proferido ao mesmo tempo e no mesmo lugar que o registrado em Mateus. Por outro lado, Mateus não menciona a indicação e ordenação dos doze, mas se refere a isso no contexto de seu relato da terceira viagem de pregação poucos meses depois (Mt.10:1-5).

Porém, Mateus relata o chamado junto ao mar da Galileia (Mt.4:18-25) antes de se referir às multidões que seguiam Jesus. Os vários relatos dos evangelhos indicam que o chamado dos doze ocorreu em resposta à óbvia necessidade de obreiros mais treinados para atenderem as multidões que acompanhavam Jesus aonde quer que Ele fosse. A indicação dos doze foi o primeiro passo na organização da igreja cristã. Cristo era Rei nesse novo reino da graça divina (ver com. do v. Mt.5:23); os doze eram seus cidadãos ou súditos (ver com. de Mc.3:14). No mesmo dia em que os doze se tornaram súditos do reino, o Rei fez Seu sermão inaugural, no qual apresentou as condições para a cidadania, proclamou a lei do reino e delineou seus objetivos (ver DTN, 298; MDC, 3, 4). Assim, o Sermão do Monte é ao mesmo tempo o discurso inaugural de Cristo como Rei do reino da graça e também a constituição do reino. Logo após o estabelecimento formal do reino e a proclamação de sua constituição, ocorreu a segunda viagem pela Galileia, durante a qual Jesus deu uma demonstração vívida e completa de como o reino, seus princípios e seu poder podem beneficiar o ser humano (ver com. de Lc.7:1; Lc.7:11).

Monte. Comparar com Mt.8:1. Não se sabe a identidade desse monte. Aparentemente, foi onde Jesus passou a noite em oração e onde tinha ordenado os doze pouco antes, no mesmo dia (ver DTN, 290, 298; ver com. de Mc.3:14). Desde o tempo das cruzadas, o Kurn Hattin, “Chifres de Hattin”, oito quilômetros a oeste da antiga Tiberíades, é apontado como possível local, mas essa tradição não pode ser remontada além das cruzadas, e por isso não é confiável. O monte no qual Cristo proferiu o Sermão do Monte é chamado de “Sinai do Novo Testamento”, visto que ele é para a igreja cristã o que o monte Sinai foi para a nação judaica. Foi no Sinai que Deus proclamou a lei divina. Foi no desconhecido monte da Galileia que Jesus reafirmou a Lei divina, explicando seu verdadeiro significado com mais detalhes e aplicando seus preceitos aos problemas da vida diária.

Como Se assentasse. Isto é, “quando se assentou”. É razoável concluir que, em harmonia com um antigo costume, Jesus normalmente Se assentava ao pregar e ensinar (ver Mt.13:1; Mt.24:3; Mc.9:35; ver com. de Lc.4:20). Esse era o hábito comum dos rabis. Ao ensinar, um mestre se assentava. Pelo menos nessa ocasião a multidão também se assentou na relva (DTN, 298).

Seus discípulos. Isso inclui, é claro, os doze apontados e ordenados antes pela manhã (ver com. de Mc.3:13-14; Lc.6:12-19). Como os companheiros mais íntimos de Jesus, eles formavam um círculo mais estreito e naturalmente ocuparam lugares próximos a Ele. Mas, além disso, havia muitos outros que seguiam Jesus e também eram conhecidos como discípulos (DTN, 488; ver com. de Mc.3:13). Mais tarde em Seu ministério, houve várias mulheres que O acompanharam e atendiam as necessidades dos discípulos (Lc.8:1-3; Mt.27:55). É provável que algumas dessas mulheres devotas estivessem presentes nessa ocasião. Porém, a audiência era composta em grande parte de trabalhadores e pescadores (DTN, 299; MDC, 39). Espias também estavam presentes (DTN, 307; MDC, 47; ver com. de Mt.4:12).

Mt.5:2 2. e Ele passou a ensiná-los, dizendo:

Ele passou a ensiná-los. Lucas observa que Jesus olhou para Seus discípulos (Lc.6:20) quando começou a falar. Apesar de algumas diferenças no relato do sermão e sobre as circunstâncias de seus ouvintes, conforme narrado por Mateus e Lucas, não se pode questionar o fato de que esses dois relatos se refiram à mesma ocasião. As semelhanças superam as supostas diferenças, e as diferenças são mais aparentes do que reais. O sermão, sem dúvida, foi muito mais longo, e os dois escritores apresentam resumos independentes. Eles incorporam em suas sinopses características que o Espírito Santo lhes impressionou a incluir (ver p. 276). Dessa forma, os relatos não são excludentes, mas complementares. Portanto, todos os pontos mencionados por ambos os evangelistas devem ser aceitos. Desse modo, é um privilégio ter um relato mais completo daquilo que Jesus disse nessa ocasião do que um único relato forneceria (ver Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17).O relato de Mateus do sermão é praticamente três vezes mais longo que o de Lucas. Isso pode ser devido ao fato de que Mateus estava mais preocupado com os ensinamentos de Jesus. A preocupação principal de Lucas, como afirma claramente no seu prólogo (Lc.1:1-4), era o aspecto histórico. O relato de Mateus do Sermão do Monte contém muitas informações que Lucas não menciona, embora Lucas relate algumas coisas que Mateus omite (ver p. 178, 179). Os principais pontos de semelhança são os seguintes:
Mateus Lucas
Mt.5:3-4; Mt.5:6 Lc.6:20-21;
Mt.5:11; Mt.5:1 Lc.6:22-23;
Mt.5:39-42; Lc.6:27-30;
Mt.5:42-48; Lc.6:32-36;
Mt.7:1-2; Lc.6:37-38;
Mt.7:3-5; Lc.6:41-42;
Mt.7:12; Lc.6:31;
Mt.7:16-21; Lc.6:43-46;
Mt.7:24-27; Lc.6:47-49;
Várias outras partes do Sermão do Monte apresentadas em Mateus ocorrem em pontos diferentes do evangelho de Lucas, sem dúvida porque Cristo repetiu esses pensamentos em ocasiões posteriores (ver com. de Lc.6:17-49). No Sermão do Monte, Cristo falou da natureza de Seu reino. Ele também refutou as falsas ideias sobre o reino do Messias que foram inculcadas na mente do povo pelos líderes judeus (MDC, 1, 3; ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17). O Sermão do Monte apresenta um contraste notável entre o cristianismo e o judaísmo da época de Cristo. Para apreciar de forma plena a importância do Sermão do Monte é preciso entender não apenas cada princípio como é individualmente apresentado, mas também a relação de cada um com o todo. O discurso constitui uma unidade que não é percebida pelo leitor casual. O esboço (ver p. 335) enfatiza essa unidade inerente e apresenta a relação das várias partes do discurso com o sermão como um todo.

Mt.5:3 3. Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus.

Bem-aventurados. Do gr. makarioi, singular makarios, “feliz”; do heb. ashre, “feliz”, “bendito” (ver com. de Sl.1:1). Ashre e makarios em geral são traduzidos como “bem-aventurado”, “feliz” (1Rs.10:8; Sl.127:5; Pv.29:18; Jo.13:17; At.26:2; 1Pe.3:14). A palavra inglesa “blessed” (benditos), empregada neste versículo na KJV, é mais próxima ao gr. eulogetos, que significa “bendito”, no uso atual (Lc.1:68; 1Pe.1:3). Eulogetos vem da raiz eulogeo, “falar bem de”, “louvar”, “honrar” (Mt.5:44; Mt.21:9; Mt.26:26; Rm.12:14). A palavra “beatitude” vem do latim beatitudo. Na Vulgata latina, cada declaração da primeira parte do sermão começa com a palavra beati, equivalente a makarioi. A palavra makarios ocorre nove vezes nos v. 3 a 11. Mas os v. 10 e 11 se referem, ao mesmo aspecto da experiência cristã e, portanto, devem ser considerados uma só bem-aventurança, totalizando oito em vez de nove. Lucas apresenta apenas quatro bem-aventuranças: primeira, quarta, segunda e oitava de Mateus, nessa ordem (Lc.6:20-23), mas acrescenta quatro ais correspondentes (v. Lc.6:24-26). Nas primeiras palavras do Sermão do Monte, Cristo enfatiza o desejo supremo de todo coração humano: felicidade. Esse desejo foi implantado no ser humano pelo próprio Criador e, originalmente, tinha o propósito de levá-lo a encontrar verdadeira felicidade por meio da cooperação com o Deus que o criou. O pecado acontece quando o ser humano tenta alcançar a felicidade como um fim em si mesma, sem considerar a obediência a Deus.

Dessa forma, no início de seu sermão inaugural, como Rei do reino da graça divina, Cristo proclama que o principal objetivo do reino é restaurar a felicidade perdida no Éden no coração humano e que aqueles que escolhem entrar pela porta “estreita” e pelo caminho “apertado” (Mt.7:13-14) encontrarão verdadeira felicidade. Acharão paz e alegria interiores, satisfação verdadeira e duradoura para a mente e o coração que só se alcança quando “a paz de Deus, que excede todo o entendimento”, está presente para guardar todo o ser em Cristo Jesus (Fp.4:7). Quando Cristo voltou para o Pai, deixou Sua paz com Seus seguidores, uma paz que o mundo não pode dar (Jo.14:27). A felicidade está no coração daqueles que estão em paz com Deus (cf. Rm.5:1) e com seu próximo (cf. Mq.6:8), que caminham de acordo com os dois grandes mandamentos da Lei de amor (ver Mt.22:37-40). Apenas os que são súditos verdadeiros do reino da graça alcançam essa disposição de mente e de coração.

Humildes. Do gr. ptochos, palavra que indica pobreza extrema, de ptasso, “humilhar-se”, “agachar-se” (ver com. de Mc.12:42; Lc.4:18; Lc.6:20). Nesse caso, ptochos se refere àqueles que são extremamente pobres no sentido espiritual e sentem necessidade daquilo que o reino dos céus tem a lhes oferecer (cf. At.3:6; ver com. de Is.55:1). Aquele que não sente necessidade espiritual, que se acha “rico e abastado” e não precisa “de coisa alguma” é, aos olhos dos céus, “miserável, pobre, cego e nu” (Ap.3:17). Somente os “humildes de espírito” entrarão no reino da graça divina; os demais não sentem necessidade das riquezas do Céu, e se negam a aceitar suas bênçãos.

Deles. Ter a percepção da necessidade própria é a primeira condição para entrar no reino da graça divina (ver MDC, 7, 8). Foi pela percepção de sua própria pobreza espiritual que o publicano na parábola “desceu justificado para sua casa”, ao contrário do fariseu (Lc.18:9-14). No reino dos céus não há lugar para o orgulhoso, o satisfeito consigo mesmo, o que é justo aos seus próprios olhos. Cristo convida o pobre de espírito a trocar sua pobreza pelas riquezas de Sua graça.

O reino dos céus. Ver com. de Mt.4:17; Lc.4:19. É importante observar que Cristo não estava falando tanto do futuro reino de glória, mas do reino presente da graça divina. Em Seus ensinamentos, Ele falava com frequência do reino da graça no coração daqueles que aceitam Sua soberania, conforme se ilustra na parábola do joio, do grão de mostarda, do fermento, da rede (Mt.13:24; Mt.13:31; Mt.13:33; Mt.13:47) e em muitas outras (ver MDC, 8, 108). Os judeus imaginavam que o reino dos céus se baseava na força que obrigaria as nações da terra a se submeterem a Israel. Mas o reino que Cristo veio estabelecer começa no coração do ser humano, permeia a vida e transborda para o coração de outras pessoas com o poder dinâmico e cativante do amor.

Mt.5:4 4. Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.

Os que choram. Do gr. pentheo, palavra que em geral indica intenso pesar em contraste com lupeomai, termo mais geral que significa “entristecer-se” (Mt.14:9; 1Pe.1:6, NVI). Assim, a extrema pobreza espiritual dos “humildes de espírito” (ver com. de Mt.5:3) corresponde ao profundo pesar das pessoas descritas no v. 4. De fato, a clara percepção da necessidade espiritual leva o ser humano a chorar pela imperfeição que vê em sua vida (ver MDC, 9; cf. DTN, 300). Cristo Se refere àqueles que, em humildade de espírito, anseiam alcançar o padrão de perfeição (cf. Is.6:5; Rm.7:24). Também há uma mensagem de conforto para aqueles que choram por causa de desilusão, luto ou outro pesar (ver MDC, 10-12).

Serão consolados. Do gr. parakaleo, “chamar ao lado de”, “pedir ajuda”, “chamar a entrar”, “mandar chamar”; também “exortar”, “animar”, “consolar”, “encorajar” e “confortar”. Um amigo verdadeiro é parakletos, e sua ajuda paraklesis. Em 1Jo.2:1, Jesus é chamado de Parakletos. Ao partir, prometeu enviar “outro Consolador” (ver com. de Jo.14:16), do gr. Parakletos, o Espírito Santo, para habitar em nós como um amigo sempre presente. Assim como Deus satisfaz o senso de necessidade espiritual com as riquezas da graça celestial (ver com. do v. Mt.5:3), também consola o pesar pelo pecado com o conforto do perdão. A menos que haja primeiramente uma percepção da necessidade, não haverá pranto pelo que falta; nesse caso, um caráter justo. Pesar pelo pecado é, portanto, a segunda exigência para aqueles que se apresentam como candidatos ao reino dos céus, e acontece naturalmente depois do primeiro passo.

Mt.5:5 5. Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.

Mansos. Do gr. praeis, singular praus, “suave”, “gentil”, “manso”. Cristo falou de Si mesmo como “manso [praus] e humilde de coração” (Mt.11:29) e, por isso, todos os que estão “cansados e sobrecarregados” (v. Mt.11:28) podem ir até Ele e encontrar descanso para a alma. O equivalente hebraico de praus é anaw ou ani, “pobre”, “afligido”, “humilde”, “manso”. Essa palavra hebraica é usada para se referir a Moisés, que era muito “manso” (Nm.12:3). Ocorre também na passagem messiânica de Is.61:1-3 (cf. com. de Mt.5:3), e no Sl.37:11, em que também é traduzido como “manso”. Mansidão é a atitude de coração, mente e vida que prepara o caminho para a santificação. Um “espírito manso [...] é de grande valor diante de Deus” (1Pe.3:4). Com frequência, os escritores do NT mencionam a mansidão como uma virtude cristã essencial (ver Gl.5:23; 1Tm.6:11). “Mansidão” para com Deus significa que aceitamos Sua vontade e consideramos positivamente Seu trato conosco, que nos submetemos a Ele em tudo, sem hesitar (cf. MDC, 15). Um “manso” tem completo controle do eu. Nossos primeiros pais perderam o reino que lhes foi prometido por causa da exaltação própria; esse reino pode ser reconquistado por meio da mansidão (MDC, 17; ver com. de Mq.6:8).

Herdarão a terra. Comparar com Sl.37:11. Os “humildes de espírito” receberão as riquezas do reino dos céus (Mt.5:3); os “mansos” “herdarão a terra”. É certo que os “mansos” não herdam a terra agora, mas sim os orgulhosos. Contudo, no tempo devido, os reinos deste mundo serão dados aos santos, àqueles que aprenderam a graça da humildade (cf. Dn.7:27). Finalmente, diz Cristo, aqueles que se humilham, os que aprendem a mansidão, serão exaltados (ver com. de Mt.23:12).

Mt.5:6 6. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos.

Os que têm fome e sede. Esta metáfora era especialmente convincente num lugar onde a média anual de chuvas não passa de 660 mm (ver vol. 2, p. 94; ver com. de Gn.12:10). O que acontece na Palestina em geral também ocorre em outras regiões do Oriente Médio. Visto que faz fronteira com grandes áreas desérticas, boa parte das terras habitadas é semiárida. Sem dúvida, muitos dos que ouviam Jesus sabiam o que era passar sede. Como ilustrado no caso de Agar e Ismael, um viajante que se perdesse ou que perdesse uma das poucas fontes existentes ao longo de sua rota podia facilmente ter sérias dificuldades (ver com. de Gn.21:14). Porém, Jesus falou da sede e da fome espiritual (ver Sl.42:1-2). Apenas os que anseiam por justiça com a ávida ansiedade de alguém faminto ou como o sedento à procura de água, a encontrará. Nenhuma fonte humana pode satisfazer a fome e a sede da alma, sejam riquezas materiais, filosofias profundas, satisfação de apetites carnais ou honra e poder. Depois de experimentar todas essas coisas, Salomão concluiu que “tudo é vaidade” (Ec.1:2; Ec.1:14; Ec.3:19; Ec.11:8; Ec.12:8; Ec.2:1; Ec.2:15; Ec.2:19).

Nada disso traz a satisfação e a felicidade que todo ser humano anseia. A conclusão do sábio foi que reconhecer o Criador e cooperar com Ele proporcionam a única satisfação eterna (Ec.12:1; Ec.12:13). Seis ou oito meses após o Sermão do Monte (ver gráfico, p. 228), Jesus fez outro grande discurso, sobre o Pão da Vida (Jo.6:26-59), no qual explanou mais a fundo o princípio apresentado brevemente no Sermão do Monte. O próprio Jesus é o “pão” pelo qual o ser humano deve ter fome. Participar desse pão sustenta a comunhão com Deus e satisfaz a fome espiritual (ver Jo.6:35; Jo.6:48; Jo.6:58). Aqueles que têm fome e sede são gentilmente convidados a ir ao Provedor celestial e receber alimento e bebida “sem dinheiro e sem preço” (Is.55:1-2). O anseio do coração por justiça é uma evidência de que Cristo já começou Sua obra nele (MDC, 19).

Justiça. Do gr. dikaiosune, da raiz dike, “costume”, “uso” e, assim, “o correto” segundo o costume. No NT, a palavra é usada no sentido de “correto”, conforme os princípios do reino dos céus. Em quase todos os casos de seu uso no NT (85 de um total de 89 vezes), dikaiosune é traduzido como “justiça”. Entre os gregos, “justiça” consistia em conformidade com costumes aceitos. Para os judeus, justiça era essencialmente uma questão de conformidade com as exigências da Lei, conforme interpretada pela tradição judaica (ver Gl.2:16-21). Mas, para os seguidores de Cristo, justiça assumiu um significado mais amplo. Em vez de estabelecerem sua própria justiça, os cristãos foram chamados a se submeter à justiça “que vem de Deus” (Rm.10:3), buscando a justiça “que é mediante a fé em Jesus Cristo, a justiça que procede de Deus” (Fp.3:9). A justiça de Cristo é tanto imputada como partilhada. Justiça imputada traz justificação. A pessoa justificada cresce em graça. Pelo poder de Cristo que habita nele, o cristão ajusta sua vida de acordo com os requisitos da lei moral apresentada nos preceitos e exemplos de Jesus. Isso é justiça partilhada (ver PJ, 310-312). Era isso que Cristo tinha em mente quando encorajou Seus ouvintes a serem “perfeitos” como o Pai celestial (ver com. de Mt.5:48). Paulo observa que a vida perfeita de Jesus tornou possível que o “preceito da lei se cumprisse em nós que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito” (Rm.8:4).

Mt.5:7 7. Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.

Misericordiosos. Do gr. eleemones, “piedoso”, “misericordioso”, “compassivo”. Cristo é “misericordioso [eleemon] e fiel sumo sacerdote” (Hb.2:17). A misericórdia da qual Cristo fala é uma virtude ativa. De nada vale se não assume a forma de atos de misericórdia. Atos de misericórdia são um teste de admissão para o reino da glória (Mt.25:31-46). Tiago inclui atos de misericórdia na definição de “religião pura” (Tg.1:27). Miqueias (Mq.6:8) resume o dever do ser humano para com Deus e seu próximo: “que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus”. Miqueias, como Cristo, menciona tanto a humildade perante Deus quanto a misericórdia para com os seres humanos. Esses atributos podem ser comparados com os dois mandamentos dos quais dependem “toda a Lei e os profetas” (Mt.22:40).

Alcançarão misericórdia. Isso acontece tanto no presente quanto acontecerá no dia do juízo, tanto da parte dos seres humanos como da parte de Deus. O princípio da lei áurea (Mt.7:12) se aplica tanto à maneira como tratamos os outros quanto ao tipo de tratamento que recebemos em troca. A pessoa cruel, de coração duro e espírito medíocre raramente recebe um tratamento gentil e misericordioso de seu próximo. Muitas vezes, os que são gentis e têm consideração pelas necessidades e pelos sentimentos do próximo recebem do mundo o mesmo tratamento.

Mt.5:8 8. Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus.

Limpos de coração. A palavra traduzida como “coração” designa o intelecto (Mt.13:15), a consciência (1Jo.3:20-21), o íntimo (1Pe.3:4). Pureza de coração, no sentido que Cristo usou, inclui muito mais que pureza sexual (MDC, 25); inclui todos os traços de caráter desejáveis em detrimento de tudo o que é indesejável. Ser “limpo de coração” é equivalente a ser vestido com as vestes da justiça de Cristo (ver com. de Mt.22:11-12), o “linho finíssimo”, que são os atos de justiça dos santos (Ap.19:8; Ap.3:18-19), isto é, a perfeição de caráter. Jesus não tinha em mente a pureza cerimonial (Mt.15:18-20; Mt.15:23:25), mas a pureza interior, do coração. Se as motivações são puras, a vida é pura. Os limpos de coração abandonaram o pecado como o princípio regulador da vida e sua vida está dedicada a Deus sem reservas (ver Rm.6:14-16; Rm.8:14-17). Ser “limpo de coração” não significa não pecar, mas que as motivações são corretas, que pela graça de Cristo a pessoa dá as costas aos erros passados e busca a perfeição em Cristo Jesus (Fp.3:13-15).

Verão a Deus. Cristo enfatiza o reino da graça divina no coração do ser humano nesta era, embora não exclua o reino eterno de glória na era porvir (ver com. do v. Mt.5:3). Portanto, está claro que as palavras “verão a Deus” são usadas no sentido espiritual e físico. Aqueles que sentem sua necessidade espiritual entram no “reino dos céus” (v. Mt.5:3) agora; aqueles que choram por causa do pecado (v. Mt.5:4) são confortados agora; os mansos (v. Mt.5:5) recebem o direito de possuir a nova terra agora; os que têm fome e sede da justiça de Jesus Cristo (v. Mt.5:6) são satisfeitos agora; e os misericordiosos (v. Mt.5:7) obtém misericórdia agora. Da mesma forma, os limpos de coração têm o privilégio de ver a Deus agora, com os olhos da fé; e, finalmente, no reino glorioso, terão o privilégio de O verem face a face (1Jo.3:2; Ap.22:4). Além disso, apenas aqueles que desenvolvem a visão celestial neste mundo terão o privilégio de ver a Deus no mundo porvir. Assim como no caso de narcóticos e bebidas embriagantes, o primeiro efeito do pecado é nublar as faculdades superiores da mente. Só depois que a serpente seduziu Eva a ver com os olhos da alma que “a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos e árvore desejável para dar entendimento” foi que a mulher “tomou-lhe do fruto e comeu” (Gn.3:6).

Quando a serpente disse: “se vos abrirão os olhos”, referia-se à visão figurada, pois o resultado disso foi o conhecimento do bem e do mal (Gn.3:5). O diabo primeiramente cega, persuadindo a pessoa a crer que a experiência com o pecado lhe dará visão mais clara. Porém, o pecado leva a cegueira ainda maior. Os pecadores têm olhos, mas não veem (Je.5:21; Is.6:10; Ez.12:2). Só aqueles cujo coração é limpo “verão a Deus”. Quando os “olhos” da alma forem “bons”, a vida será cheia de luz (Mt.6:22-23). Muitos cristãos se tornam espiritualmente estrábicos, na tentativa de manter um olho fixo na Canaã celestial e outro nos “prazeres transitórios do pecado” (Hb.11:25) e nas “panelas de carne” do Egito (Ex.16:3). Nossa única salvaguarda é viver por princípio, colocar Deus em primeiro lugar na vida. Aqueles que, no presente, desejam as coisas deste mundo, cuja atenção está fixa nas atrações que Satanás lhes mostra, jamais enxergarão o quanto vale mais obedecer a Deus. Os que querem ver a Deus devem conservar limpa a janela da mente.

Mt.5:9 9. Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.

Pacificadores. Do gr. eirenopoioi, de eirene, “paz”, e poieo “fazer”. Cristo, neste caso, se refere principalmente a estar em harmonia com Deus (DTN, 302-305; MDC, 28). “O pendor da carne é inimizade contra Deus” (Rm.8:7), mas Cristo, o grande pacificador, veio para mostrar ao ser humano que Deus não é um inimigo (ver MDC, 25). Cristo é “o Príncipe da Paz” (ls.9:6-7; Mq.5:5). Ele foi o mensageiro da paz de Deus para o ser humano, e “justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus” por intermédio dEle (Rm.5:1). Quando Jesus concluiu Sua missão e voltou para o Pai, Ele pôde dizer: “Deixo-vos a paz, a Minha paz vos dou” (Jo.14:27; 2Ts.3:16). A fim de compreender o que Cristo quis dizer com “pacificadores” é útil observar o significado de paz no pensamento e na fala semíticos. O equivalente hebraico do gr. eirene é shalom, que significa “plenitude”, “inteireza”, “prosperidade”, “bem-estar” ou “paz”. Tendo em vista o fato de que Cristo e o povo comum usavam o aramaico, idioma bem parecido com o hebraico, Jesus sem dúvida usou a palavra com conotações semíticas. Os cristãos devem viver em paz entre si (1Ts.5:13) e seguir “a paz com todos” (Hb.12:14). Devem orar por paz, trabalhar pela paz e ter interesse nas atividades que contribuem para uma sociedade pacífica.

Filhos de Deus. Os judeus se consideravam “filhos de Deus” (cf. Dt.14:1; Os.1:10), conceito que os cristãos também têm (1Jo.3:1). Ser um filho de Deus significa ter um caráter semelhante ao dEle (1Jo.3:2; Jo.8:44). “Pacificadores” são os “filhos de Deus” porque estão em paz com Ele e se dedicam a fazer com que seu próximo esteja em paz com o Céu.

Mt.5:10 10. Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus.

Perseguidos. Cristo Se refere principalmente à perseguição sofrida no processo de abandonar o mundo pelo reino dos céus. Desde que o pecado entrou no mundo, há “inimizade” entre Cristo e Satanás, entre o reino dos céus e o reino deste mundo e entre os que servem a Deus e os que servem a Satanás (Gn.3:15; Ap.12:7-17). Esse conflito continuará até que o reino do mundo se torne do nosso Senhor e do Seu Cristo (Ap.11:15; Dn.2:44; Dn.7:27). Paulo advertiu os crentes de que “através de muitas tribulações, nos importa entrar no reino de Deus” (At.14:22). Cidadãos do reino celestial devem esperar sofrer tribulação neste mundo (Jo.16:33), pois o caráter, ideal, aspiração e conduta deles são testemunhas silenciosas contra o mal deste mundo (cf. 1Jo.3:12). Os inimigos do reino celestial perseguiram Cristo, o Rei, e é de se esperar que persigam Seus súditos leais (Jo.15:20). “Todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos” (2Tm.3:12).

Deles é o reino. Esta é a mesma promessa feita no v. Mt.5:3 para aqueles que sabem de sua necessidade espiritual. “Se perseveramos, também com Ele reinaremos” (2Tm.2:12; Dn.7:18; Dn.7:27). Os que sofrem mais por Cristo compreendem melhor o que Ele sofreu por eles. É apropriado que a primeira e a última bem-aventurança assegurem que essas pessoas serão súditas do reino. Os que cumprem essas oito qualificações para a cidadania são dignos de um lugar no reino.

Mt.5:11 11. Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vós.

Por Minha causa. Os cristãos sofrem por causa do nome que carregam, o nome de Cristo. Em todas as épocas, como no tempo da igreja primitiva, os que verdadeiramente amam o seu Senhor se regozijam em serem “considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome” (At.5:41; 1Pe.2:19-23; 1Pe.3:14; 1Pe.4:14). Cristo advertiu Seus discípulos de que eles seriam odiados de todos por causa do Seu nome (Mt.10:22), mas acrescentou que quem “perde a vida por Minha causa achá-la-á” (Mt.10:39). Os cristãos devem esperar padecer por Cristo (Fp.1:29).

Injuriarem. Do gr. oneidizo, “reprovar”, “caluniar”, “insultar” (ver com. de Lc.6:22). Mt.4:11-12 não constitui uma bem-aventurança adicional; é simplesmente uma explicação das formas em que a perseguição pode se manifestar.

Mt.5:12 12. Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós.

Regozijai-vos. O cristão deve se regozijar com tudo (Fp.4:4), sabendo que Deus fará tudo para seu bem (Rm.8:28). Isso é especialmente verdadeiro quanto à tentação e às provas (Tg.1:2-4), pois o sofrimento desenvolve paciência e outros traços de caráter essenciais aos cidadãos do reino celestial.

Exultai. Comparar com Lc.6:23.

É grande o vosso galardão. Ver também o com. de Lc.6:24-26. Para o cristão maduro, a recompensa não é o mais importante (ver PJ, 398). Ele não obedece apenas com o propósito de entrar no Céu; obedece porque, para ele, cooperar com seu Criador é o objetivo e a alegria supremos da existência. O sacrifício pode ser grande, mas a recompensa também o é. Quando o Filho do Homem vier em glória “retribuirá a cada um conforme as suas obras” (Mt.16:27; Ap.22:12).

Profetas. Elias foi perseguido por Acabe e Jezabel (1Rs.18:7-10; 1Rs.19:2), e Jeremias, por seus compatriotas (Je.15:20; Je.17:18; Je.18:18; Je.20:2). Perseguição e crise podem ser usadas por Deus para purificar a vida e eliminar a escória do caráter (cf. Jó.23:10).

Mt.5:13 13. Vós sois o sal da terra; ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens.

Vós. No grego, esse pronome é enfático. É importante lembrar que Jesus Se dirigia aos discípulos, particularmente aos doze, como súditos do reino da graça divina (ver com. dos v. Mt.5:1-3). Outros estavam ouvindo, principalmente trabalhadores e pescadores (MDC, 39), mas também estavam presentes espias a mando dos fariseus (DTN, 307; ver com. de Mc.2:6).

Sal. Na Palestina, o sal era recolhido ao longo da costa ou em lagos. A forma como era recolhido resultava na presença de muitas impurezas. Em contato com a umidade, ou exposto à chuva, se desvanecia por ser muito solúvel, restando apenas impurezas. A ideia de comparar os cidadãos do reino com o sal é que ele serve para preservar (cf. MDC, 35). Antes da refrigeração e de outros meios modernos de se conservar o alimento, o sal e as especiarias eram muito usados para esse fim. Na antiga Palestina, usava-se o sal quase que exclusivamente para esse propósito e como tempero (ver Jó.6:6). Da mesma forma, o cristão, ao se tornar um agente na salvação de outros por meio da propagação do evangelho, exerce uma influência preservadora e purificadora no mundo. Os discípulos deveriam reconhecer a salvação do próximo como sua responsabilidade principal. Não deviam se retirar da sociedade por causa da perseguição (ver Mt.5:10-12) ou por outras razões, mas permanecer em contato estreito com o próximo. No relato do Sermão do Monte, Lucas não inclui o conteúdo de Mt.5:13-16, embora cite uma declaração similar de Cristo feita em outra ocasião (Lc.14:34-35).

Marcos também apresenta uma passagem similar em que as palavras foram ditas apenas aos discípulos, em outra ocasião (Mc.9:50), e aplicadas particularmente à característica de se conviver bem com todos. O fato de se atribuírem a Jesus os mesmos dizeres, ou similares, em diferentes situações em Seu ministério leva alguns a concluir que os escritores dos evangelhos, casual e arbitrariamente, atribuíram os dizeres a momentos diferentes, sem considerar quando de fato Ele fez essas declarações. Porém, essa conclusão se baseia na noção ingênua de que Jesus tenha expressado uma determinada ideia uma vez apenas durante Seu ministério. Mas não existe razão válida para se supor que Ele não teria repetido suas observações, no todo ou em partes, em vários momentos e a públicos diferentes e, talvez, até às mesmas pessoas.

Vier a ser insípido. Seria tão impensável para um cristão perder suas características essenciais e ainda continuar sendo cristão quanto seria para o sal perder seu sabor e ainda ser considerado e usado como sal. Se os cristãos forem cristãos apenas no nome, sua cidadania nominal no reino dos céus se torna uma farsa. Não são cristãos a menos que reflitam o caráter de Cristo.

Sabor. Isto significa ter restaurada sua característica essencial e útil. Quando o amor, poder e justiça de Cristo se perdem da vida de um cristão professo, não há outra fonte à qual possa se voltar para suprir a falta. Um cristão nominal não pode transmitir a outros aquilo que ele próprio não possui. No antigo ritual cerimonial, usava-se o sal em todos os sacrifícios (Lv.2:13; Ez.43:24; Mc.9:49). Sem ele, o sacrifício era inaceitável. Nesse caso, o sal tipificava a justiça de Cristo (ver DTN, 439). A fim de que nossa vida seja um “sacrifício vivo, santo e agradável a Deus” (Rm.12:1), ela deve ser preservada e temperada pela justiça perfeita de Jesus Cristo (ver Gl.2:20).

Para nada mais presta. Um cristão cuja vida é destituída da graça e do poder de Cristo “para nada mais presta”. Ele se torna um prejuízo à causa do reino, pois leva uma vida que representa os princípios do reino de forma errada.

Pisado. De onde estava, a multidão de ouvintes podia ver o caminho branco de sal, lançado ali porque tinha se tornado imprestável (MDC, 36, 37).

Mt.5:14 14. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um monte

Vós. No grego, este pronome é enfático.

Luz. A luz sempre foi um símbolo da presença divina (ver com. de Gn.1:3; Gn.3:24). João se refere a Jesus como a “luz dos homens” que brilha em meio à escuridão deste mundo (Jo.1:4-9). Ao final de Seu ministério, Jesus Se referiu a Si mesmo como “a luz do mundo” (ver com. de Jo.8:12; Jo.9:5). Ao aceitar a Jesus como a luz do mundo e se manter fiel ao seu chamado, o cristão reflete essa luz. Na profecia messiânica, Jesus é chamado de “grande luz” (Is.9:2) e “Sol da justiça” (Ml.4:2; ver com. de Lc.1:79). Quando a verdadeira Luz ilumina os seres humanos, eles são exortados a se levantar e resplandecer (Is.60:1-3). Aqueles que amam e servem o Senhor “brilham como o sol” (ver com. de Jz.5:31), tanto neste mundo como no mundo porvir (ver Mt.13:43). Ainda era de manhã quando Cristo falou (MDC, 38), e o sol ascendia no céu em direção ao zênite (cf. Sl.19:4-6). De modo similar, os doze bem como todos os futuros cidadãos do reino deviam deixar sua luz brilhar pelo mundo, dissipando a escuridão do pecado e da ignorância sobre a vontade e os caminhos de Deus (ver com. de Jo.1:4; Jo.1:7; Jo.1:9).

Mundo. Do gr. kosmos (ver com. de Mt.4:8).

Edificada sobre um monte. Antigas cidades da Palestina geralmente se situavam sobre montes, como testificam suas ruínas. Essas cidades podiam ser vistas de distâncias consideráveis. Do lugar onde Cristo e a multidão estavam assentados, podiam ser vistas muitas cidades e vilas nos montes ao redor (MDC, 39).

Mt.5:15 15. nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no velador, e alumia a todos os que se encontram na casa.

Uma candeia. Do gr. luchnos, “uma lâmpada”, não como as que se usam atualmente. As lâmpadas antigas consistiam de um recipiente de barro ou de metal em geral com formato de pires, com o pavio mergulhado no azeite e a parte acesa que ficava na borda do prato ou se projetava através de um orifício especial (comparar com Mc.4:21; Lc.8:16; Lc.11:33).

Alqueire. Do gr. modios, medida que continha 8,75 litros. O recipiente era usado com frequência no lar para guardar farinha. Cristo usou o singular porque no lar de pessoas comuns daquela época havia apenas um. Era feito em geral de barro cozido. Como nação, os judeus estavam escondendo sua luz (cf. Is.60:1) debaixo de um “alqueire”; Jesus ressaltou que a luz confiada a eles pertencia a todos os seres humanos (ver vol. 4, p. 13-17).

Velador. Do gr. luchnia, “candeeiro”. Nos lares de pessoas comuns, era, em geral, um suporte de barro cozido. Em outros casos, colocava-se a luminária numa estante na parede ou na viga central de pedra ou madeira que servia para sustentar o teto (ver Ex.25:31; Hb.9:2; Ap.1:12; Ap.11:4).

Alumia a todos. Todos os membros de uma casa podem se beneficiar de uma lâmpada posta em seu devido lugar. De forma semelhante, era propósito divino que toda a família humana se beneficiasse da luz da verdade que Deus tinha confiado aos descendentes de Abraão (ver Gn.12:3; Dt.4:6; Is.60:1-3; ver também vol. 4, p. 15-17; ver com. de Lc.15:8).

Mt.5:16 16. Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus.

Brilhe também a vossa luz. A luz da verdade vem do Céu (Jo.1:4), mas quando ilumina nossa própria vida ela se torna nossa luz (Is.60:1-3; Ef.5:14). Os doze recém-nomeados eram os primeiros portadores de luz do cristianismo. A eficácia com que os discípulos refletiram a luz da verdade e do amor de Deus se tornou evidente mesmo para seus piores inimigos, que “reconheceram que haviam eles estado com Jesus” (At.4:13). Era Jesus quem tinha disseminado pelo mundo a luz do céu (Jo.1:4). Os líderes judeus não poderiam ter expressado elogio maior aos discípulos; não poderiam ter demonstrado maior reconhecimento da eficácia da missão de Cristo. Ele acendeu uma luz no coração das pessoas que jamais se extinguiria.

Vejam as vossas boas obras. Uma lâmpada é apreciada pela claridade e força da luz que reflete. O azeite numa lâmpada que está sobre um velador pode não ser visível para as pessoas num cômodo, mas o fato de ela emitir luz é evidência de que há azeite na lâmpada.

Glorifiquem a vosso Pai. Satanás sempre buscou dar uma impressão errônea do Pai. Cristo veio para dissipar as trevas e revelar o Pai. Cristo atribuiu essa mesma obra a Seus discípulos. A luz brilha, não tanto para que os seres humanos possam vê-la, mas para que possam ver outras coisas por causa da luz. A luz do cristão deve brilhar, não para que as pessoas sejam atraídas a ele, mas para que sejam atraídas a Cristo, que é a luz da vida, e para as coisas dignas de serem vistas (Mt.6:31-34; Jo.6:27; Is.55:1-2). Essa é a primeira vez em que Mateus se refere a Deus como “Pai”, termo que usa várias vezes deste ponto em diante (Mt.5:45; Mt.5:48; Mt.6:1; Mt.6:9). O conceito de Deus como Pai e dos seres humanos como Seus filhos ocorre com frequência no AT (Dt.32:6; Is.63:16; Is.64:8; Je.3:4). Cristo deu novo significado à relação Pai-Filho (PJ, 141, 142). Na literatura judaica, Deus é representado muitas vezes como “Pai” celestial.

Mt.5:17 17. Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir.

Não penseis. Como em quase todas as ocasiões durante Seus últimos dois anos de ministério (ver com. de Mc.2:6; Lc.6:11), estavam presentes espias enviados para investigar e relatar as atividades de Jesus. Mesmo enquanto o Mestre falava, eles cochichavam aos ouvintes que Ele fazia pouco caso da lei (DTN, 307; MDC, 47). Mas, como em muitos outros momentos (ver com. de Mc.2:8; Lc.4:23; Lc.6:8), Jesus leu seus pensamentos (DTN, 307) e lhes contestou a objeção, dando evidência de Sua divindade.

Vim. Jesus Se refere à Sua vinda procedente do Pai ao mundo (Jo.16:28; Jo.18:37).

Revogar. Do gr. kataluo, literalmente, “desfazer”, como se desarma uma tenda, daí, “tornar inválido”, “abolir”, “anular”. Se foi Cristo quem proclamou a lei no monte Sinai, por que a anularia? (ver PP, 366; ver com. de Mt.23:23).

A Lei ou os Profetas. Do gr. nomos (ver com. de Rm.3:19), equivalente ao heb. torah, que inclui toda a vontade de Deus revelada (ver com. de Sl.119:1; Sl.119:33; Pv.3:1). A expressão “a Lei ou os Profetas” representa uma divisão das Escrituras do AT em duas partes (ver Mt.7:12; Mt.11:13; Mt.22:40; Lc.16:16; Jo.1:45; Rm.3:21). A classificação se encontra também na antiga literatura judaica (ver 4 Macabeus 18:10). Porém, a divisão mais comum entre os judeus era em três partes: a Lei, os Profetas e os Salmos (Lc.24:44), ou, de acordo com o título da Bíblia hebraica “Lei, Profetas e Escritos”. O contexto indica que Jesus provavelmente Se referiu à lei moral e aos estatutos civis contidos nos livros de Moisés e confirmados pelos profetas (DTN, 307; MDC, 45). Mais à frente no capítulo, Jesus escolhe alguns preceitos dos dez mandamentos (Mt.5:21-47) e das leis de Moisés (ver v. Mt.5:33; Mt.5:38; Mt.5:43) e prossegue fazendo um contraste entre Sua interpretação deles com a dos escribas, os intérpretes oficiais e mestres da lei (ver p. 43; ver com. de Mc.1:22; Mc.2:6; Mc.2:16; Lc.5:17). Cristo deixa claro que não Ele, mas os mestres estavam destruindo a lei, anulando-a com sua tradição (Mt.15:3; Mt.15:6).

É provável que as ilustrações extraídas da lei (Mt.5:21-47) representem apenas parte do que Cristo disse nessa ocasião (ver com. de Mt.5:2). O discurso deve ter sido muito mais amplo. Quando Ele disse que veio para cumprir a Lei e os Profetas, deve ter enfatizado, além disso, que nEle se cumpriam os símbolos da lei ritual que apontavam para Ele e todas as previsões messiânicas das Escrituras (ver Lc.24:44). Ele não tinha vindo para abolir nenhuma parte das Escrituras que Ele próprio outorgara (1Pe.1:11; PP, 366) e que testificavam dEle (Jo.5:39; Lc.4:21). O grande ponto de disputa entre Cristo e os escribas tinha a ver com as tradições pelas quais interpretavam a santa lei de Deus (ver p. 54; ver com. de Mc.1:22; Mc.1:44; Mc.2:19; Mc.2:24; Mc.7:1-14; Lc.6:9). Desde a infância, Jesus agiu de forma independente dessas leis rabínicas, que não tinham fundamento no AT (DTN, 84). O que Ele deixou de lado foi a falsa interpretação dada às Escrituras pelos escribas (DTN, 307), não a lei em si.

Cumprir. Do gr. pleroo, “completar”, “encher”. No Sermão do Monte, o Autor da lei deixou claro o verdadeiro significado de seus preceitos e a maneira pela qual esses preceitos encontrariam expressão no pensamento e na vida dos cidadãos do reino que Ele viera estabelecer (ver com. de Is.59:7). O próprio Legislador ratificou a proclamação da lei no Sinai, reafirmando sua vigência para aqueles que seriam Seus súditos e anunciou que qualquer um que se atrevesse a anulá-la, fosse por preceito ou, por exemplo, jamais entraria no “reino dos céus” (Mt.5:20). A afirmação de que, cumprindo a lei moral, Cristo anulava essa lei não está em harmonia com o contexto de Sua declaração. Tal interpretação nega o sentido que Cristo obviamente queria transmitir. Segundo essa visão, Cristo teria dito que não veio para “destruir” a lei, mas que ao cumpri-la a anulava! A interpretação ignora a forte antítese na palavra ala (“mas”) e torna as duas ideias quase sinônimas! Ao cumprir a lei, Cristo simplesmente lhe deu um sentido mais amplo, dando aos seres humanos um exemplo de perfeita obediência à vontade de Deus, a fim de que a mesma lei “se cumprisse [pleroo] em nós” (Rm.8:3-4).

Mt.5:18 18. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra.

Em verdade. Do gr. amen, do heb. amen, “firme”, “estabelecido”, “seguro”. No sentido hebraico, amen significa uma resposta confirmatória e enfática ao que diz outra pessoa (Nm.5:22; Dt.27:15-16). No NT, ela tem esse mesmo sentido (1Co.14:16). Amém também é frequente no NT no encerramento das doxologias (Rm.1:25; Gl.1:5). Mas é peculiar de Jesus a forma como usa a palavra amém para confirmar e enfatizar o que Ele mesmo diz. Muitas de Suas falas começam com a frase: “Em verdade vos digo” (Mt.6:2; Mt.6:5; Mt.6:16), ou, como no evangelho de João (25 vezes), “em verdade, em verdade te digo” (Jo.3:3; Jo.3:5; Jo.3:11; ver com. de Jo.1:51).

Até que o céu e a terra passem. Comparar com Mc.13:31; Lc.16:17. Sendo a lei uma expressão da vontade de Deus e o plano de salvação, uma expressão da misericórdia de Deus, nenhum desses fracassará. “A palavra de nosso Deus permanece eternamente” (Is.40:8).

Nem um. Forte negação no idioma grego. Uma mudança na lei moral é tão improvável quanto uma transformação no caráter de Deus, que é imutável (Ml.3:6). Os princípios da lei moral são tão permanentes quanto o próprio Deus.

I. Do gr. iota, a nona letra do alfabeto grego, que corresponde ao heb. yod (ver p. xxi), a menor letra do alfabeto hebraico.

Til. Do gr. keraia, literalmente, “um chifre pequeno”, provável correspondência com o pequeno gancho na letra vav (w; ver p. xxi) ou uma parte de alguma outra letra necessária para distingui-la de uma semelhante a ela. Ao ver os equivalentes hebraicos de b e k, d e r, h e ch (p. xxi) percebe-se a importância dos pequenos detalhes dessas letras. Os judeus tinham uma tradição de que se todos os habitantes do mundo tentassem abolir a mínima letra da lei, possivelmente não teriam sucesso. Fazer isso implicaria uma falta tão grande, raciocinavam, que o mundo seria destruído.

Cumpra. Do gr. ginomai, “tornar-se”, “ocorrer”, “ser estabelecido”. Deus não modificará ou alterará Sua vontade expressa (ver com. do v. Mt.5:17). Sua “palavra” cumprirá Seu propósito beneficente e “prosperará” (Is.55:11). Os preceitos divinos não serão mudados para se harmonizar à vontade humana.

Mt.5:19 19. Aquele, pois, que violar um destes mandamentos, posto que dos menores, e assim ensinar aos homens, será considerado mínimo no reino dos céus; aquele, porém, que os observar e ensinar, esse será considerado grande no reino dos céus.

Violar. Do gr. luo, “desatar” (ver Mt.18:18); ao se referir a mandamentos, “quebrar”, “anular”, “cancelar”. Kataluo, “destruir” (Mt.5:17), é uma forma mais enfática da mesma palavra. Ao usar a forma mais fraca, luo, talvez Cristo quisesse mostrar que, mesmo uma leve transgressão dos mandamentos, resulta na reputação de “mínimo no reino”.

Um destes mandamentos. Os escribas (ver p. 43) tinham ordenado de forma meticulosa todos os preceitos da lei de Deus, as leis de Moisés, civis e cerimoniais, e seus próprios regulamentos numa escala de importância relativa, supondo que se um mandamento de menor importância contradissesse a um mais importante, o último anulava o primeiro. Por meio desse legalismo era possível conceber meios de contornar os mais claros requisitos da lei de Deus (ver Mt.23:4; Mt.23:14; Mt.23:17-19; Mt.23:23-24; Mc.7:7-13; Jo.7:23). Considerava-se prerrogativa dos rabinos declarar se certas ações eram “permitidas” ou “proibidas”. Jesus deixou claro que, longe de liberar o ser humano do cumprimento de mandamentos da lei moral, Ele era ainda mais rígido do que os intérpretes oficiais da lei, os escribas e rabis, pois não permitia exceções em nenhum momento. Todos os mandamentos eram iguais e permanentemente obrigatórios.

E assim ensinar aos homens. Comparar com o exemplo de Jeroboão (1Rs.14:16).

Considerado mínimo. Isto é, considerado como menos digno. Cristo de forma alguma deu a entender que alguém que violasse os mandamentos e ensinasse outros a fazer isso iria para o Céu. Ele deixou claro que atitude o reino assumiria para com os transgressores, isto é, como os julgaria. Isso fica evidente no v. Mt.5:20, em que os “escribas e fariseus”, que violavam os mandamentos e ensinavam a outros como fazer isso, seriam excluídos do reino.

Mt.5:20 20. Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus.

Vossa justiça. Deve-se lembrar de que Cristo estava Se dirigindo ao recém-apontado círculo íntimo de discípulos, os doze, em particular, e todos os outros que eram cidadãos futuros do reino recém-estabelecido (ver com. do v. Mt.5:1). Cristo apresenta em linguagem clara o padrão elevado desse cidadão.

Exceder. A “justiça” dos cidadãos do reino dos céus deve exceder a dos escribas, os intérpretes oficiais da lei, e a dos fariseus, que se achavam mais piedosos que os demais (ver p. 39). Era como se, num campeonato de atletismo, os discípulos como amadores tivessem que competir com profissionais e campeões e lhes fosse dito que o mínimo que deveriam fazer era superar esses campeões.

A dos escribas e fariseus. A justiça dos escribas e fariseus consistia em obediência externa à letra da lei; Cristo chamou a atenção para os princípios subjacentes da lei e para a prática deles. Como alguns mestres de religião modernos, os escribas faziam concessões levando em conta a fraqueza da natureza humana, minimizando assim a gravidade do pecado. Dessa forma, facilitavam a desobediência a Deus e encorajavam essa atitude (cf. GC, 572). Ensinavam que a pessoa será julgada com base na maioria de seus atos; isto é, se ela faz mais coisas boas do que más, Deus a considerará justa (Mishnah, Aboth, 3.16, ed. Soncino, Talmude, p. 38, 39). Para compensar os atos maus, prescreviam um sistema de justiça por obras, através do qual a pessoa podia obter mérito suficiente para superar o balanço desfavorável. Os fariseus consideravam seu sistema de justiça por obras como um passaporte para o Céu; de fato, por isso eram fariseus. Jesus apresentou a ineficácia desse sistema para qualificar alguém sequer a pôr os pés no reino. Esforços para se obter justiça mediante atos formais ou supostamente meritórios são menos que nada (ver Rm.9:31-33).

Escribas e fariseus. Ver p. 39, 40, 43.

Jamais. Do gr. ou me, uma negativa dupla enfática.

Mt.5:21 21. Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e: Quem matar estará sujeito a julgamento.

Ouvistes. Jesus continua a dar exemplos específicos de Sua interpretação da lei. Como seu Autor, Ele é seu único verdadeiro intérprete. Ao pôr de lado a tolice da casuística rabínica, Jesus restaurou a verdade à beleza e ao brilho originais. A expressão “ouvistes” indica que a maioria dos ouvintes nessa ocasião não tinha lido a lei por si mesmos. Isso era de se esperar, pois a maior parte deles era de trabalhadores comuns e pescadores (MDC, 39). Mais tarde, Jesus perguntou aos sacerdotes e anciãos instruídos: “Nunca lestes nas Escrituras?” (Mt.21:42). Mas, naquele mesmo dia, um grupo de pessoas comuns que estava no átrio do templo ao se dirigir a Jesus disse: “Nós temos ouvido da lei” (Jo.12:34).

Que foi dito. Quando citavam antigos intérpretes da lei como autoridade, os rabis com frequência introduziam suas observações com as palavras que Jesus usa nesse versículo. Nos escritos rabínicos, essas palavras também são usadas para introduzir citações das Escrituras.

Aos antigos. Ou, “aos da antiguidade”. O grego aceita ambos.

Não matarás. O sexto mandamento do decálogo (ver com. de Ex.20:13).

Sujeito a julgamento. Isto é, “sujeito à acusação”. Em caso de homicídio não premeditado, diferente de assassinato, a lei protegia o homicida (ver com. de Nm.35:6; Dt.19:3). A referência é ao derramamento intencional de sangue e à punição pelas autoridades constituídas.

Mt.5:22 22. Eu, porém, vos digo que todo aquele que [sem motivo] se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento; e quem proferir um insulto a seu irmão estará sujeito a julgamento do tribunal; e quem lhe chamar: Tolo, estará sujeito ao inferno de fogo.

Eu, porém, vos digo. Os rabis citavam a tradição como autoridade para interpretação da lei. Cristo falava com autoridade própria, e esse fato distinguia Seus ensinos, como o povo notou prontamente (ver Mt.7:29; ver com. de Lc.4:22). A expressão “Eu, porém, vos digo” ocorre seis vezes neste capítulo (Mt.5:22; Mt.5:28; Mt.5:32; Mt.5:34; Mt.5:39; Mt.5:44). Cristo mostrou que Suas exigências iam muito além da mera forma da lei e que incluíam o espírito que daria vida e significado ao que, do contrário, seria apenas forma. Ele apresentou seis exemplos específicos para tornar clara a diferença entre atos externos e as motivações que impulsionavam esses atos. Esse contraste, que surge como um fio de ouro ao longo do Sermão do Monte, faz deste discurso a declaração suprema da filosofia de vida cristã, a maior exposição de ética de todos os tempos. Cristo apontou quão longo é o alcance dos requerimentos da lei e enfatizou que de nada serve mera conformidade exterior com a lei.

Que [...] se irar. O assassinato é resultado da ira. Mas alguém pode esconder esse sentimento de seus semelhantes, mesmo daqueles que são o objeto dele. O melhor que os tribunais podem fazer é punir atos que resultam da ira. Somente Deus pode ir à raiz do problema e condenar e punir alguém por abrigar esse sentimento.

Sem motivo (ACF). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a omissão desta frase (cf. MDC, 55). Isso parece indicar que Cristo aprova a ira para com o “irmão” que fez algo para merecê-la, contrariando os ensinamentos de Cristo com respeito a amar os inimigos e fazer o bem àqueles que têm ódio no coração (v. Mt.5:44). Por outro lado, as Escrituras indicam que a ira contra o pecado pode ser justificável (ver com. de Mc.3:5) quando o elemento pessoal está totalmente ausente e a indignação justa se direciona apenas ao mal em si (ver Ex.32:19; Jo.2:14-17). Algumas passagens dizem que Deus está irado (ver Nm.25:4; Is.13:9; Is.30:27; Is.42:25; Dn.9:16). Portanto, está claro que a indignação justa contra atos que desonram a Deus ou trazem dano a inocentes não deve ser condenada (DTN, 310).

Julgamento. É provável que isso se refira ao veredito do tribunal local de uma vila ou cidade e indique que a ira foi expressa com ameaças ou atos.

Insulto. Do gr. rhaka, provavelmente uma transliteração do aramaico reqa (heb. reqah), “imprestável”, “estúpido”. é uma expressão de forte desprezo. Na literatura rabínica, reqa é empregada como a exclamação de um oficial feita a um homem que não lhe saudou devidamente. O cristão deve tratar até o mais ignorante e degradante com respeito e ternura (MDC, 57).

Tribunal. Do gr. sunedrion, neste caso, talvez o sinédrio local, ou tribunal, em vez de o grande Sinédrio em Jerusalém.

Tolo. Do gr. moros, “estúpido”, “tolo”. Sugeriu-se que moros está relacionado ao heb. marah, “contencioso”, “rebelde”, “contumaz”. Enquanto rhaka expressa desprezo pela pouca inteligência de alguém, moros, como usado neste caso, parece incluir também desprezo pelas intenções do indivíduo. No primeiro caso, a pessoa é chamada de “estúpida”, no segundo, de “infame”, indicando má intenção. Se Cristo Se recusou a proferir “juízo infamatório” contra o diabo (Jd.1:9), não devemos fazer isso com nosso semelhante. Devemos deixar com Deus a obra de julgar e condenar alguém por causa de suas intenções. De acordo com o Talmude, alguém culpado de insultar a outro chamando-o de “escravo” devia ser excomungado da sinagoga por 30 dias, e alguém que chamasse a outro de “bastardo” deveria receber 40 chicotadas. No caso de alguém que chamasse o outro de “ímpio”, o ofendido poderia “lutar” ou “tocar” na sua vida (privando-o de alimento, etc.).

Inferno de fogo. Literalmente, “o geena [gr. geenna] de fogo”, ou “o inferno de fogo”. Geenna, inferno, é uma transliteração do heb. ge ben hinnom, “vale de Hinom” ou “vale do Filho de Hinom” (Js.15:8). Esse vale está ao sul e a oeste de Jerusalém e se encontra com o vale de Cedrom ao sul da Cidade de Davi e do tanque de Siloé (ver com. de Je.19:2). O ímpio rei Acaz (ver vol. 2, p. 70) parece ter introduzido o rito pagão bárbaro de queimar crianças a Moloque num lugar chamado Tofete, no vale de Hinom (2Cr.28:3; cf. PR, 57), no tempo de Isaías (ver com. de Lv.18:21; Dt.18:10; Dt.32:17; 2Rs.16:3; 2Rs.23:10; Je.7:31). Manassés, neto de Acaz, retomou essa prática (2Cr.33:1; 2Cr.33:6; Je.32:35). Anos depois, o bom rei Josias profanou formalmente os lugares altos no vale de Hinom, onde essa forma atroz de culto havia sido realizada (2Rs.23:10), exterminando-a. Como punição por essa e outras maldades, Deus advertiu Seu povo de que o vale de Hinom um dia se tornaria “o vale da Matança” para “os cadáveres deste povo” (Je.7:32-33; Je.19:6; Is.30:33).

Da mesma forma, o fogo de Hinom se tornou símbolo do fogo consumidor do último grande dia de juízo e punição dos ímpios (cf. Is.66:24). No pensamento escatológico judaico, derivado em parte da filosofia grega, geena era o lugar onde as almas dos pagãos eram mantidas sob punição até o dia do juízo final e das recompensas. A tradição que diz que o vale de Geena era um lugar onde se queimava lixo e, portanto, um símbolo do fogo do último dia, parece ter se originado com o Rabbi Kimchi, um erudito judeu dos séculos 12 e 13. Na literatura judaica antiga, nada consta sobre essa ideia. Os antigos rabis baseiam esse pensamento em Is.31:9.

Mt.5:23 23. Se, pois, ao trazeres ao altar a tua oferta, ali te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti,

Oferta. Do gr. doron, que se refere a presentes ou ofertas especiais. Em Mt.23:18-19, é evidente a importância ritual ligada a uma oferta sobre o altar.

Teu irmão. Os que ouviam o sermão, sem dúvida compreenderam “irmão” como um semelhante judeu. Para os cristãos, seria um semelhante cristão. O termo é compreendido corretamente como designando aqueles com quem estamos associados estreitamente de uma forma ou outra. Mais tarde, no entanto, Cristo deixou claro que todos são irmãos, a despeito de etnia ou credo (ver Lc.10:29-37).

Mt.5:24 24. deixa perante o altar a tua oferta, vai primeiro reconciliar-te com teu irmão; e, então, voltando, faze a tua oferta.

Deixa. O ato de fazer uma “oferta” pessoal, ou sacrifício, era considerado o mais santo e importante de todos os atos religiosos, contudo mesmo isso devia ocupar um lugar secundário sob as circunstâncias apresentadas. É possível que a “oferta”, neste caso, fosse feita para garantir perdão e favor divino. Cristo insiste que se deve primeiramente fazer as pazes com o semelhante antes de se buscar reconciliação com Deus (ver Mt.6:15; 1Jo.4:20). A obrigação mais importante tem prioridade sobre outra menos importante. Reconciliação é mais importante que sacrifício. Viver os princípios cristãos (Gl.2:20) tem valor muito maior aos olhos de Deus do que as formas exteriores de religião (ver 2Tm.3:5).

Reconciliar-te. Ver com. de Mt.6:12; Mt.18:15-19.

Mt.5:25 25. Entra em acordo sem demora com o teu adversário, enquanto estás com ele a caminho, para que o adversário não te entregue ao juiz, o juiz, ao oficial de justiça, e sejas recolhido à prisão.

Entra em acordo. Do gr. eunoeo, “estar bem disposto [para com alguém]”, relacionado a eunoos, “bem disposto”, “favorável”, “amigável”. Portanto, entrar em acordo indica uma mudança de atitude para com um antigo adversário.

Adversário. Do gr. antidikos, “um oponente”, neste caso, num tribunal. O contexto indica que o “adversário” é o “acusador”, e a pessoa para quem Cristo está falando é o acusado (comparar com Lc.12:58-59).

A caminho. Isto é, a caminho do tribunal. Jesus diz que é preferível resolver o caso sem recorrer ao tribunal.

Oficial de justiça. Do gr. huperetes, “um oficial subordinado”. O termo é usado no NT para se referir a assistentes da sinagoga (ver com. de Lc.4:20), a João Marcos como assistente de Paulo e Barnabé (At.13:5) e aos ministros do evangelho (Lc.1:2; At.26:16; 1Co.4:1).

Mt.5:26 26. Em verdade te digo que não sairás dali, enquanto não pagares o último centavo.

Em verdade. Ver com. do v. Mt.5:18.

Não sairás. Do gr. ou me, negativa dupla, e, portanto, mais enfática.

Centavo. Do gr. kodrantes, do latim quadrans, equivalente aos “dois quadrantes” da viúva pobre (cf. Mc.12:42).

Mt.5:27 27. Ouvistes que foi dito: Não adulterarás.

Ouvistes. Ver com. do v. Mt.5:21.

Não adulterarás. Citação de Ex.20:14 (cf. Dt.5:18).

Mt.5:28 28. Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela.

Eu porém vos digo. Ver com. do v. Mt.5:22. Fundamentalmente, a explicação de Jesus da relação matrimonial e suas responsabilidades se baseia no plano original de Deus para o lar (Gn.2:21-24; Mt.19:8), não na lei mosaica (ver Dt.24:1-4). Nesse plano, o propósito do casamento era satisfazer a necessidade de companhia (Gn.2:18) e proporcionar um lar e a devida educação para os filhos (ver Gn.1:28; Gn.18:19; Pv.22:6; Ef.6:1-4). O lar foi estabelecido como um ambiente ideal onde pais e filhos devem aprender de Deus e desenvolver um caráter à altura dos ideais elevados relativos ao propósito divino que levou a sua criação.

Olhar para uma mulher. A beleza feminina é um dom de um Criador amoroso, que ama toda beleza verdadeira. A apreciação pura dessa beleza é correta e própria. Além disso, a atração que cada gênero tem pelo outro foi implantada no homem e na mulher pelo Criador e, quando se manifesta dentro dos limites ordenados por Deus, é inerentemente boa, mas quando pervertida para servir ao eu e a interesses ímpios, torna-se uma das forças destrutivas mais poderosas.

Intenção impura. Do gr. epithumeo, “colocar o coração sobre [algo]”, “ansiar”, “cobiçar”, “desejar”. Sentir luxúria por algo é experimentar intenso desejo por isso. Epithumeo é usado tanto no sentido bom quanto no mau. Jesus disse aos doze que desejava (epithumia) ansiosamente (epithumeo) comer a última Páscoa com eles (Lc.22:15). No seu bom sentido, epithumeo ocorre também em outras passagens (Mt.13:17; Lc.17:22; Hb.6:11; 1Pe.1:12). O substantivo da mesma raiz, epithumia, “desejo”, é usado de forma semelhante em duas cartas paulinas (Fp.1:23; 1Ts.2:17). Um dos equivalentes hebraicos de epithumeo é chamad, “desejar”, “ter prazer em”. Chamad é traduzido como “cobiçarás” no décimo mandamento (Ex.20:17), “desejarás”, em Dt.5:21, e “agradasse”, em Is.53:2. Cristo, sem dúvida, tinha em mente o décimo mandamento quando advertiu contra olhar “para uma mulher com intenção impura”. Em outras palavras, o homem que põe as afeições e a vontade em harmonia com o décimo mandamento se protege de violar o sétimo.

Coração. Do gr. kardia, “coração”, neste caso, o intelecto, as afeições e a vontade. Como um homem “imagina em sua alma, assim ele é” (Pv.23:7). Cristo ressalta que o caráter é determinado não tanto pelo ato exterior, mas pela atitude interior que motiva o ato. O ato exterior meramente reflete e ativa a atitude interior. Aquele que pratica más ações se está certo de que ninguém vai saber, e que se detém apenas por temor disso, é culpado aos olhos de Deus. O pecado acima de tudo é um ato das faculdades superiores da mente: a razão, o poder de escolha, a vontade (ver com. de Pv.7:19). O ato exterior é mera extensão da decisão interior.

Mt.5:29 29. Se o teu olho direito te faz tropeçar, arranca-o e lança-o de ti; pois te convém que se perca um dos teus membros, e não seja todo o teu corpo lançado no inferno.

Teu olho direito. Comparar com Mt.18:8-9. Em Mt.5:28, Cristo foi mais além do ato para chamar atenção à motivação que impulsiona o ato, isto é, a intenção ou forma de pensar que origina o ato. Ele vai além da motivação ou intenção para apontar os caminhos pelos quais o pecado entra na vida, os sentidos que se comunicam com o sistema nervoso. Para a maioria, os mais fortes incentivos ao pecado são aqueles que alcançam a mente pelos nervos ótico e auditivo, entre outros (AA, 518). Aqueles que se recusam a ver, ouvir, experimentar, cheirar ou tocar o que incita ao pecado vão mais além do que simplesmente evitar pensamentos pecaminosos. Aqueles que de imediato banem os pensamentos maus quando, momentaneamente passam como um relâmpago na mente, evitam que se desenvolva um padrão de pensamento habitual que condicione a mente a pecar quando surge oportunidade. Cristo teve uma vida sem pecado porque “nada havia nEle que correspondesse aos sofismas de Satanás” (DTN, 123).

Tropeçar. Do gr. skandalizo, “engodar”, “enganar”, “fazer tropeçar”, de skandalon, mecanismo que aciona uma armadilha (ver Rm.11:9; Rm.14:13; 1Jo.2:10; Ap.2:14).

Arranca-o. Em certo sentido, seria melhor viver cego ou com outra deficiência qualquer do que perder a vida eterna. Mas Cristo usa linguagem figurada. Ele não aconselha a mutilar o corpo, mas a controlar os pensamentos. Recusar-se a contemplar o que é mal é tão eficaz quanto se tornar cego e tem a vantagem adicional de continuar com a visão e usá-la para o que é bom. Uma raposa que caiu numa armadilha, às vezes, corta a dentadas sua própria pata para escapar. Da mesma forma, um lagarto pode sacrificar sua cauda ou, uma lagosta, sua pinça. Ao falar de arrancar um olho ou cortar uma mão, Cristo fala num sentido figurado da ação resoluta que deveria ser tomada pela vontade a fim de se guardar contra o mal. O cristão faz bem em seguir o exemplo de Jó, que fez aliança com seus olhos (Jó.31:1; 1Co.9:27).

Inferno. Do gr. geenna (ver com. do v. Mt.5:22).

Mt.5:30 30. E, se a tua mão direita te faz tropeçar, corta-a e lança-a de ti; pois te convém que se perca um dos teus membros, e não vá todo o teu corpo para o inferno.

Tua mão direita. Isto é, como um instrumento de desejos maus (ver com. do v. Mt.5:29).

Mt.5:31 31. Também foi dito: Aquele que repudiar sua mulher, dê-lhe carta de divórcio.

Também foi dito. Ver com. do v. Mt.5:21.

Repudiar. Do gr. apoluo, “libertar-se”, com sentido de “divorciar-se”.

Carta de divórcio. Do gr. apostasion, “um certificado [de divórcio]”, de aphistemi, “separar”, “abandonar”. A palavra “apostasia” tem a mesma raiz. Como Cristo, mais tarde, observou, o divórcio não fazia parte do plano original de Deus, mas foi aprovado transitoriamente na lei de Moisés por causa da “dureza” do coração do homem (Mt.19:7-8; quanto à natureza e ao propósito da lei de Moisés em relação ao divórcio, ver com. de Dt.24:1-4). Deve-se enfatizar que a lei de Moisés não instituiu o divórcio. Sob direção divina, Moisés o tolerou e o regulou para prevenir abusos. O casamento cristão deve estar fundamentado em Gn.2:24, não em Dt.24:1.

Mt.5:32 32. Eu, porém, vos digo: qualquer que repudiar sua mulher, exceto em caso de relações sexuais ilícitas, a expõe a tornar-se adúltera; e aquele que casar com a repudiada comete adultério.

Relações sexuais ilícitas. Do gr. porneia, termo geral que se aplica à relação sexual ilícita. A escola liberal de Hillel ensinava que um homem podia se divorciar pelo motivo mais trivial, como por exemplo, se sua esposa deixasse a comida queimar (Mishnah, Gittin, 9.10, ed. Soncino, Talmude, p. 436, 437; cf. MDC, 63). No entanto, a escola mais conservadora de Shammai interpretava a expressão “coisa indecente” (Dt.24:1) como “coisa imprópria” com o significado de “imodesto” ou "indecente” (Mishnah, Gittin, 9.10, ed. Soncino, Talmude, p. 436). Mas Jesus deixou claro que não devia haver divórcio, exceto no caso de infidelidade. A relação matrimonial foi pervertida pelo pecado, e Jesus veio restaurá-la à pureza e beleza originais dadas pelo Criador (ver com. de Dt.14:26). Em Sua providência, Deus quis que a instituição do casamento fosse uma bênção que elevasse a humanidade. O companheirismo entre marido e mulher foi ordenado por Deus como o ambiente ideal para o caráter cristão amadurecer. A maior parte dos ajustes de personalidade da vida conjugal e das dificuldades encontradas por muitos em fazer esses ajustes requer domínio próprio e, muitas vezes, abnegação e sacrifício.

O amor verdadeiro é “paciente, é benigno”, “não procura os seus interesses”, “tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1Co.13:4-7). Quando cristãos se casam, devem aceitar a responsabilidade de aplicar os princípios afirmados nesses versículos. Maridos e esposas que fazem isso e que desejam que a graça de Cristo opere em sua vida verão que não há dificuldade, por mais séria que pareça, que não possa ser solucionada. Nos pontos em que os temperamentos não são compatíveis, a solução do cristão é modificar as inclinações, e não trocar de cônjuge.

Comete adultério. Uma esposa repudiada naturalmente buscaria um novo lar. Mas, ao casar-se com outro, ela cometeria adultério, porque seu casamento anterior não foi dissolvido de modo legal aos olhos de Deus (cf. Mc.10:11-12). Cristo com ousadia pôs de lado a tradição rabínica de Seus dias, principalmente a da escola de Hillel, que permitia o divórcio por qualquer motivo. Para os judeus desse período, era relativamente fácil que os maridos se livrassem do casamento de modo legal. Jesus enfatizou que o casamento foi instituído por Deus e, quando devidamente efetivado, tinha aprovação divina. O que Deus tinha unido nenhuma tradição ou prática rabínica poderia separar.

Mt.5:33 33. Também ouvistes que foi dito aos antigos: Não jurarás falso, mas cumprirás rigorosamente para com o Senhor os teus juramentos.

Também. Essa é a terceira ilustração da interpretação espiritual que Cristo faz da lei.

Ouvistes. Ver com. do v. Mt.5:21.

Que foi dito. O que se segue não é exatamente uma citação, mas um resumo de certos ensinos mosaicos (Lv.19:12; Ex.20:7; Nm.30:2; Dt.23:22).

Jurarás. Do gr. epiorkeo, “jurar em falso”. Cristo se refere a declarações solenes para afirmar a verdade do que foi dito ou de promessas feitas. Fala de perjúrio, particularmente de juramentos falsos nos quais se invoca o nome de Deus, desonrando-o e profanando-o.

Cumprirás [...] teus juramentos. Cristo fala de promessas, especialmente as feitas a Deus. Porém, a ênfase não está naquilo que se promete, mas no cumprimento da promessa. Ele destaca não a forma como as promessas são feitas, mas como são mantidas (sobre a solenidade e inviolabilidade dos votos feitos a Deus, ver com. de Lv.19:12; Nm.30:2; Dt.23:21).

Mt.5:34 34. Eu, porém, vos digo: de modo algum jureis; nem pelo céu, por ser o trono de Deus

Eu, porém, vos digo. Ver com. do v. Mt.5:22.

De modo algum jureis. Jesus não Se refere ao juramento solene judicial (MDC, 66; ver com. de Mt.26:64), mas aos juramentos comuns entre os judeus. No geral, iniciar uma frase com as palavras “eu juro” fazia da declaração um juramento. Mas, como em outras coisas, os judeus tinham muitos recursos para se libertar das obrigações aceitas sob juramentos. A atitude de Cristo para com os juramentos é apresentada com mais detalhes em Mt.23:16-22. Perante Caifás, o próprio Cristo respondeu sob juramento (Mt.26:63-64). Paulo repetidamente invocou a Deus como testemunha de que o que dizia era verdade (2Co.1:23; 2Co.11:31; 1Ts.5:27). O decálogo não proíbe juramentos, mas perjúrio (Ex.20:7; Ex.20:16). “Se existe alguém que possa coerentemente testificar sob juramento, esse é o cristão” (MDC, 67). Quando há no coração disposição para falar a verdade, o juramento se torna desnecessário. A prática de invocar o nome de Deus em certos momentos indica que uma afirmação sob tais circunstâncias é mais confiável do que em outras. Cristo ordena que haja verdade em tudo o que se faz. “Tudo quanto os cristãos fazem deve ser tão transparente como a luz do Sol” (MDC, 68).

Nem pelo céu. Os rabis diziam que jurar “pelo céu e pela terra” não obrigava a pessoa a cumprir o que tinha prometido, mas jurar por um substituto do nome divino (ver vol. 1, p. 150) ou por um dos atributos de Deus tornava a pessoa responsável.

Mt.5:35 35. nem pela terra, por ser estrado de seus pés; nem por Jerusalém, por ser cidade do grande Rei

Estrado de Seus pés. Comparar com Is.66:1. Uma expressão poética que enfatiza a insignificância da Terra e de seus habitantes em comparação a Deus (cf. Is.57:15; Ec.5:2; Lm.2:1).

Grande Rei. Isto é, Deus.

Mt.5:36 36. nem jures pela tua cabeça, porque não podes tornar um cabelo branco ou preto.

Nem jureis pela tua cabeça. Outra fórmula comum para juramento.

Mt.5:37 37. Seja, porém, a tua palavra: Sim, sim; não, não. O que disto passar vem do maligno.

A tua palavra. Comparar com Ef.4:29.

Sim, sim. Comparar com Tg.5:12. Para o cristão, para alguém que respeita sua palavra, um simples sim ou não tem tanto peso e confiabilidade quanto uma declaração mais elaborada.

Vem do maligno. Ou, “vem o maligno” (cf. Mt.13:19; 1Jo.3:12).

Mt.5:38 38. Ouvistes que foi dito: Olho por olho, dente por dente.

Ouvistes. Ver com. do v. Mt.5:21. Cristo apresenta a quarta ilustração do espírito da lei em contraste com a mera formalidade de cumpri-la. Os v. 38 a 42 têm a ver com a atitude que um cristão deve ter ao ser prejudicado por alguém.

Que foi dito. Ver com. do v. Mt.5:21. A citação deste versículo se baseia em Ex.21:24; Lv.24:20; Dt.19:21 (ver com. de Ex.21:24; ver vol. 1, p. 664, 665).

Olho por olho. Quando essa lei foi instituída, marcou um grande avanço sobre o sistema de justiça comum da Antiguidade, sob o qual era prática geral retribuir danos ou se cobrar uma dívida com juros exorbitantes. A lei era um estatuto civil, e a punição devia ser dada com supervisão de um tribunal. Mas não se justificava a vingança pessoal (MDC, 70; sobre uma disposição semelhante no Código de Hamurábi, ver vol. 1, p. 664, 665).

Mt.5:39 39. Eu, porém, vos digo: não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra

Eu, porém, vos digo. Ver com. do v. Mt.5:22.

Não resistais ao perverso. Isto é, não busqueis vingança por males sofridos. Jesus parece se referir à hostilidade ativa em vez de à resistência passiva. A palavra “perverso” pode se referir tanto a alguém ou a algo mau. Nesse caso, parece indicar o primeiro. Inclui o mal feito a alguém e por alguém. O cristão não deve pagar violência com violência, mas vencer o mal com o bem (Rm.12:21) e amontoar “brasas vivas” sobre a cabeça de quem o aborrece (Pv.25:21-22).

Face. Como em todas as demais ilustrações dos v. Mt.5:21-47, Jesus Se preocupa mais com o espírito que motiva o ato do que com o ato em si. O cristão não deve lutar por aquilo que considera ser seu direito. Ele se submeterá ao dano, em vez de buscar oportunidade para se livrar dele. O próprio Jesus observou plenamente o espírito dessa ordem, embora literalmente não tenha atraído sobre Si sofrimento adicional (Jo.18:22-23; Is.50:6; Is.53:7). Nem o fez Paulo (At.22:25; At.23:3; At.25:9-10). Na cruz, Cristo manifestou esse espírito quando pediu ao Pai que perdoasse os ofensores (Lc.23:34).

Mt.5:40 40. e, ao que quer demandar contigo e tirar-te a túnica, deixa-lhe também a capa.

Ao que quer demandar contigo. Isto é, “fazer comparecer diante de um tribunal”. O grego deixa claro que o julgamento não tinha começado ainda; havia apenas a possibilidade de uma ação legal.

Túnica. Do gr. chiton, uma veste que se usava sobre a pele.

Deixa-lhe também. O cristão deve se manter manso diante de um dano.

Capa. Do gr. himation, neste caso, o “manto”, ou veste exterior, que comumente se usava como proteção à noite, em contraste com o chiton, O pobre, às vezes, tinha pouco ou nada além da “capa” para oferecer como segurança de um empréstimo. Porém, a lei de Moisés, proibia um credor de reter essa veste durante a noite em penhor (Ex.22:26-27). Tendo em vista que a capa era considerada mais essencial que a “túnica”, ou veste interior, entregá-la sem resistência demonstraria concessão maior, especialmente porque a lei dava ao dono certos direitos sobre sua capa.

Mt.5:41 41. Se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com ele duas.

Obrigar. Do gr. aggareuo, com o significado de “obrigar a servir”. A palavra aggaros é um empréstimo do persa que significa “correio a cavalo”. Entre os persas, usava-se a palavra com referência a correios reais do sistema postal imperial, o qual os persas desenvolveram em um nível de eficiência surpreendente (ver com. de Et.3:13). Nos tempos dos romanos, aggareuo e aggaros se referiam ao serviço obrigatório de transporte de equipamento militar. Epicteto (iv.1.79) aconselha sobre esse serviço: “se há uma requisição e um soldado o tomar [seu burro] de ti, deixa-o ir. Não resista nem reclame, do contrário te golpeará e perderás o burro”. Resistir era provocar um ato cruel. Em Mt.27:32 e Mc.15:21, usa-se aggareuo quando é ordenado a Simão que carregue a cruz de Cristo. Jesus Se referiu a casos como o de um judeu civil sendo obrigado por um soldado romano a carregar sua bagagem pela distância de uma milha, conforme a lei (cf. Lc.3:14). O cristão deveria fazer o dobro do que era exigido na lei, e com alegria. Em Cafarnaum, havia uma guarnição militar romana e, enquanto Jesus falava, aqueles que ouviam podiam ver um grupo de soldados romanos passando ao longo de uma estrada próxima (MDC, 70). Os judeus esperavam e criam que o Messias humilharia o orgulho de Roma. Jesus aconselhou submissão à autoridade romana.

Mt.5:42 42. Dá a quem te pede e não voltes as costas ao que deseja que lhe emprestes.

Não voltes as costas. Isto é, não o recuse. Cidadãos do reino dos céus são generosos (ver com. de Lc.6:30).

Mt.5:43 43. Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo.

Ouvistes que foi dito. Ver com. do v. Mt.5:21.

Amarás. Do gr. agapao, A palavra “amor” não reflete a riqueza de significados da palavra grega. Nossa palavra “amor” significa tantas coisas diferentes e transmite tantas ideias que o verdadeiro significado de agape é obscurecido na tradução. Os gregos tinham três palavras para transmitir as ideias que buscamos expressar com a palavra “amor”: agapan, philein e eran . Philein em geral descreve amor afetuoso, sentimental, baseado em emoções e sentimentos. Visto que se baseia em sentimentos, está sujeito a mudar à medida que os sentimentos mudam. Eran denota “amor” apaixonado, sensual, que opera essencialmente no plano físico. Algumas formas de paixão podem ser classificadas sob essa variedade de “amor”. Eran não é usado no NT. No NT, agapan, quando contrastado com philein, descreve amor do ponto de vista do respeito e da estima.

Acrescenta princípio ao sentimento, de modo que o princípio controla os sentimentos. Põe em ação as faculdades superiores da mente e da inteligência. Enquanto philein é “amar” somente os que nos “amam”, agapan estende o amor até aos que não nos amam. Agapan é altruísta, ao passo que eran é egoísta, e mesmo philein pode, às vezes, ser manchado pelo egoísmo. O substantivo agape se encontra quase exclusivamente na Bíblia. O agape do NT é amor na sua forma mais elevada e verdadeira, amor insuperável, amor que leva alguém a se sacrificar por outros (Jo.15:13). Indica reverência a Deus e respeito pelos semelhantes. É um princípio divino de pensamento e ação que modifica o caráter, governa os impulsos, controla as paixões e exalta as afeições (ver com. de Lc.6:30).

Teu próximo. Para os judeus, o “próximo” era um israelita, de nascimento ou convertido ao judaísmo. Mesmo os meio-irmãos samaritanos eram excluídos e considerados estranhos. Na parábola do bom samaritano (Lc.10:29-37), Jesus rejeita essa classificação estreita e proclama a irmandade entre todos. O amor do cristão busca o bem de todos, independentemente de raça ou credo. O sentido literal de “próximo” é “habitante próximo”.

Odiarás o teu inimigo. Esta frase não faz parte da citação de Lv.19:18. É, sem dúvida, uma máxima popular. Ódio ou desprezo por outros é o resultado natural do orgulho. Como filhos de Abraão (Jo.8:33; ver com. de Mt.3:9), crendo-se superiores a outros (cf. Lc.18:11), os judeus desprezavam todos os gentios. É como se Jesus dissesse: “A lei diz para amar seu próximo; Eu digo, amem também seus inimigos” (ver Mt.5:43-44). Ele explicou por que devemos amar nossos inimigos: porque Deus o faz assim (v. Mt.5:45-48) e porque nós somos filhos do Senhor (Mt.5:45; 1Jo.3:1-2).

Mt.5:44 44. Eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem

Eu, porém, vos digo. Ver com. do v. Mt.5:22.

Amai os vossos inimigos. Comparar com Rm.12:20. A palavra traduzida como “amai”, agapan, indica o amor que implica respeito, em contraste com philein, que descreve o amor da emoção (amor filial), tal como existe entre membros de uma família (ver com. de Mt.5:43). A ordem seria impossível de se cumprir se fosse exigido que todos amassem seus inimigos com o sentido da palavra philein, pois não poderiam sentir em relação a seus inimigos a mesma afeição que sentiriam por algum membro da família, tampouco é isso o que se espera. Philein é espontâneo, emotivo e em nenhum lugar do NT se pede que se ame dessa forma.

Por outro lado, se pode ordenar que se ame conforme agapan, pois esse amor está sob o domínio da vontade. Amar nossos piores inimigos no sentido de agapan é tratá-los com respeito e cortesia e considerá-los como Deus os considera.

Bendizei (ACF). Certas versões trazem duas frases extras: “bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam” (ACF). Contudo, importante evidência textual (cf. p. 136) omite essas sentenças, bem como as palavras “vos maltratam”, na sentença seguinte. Segundo a evidência textual, o manuscrito original de Mateus trazia apenas: “Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem” (ARA; comparar, porém, com Lc.6:27-28).

Mt.5:45 45. para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos.

Filhos do vosso Pai. Eles se assemelham ao Pai em caráter (MDC, 75; ver com. dos v. Mt.5:43; Mt.5:48). O teste do amor a Deus é o amor ao próximo (1Jo.4:20).

Vosso Pai celeste. Esta expressão é característica de Mateus.

Sobre maus. Com essa ilustração óbvia da natureza, Jesus corrige o erro popular de que Deus concede bênçãos aos santos e as retém dos pecadores (ver com. de Jo.9:2). Os judeus atribuíam a Deus o mesmo espírito de ódio pelos pecadores e não judeus que eles próprios sentiam, mas quer sejam as bênçãos da natureza ou da salvação, “Deus não faz acepção de pessoas” (At.10:34-35).

Mt.5:46 46. Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também o mesmo?

Os que vos amam. Ver com. do v. Mt.5:43.

Que recompensa tendes? Isto é, “Que crédito em particular tendes? O que há de especial nisso?” (Ver com. de Mt.7:12; Lc.6:32-35).

Publicanos. Ver p. 54.

Mt.5:47 47. E, se saudardes somente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o mesmo?

E se saudardes. A saudação universal no Oriente, shalom ou salaam, “paz”, inclui o desejo de que a pessoa desfrute bênçãos espirituais e materiais (ver com. do v. Mt.5:9).

Os gentios. Não há nada digno de honra em se fazer o que todos os demais fazem. A evidência textual favorece (cf. p. 136) “gentios” em vez de “publicanos” (ARC; cf. Mt.6:7).

Mt.5:48 48. Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste.

Portanto, sede. Com estas palavras, Cristo apresenta a conclusão que se deve tirar das ilustrações de Sua aplicação superior e espiritual da lei do reino dos céus dada nos v. Mt.5:21-47, embora seja provável que a ideia do v. 48 esteja mais estreitamente relacionada à linha de pensamento dos v. Mt.5:43-47. Em todas essas ilustrações, Cristo demonstrou que no reino que veio estabelecer são as atitudes internas e as motivações que determinam a perfeição de caráter, e não somente os atos exteriores. O ser humano olha a aparência exterior, mas Deus vê o coração (1Sm.16:7).

Perfeitos. Do gr. teleios, literalmente, “alguém que atingiu o alvo”, ou “completo”, de telos, “fim”, “cumprimento”, “conclusão” ou “limite”. Na literatura grega, usa-se teleioi para se referir a vítimas perfeitas para sacrifício, a animais crescidos ou adultos, a seres humanos adultos, a profissionais treinados e totalmente qualificados. Paulo fala dos “experimentados” (1Co.2:6) e de “todos, pois que somos perfeitos” (Fp.3:15). Ao mesmo tempo, percebe que há novas alturas a conquistar e que ele próprio não chegou à perfeição final. Teleioi também é usado no NT para indicar uma pessoa “madura” no sentido físico e intelectual (1Co.14:20, “homens amadurecidos”; Hb.5:14, os que são “adultos”; sobre tam, o equivalente hebraico, ver com. de Jó.1:1; Pv.11:3; Pv.11:5). Jesus não Se refere a uma vida isenta de pecado (ver CC, 62; RH, 18/03/1890). A santificação é uma obra progressiva. Os judeus buscavam arduamente se tornar justos mediante seus próprios esforços, a fim de obter salvação pelas obras. Mas, no seu minucioso legalismo, davam tanta atenção aos detalhes da letra da lei que perdiam de vista seu espírito (cf. Mt.23:23). No Sermão do Monte, Cristo buscou chamar atenção para o trigo, e deixar de lado a casca. Eles fizeram da lei um fim em si mesma, algo para ser cumprido e pronto, e tinham se esquecido de que o propósito dela era lançar o olhar aos ideais elevados de amor supremo para com Deus e amor abnegado para com o próximo (Mt.22:34-40). Os rabis ensinavam que a justiça consistia em ter mais atos bons do que maus no registro celestial. É importante observar a relação entre os v. 48 e 45 (cap. 5), pois ser “filhos do vosso Pai celeste” (v. 45) é equivalente a ser “perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste” (v. 48).

Mt.6:1 1. Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso Pai celeste.

Guardai-vos. Depois de falar da justiça verdadeira (Mt.5), Cristo Se volta à aplicação prática da justiça aos deveres do cidadão do reino dos céus (Mt.6; ver DTN, 312). Os cristãos devem evitar fazer alarde de seus atos de adoração e caridade. Em três exemplos: caridade (v. Mt.6:2-4), oração (v. Mt.6:5-8) e jejum (v. Mt.6:16-18), Jesus contrasta as antigas práticas do judaísmo com os elevados ideais do reino dos céus (ver com. de Mt.5:22; Mc.2:21-22).

Esmola. Do gr. eleemosune. A evidência textual favorece (cf. p. 136) dikaiosune, “justiça” ou “piedade”. Ambos os significados se ajustam ao contexto. Caso se adote “justiça”, então, as três ilustrações específicas de esmola, oração e jejum são exemplos do princípio tratado no v. 1. As três ilustrações, provavelmente, representem as formas mais comuns de “justiça” farisaica. Deve-se observar que Cristo de modo algum faz objeção a atos religiosos; Sua preocupação é que a intenção seja pura e que esses atos sejam realizados sem ostentação.

Diante dos homens. Isto é, com o objetivo de atrair atenção e admiração (ver com. do v. Mt.6:2).

Com o fim de serdes vistos. Do gr. theaomai, “contemplar”, “ver”. As palavras “teatro” e “teatral” provêm dessa raiz. Atos piedosos realizados “diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles”, tinham o propósito de ganhar o louvor das pessoas.

Junto de vosso Pai celeste. Literalmente, “do lado de vosso Pai”.

Mt.6:2 2. Quando, pois, deres esmola, não toques trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa.

Não toques trombeta. Não se sabe se esta ilustração deve ser entendida literalmente ou como uma figura de linguagem. Não há exemplo dessa prática nos escritos judaicos, embora seja encontrada na literatura antiga de outras partes do Oriente. A expressão “como fazem os hipócritas” pode, à primeira vista, sugerir que Cristo estivesse afirmando um fato literal; contudo, “os hipócritas” também podiam ter tocado trombetas de forma metafórica. Seja como for, Cristo reprova a atitude de divulgar atos de caridade.

Hipócritas. Do gr. hupokritai, de um verbo cujo significado é “fingir”, “dissimular”. Os judeus ajudavam os pobres com contribuições impostas aos membros da comunidade, com base no que cada um podia pagar. Os fundos assim adquiridos eram aumentados por meio de ofertas voluntárias. Além disso, faziam-se apelos de tempos em tempos em reuniões religiosas públicas nas sinagogas ou ao ar livre, realizadas geralmente nas ruas. Nessas ocasiões, as pessoas eram tentadas a prometer grandes quantias a fim de serem louvadas pelos presentes na ocasião. Havia também a prática de se permitir que aquele que contribuísse com uma grande quantia se assentasse num lugar de honra ao lado dos rabis. Portanto, o desejo de ser louvado era frequentemente a motivação dessas ofertas. Também acontecia de muitos prometerem grandes quantias e depois não cumprirem suas promessas. Sem dúvida, a referência de Jesus à hipocrisia incluía essa forma de fingimento.

Nas ruas. Ver com. do v. Mt.6:5.

Para serem glorificados pelos homens. Ou, “para serem elogiados pelos outros” (NTLH).

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Já receberam a recompensa. O texto original dá a ideia de que receberam sua recompensa na totalidade. A palavra traduzida como “receberam” ocorre com frequência nos recibos de papiros gregos antigos, com o significado de “pago” ou de “recebido o pagamento de”. Os hipócritas, diz Jesus, receberam todo o pagamento possível. Eles praticavam a caridade estritamente como uma transação comercial por meio da qual esperavam comprar admiração pública; não se preocupavam em ajudar os aflitos. A recompensa que desejavam seria tudo que receberiam, nada mais.

Mt.6:3 3. Tu, porém, ao dares a esmola, ignore a tua mão esquerda o que faz a tua mão direita

Ao dares a esmola. Jesus Se referia a cada pessoa que O ouvia de forma individual (sobre a responsabilidade do rico para com o pobre, conforme apresentada na lei de Moisés, ver com. de Lv.25:25; Lv.25:35; Dt.15:7; Dt.15:11).

Tua mão esquerda. Diz-se que, para os árabes, a mão direita e a esquerda representam amigos íntimos. Jesus diz que não é necessário que o amigo íntimo saiba dos atos piedosos do outro. Neste caso, Cristo usa a hipérbole. Ele não quer dizer com isso que a caridade deve sempre ser feita em segredo (MDC, 80). Paulo comentou a generosidade dos cristãos da Macedônia (Fp.4:16) e escreveu aos coríntios que o “zelo” deles tinha “estimulado a muitíssimos” a serem ativos na causa de Deus (2Co.9:2). Jesus quer dizer que os cristãos não devem fazer caridade a fim de obterem louvor e honra.

Mt.6:4 4. para que a tua esmola fique em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.

Em secreto. A Mishnah se refere ao que chama de “câmara secreta”, localizada dentro da área do templo onde o devoto depositava suas ofertas em secreto e onde os pobres podiam vir também em secreto buscar ajuda para satisfazer suas necessidades, para as quais, de outro modo, seriam incapazes de prover.

Vê em secreto. Isto é, Deus vê as motivações secretas do coração que impulsionam a ação, e é por essas motivações, e não pelos atos em si, que as pessoas receberão “o seu louvor da parte de Deus” no dia do juízo (1Co.4:5; Rm.2:16).

Publicamente (ARC). Evidências textuais apoiam a omissão desta palavra (cf. p. 136). No último dia, “manifesta se tornará a obra de cada um” (1Co.3:13; Mt.25:31-46; 1Co.4:5). Quando Cristo vier, dará a cada um segundo suas obras (Mt.16:27; Ap.22:12). Os cristãos não devem “pensar na recompensa, mas no serviço” (MDC, 81).

Mt.6:5 5. E, quando orardes, não sereis como os hipócritas; porque gostam de orar em pé nas sinagogas e nos cantos das praças, para serem vistos dos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa.

Orardes. Ver com. dos v. Mt.6:3; Mt.6:6-7; Mt.6:9.

Os hipócritas. Ver com. do v. Mt.6:2.

Em pé. A referência é às horas de oração, pela manhã e pela tarde (ver com. de Lc.1:9). O templo e as sinagogas eram obviamente os lugares usuais de oração. Aqueles que não podiam orar nesses lugares podiam fazê-lo no campo, em casa ou em sua cama. Mais tarde, a tradição estabeleceu que algumas orações deviam ser proferidas em pé, outras assentado, outras andando, montando um jumento, sentado ou deitado na cama.

Nos cantos das praças. Lugares onde geralmente se faziam as transações comerciais. Se os fariseus estivessem nesses lugares na hora estipulada para oração, ficavam em atitude de oração e recitavam em voz alta as frases formais que em geral usavam. Sem dúvida, muitos planejavam estar nesses locais durante essas horas.

Para serem vistos dos homens. Ver com. dos v. Mt.6:1-2.

Em verdade. Ver com. do Mt.5:18.

Já receberam a recompensa. Ver com. do v. Mt.6:2. Em grego, a frase é idêntica.

Mt.6:6 6. Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.

Tu, porém. Ver Is.26:20 (cf. 2Rs.4:33). A palavra “tu” é enfática.

Orares. O verbo está no singular. Jesus Se dirige a cada membro de Seu grupo, individualmente.

Teu Pai. Ver com. do v. Mt.6:9.

Em secreto. A expressão provavelmente significa “que ouve o que é dito em secreto”, como indica o contexto (ver com. do v. Mt.6:4).

Vê em secreto. O que o ser humano não pode ver é visível para Deus. Ele vê o que se faz secretamente (ver com. do v. Mt.6:4).

Publicamente (ACF). Ver com. do v. Mt.6:4.

Mt.6:7 7. E, orando, não useis de vãs repetições, como os gentios; porque presumem que pelo seu muito falar serão ouvidos.

Orando. Ou, “em oração”. O que se segue é uma continuação do tema, não a introdução de um novo tema.

Vãs repetições. Do gr. battologeo, palavra que ocorre apenas neste versículo no NT. Sugerem-se os seguintes significados: “balbuciar”, “dizer a mesma coisa várias vezes”, “murmurar”, “falar rapidamente”, “falar sem se prestar atenção no que se fala”. Jesus não proibiu que se repetissem pedidos em orações, pois Ele mesmo empregou essas repetições (Mt.26:44).

Como os gentios. Comparar com 1Rs.18:26; At.19:34. Os tibetanos creem que, quando giram a roda de oração [aparelho manual], uma oração é repetida milhares de vezes, sem pensamento ou esforço do adorador.

Mt.6:8 8. Não vos assemelheis, pois, a eles; porque Deus, o vosso Pai, sabe o de que tendes necessidade, antes que lho peçais.

O vosso Pai. Evidências textuais (cf. p. 136) apoiam a inserção da palavra “Deus” antes de “vosso” (como na ARA). A oração não informa a Deus sobre algo que de outro modo não saberia, tampouco é um meio de persuadi-Lo a fazer o que não está disposto a fazer. A oração nos põe em contato com o Onisciente e faz com que cooperemos efetivamente com Sua vontade.

Mt.6:9 9. Portanto, vós orareis assim: Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome

Vós orareis. A palavra “vós” é enfática no grego. Deve-se recordar que Jesus estava Se dirigindo particularmente aos doze, os novos membros do reino dos céus (ver com. de Mt.5:1-2). A palavra “vós”, nesse caso, contrasta com “hipócritas” (v. Mt.6:2) e “gentios” (v. Mt.6:7).

Assim. Isto é, segundo esse padrão – não necessariamente com as mesmas palavras – um modelo quanto ao conteúdo, mas não necessariamente quanto à forma. O contexto indica que essa oração é apresentada como um modelo em contraste com as “vãs repetições” e o “muito falar” das orações pagãs, características que foram adotadas pelos fariseus (ver com. do v. Mt.6:7). Cristo disse aos cidadãos de Seu reino: “Não vos assemelheis, pois, a eles”, mas “orareis assim” (v. Mt.6:8-9). É interessante notar que as várias ideias expressas no Pai Nosso e, com frequência, as palavras com que essas ideias são expressas, se encontram tanto no AT quanto nas orações rituais judaicas conhecidas como Ha-Kaddish. Visto que as ideias expressas no Pai Nosso já eram correntes nas orações dos judeus da época de Cristo, pode-se explicar o paralelo com base em que tudo o que o judaísmo tinha de bom, incluindo os sentimentos expressos nas orações, originalmente vinham de Cristo (ver PP, 366, 367; DTN, 52). Tudo o que deu a Seu povo era bom, e Ele sabia disso (Mt.5:17-18). Porém, em meio às revelações da verdade divina, havia brotado tradição humana e adoração formal que obscureceram o que era essencial à salvação (ver com. de Mt.5:17; Mt.5:19; Mt.5:22).

Esse fato era evidente nas orações que os rabis proferiam e ensinavam o povo a repetir. A oração tinha se tornado longa e repetitiva, e a sinceridade de pensamento e expressão fora obscurecida por uma forma literária impessoal, com palavras bonitas, mas, com frequência, carentes de sinceridade de espírito (ver com. dos v. Mt.6:7-8). Na oração do Senhor, Jesus resgatou o que era essencial e restaurou a oração a uma forma simples e compacta, cujo significado podia ser compreendido pela pessoa mais simples. Assim, embora reflita, até certo ponto, as orações do judaísmo, a oração do Senhor é, contudo, inspirada e original. Sua originalidade está na escolha de petições e no seu arranjo. Sua aceitação universal reflete o fato de que expressa mais perfeitamente do que qualquer outra oração as necessidades fundamentais do ser humano.

Pai nosso. Em toda oração, em primeiro lugar, deve haver o reconhecimento de que somos filhos de um Pai celestial. Podemos ser indignos de nos dirigirmos a Ele como “Pai”, mas, sempre que o fizermos com sinceridade, Ele nos recebe com alegria (ver Lc.15:21-24) e nos reconhece como Seus filhos. O fato de que Ele é nosso Pai nos une como cristãos na grande e universal irmandade de fé com todos que, com sinceridade e verdade, reconhecem o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo.

Que estás nos céus. Apesar da relação estreita e pessoal entre o “Pai” nos céus e Seus filhos terrenos, estes sempre perceberão a infinita majestade e grandeza divinas (ver ls.57:15) e a completa insignificância deles (ver Mt.6:5). A consciência de que “Deus está nos céus”, e nós, “na terra” (Ec.5:2) traz ao coração contrito o espírito de reverência e humildade, a primeira condição para a salvação.

Santificado. Do gr. hagiazo, “considerar [ou ‘tratar’] como santo”, relacionado ao adjetivo hagios, “santo”. O nome de Deus é honrado de duas formas: (1) por atos divinos que levam os seres humanos a reconhecer e a reverenciar Yahweh como Deus (ver Ex.15:14-15; Js.2:9-11; Js.5:1; SI.145:4; Sl.145:6; Sl.145:12); e (2) pelas ações dos seres humanos que O honram como Deus e Lhe rendem a adoração e a obediência que Lhe são devidas (ver Is.58:13; Mt.7:21-23; At.10:35).

Seja o Teu nome. No emprego moderno, um nome não passa de um meio pelo qual a pessoa é identificada. Contudo, nos tempos bíblicos, o nome estava relacionado à vida do indivíduo. Com frequência, os nomes “representavam traços de caráter que os pais desejavam ver desenvolvidos no filho” (PR, 481). O nome de Deus exemplifica Seu caráter (ver Ex.34:5-7). O significado que os judeus davam ao nome divino se reflete na reverência com a qual o pronunciavam, ou deixavam de pronunciar, ou, ainda, usavam em vez dele uma circunlocução (ver vol. 1, p. 148-150). O nome de Deus é santo ou “santificado”, porque o próprio Deus é santo. Santificamos Seu nome quando reconhecemos a santidade de Seu caráter e permitimos que Ele reproduza esse caráter em nós. O tempo verbal do grego sugere que o nome de Deus ainda não está sendo santificado e pode se referir ao tempo quando ele será santificado universalmente (cf. com. do v. Mt.6:10).

Mt.6:10 10. venha o teu reino; faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu

Venha o Teu reino. Sobre a natureza do reino dos céus e sua posição central nos ensinos de Jesus, ver com. de Mt.4:17; quanto ao “reino dos céus” no Sermão do Monte, ver com. de Mt.5:2-3. Cristo Se refere não tanto ao reino da graça, mas ao reino de Sua glória (MDC, 108), para o qual o reino da graça prepara o caminho e com o qual culmina (ver Mt.25:31). Essa interpretação se apoia no tempo verbal do grego (ver com. do v. Mt.6:13). Ao longo dos séculos, a promessa de que os reinos deste mundo finalmente se tornarão o reino de nosso Senhor Jesus Cristo (Ap.11:15) tem motivado os cidadãos do reino da graça a viver em santidade (1Jo.3:2-3) e a se sacrificarem na proclamação das boas-novas do reino (ver At.20:24; 2Tm.4:6-8). Na mente e no coração de verdadeiros cristãos em todas as eras, “a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus” (Tt.2:13) tem sido sempre o mais importante e os tem inspirado a viver em santidade.

Faça-se a Tua vontade. Cristo fala da vontade de Deus, particularmente quanto ao que afeta este planeta. Quando o coração humano se rende à jurisdição do reino da graça divina, a vontade de Deus se cumpre nele. O tempo do verbo grego mostra que isso não acontece na Terra. O pedido é que o reino do pecado tenha fim e que a vontade de Deus seja cumprida nesta Terra de forma universal assim como nos outros domínios da criação divina.

Mt.6:11 11. o pão nosso de cada dia dá-nos hoje

Dá-nos. Na primeira parte da oração do Senhor (v. Mt.6:9-10), a atenção é dirigida à paternidade, ao caráter, reino e à vontade de Deus. Na segunda parte da oração (v. 11-13), o pedido é a respeito das necessidades temporais e espirituais do ser humano. Era a “grande multidão” que ouvia Cristo com alegria (Mc.12:37). Em sua maioria eram pescadores, agricultores e trabalhadores. Eram esses que O ouviam no monte junto à planície de Genesaré e ao mar da Galileia (MDC, 39; DTN, 299). O trabalho era incerto para muitos deles, as condições de vida eram precárias, e talvez muitos já tivessem passado fome e necessidade, devido a secas, impostos altos, etc. Como acontece quase sempre, aqueles que possuem pouco dos bens deste mundo sentem de forma mais vívida sua dependência de Deus para suprir suas necessidades materiais do que aqueles que têm o suficiente e de sobra.

Pão. Mesmo aqueles que têm abundância de “pão” e de bens deste mundo, fazem bem ao lembrar que é Deus quem dá “força” para adquirirem “riquezas” (Dt.8:18), uma lição que Jesus ensinou na parábola do homem rico (Lc.12:16-21). Tudo o que temos vem de Deus, e devemos estar sempre gratos por Sua bondade. Nosso “pão de cada dia” inclui tanto provisões materiais quanto espirituais.

De cada dia. Do gr. epiousios, palavra que ocorre no NT apenas nesta passagem e em Lc.11:3. Não se sabe seu sentido exato. A única ocorrência da palavra na literatura grega secular lança pouca luz sobre seu significado. Entre os significados sugeridos estão: (1) o necessário para existir, (2) para o dia presente, (3) para o dia por vir. As palavras de Mt.6:34 tendem a confirmar a ideia de que se refira a um suprimento diário para manter a vida (ver p. 92, 93).

Mt.6:12 12. e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores

Perdoa-nos. O verbo perdoar utilizado neste versículo, do gr. aphiemi, é uma palavra comum no NT, que com frequência significa “mandar embora” ou “dispensar”, “sair” (ver Mt.4:11; Mc.4:36). É provável que o significado “perdoar” esteja baseado na ideia de que a pessoa arrependida é mandada embora em paz.

Dívidas. Do gr. opheilema, uma palavra comum para débitos legais (cf. Rm.4:4), mas usada aqui para dívidas morais e espirituais. O pecado é uma dívida e o pecador, um devedor. Lucas fala de “pecados” (Lc.11:4; ver com. de Mt.18:28; Mt.18:30; Lc.7:41-43).

Assim como nós temos perdoado. Isto é, conforme é nosso hábito perdoar. A evidência textual está dividida (cf. p. 136) entre esta variante e “assim como nós perdoamos”, indicando que não ousamos pedir perdão, a menos e até que tenhamos perdoado o próximo (ver com. de Mt.5:24; Mt.18:23-35).

Nossos devedores. Isto é, aqueles que nos maltrataram.

Mt.6:13 13. e não nos deixes cair em tentação; mas livra-nos do mal [pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém]!

Tentação. Do gr. peirasmos, “tentação”, também “prova” ou “teste” (1Pe.4:12). O verbo peirazo é traduzido como “experimentar” (Jo.6:6), “examinai” (2Co.13:5) e “pôr à prova” (Hb.11:17; Ap.2:2; Ap.2:10). Mesmo quando se traduz peirasmos como “tentação”, algumas vezes fica claro, a partir do contexto, que significa “teste” ou “prova” (At.20:19; Tg.1:2; Ap.3:10; 1Pe.4:12). As Escrituras deixam claro que Deus “testa” ou “prova” os seres humanos (ver Gn.22:1; Ex.20:20), mas nunca os induz a pecar (Tg.1:13). Talvez isso devesse ser entendido como um pedido: “Não nos deixes cair em tentação” (ver 1Co.10:13; ver com. de SI.141:4). Essa parte do Pai Nosso, às vezes, é compreendida como uma súplica a Deus para nos livrar de toda tentação. Mas a promessa de Deus não é que seremos protegidos da tentação, mas que seremos protegidos de cair (Jo.17:15). Com muita frequência, nos colocamos no caminho da tentação (ver com. de Pv.7:9). Verdadeiramente orar “não nos deixes cair em tentação” é renunciar a nossos caminhos e nos submeter aos de Deus.

Mal. Do gr. poneros. A forma empregada neste caso, pode se referir tanto a uma pessoa má quanto a algo mau (ver com. de Mt.5:39). Não está claro qual significado se pretende nesta passagem. Alguns optam por “o maligno”, isto é, o diabo, ao passo que outros creem que se refira ao mal como um princípio. A conjunção adversativa “mas” parece indicar que “mal” equivale à “tentação” na frase anterior; se esse for o caso, é provável que “mal” se refira ao mal moral.

Teu é o reino. Esta frase introduz a doxologia da Oração do Senhor. Há evidência textual importante (cf. p. 136) para a omissão desta doxologia. Ela não está na versão de Lucas (Lc.11:4). No entanto, a ideia que expressa é certamente bíblica, e bem próxima à de 1Cr.29:11-13. Uma doxologia menor é encontrada em 2Tm.4:18. O “reino”, o “poder” e a “glória” atribuídos ao Pai, sem dúvida, incluem o reino presente da graça divina no coração do ser humano, mas, principalmente, antecipa o glorioso reino a ser inaugurado com o retorno de Cristo à Terra para governar com poder e glória (ver com. do v. Mt.6:10).

Amém. Ver com. de Mt.5:18.

Mt.6:14 14. Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará

Se perdoardes. Comparar com Mt.18:23-35; Mc.11:25-26; ver com. de Mt.6:12.

Ofensas. Do gr. paraptomata, de um verbo cujo significado é “cair para um lado”. Observe que a palavra “dívidas” do v. Mt.6:12 provém de uma palavra grega diferente. A palavra paraptomata indica desvio da verdade ou retidão. No NT, parece indicar uma violação consciente do que é certo, e que, portanto, envolve culpa.

Vosso Pai celeste. Ver com. do v. Mt.6:9.

Mt.6:15 15. se, porém, não perdoardes aos homens [as suas ofensas], tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas.

Se, porém, não perdoardes. Quem não está disposto a perdoar não merece ser perdoado. Além disso, perdoar alguém assim seria desconsiderar seu espírito inclemente. Alguém esperar dos outros o que não está disposto a fazer é a própria essência do egoísmo e do pecado. Deus não perdoa alguém que acolhe um espírito não perdoador, pois essa pessoa necessita vencer esse defeito de caráter. Deus não poderia perdoar tal pessoa e, ao mesmo tempo, ser leal com Seu próprio caráter justo. Somente quando estamos em harmonia com os semelhantes é que podemos estar em harmonia com Deus (ver 1Jo.4:20; ver com. de Mt.7:12).

As suas ofensas. A evidência textual se divide (cf. p. 136) entre a retenção e a omissão desta frase.

Mt.6:16 16. Quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim de parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa.

E (ARC). Os v. 16 a 18 registram o terceiro dever religioso em série aqui (ver com. do v. Mt.6:1).

Jejuardes. Sobre o jejum entre os judeus, ver com. de Mc.2:18; Mc.2:20. A referência é ao jejum voluntário, particular. Afligir o corpo pelo pecado da alma é, na verdade, desviar-se do problema e perder de vista a verdadeira natureza do arrependimento, pois o pecado é uma doença espiritual, não do corpo (MDC, 87).

Contristados. Jesus não necessariamente proíbe o semblante triste, se é genuíno; Ele Se refere à aparência fingida dos “hipócritas”.

Os hipócritas. Ver com. do v. Mt.6:2.

Desfiguram. Do gr. aphanizo, “tornar invisível” ou “tornar irreconhecível”. Jesus Se refere à ação de ocultar ou esconder os verdadeiros sentimentos por meio de uma aparência de tristeza simulada, como um ator que esconde o rosto sob uma máscara, com o pretexto de ter piedade superior. Ao jejuarem, os líderes religiosos da época tinham o hábito de não tomar banho, não fazer a barba nem pentear o cabelo. No grego, há um interessante jogo de palavras com “desfigurar” e “aparecer”, ambas da raiz phaino. Embora não seja possível reproduzir em português a força plena desse jogo de palavras, a seguinte tradução livre se aproxima da afirmação de Jesus: “eles fazem desaparecer seus rostos [verdadeiros] [seus sentimentos reais] a fim de que eles [próprios] possam aparecer”.

Parecer aos homens. Eles buscavam garantir a atenção de seus semelhantes e, com ela, a reputação de piedade superior.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

A recompensa. Ver com. dos v. Mt.6:1-2.

Mt.6:17 17. Tu, porém, quando jejuares, unge a cabeça e lava o rosto,

Tu, porém. O Sermão do Monte contrasta a filosofia divina com a humana. Os ensinos de Jesus [“Eu, porém, vos digo” (Mt.5:22)] estão em oposição aos dos rabis, assim como a vida dos cidadãos do reino dos céus – “Tu, porém” (Mt.6:6) – em contraste com a dos “hipócritas”.

Quando jejuares. Jesus não aconselha o jejum, nem o condena. Se alguém jejua ou não, só diz respeito a ele mesmo. De fato, a própria essência do jejum é a consciência da necessidade pessoal de praticá-lo. O ponto em questão no ensinamento de Jesus é que o jejum deve ser uma experiência pessoal realizada por causa de um senso de necessidade, e não como uma formalidade ou para obter reputação de piedade superior. Não há benefício em jejuar apenas porque alguém ordena a prática.

Unge a cabeça. O óleo era símbolo de alegria (Sl.45:7; Sl.104:15). Ungir a cabeça com óleo simbolizava as bênçãos recebidas (Sl.23:5; Sl.92:10). Cidadãos do reino dos céus podem jejuar, mas, quando o fizerem, devem proceder normalmente, pois o jejum é pessoal e perde seu sentido se for feito para “parecer aos homens” que jejua.

Lava o rosto. Diferente dos “hipócritas” quando jejuam (ver com. do v. Mt.6:16).

Mt.6:18 18. com o fim de não parecer aos homens que jejuas, e sim ao teu Pai, em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.

Não parecer. Não há nada de triste na religião cristã; e o cristão que é triste, seja em palavras ou aparência, representa de forma errada o caráter de Deus (MDC, 88). É uma alegria e um privilégio ser filho de Deus (1Jo.3:1-2), e um semblante triste dá a aparência de sermos órfãos, em vez de filhos.

E sim ao teu Pai. O jejum é algo entre o ser humano e Deus, não entre o ser humano e seus semelhantes.

Era secreto. Ver com. do v. Mt.6:6.

Teu Pai [...] te recompensará. Ver com. do v. Mt.6:4.

Mt.6:19 19. Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam

Não acumuleis. Literalmente, “não tenhais o hábito de acumular” ou “pareis de acumular”. O acúmulo de bens materiais é, em geral, motivado por um desejo de segurança e reflete temor e incerteza do futuro. Jesus ressalta aos futuros cidadãos de Seu reino que a posse de riquezas materiais é uma fonte de ansiedade, em vez de um meio para escapar dela. O cristão não deve estar ansioso devido às necessidades materiais, pois acredita que Deus as conhece e as satisfará (v. Mt.6:31-34). Como Paulo observou mais tarde, isso não significa que o cristão será negligente diante de suas próprias necessidades e das de sua família (1Ts.4:11; 2Ts.3:10; 1Tm.5:8). Parece que o trecho de Mateus 6:19 a 21 foi escrito em forma de poesia e pode ter sido um provérbio (ver com. de Pv.10:22).

Tesouros. Do gr. thesaurous (ver com. de Mt.2:11). Cristo Se refere à riqueza no sentido amplo de todas as posses materiais. Assim como nos dias de hoje, o amor ao dinheiro era a paixão dominante de milhares na época de Cristo. No texto original, há um interessante jogo de palavras.

A traça e a ferrugem. Símbolos de diferentes tipos de danos. Ferrugem, do gr. brosis, de bibrosko, “comer”, é, literalmente, algo que carcome ou corrói. Todo bem material é afetado de uma forma ou de outra pela perda, desgaste, depreciação ou deterioração.

Corroem. Do gr. aphanizo (ver com. do v. Mt.6:16). “Consomem” seria uma tradução mais adequada neste caso.

Escavam e roubam. Ou, “escavar através”, isto é, por meio de uma parede de tijolos ou barro.

Mt.6:20 20. mas ajuntai para vós outros tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões não escavam, nem roubam

Mas ajuntai. Ver com. de Mt.6:19; Lc.12:33. No Sermão do Monte, não se proíbe acumular tesouros, desde que se acumule no lugar certo. Cristo deseja que os cidadãos do reino dos Céus façam um bom investimento do tempo e da força que seu Pai celestial lhes concedeu nesta vida. Tudo o que alguém tem é um empréstimo da parte de Deus; apenas o “tesouro” que se acumula no Céu é o que verdadeiramente pode ser chamado de seu.

Tesouros no céu. Tal tesouro é permanente, não é afetado pelos inimigos do tesouro terreno nem pelos danos do tempo. Investimentos no tesouro celestial se valorizam com o passar dos anos, enquanto o tesouro terreno inevitavelmente perde seu valor.

Mt.6:21 21. porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração.

Estará também o teu coração. Tesouro é aquilo em que o ser humano coloca seu coração, a despeito do valor intrínseco. O “tesouro” de uma criança pode ter pouco valor intrínseco, mas, com frequência, significa tanto para ela quanto a fortuna de um rei. O real interesse de alguém está onde estão seus “tesouros”.

Mt.6:22 22. São os olhos a lâmpada do corpo. Se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo será luminoso

Os olhos. Isto é, os olhos espirituais que permitem ao ser humano ter uma visão celestial e que o capacitam a contemplar o que é invisível à visão natural (ver Rm.1:20; Hb.11:27). Tal visão é um guia para a pessoa, do mesmo modo que a visão física é um guia para o corpo.

Lâmpada. Do gr. luchnos, e não phos, “luz”. Luchnos se refere à fonte de luz ou ao meio através do qual ela brilha, não à luz em si (ver com. de Mt.5:15). Os v. 22 e 23 ilustram o princípio encontrado nos v. Mt.6:19-21. Excessiva preocupação com o acúmulo de riquezas materiais é evidência de visão espiritual defeituosa, de escuridão de alma (ver v. Mt.6:34). A “luz” do corpo é o discernimento que relaciona devidamente o valor das coisas temporais com o valor das coisas eternas.

Bons. Do gr. haplous, “simples” (diferente de composto), “natural”, “sincero”, “absolutamente verdadeiro”, “sem dobras”, como um pedaço de tecido estendido. Nesta passagem, haplous contrasta com poneros, “maus” (ver com. do v. Mt.6:23). Seu significado se aproxima muito da palavra “perfeitos” de Mt.5:48 (ver com. ali). A tradução “bons”, no sentido de “com saúde”, é adequada ao contexto. Um cristão cujo “olho” espiritual é “bom” é alguém cujo discernimento e julgamento o tornam uma pessoa simples, sem artifícios, íntegra e pura, com uma verdadeira perspectiva das coisas temporais e eternas. Uma boa visão resulta num propósito bom, em dedicação integral ao reino dos céus e na prática dos princípios eternos (Fp.3:8; Fp.3:13-14; MDC, 91). Para ser eficaz, a visão deve estar focada e concentrada. Da mesma forma, aqueles que desejam verdadeira luz devem ter sua visão espiritual claramente focada. Do contrário, sua visão será embaçada e sua percepção da verdade e do dever ficará comprometida (ver com. de Ap.3:18).

Mt.6:23 23. se, porém, os teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em trevas. Portanto, caso a luz que em ti há sejam trevas, que grandes trevas serão!

Se, porém. Comparar com Lc.11:34.

Maus. Do gr. poneros, neste caso, com o sentido de “em más condições”, “doente”. Uma pessoa com “olhos maus”, diz Robertson, é alguém que mantém “um olho nos tesouros terrenos e o outro arrogantemente levantado para o Céu”. Ele tem confusão espiritual e visão dupla; como resultado, tem propósito duplo (ver com. do v. Mt.6:24) e acha que é possível desfrutar tudo o que o mundo tem a oferecer e ainda herdar as alegrias eternas do Céu. O amor ao eu debilitou sua visão a ponto de, como Eva, ver as coisas como na realidade não são (ver Gn.3:6).

Que grandes. As trevas espirituais prejudicam o caráter e a personalidade.

Mt.6:24 24. Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.

Ninguém. Comparar com Lc.16:13.

Servir a dois senhores. Isto é, dois seres de caráter e interesses diferentes. É tão impossível “servir a dois senhores” quanto o é focar a visão em duas coisas ao mesmo tempo, ou concentrar o pensamento em mais de uma ideia. Tentar servir a Deus com coração dividido é ser instável em todos os caminhos (ver Tg.1:8). A religião cristã não pode aceitar o papel de ser uma influência entre muitas. Sua influência, se é que está presente na vida, deve necessariamente ser suprema e controlar todas as demais influências, harmonizando a vida com seus princípios.

Um. Do gr. ho heteros, isto é, outro de tipo ou qualidade diferente. Quando se fala de outro do mesmo tipo, usa-se a palavra gr. allos (ver Mt.5:39). Embora seja possível “servir a dois senhores”, cujos caráter e interesses são os mesmos, certamente não é possível fazê-lo quando são conflitantes.

Amar ao outro. Isto é, ser devotado a um dos dois senhores.

Não podeis. Não existe posição neutra. Aquele que não está totalmente do lado de Deus está, na verdade, e para fins práticos, do lado do diabo. Trevas e luz não podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo. É impossível servir a Deus e às riquezas porque o que pedem é irreconciliável. Aqueles que servem às riquezas são seus escravos e cumprem suas ordens, a despeito de si mesmos (Rm.6:16).

Riquezas. Transliterado do aramaico mamon ou mamona, com o significado de “riqueza” de todo tipo. Não é um nome próprio, a menos que esteja personificando riquezas.

Mt.6:25 25. Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes?

Não andeis ansiosos. Do gr. merimnao, “se preocupar com”, “estar ansioso sobre”, “pensar em” (comparar com o emprego de merimnao, em 1Co.7:32; 1Co.12:25; Lc.12:22-31; ver com. de Sl.55:22). Jesus não está aconselhando o ascetismo, nem premiando a pobreza. Ele não afirma que um pobre ou despreocupado é mais aceitável a Deus do que um diligente e rico. O próprio Jesus aconselhou prudência na administração da vida pessoal e dos negócios (ver Lc.14:28-32). O que Ele condena é o hábito de se preocupar com as coisas materiais, principalmente as que são supérfluas. Ele condena o desejo que conduz à extravagância. O cristão deve poder discernir claramente o valor relativo das coisas, e sua preocupação deve ser proporcional a esse valor. Ele compreende que a riqueza não é um fim em si mesma, mas um meio para fins mais importantes, e seu objetivo supremo na vida não será ajuntar riquezas.

Vida. Do gr. psuche, neste caso, designa a vida física (sobre outros significados de psuche, ver com. de Mt.10:28).

Comer. Do gr. trophe, “alimento”, “nutrição”. Esse termo inclui todo tipo de alimento. Inclui a carne de animais utilizados como alimento, mas não se restringe a ela. O importante, diz Jesus, aquilo que deve receber mais atenção, é a vida em si. O alimento não é um fim em si mesmo, mas um meio para manter a vida. Aquele cujo principal objetivo é assegurar alimento e vestimenta perde o que é mais importante na vida. A comida é um meio para se viver, não o contrário (cf. com. de Mc.2:27).

Mt.6:26 26. Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves?

Observai. Por meio de três exemplos da natureza, Jesus ilustra a verdade de que Deus, o autor da vida, provê o que é necessário para mantê-la, e que o ser humano não precisa andar ansioso em razão disso. Essas três ilustrações são as aves (v. Mt.6:26), o curso da vida (v. Mt.6:27) e as flores (v. Mt.6:28).

As aves. Os pássaros não precisam do cuidado do ser humano. É Deus quem lhes dá a existência e lhes sustenta. Ao mesmo tempo, requer que exercitem a habilidade que lhes deu para buscar alimento. Talvez existam poucos trabalhos que sejam tão duros e tão incansáveis quanto o de um passarinho em busca de alimento, principalmente quando tem um ninho cheio de filhotes para alimentar. Do mesmo modo, Deus espera que o ser humano aceite a responsabilidade de trabalhar para suprir as necessidades da vida. Mas, diz Jesus, não era propósito de Deus que o ser humano considerasse tal trabalho o objetivo e a meta da vida.

Não semeiam. O Criador deu leis naturais que operam para produzir alimento (Jó.38:41; Sl.145:15-16; Sl.147:9). O alimento está ali, mas as aves devem buscá-lo.

Sustenta. Aquele que provê alimento para essas criaturas é o mesmo com quem se pode contar para prover o necessário para a vida. Deus nos promete isso se estamos dispostos a trabalhar. O desejo de superabundância de bens materiais é implantado pelo maligno e, inevitavelmente, conduz o ser humano a tentar acumular mais do que precisa das coisas boas da vida. É esse desejo pervertido que estimula o egoísmo e conduz ao crime, à violência e à guerra.

Muito mais do que as aves. Se Deus provê alimento com abundância para as pequenas criaturas de Suas mãos, Ele Se preocupará ainda mais com a felicidade e bem-estar do ser humano.

Mt.6:27 27. Qual de vós, por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida?

Qual de vós [...]? Esta é a segunda ilustração do princípio contido no v. Mt.6:25 (ver com. do v. Mt.6:26; comparar com Lc.12:25).

Ansioso. Isto é, preocupação (ver com. do v. Mt.6:25).

Vida. Do gr. helikia, que pode indicar tanto “idade” quanto “estatura”. Helikia é traduzido como “idade” em Jo.9:23; Hb.11:11; e “estatura” em Lc.19:3. Não se sabe se Cristo falava de aumento na estatura ou de duração da vida.

Mt.6:28 28. E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham, nem fiam.

Por que andais ansiosos [...]? Comparar com Lc.12:26-27. Cristo aponta para a terceira ilustração do cuidado do Pai com as criaturas de Sua mão.

Lírios. Do gr. krina. A identificação exata é incerta. Talvez Jesus tenha usado krina como um termo geral para flores do campo. Sugere-se que a referência seja à anêmona multicolorida, uma flor comum, colorida e notável da Palestina.

Mt.6:29 29. Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles.

Eu, contudo, vos afirmo. Ver com. de. Mt.5:22; comparar com Lc.12:27.

Toda a sua glória. Era famoso o esplendor da corte de Salomão (1Rs.10:1-13; 1Rs.10:21).

Nem Salomão [...] se vestiu. Literalmente, “não se vestiu”.

Mt.6:30 30. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós outros, homens de pequena fé?

Ora, se. Cristo resume o princípio implícito nas ilustrações dos v. Mt.6:26-28. Os v. 30 a 34 repetem e enfatizam o ensino do v. Mt.6:25.

Erva. Provavelmente, uma associação com as flores do campo do v. Mt.6:28 e, em certo sentido, uma continuação da ilustração dos “lírios”.

Forno. Pasto e galhos secos abasteciam fornos antigos.

Quanto mais. Aquele que deu a vida certamente concederá as dádivas menores do alimento e da vestimenta. Ele não ficará inativo em atitude de despreocupação caprichosa com a preservação da vida que Ele mesmo deu. É razoável pensar que Deus Se preocupa com Seus filhos.

Pequena fé. Ver com. de Mt.8:26.

Mt.6:31 31. Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que comeremos? Que beberemos? Ou: Com que nos vestiremos?

Não vos inquieteis. Ver com. do v. Mt.6:25. A vida é mais importante que o alimento, mas o reino de Deus é ainda mais importante. O ser humano deve se preocupar apenas com o que é mais essencial.

Mt.6:32 32. Porque os gentios é que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe que necessitais de todas elas

Os gentios é que procuram. Não é apropriado que cidadãos do reino dos céus se preocupem demasiado em obter bens materiais. Um filho de Deus não deve deixar as coisas de valor eterno para buscar aquilo que não é melhor que “a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno” (v. Mt.6:30; ver com. de Is.55:1-2; Jo.6:27).

Sabe. Esta é a segunda razão para não dedicar a vida a buscar bens materiais. Deus sabe do que precisamos e Ele o providenciará.

Mt.6:33 33. buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.

Buscai, pois, em primeiro lugar. Comparar com Lc.12:31. O grande propósito da existência é receber o reino de Deus (At.17:27). A maioria está preocupada em trabalhar “pela comida que perece” (Jo.6:27), pela água da qual voltará a ter sede (Jo.4:13). A maioria gasta dinheiro “naquilo que não é pão” e suor “naquilo que não satisfaz” (Is.55:2). Com frequência, tendemos a fazer de “todas estas coisas [materiais]” o principal objetivo na vida, com a vã esperança de que Deus será indulgente conosco e que, no final da jornada da vida, acrescentará a eternidade ao nosso breve tempo de vida. Cristo nos ordena que coloquemos em primeiro lugar o que é o mais importante e nos assegura que o menos importante nos será acrescentado segundo nossa necessidade.

O Seu reino. Ver com. de Mt.3:2; Mt.5:13; Mt.6:10.

Acrescentadas. Não existe segurança longe de Deus e de Seu reino. A melhor cura para a preocupação é confiança em Deus. Se fizermos nossa parte fielmente, se colocarmos o reino dos céus em primeiro lugar no pensamento e na vida, Deus cuidará de nós. Ele ungirá nossa cabeça com óleo (ver com. do v. Mt.6:17), e nosso cálice transbordará de coisas boas (Sl.23:5).

Mt.6:34 34. Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal.

Portanto, não vos inquieteis. Ver com. do v. Mt.6:25. Os cristãos podem estar livres da ansiedade em meio às circunstâncias mais difíceis, plenamente seguros de que Ele fará tudo ficar bem (cf. Mc.7:37), de que todas as coisas “cooperam para o bem” (Rm.8:28). Deus conhece o futuro; ao passo que não sabemos o que “trará à luz” (Pv.27:1). E Aquele que conhece o futuro nos convida a confiar no Seu cuidado contínuo e a não nos preocuparmos com problemas e perplexidades. Quando o amanhã vier, os problemas antecipados com frequência provarão ter sido totalmente imaginários. Muitas pessoas permitem ser assombradas pelo fantasma do amanhã antes que ele venha. Os cristãos devem sempre se lembrar de que Deus não concede auxílio para os fardos do amanhã antes que esse dia chegue. Eles têm o privilégio de experimentar a cada dia a verdade das palavras de Cristo a Paulo: “Minha graça te basta” (2Co.12:9; Mt.4:16).

Basta ao dia. “Por que preocupar-se com o amanhã?”, pergunta Cristo, “o amanhã cuidará de si mesmo quando chegar”. Cada dia traz sua própria medida de problemas e cuidados, e sábio é aquele que aprende a não tentar carregar hoje os fardos de amanhã.

O seu próprio mal. Ver Pv.27:1.

Mt.7:1 1. Não julgueis, para que não sejais julgados.

Não julgueis. Jesus Se refere em especial ao fato de julgar as intenções de outra pessoa, não ao fato de julgar se seus atos são certos ou errados. Somente Deus pode julgar as intenções, pois só Ele pode ler o pensamento (ver Hb.4:12; DTN, 314). Visto que Deus vê o coração humano, Ele ama o pecador e odeia o pecado. Como o ser humano é capaz de discernir apenas o “exterior” (1Sm.16:7), e não o coração, inevitavelmente comete erros. Jesus não Se refere à percepção por meio da qual o cristão deve distinguir entre o certo e o errado (Ap.3:18; cf. T5, 233), mas sim ao hábito da crítica e da censura, em geral, injusta.

Mt.7:2 2. Pois, com o critério com que julgardes, sereis julgados; e, com a medida com que tiverdes medido, vos medirão também.

Com o critério com que julgardes. Comparar com Mc.4:24; Lc.6:38. Com a mesma medida que medirmos seremos medidos, pois injustiça leva a injustiça. Mais que isso, a injustiça de alguém para com seu próximo leva ao juízo divino, como ensinou Jesus na parábola do credor incompassivo (Mt.18:23-35). Podemos condenar a ofensa, mas como Deus, devemos sempre estar dispostos a perdoar o ofensor. Podemos estender misericórdia ao ofensor sem justificar o mal que possa ter cometido.

Mt.7:3 3. Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão, porém não reparas na trave que está no teu próprio?

Por que vês [...]? Comparar com Lc.6:41. O provérbio “quem tem telhado de vidro não atira pedras no do vizinho” tem significado semelhante. Também há um provérbio árabe que diz: “Como podes ver a farpa no olho do teu irmão, e não ver a viga no teu olho?”

Argueiro. Do gr. karphos, um mero “fragmento” ou “farpa” de madeira seca ou palha. Embora seja uma partícula tão minúscula, nos olhos seria irritante. O “argueiro” representa, é claro, a falta mínima. A pessoa pronta a censurar facilmente detecta uma falha em outra, mesmo sendo pequena.

Trave. Do gr. dokos, um “tronco” ou uma “tábua”, um pedaço de madeira usado na construção de uma casa.

Mt.7:4 4. Ou como dirás a teu irmão: Deixa-me tirar o argueiro do teu olho, quando tens a trave no teu?

Como dirás [...]? Comparar com Lc.6:42.

Deixa-me tirar. Esse favor não é motivado tanto por um desejo de ajudar, mas sim para chamar atenção ao fato de que o argueiro está ali, e à suposta sabedoria e habilidade de quem oferece o favor.

Trave. Completamente esquecido do fato de que ele mesmo comete erros, e de sua fraqueza, o hipócrita fica impaciente com seu irmão. Com frequência certos cristãos expressam profunda indignação com o caminho que alguns tomam, ou pressupõem que tomaram, para depois descobrirem que eles próprios são culpados do mesmo pecado do qual acusaram outros. Esse foi o caso dos fariseus que levaram a Jesus a mulher pega em adultério (Jo.8:3-11; DTN, 461) e, também, de Simão, quando julgou Maria (Lc.7:36-39; DTN, 566). O cristão que descobre o erro do irmão irá corrigi-lo “com espírito de brandura” (Gl.6:1), considerando que ele próprio pode ter sido tentado e pode ter caído naquele mesmo ponto, ou pode cair no futuro.

Mt.7:5 5. Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho e, então, verás claramente para tirar o argueiro do olho de teu irmão.

Hipócrita. A pessoa crítica, censuradora, é sempre hipócrita, e suas críticas, em parte, têm o objetivo de encobrir a própria hipocrisia (ver com. de Mt.6:2).

Verás claramente. Somente quando a pessoa está disposta a sofrer, se preciso for, para ajudar um irmão errante, ela deixa de ser cega para ajudá-lo (ver MDC, 128). Ajudar outros a enxergar e a se livrar de defeitos no caráter e na vida é a operação mais delicada na área das relações humanas e requer visão clara e discernimento perspicaz da parte de quem se propõe a isso.

Mt.7:6 6. Não deis aos cães o que é santo, nem lanceis ante os porcos as vossas pérolas, para que não as pisem com os pés e, voltando-se, vos dilacerem.

Não deis. Depois de falar sobre os erros pequenos ou imaginários na vida e no caráter de outros, Cristo fala da atitude cristã para com aqueles que estão de forma clara e completa no erro e não têm desejo de escapar do pecado.

Cães. Ainda hoje, no Oriente, cães são os carniceiros das cidades e, em sua maioria, criaturas selvagens. Para os judeus, o cão era também um animal impuro segundo as leis cerimoniais e, visto que não tinha muito valor doméstico, era considerado com desprezo (ver com. de Jó.30:1).

O que é santo. Provável referência a ofertas ou sacrifícios levados ao templo e consagrados a seu uso. A Mishnah diz: “Não se pode redimir as ofertas [de animais] a fim de dar de comer aos cães”. O obreiro do evangelho não deve perder tempo com aqueles que “só fariam do evangelho um objeto de contenção e ridículo” (ver MDC, 129; T3, 450).

Pérolas. Do gr. margaritae, do qual provém o nome Margarete. É possível que, neste caso, Jesus tivesse em mente pérolas pequenas, que por seu tamanho e cor poderiam, à primeira vista, ser confundidas pelos porcos como alimento.

Mt.7:7 7. Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e achareis; batei, e abrir-se-vos-á.

Pedi. Após apresentar os elevados ideais do reino dos céus (Mt.5:21-7:6), Jesus dedica o restante de Seu sermão para falar dos meios pelos quais cidadãos de Seu reino podem tornar essas nobres virtudes parte da vida deles (Mt.7:7-12). Ele conduz Seus ouvintes ao ponto em que os caminhos se dividem e chama atenção para o fato de que a cidadania de Seu reino envolve grande sacrifício pessoal (Mt.7:13-14; Lc.14:27-33) e não deve ser assumida de forma impensada. Adverte contra a filosofia e o conselho dos pretensos líderes religiosos, lobos em pele de cordeiro (Mt.7:15-20) e conclui com um fervoroso apelo para se viver de acordo com os princípios do reino (v. Mt.7:21-27). Reconhecendo que é impossível aos pecadores, por si mesmos, harmonizarem a vida com os princípios da lei divina, Cristo indica a Seus ouvintes a fonte de poder para o viver cristão. Tudo de que os cidadãos do reino precisam poderão receber, se pedirem. O que não podem fazer por sua própria força pode ser realizado quando o esforço humano se une ao poder divino. Aqueles que pedirem não serão desapontados (v. Mt.7:9-11). Deus não é mesquinho com as bênçãos do Céu; Ele não trata o ser humano da mesma forma como o ser humano trata um ao outro (v. Mt.7:1-6). Ele é bondoso e misericordioso.

Mt.7:8 8. Pois todo o que pede recebe; o que busca encontra; e, a quem bate, abrir-se-lhe-á.

Sem comentário para este versículo.

Mt.7:9 9. Ou qual dentre vós é o homem que, se porventura o filho lhe pedir pão, lhe dará pedra?

Qual dentre vós [...]? Nenhum pai seria tão duro e cruel. E se eles, mesmo na sua imperfeição humana, não conceberiam tal atitude, quanto menos Seu Pai celestial.

Mt.7:10 10. Ou, se lhe pedir um peixe, lhe dará uma cobra?

Sem comentário para este versículo.

Mt.7:11 11. Ora, se vós, que sois maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará boas coisas aos que lhe pedirem?

Quanto mais [...]? Nos Seus ensinos, com frequência, Cristo apela do menor para o maior; neste caso, do amor dos pais humanos para o amor infinitamente maior do Pai celestial (ver Mt.6:30). Jesus toma o melhor da natureza humana e logo aponta o caráter incomparavelmente maior de Deus.

Boas coisas. Crianças em geral não se sentem inibidas para pedir algo. Não devemos hesitar em ir ao Doador de “toda boa dádiva e todo dom perfeito” (Tg.1:17).

Mt.7:12 12. Tudo quanto, pois, quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles; porque esta é a Lei e os Profetas.

Assim fazei-o. Ver com. de Mt.7:7; Lc.6:31. O modo como o cristão trata seu próximo é um teste da genuinidade de sua religião (1Jo.4:20; Mt.25:31-46). A regra áurea resume os deveres da segunda tábua do decálogo e é outra afirmação do grande princípio de amor ao próximo (ver Mt.19:16-19; Mt.22:39-40; 1Jo.4:21). Apenas aqueles que fazem da regra áurea sua lei para vida e a praticam podem esperar ser admitidos no reino da glória. A atitude para com o próximo é um indicativo infalível da atitude para com Deus (ver 1Jo.3:14-16). Grandes pensadores de outras épocas e culturas descobriram e afirmaram a verdade sublime expressa na regra áurea, contudo, em geral, de forma negativa. Por exemplo, atribuem-se a Hillel, famoso rabi da geração anterior a Jesus, essas palavras: “Não faça a seu próximo aquilo que lhe é odioso; nisso consiste a Torah, o restante é comentário disso”.

A regra áurea também está no livro apócrifo de Tobias (4:15): “Não faça a ninguém aquilo que lhe é odioso”, e na Carta de Aristeias: “Assim como não desejas que te sobrevenha o mal, mas sim, desfrutar de tudo o que é bom, deves lidar com aqueles que te são sujeitos e com os transgressores.” É digno de nota que Jesus transformou um preceito negativo em positivo. Eis uma diferença essencial entre o cristianismo e outros sistemas religiosos, e entre o verdadeiro cristianismo e a religião que segue as formas, mas nega o poder vital do evangelho. A regra áurea toma o egoísmo supremo (o que gostaríamos que outros nos fizessem) e o transforma em suprema abnegação (o que devemos fazer para os outros). Essa é a glória do cristianismo. Essa é a vida de Cristo vivida naqueles que O seguem e carregam Seu nome (ver com. de Mt.5:48).

Esta é a Lei. Cristo nega de forma enfática que o princípio apresentado na regra áurea seja algo novo; é a própria essência da lei, dada por Moisés (a Torah), e o que os profetas escreveram; em outras palavras, todo o AT (ver com. de Mt.5:17; Lc.24:44). Quem atribui a lei do amor apenas ao NT, e relega o AT ao esquecimento, como um sistema religioso obsoleto, critica o Mestre, que declarou especificamente que não veio para mudar os grandes princípios contidos na “Lei” e nos “Profetas” (ver com. de Mt.5:17-18; Lc.24:27; Lc.24:44). Todo o Sermão do Monte, de Mt.5:20-7:11, ilustra essa grande verdade. Depois de afirmar que não veio abolir os ensinos de Moisés e dos profetas, Cristo apresenta em detalhes Sua atitude para com a lei, ao engrandecê-la e honrá-la (ver Is.42:21).

Mt.7:13 13. Entrai pela porta estreita (larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz para a perdição, e são muitos os que entram por ela),

Entrai. [As duas estradas, Mt.7:13-14 = Lc.13:24; Comentário principal: Mt]. Nos v. 13 e 14, Jesus convida Seus ouvintes a aceitarem Seus princípios como norma de sua vida, e lhes aponta como e onde começar. Ele é a “porta” (Jo.10:7; Jo.10:9) e o “caminho” (Jo.14:6). Aquele que deseja entrar no reino dos céus, que quer ter “vida” e “vida em abundância”, deve entrar por meio dEle; não há outro caminho (Jo.10:7-10; comparar com Lc.13:24).

Estreita. Do gr. stenos, “apertado”. Não se deve confundir “estreito” com “reto”. A porta fica no começo do caminho, não no fim. Ela é estreita, e passará por ela apenas aquilo que é essencial para a jornada. Antigamente, as portas das cidades eram fechadas ao pôr do sol, e visto que estavam situadas geralmente no topo de colinas ou rochas íngremes, o caminho que conduzia até as portas era com frequência estreito. Aquele que quisesse entrar antes que a porta fosse fechada, devia se esforçar para chegar a tempo (ver Lc.13:24).

Espaçoso, o caminho. O conceito dos “dois caminhos” é frequente (ver Dt.11:26; Dt.30:15; Je.21:8; Sl.1).

Mt.7:14 14. porque estreita é a porta, e apertado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela.

Porque. Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a variante: “quão estreita é a porta”.

Estreita é a porta. Comparar com Mt.19:24. A estreiteza da porta requer que aquele que entra por ela negue o próprio eu.

Apertado. Do gr. thlibo, “comprimir”, “apertar”, portanto, um caminho que é apertado ou estreito como em um desfiladeiro entre grandes rochas, em comparação com o caminho “espaçoso” ou fácil. Por isso, exige esforço, do gr. agonizomai (ver com. de Lc.13:24).

Poucos. Muitos não entram pela porta pela simples razão de que não querem encontrá-la. Todos são convidados e podem entrar por ela (ver Ap.22:17).

Mt.7:15 15. Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam disfarçados em ovelhas, mas por dentro são lobos roubadores.

Falsos profetas. Comparar com Mt.24:5; Mt.24:11; Mt.24:24; Mc.13:22. Um verdadeiro profeta é aquele que fala no lugar de Deus. Um falso profeta é alguém que finge estar falando no lugar de Deus, quando na realidade fala apenas dos pensamentos pervertidos de seu próprio coração (cf. Is.30:10; Je.14:13-15; Je.23:16-17; Je.23:21; Je.23:25; Je.23:30-32; Je.23:38; Je.29:8-9; Ez.13:2-3; Ez.13:10-11; comparar com as experiências de Jeremias com os falsos profetas de seus dias, em Je.27-29). Os falsos profetas são aqueles que professam que é possível entrar pela porta larga e pelo caminho espaçoso. Eles são os “ladrões”, cujo único propósito é roubar, matar e destruir (Jo.10:7-10; sobre advertências contra falsos profetas, ver At.20:28-31; 2Ts.2:3; 2Ts.2:7; 2Pe.2; 1Jo.2:18-19).

Disfarçados em ovelhas. A semelhança entre “lobos” e “ovelhas” era apenas externa. Não havia mudança de coração, apenas de aparência. É evidente que o propósito era enganar as ovelhas e criar nelas uma falsa sensação de segurança a fim de devorá-las com mais facilidade. O povo de Deus com frequência é descrito como ovelhas, e Deus, como Seu pastor (Sl.23:1-2; Sl.78:52; Sl.80:1; Sl.100:3; Is.40:11; Is.53:6; Ez.34:10-19; Jo.10:1-16).

Lobos. Comparar com Sf.3:3; Mt.10:16; Jo.10:12.

Roubadores. Do gr. harpax, “voraz”. Esses “lobos” não são apenas maus de coração, mas contrários à verdade e àqueles que a seguem. Seu objetivo é prejudicar as ovelhas para se beneficiarem. Gananciosos e ávidos por dinheiro e poder, são mais perigosos que os “cães” ou os “porcos” do v. Mt.7:6 (ver com. de Mq.3:5-11).

Mt.7:16 16. Pelos seus frutos os conhecereis. Colhem-se, porventura, uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos?

Pelos seus frutos os conhecereis. Do gr. epiginosko, “conhecer plenamente”. A metáfora muda; as “ovelhas” não estão totalmente desprotegidas; elas são capazes de detectar os “lobos” por meio de seu porte e de sua conduta. As reivindicações atraentes desses falsos profetas não demonstram seu caráter verdadeiro. Suas palavras bonitas e exaltada posição não são provas válidas do que são na realidade, tampouco se pode confiar em seus milagres (v. Mt.7:22). As palavras “os conhecereis” podem ser consideradas como uma promessa de que as “ovelhas” que conhecem a voz de Seu Pastor (Jo.10:4) não serão enganadas pelos “lobos” (ver T5, 233). Aqueles que realmente amam o Senhor e se entregam plenamente à Sua vontade não precisam temer serem desviados se obedeceram à voz de Deus que lhes fala dia a dia, por meio de Sua palavra e de Seus conselhos (GC, 598; T8, 298). Na grande hora da provação que está porvir, apenas os que conhecem a verdade e a amam estarão seguros contra os enganos de Satanás (Os.4:6; 2Ts.2:9-10; T6, 401; comparar com Mt.12:33-35; Lc.6:43-45).

Uvas dos espinheiros. Comparar com Tg.3:11-12.

Mt.7:17 17. Assim, toda árvore boa produz bons frutos, porém a árvore má produz frutos maus.

Assim, toda árvore boa. Comparar com Mt.12:33-34.

Bons frutos. Isto é, frutos de boa aparência, aroma e sabor agradáveis. Esses frutos são atraentes em todos os aspectos. O “fruto do Espírito” é descrito em Gl.5:22-23.

Má. Do gr. sapros, “podre”, “deteriorado”. A mesma palavra é traduzida como “ruins” em Mt.13:48.

Frutos maus. As obras da carne são alistadas em Gl.5:19-21 (comparar com as “uvas bravas” da parábola da vinha má [Is.5:1-7], e com os figos, que de tão ruins não podiam ser comidos [Je.24:2; Je.24:8]).

Mt.7:18 18. Não pode a árvore boa produzir frutos maus, nem a árvore má produzir frutos bons.

Árvore boa. Comparar com Lc.6:43. Uma pessoa cujo caráter é sólido demonstrará automaticamente esse caráter nas palavras e ações.

Mt.7:19 19. Toda árvore que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo.

Cortada. João Batista falou do “machado” posto “à raiz das árvores” (ver com. de Mt.3:10). Numa parábola posterior, outra vez Cristo usou a metáfora de se cortar uma árvore inútil (Lc.13:6-9).

Lançada ao fogo. Ver com. de Mt.3:10. O fruto mau, ou “obras” más, será queimado no fogo do último dia (2Pe.3:10-12).

Mt.7:20 20. Assim, pois, pelos seus frutos os conhecereis.

Pelos seus frutos. Ver com. do v. Mt.7:16. A afirmação com a qual se introduz a metáfora da árvore e seu fruto é repetida no final, para dar ênfase.

Mt.7:21 21. Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.

Nem todo. As palavras “nem” e “mas” enfatizam o forte contraste entre quem só fala e quem realmente faz a vontade divina. A mera profissão é inútil. Aquele que supõe conhecer a Deus e, contudo desobedece aos Seus mandamentos “é mentiroso, e nele não está a verdade” (1Jo.2:4), a despeito de qualquer aparência do contrário.

Senhor, Senhor! Reconhecer a Cristo como “Senhor” é professar a crença de que Ele de fato é o Messias e assumir o papel de discípulo.

Aquele que faz. Isto é, aquele que realiza a vontade de Deus quando a conhece. A fé em Deus deve acompanhar obras, ou as obras resultarão em mera forma. É verdade que “a fé, se não tiver obras, por si só está morta” (Tg.2:17), mas também é verdade que obras sem fé sincera e viva são inúteis (Hb.11:6). Aqueles que não conhecem a vontade de Deus não são culpados disso (Lc.12:47-48), mas os que ouvem a voz de Deus falando ao coração e ainda persistem nos seus próprios caminhos “não têm desculpa do seu pecado” (Jo.15:22) e correm perigo de presunção.

Mt.7:22 22. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres?

Muitos [...] hão de dizer-Me. Pela primeira vez, Jesus indiretamente Se refere ao fato de que “naquele dia” virá como Juiz de todos (cf. Mt.26:64). Aqueles que se dirigirem a Cristo como Senhor no grande dia do juízo final o farão como professos cristãos. Eles fingiram nesta vida serem Seus seguidores, mas foram pesados na balança e achados em falta.

Naquele dia. O grande dia do juízo final (cf. Mt.25:32-33; Mt.25:41). “Aquele dia”, ou “o Dia do Senhor”, é mencionado com frequência pelos profetas do AT (ver Is.2:11; Is.2:17; Jl.2:1; Jl.3:14; Am.5:18; Am.5:20; Sf.1:15; Ml.3:17; Ml.4:1; Lc.10:12; 2Ts.1:10; 2Tm.4:8).

Profetizado em Teu nome. A forma da pergunta no grego indica que quem fala espera uma resposta positiva. Estão dizendo: “Certamente profetizamos em Teu nome, não é, Senhor?” Dificilmente afirmariam isso diante do grande Juiz do universo se a afirmação não estivesse aparentemente respaldada pelos fatos. Essa é a medida de sua arrogância e vã ilusão. É como se protestassem ao Juiz que Sua decisão fosse injusta e que Ele não poderia rejeitá-los. Pregaram em Seu nome, contudo se esqueceram de que é vão o culto externo baseado na tradição humana.

Expelimos demônios. Supunha-se que esse era o mais difícil de todos os milagres (ver com. de Mc.1:23) e que representava todos os outros que poderiam ser mencionados. Quando os setenta retornaram da primeira expedição evangelística, o fato de que “os próprios demônios” se submetiam a eles foi o que lhes pareceu mais importante (Lc.10:17; ver Nota Adicional a Marcos 1; Mc.1:45).

Muitos milagres. Talvez incluindo milagres reais (cf. GC, 553, 588), realizados como evidência de que Deus estava com eles e aprovava seus ensinos (ver Ap.13:13-14; 2Ts.2:9-10). As Escrituras deixam claro que a realização de milagres não é em si evidência conclusiva de que o poder divino está em operação. O maior milagre de todos os tempos e da eternidade é uma vida transformada à semelhança divina (ver DTN, 406, 407). Aqueles que professam ser profetas devem ser testados por meio de sua conduta (ver com. de Mt.7:16), e não por seus milagres (ver p. 208, 209).

Mt.7:23 23. Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade.

Então, lhes direi explicitamente. Do gr. homologeo, neste caso, “declarar abertamente”.

Nunca vos conheci. Ou, de acordo com a forma do verbo grego: “nunca vos reconheci, [ou, ‘me familiarizei com’]”. Isso é evidência de que seus ensinos não se harmonizavam com a vontade de Deus e que seus milagres não eram realizados mediante Seu poder.

Apartai-vos de Mim. Comparar com Mt.25:41. O pecado resulta em separação completa de Deus.

Iniquidade. Do gr. anomia, “ilegalidade” ou “falta de conformidade com a lei”. Os obreiros da iniquidade não andam em conformidade com a lei, pois se recusaram a harmonizar sua vida com o padrão perfeito apresentado na lei do reino dos céus – e “o pecado é a transgressão da lei [anomia]” (1Jo.3:4). No monte das Oliveiras, Cristo disse que nos últimos dias a “iniquidade”, anomia, se multiplicaria (Mt.24:12) e, poucas décadas depois, Paulo observou que o “mistério da iniquidade [anomia]” já estava atuando (2Ts.2:7).

Mt.7:24 24. Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as pratica será comparado a um homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha

Pois. A conclusão e o apelo do Sermão do Monte se apresentam em forma de uma parábola dupla (comparar com Lc.6:47-49).

Ouve. Sem dúvida, Cristo Se refere a mais do que meramente ouvir. Aqueles que ouvem essas palavras as entendem, ao menos até o ponto de terem luz suficiente para agir, portanto, são responsáveis perante Deus (ver com. do v. Mt.7:21).

E as pratica. Ver com. do v. Mt.7:21; cf. Mt.5:19. É perigoso ouvir uma ordem divina e não colocá-la em prática, pois ouvir traz consigo, inevitavelmente, a responsabilidade de agir em conformidade. Os “filhos de Deus” são os que seguem Seu Espírito (Rm.8:14). A obediência às palavras de Cristo transforma o caráter (ver com. de Jo.5:24).

Será comparado. Evidência textual favorece (cf. p. 136): “Ele será semelhante”.

Sua casa. Isto é, a “casa” do caráter.

Sobre a rocha. O Senhor Jesus Cristo é a “rocha” sobre a qual o cristão e a igreja cristã devem ser edificados (ver com. de Mt.16:18). Segundo Lc.6:48, o construtor “cavou, abriu profunda vala”, a fim de ter um firme fundamento. Construir firmemente requer muito tempo e esforço; é muito mais simples construir uma casa sem se preocupar em providenciar um fundamento sólido.

Mt.7:25 25. e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, que não caiu, porque fora edificada sobre a rocha.

Caiu a chuva. Observa-se aqui o estilo ágil de Jesus: frases curtas que descrevem vividamente a tempestade – um recurso literário.

Ventos. Os “ventos” da tentação e das provas (DTN, 314), ou os ventos dos falsos ensinos que tendem a retirar a pessoa do firme fundamento da fé (Ef.4:14).

Não caiu. Bem-aventurado é aquele que em sua luta “contra os dominadores deste mundo tenebroso”, pode “resistir no dia mau”, e depois de ter vencido tudo, “permanecer” inabalável (Ef.6:12-13). Bem-aventurado é aquele que quando as tempestades da vida findarem, perceber que pela graça de Cristo seu caráter resistiu a “todos os dardos inflamados do maligno” (Ef.6:16). Sua alma está ancorada na grande esperança cristã (Hb.6:19; Tt.2:13; Hb.10:35) e não irá cair.

Edificada sobre a rocha. Isto é, sobre os ensinamentos de Cristo. Neste caso particular, os ensinos do Sermão do Monte (v. Mt.7:24). As palavras de Cristo nunca passarão (Mt.24:35), mas permanecerão para sempre (Is.40:8; 1Pe.1:25). Somente nEle há salvação (At.4:12).

Mt.7:26 26. E todo aquele que ouve estas minhas palavras e não as pratica será comparado a um homem insensato que edificou a sua casa sobre a areia

Não as pratica. Jesus repete a parábola na forma negativa para dar ênfase ao ensinamento. A repetição é um recurso comum nos ensinos de Jesus. A diferença nos dois casos é apenas o fundamento; todo o restante é igual. É evidente que o homem aqui representado sabia quais poderiam ser as consequências de suas ações (ver com. do v. Mt.7:24).

Homem insensato. “Insensato” porque não fez o que sabia que deveria ser feito (comparar com o homem sem a veste nupcial [Mt.22:11-13] e com as cinco virgens néscias [Mt.25:2-3]).

Sobre a areia. Aquele que não dá ouvidos ao evangelho constrói sobre a instável areia do eu, sobre seus próprios esforços (MDC, 152) e sobre teorias e invenções humanas (DTN, 314).

Mt.7:27 27. e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, e ela desabou, sendo grande a sua ruína.

Caiu a chuva. A areia seca, que parecia tão segura e convidativa no bom tempo, torna-se uma torrente caudalosa com as fortes chuvas.

Ela desabou. Ver com. do v. Mt.7:25.

Sendo grande a sua ruína. Comparar com a ruína daqueles que confiaram na mentira (ver Is.28:16-18) e com a dos que construíram a “parede” do caráter de maneira “frágil” (cf. Ez.13:10-16, AA).

Mt.7:28 28. Quando Jesus acabou de proferir estas palavras, estavam as multidões maravilhadas da sua doutrina

Acabou de proferir. Sobre reações aos ensinos de Jesus similares às registradas aqui, ver Mc.1:22; Lc.4:31-32.

Estas palavras. As registradas em Mt.5-7.

Doutrina. Do gr. didache, “ensino” (ver com. de Mc.1:21-22). O povo estava admirado, pois os ensinos de Jesus eram bem diferentes dos ensinos dos escribas nas sinagogas.

Mt.7:29 29. porque ele as ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas.

Como quem tem autoridade. Não por meio de dogmas, mas com Sua própria autoridade, em vez de citar expositores anteriores da lei, como faziam os rabis. Observe o uso frequente nos evangelhos da expressão “em verdade vos digo” (ver com. de Mt.5:18) e sua equivalente “quem tem ouvidos [para ouvir], ouça” (Mt.11:15).

Os escribas. Evidências textuais favorecem (cf. p. 136) a variante “seus escribas”, significando aqueles a quem o povo ouvia (cf. “seus”, em Lc.5:30). O ensino dos escribas era dogmático e baseado em tradições dos anciãos. No método de Cristo, havia poder vivificante, bem como nas verdades que apresentava, em contraste com o formalismo morto dos ensinos dos escribas. Há evidência textual (cf. p. 136) para o acréscimo de “e fariseus”.

NOTA ADICIONAL A MATEUS 7

Nos escritos dos eruditos rabínicos se encontram vários paralelos com os ensinos morais e religiosos de Jesus no Sermão do Monte e outras passagens. A pergunta é: até que ponto um depende do outro? Eruditos judeus modernos argumentam que, na maioria, Jesus dependeu da tradição judaica das escolas de Sua época. Tobias Tal declarou que os ensinos morais do NT são encontrados sem exceção no Talmude e, além disso, que o Talmude foi a fonte da qual os evangelhos tomaram emprestados seus ensinos morais. Um erudito judeu moderno afirma que “no evangelho não há sequer um ensinamento ético que não tenha paralelo no Antigo Testamento, nos livros apócrifos ou na literatura do Talmude e do Midrash do período próximo ao de Jesus”. Ele ainda afirma que “Jesus não apresentou quase nenhum ensinamento ético que fosse fundamentalmente estranho ao judaísmo. A semelhança é tão extraordinária que quase poderia parecer que os evangelhos foram compostos simples e unicamente do conteúdo do Talmude e do Midrash”.

Muitos comentaristas cristãos, embora não sejam tão radicais como os eruditos judeus mencionados acima, ainda citam vários paralelos da literatura rabínica, criando a impressão de que Jesus, na verdade, ensinou pouco além daquilo que já era conhecido aos judeus (ver p. 83-87). Os paralelos surpreendentes existem; ninguém pode negar. Mas não se deduz necessariamente que Jesus tenha extraído Seus ensinos morais da literatura rabínica. Talvez a comparação mais extensa já feita entre o Novo Testamento e a literatura judaica seja a de Hermann L. Strack e Paul Billerbeck, em Kommentar zum Neuen Testament aus Talmud und Midrasch, uma obra monumental de 4.102 páginas. Visto que os autores são sem dúvida as principais autoridades no assunto, é interessante notar suas observações e conclusões feitas num epílogo dos comentários do Sermão do Monte (vol. 1, p. 497-502). Eles observam que, salvo uma exceção (o que disse Hillel, ver com. de Mt.7:12), os paralelos com o Sermão do Monte atribuídos por nomes a rabinos são todos de mestres rabinos que viveram depois da época de Jesus. Argumenta-se contra isso que muitos dizeres, embora levem os nomes de autores posteriores, são de origem anterior, sendo possível que tenham servido de fonte para Jesus.

No entanto, Strack e Billerbeck defendem a regra bem estabelecida de que um dizer que é atribuído a um determinado autor na verdade pertence ao erudito cujo nome leva, a menos que se possa provar, a partir de fontes confiáveis, que esse dizer já existia antes. Quando se aplica essa regra aos dizeres do Sermão do Monte, torna-se imediatamente evidente que a vasta maioria deles deve ser atribuída a Jesus, visto que Ele viveu antes dos eruditos a quem são atribuídos na literatura rabínica. Não se nega que alguns desses dizeres podem ter sido anteriores, mas cabe a quem assim crê provar em cada caso que o dizer é de fato mais antigo. Examinemos por um momento o outro lado da questão. Até que ponto Jesus pode ter sido a fonte de alguns dos dizeres da literatura rabínica? Strack e Billerbeck observam evidências de que os eruditos tanaíticos [rabinos pertencentes à era tanaítica, do primeiro ao segundo século d.C.] mais antigos, que viveram por volta de 100 d.C., conheciam bem alguns dos ensinos de Jesus. Por exemplo, a declaração de Mt.7:12 é mencionada num debate entre Gamaliel II (c. 90 d.C.) e um cristão.

Não se pode avaliar a influência que Jesus teve no desenvolvimento do pensamento judaico, em especial, durante os primeiros anos em que a sinagoga e a igreja estavam estreitamente relacionadas. Podem-se considerar os seguintes dizeres como uma análise justa da situação: “Sugeriu-se, embora dificilmente se possa provar, que as críticas feitas por Jesus, posteriormente quando sua origem tinha sido esquecida, pudessem ter tido algum papel no desenvolvimento do código judaico à medida que este tomou forma na Mishnah e no Talmude”. Quando se recorda que a porcentagem de dizeres rabínicos que não se baseia total ou parcialmente num texto bíblico é mínima, não é de se surpreender que se encontrem paralelos entre esses dizeres e os de Jesus, que deu origem ao AT. Em todos os tempos, quando homens piedosos permitiram que o Espírito Santo, que inspirou os escritos do AT, os influenciasse, suas palavras refletiram a luz do Céu. De fato, essa observação explica por que filósofos que atuaram fora da área da religião revelada, tais como Confúcio e Platão, frequentemente apresentaram ideais elevados. Jesus é a “verdadeira luz, que vinda ao mundo, ilumina a todo homem” (Jo.1:9; cf. DTN, 465). Embora existam paralelos entre os dizeres de Jesus e os de eruditos judeus ao mesmo tempo, há diferenças importantes, como observam Strack e Billerbeck.

Nenhum erudito judeu posterior deixou tantos dizeres morais e religiosos como Jesus. Nenhum erudito judeu posterior foi capaz de apresentar seus dizeres de forma breve e com a autoridade que admiramos tanto nos ensinos de Jesus. Acima de tudo, ninguém teve os mesmos objetivos de Jesus, e nisso está a principal diferença, a despeito de todas as semelhanças. Jesus se opôs diretamente à doutrina farisaica da salvação pelas obras, e ensinou com destemor a impropriedade da justiça legalista. Ao mesmo tempo, mostrou a Seu povo um novo caminho que conduz a uma justiça mais elevada. A literatura rabínica dá evidência incontestável de que a religião dos judeus, conforme apresentada pelos rabis, era uma religião em que a redenção era obtida por conta própria. O cristianismo, por outro lado, não está centrado numa coleção particular de verdades éticas e de ensinos, mas em Jesus somente, Sua pessoa e obra. A importância espiritual dos ensinos de Jesus não deve ser medida simplesmente por seus grandes princípios morais. Muitos deles já tinham sido apresentados no AT ou nos dizeres de homens que foram, em diferentes níveis, iluminados pela luz do Céu. Cristo falava como homem algum jamais falou e com uma autoridade que chamava atenção.

A diferença marcante de nosso Senhor é o fato de Ele ser divino, ao passo que os outros mestres eram humanos. Ele não veio apenas para dizer como se deve viver, mas também para dar poder para se viver como ordenou. Ele não veio apenas para mostrar que o pecado é mau e que a justiça é o verdadeiro alvo da vida, mas veio para apagar pecados passados e dar aos seres humanos a justiça que provém do Céu. Isso mestres humanos não poderiam fazer. Na melhor das hipóteses, poderiam apontar aos seres humanos um caminho melhor. Mas Jesus é “o caminho, e a verdade, e a vida” (Jo.14:6). Pelo Pai, Ele tornou-Se para nós “sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção” (1Co.1:30). Jesus é a “verdadeira luz” (Jo.1:9). Ele é a fonte de toda luz verdadeira, não o refletor da luz de outrem (ver com. de Jo.1:9; Jo.5:35). Tudo o que é bom e nobre tem origem nEle e conduz a Ele.

Mt.8:1 1. Ora, descendo ele do monte, grandes multidões o seguiram.

Grandes multidões. [A cura de um leproso, Mt.8:1-4 = Mc.1:40-44 = Lc.5:12-14. Comentário principal: Mc]. O v. 1 conclui a narrativa do Sermão do Monte. Mateus menciona as grandes multidões que acompanhavam Jesus tanto antes (Mt.4:24-25) quanto depois do sermão (Mt.8:1; sobre o contexto cronológico em que outro escritor sinótico menciona as grandes multidões neste período do ministério de Cristo, ver com. de Mc.1:45).

Mt.8:2 2. E eis que um leproso, tendo-se aproximado, adorou-o, dizendo: Senhor, se quiseres, podes purificar-me.

Um leproso. De acordo com Marcos (Mc.1:40-44) e Lucas (Lc.5:12-14) este incidente ocorreu antes do Sermão do Monte. Parece claro que Mateus segue uma disposição temática dos eventos da vida de Jesus, de preferência a uma disposição estritamente cronológica (ver p. 276). Ao que tudo indica, o evento registrado em Mt.8:5-13 aconteceu quase que imediatamente após o Sermão do Monte (ver com. de Lc.7:1), talvez no mesmo dia.

Adorou-O. Do gr. proskuneo, “adorar” ou “prestar homenagem”, ajoelhando-se ou prostrando-se. Apesar de proskuneo ser usado em referência à adoração ao Pai e ao Filho em dezenas de vezes do NT (Mt.4:9-10; Mt.14:33; Jo.4:20-24; Ap.19:10), em poucos casos, como em Mt.18:26, a palavra não indica necessariamente o reconhecimento da divindade (ver também com. de Et.3:2).

Mt.8:3 3. E Jesus, estendendo a mão, tocou-lhe, dizendo: Quero, fica limpo! E imediatamente ele ficou limpo da sua lepra.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:4 4. Disse-lhe, então, Jesus: Olha, não o digas a ninguém, mas vai mostrar-te ao sacerdote e fazer a oferta que Moisés ordenou, para servir de testemunho ao povo.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:5 5. Tendo Jesus entrado em Cafarnaum, apresentou-se-lhe um centurião, implorando:

Entrado em Cafarnaum. [A cura do criado de um centurião, Mt.8:5-13 = Lc.7:1-10. Comentário principal: Lc].

Mt.8:6 6. Senhor, o meu criado jaz em casa, de cama, paralítico, sofrendo horrivelmente.

Sofrendo horrivelmente. Ver com. de Mt.4:24.

Mt.8:7 7. Jesus lhe disse: Eu irei curá-lo.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:8 8. Mas o centurião respondeu: Senhor, não sou digno de que entres em minha casa; mas apenas manda com uma palavra, e o meu rapaz será curado.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:9 9. Pois também eu sou homem sujeito à autoridade, tenho soldados às minhas ordens e digo a este: vai, e ele vai; e a outro: vem, e ele vem; e ao meu servo: faze isto, e ele o faz.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:10 10. Ouvindo isto, admirou-se Jesus e disse aos que o seguiam: Em verdade vos afirmo que nem mesmo em Israel achei fé como esta.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Mt.8:11 11. Digo-vos que muitos virão do Oriente e do Ocidente e tomarão lugares à mesa com Abraão, Isaque e Jacó no reino dos céus.

Muitos virão. Lucas omite de seu relato a declaração de Cristo com respeito à reunião dos gentios (Mt.8:11-12), mas emprega uma declaração similar em outra passagem (ver Lc.13:28-29). A reunião das nações gentílicas era um tema comum nos profetas do AT (ver vol. 4, p. 12-25).

Tomarão lugares. Do gr. anaklino, “reclinar” (sobre hábitos alimentares, ver com. de Mc.2:15). A figura de um banquete é empregada com frequência por escritores bíblicos como símbolo das alegrias do reino messiânico (ver Is.25:6; Lc.13:29; Lc.14:15; Ap.19:9).

Mt.8:12 12. Ao passo que os filhos do reino serão lançados para fora, nas trevas; ali haverá choro e ranger de dentes.

Os filhos do reino. Ver com. de Mt.3:9. A expressão “os filhos do reino” era comum no hebraico para descrever os que tinham direito a herdar o reino.

Nas trevas. Símbolo que representa o aniquilamento final dos impenitentes obstinados.

Choro e ranger de dentes. Mateus registra vários outros casos em que Jesus usou esta expressão para descrever o remorso dos perdidos ao contemplarem seu triste destino em contraste com a alegria que poderiam ter tido (ver Mt.13:42; Mt.13:50; Mt.22:13; Mt.24:51; Mt.25:30). A mesma expressão ocorre com frequência na literatura contemporânea judaica para descrever o Geena (ver com. de Mt.5:22).

Mt.8:13 13. Então, disse Jesus ao centurião: Vai-te, e seja feito conforme a tua fé. E, naquela mesma hora, o servo foi curado.

Naquela mesma hora. Menciona-se com frequência cura imediata (ver Mt.9:22; Mt.15:28; Mt.17:18). Há evidência textual (cf. p. 136) para o acréscimo de “e quando o centurião voltou para sua casa naquela hora encontrou seu servo curado”.

Mt.8:14 14. Tendo Jesus chegado à casa de Pedro, viu a sogra deste acamada e ardendo em febre.

Casa de Pedro. [A cura da sogra de Pedro, Mt.8:14-15 = Mc.1:29-31 = Lc.4:38-39. Comentário principal: Mc].

Mt.8:15 15. Mas Jesus tomou-a pela mão, e a febre a deixou. Ela se levantou e passou a servi-lo.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:16 16. Chegada a tarde, trouxeram-lhe muitos endemoninhados; e ele meramente com a palavra expeliu os espíritos e curou todos os que estavam doentes

Com a Sua palavra (ARC). [Muitas outras curas, Mt.8:16-17 = Mc.1:32-34 = Lc.4:40-41. Comentário principal: Mc]. Ou, “com uma palavra”.

Mt.8:17 17. para que se cumprisse o que fora dito por intermédio do profeta Isaías: Ele mesmo tomou as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças.

Para que se cumprisse. Ver com. de Mt.1:22.

Tomou. Parece que Mateus faz uma paráfrase ou uma tradução livre de Is.53:4. A passagem de Isaías se refere primeiramente às “enfermidades” do pecado, conforme se observa pelo contexto (ver com. de Mt.23:4). Mateus a interpreta num sentido mais literal. Cristo, em Sua humanidade (ver Jo.1:14; Fp.2:6-8), era plenamente capaz de expressar simpatia e realmente sentir o que sentimos e se compadecer de nós.

Carregou. Do gr. bastazo, “levar”, “levantar”. A mesma palavra é usada em Mt.3:11 com relação às sandálias (ver com. de Mt.3:11).

Mt.8:18 18. Vendo Jesus muita gente ao seu redor, ordenou que passassem para a outra margem.

Vendo Jesus. [Jesus põe à prova os que querem segui-Lo, Mt.8:18-22 = Lc.9:57-62. Ver mapa, p. 216; gráfico, p. 228]. Os três evangelhos sinóticos registram o relato da tempestade apaziguada no mar, a cura dos endemoniados gadarenos, da mulher inválida e a ressurreição da filha de Jairo mais ou menos como um grupo de milagres, nessa ordem. Como de costume, o relato em Marcos contém muitos detalhes gráficos não mencionados por Mateus nem por Lucas. O primeiro desses milagres ocorreu na noite seguinte ao sermão de Cristo à beira-mar, no qual Ele ensinou as parábolas registradas em Mt.13. Portanto, cronologicamente, o apaziguamento da tempestade registrado no cap. 8 segue as parábolas registradas no cap. 13. Marcos e Lucas, que seguem uma ordem mais cronológica, apresentam os milagres depois do sermão à beira-mar. Era provavelmente o início do outono de 29 d.C. (ver com. de Lc.7:11), durante a segunda viagem missionária pela Galileia, que esse incidente ocorreu. Cansado e exausto de muitos dias de ministério público extenuante, Jesus atravessou o mar em busca de um breve descanso e distanciamento das multidões que O rodeavam.

Muita gente. Multidões seguiam Jesus aonde quer que fosse (ver Mt.4:25; Mc.3:7; Mc.4:1) e, como resultado disso, Ele frequentemente tinha pouco ou nenhum tempo para comer (ver Mc.3:20; DTN, 333). Enquanto atravessava o mar, vencido pela fraqueza e fome, logo adormeceu (DTN, 334). Ministrar às necessidades físicas e espirituais do povo exigia, mesmo dEle, o desgaste de forças que deviam ser restauradas com descanso e alimento. Foi por essa razão que o Salvador buscou algumas horas de descanso de Seu trabalho incessante.

A outra margem. Isto é, a região de Decápolis, do outro lado da Galileia (ver p. 34), a sudeste do mar da Galileia. Essa região era pouco povoada e, em sua maioria, pagã. Não há registros de que escribas e fariseus tenham seguido Jesus ali.

Mt.8:19 19. Então, aproximando-se dele um escriba, disse-lhe: Mestre, seguir-te-ei para onde quer que fores.

Um escriba. Apesar da semelhança aparente desta passagem com a de Lucas (ver Lc.9:57-62), é quase certo que se referem a duas ocasiões separadas e distintas. Embora Mateus não siga uma sequência estritamente cronológica, inseriu esse relato de dois homens que se ofereceram para serem discípulos de Jesus dentro do relato da travessia do lago (v. Mt.8:18; Mt.8:23-27). Parece que a única conclusão razoável é a de que os dois voluntários se aproximaram de Jesus no final do sermão à beira-mar (ver com. do v. Mt.8:18), enquanto Se preparava para cruzar o lago. O relato similar em Lucas é situado no registro da partida final de Jesus da Galileia para Jerusalém (ver Lc.9:51; Lc.9:57), que precede imediatamente o relato do envio dos setenta às cidades e vilas de Samaria e Pereia (ver Mt.9:62; Mt.10:1) e, portanto, parece estar relacionado a esses eventos. Foi no final do outono de 30 d.C. que Jesus deixou a Galileia a fim de ir para Jerusalém e Pereia (ver com. de Mt.9:51).

Além disso, deve-se notar que Jesus respondeu a Judas com palavras similares às registradas em Mt.8:19-20, quando ele se ofereceu para o discipulado durante o verão de 29 d.C., muitas semanas antes do sermão à beira-mar (ver DTN, 293; SP2, 305, 306; ver com. de Mt.5:1). Devia ser costume de Jesus advertir a todo discípulo voluntário, bem como àqueles que convidou pessoalmente, das provações e dos sacrifícios que acompanhavam o discipulado e, em várias ocasiões, pode ter usado palavras semelhantes às registradas nessa passagem. Há muitas tentativas de se identificar o “escriba” que foi até Jesus, mas, na melhor das hipóteses, não passam de conjecturas (sobre a posição de um escriba no tempo de Jesus, ver com. de Mc.1:22). Como um homem culto, instruído e de elevada posição social, sem dúvida, seria mais difícil para um escriba se acostumar às privações da vida de um discípulo do que para um pescador, por exemplo (ver com. de Mc.2:10).

Mestre. Do gr. didaskalos, “mestre”, “professor” (ver com. de Mt.12:38).

Seguir-Te-ei. Esse escriba se ofereceu como voluntário e pediu para ser discípulo em tempo integral. Do mesmo modo, quando Jesus dizia: “Segue-Me”, estendia um convite ao discipulado em tempo integral (ver com. de Mt.4:19; Mc.2:14). É possível que o escriba fosse um seguidor ocasional, e tivesse visto e ouvido o suficiente para despertar no coração o anseio de estar com o Mestre constantemente e aprender dEle. Porém, parece que era um indivíduo temperamental, mais dado ao impulso do que ao princípio, e que não tinha considerado plenamente o custo do discipulado (ver Lc.14:25-33).

Para onde quer que fores. Comparar com as palavras de Rute a Noemi (Rt.1:16) e de Pedro a Cristo (Lc.22:33). Contudo, no caso do escriba, suas palavras podem não ter significado mais do que a intenção de se tornar um discípulo permanente. Faltava-lhe a fidelidade de Rute, ao passo que refletia a inconstância de Pedro (ver com. de Mc.3:16). O discipulado requer firmeza de propósito e paciência em face da dificuldade e desilusão (ver com. de Lc.9:62).

Mt.8:20 20. Mas Jesus lhe respondeu: As raposas têm seus covis, e as aves do céu, ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça.

Covis. Ou, “tocas”.

Ninhos. Do gr. kataskenoseis, literalmente, “tendas”, daí, “habitações” no sentido de “lugares de descanso” ou de “estada temporária”.

Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51.

Reclinar a cabeça. A fim de cumprir a missão para a qual viera à Terra, Cristo passou a maior parte de Seu ministério transitando de um lugar a outro, não sem um propósito (ver com. de Lc.2:49), mas sem domicílio fixo. Alguém acostumado ao conforto de um lar, como provavelmente era o caso desse escriba, talvez achasse a vida itinerante difícil e desagradável. Testemunhas do evangelho devem estar sempre dispostas a enfrentar dificuldades como bons soldados de Jesus Cristo (ver 2Tm.2:3).

Mt.8:21 21. E outro dos discípulos lhe disse: Senhor, permite-me ir primeiro sepultar meu pai.

Outro. Talvez esse homem tivesse sido um discípulo casual e se propunha a ser aceito como discípulo permanente, em tempo integral. Em contraste com o discípulo dos v. Mt.8:19-20, que tinha a tendência de ser temperamental e agir precipitadamente por impulso, esse homem, a julgar pela resposta que Cristo lhe deu, parecia ser de natureza oposta: lento, letárgico e inclinado a adiar as coisas.

Sepultar meu pai. Com toda probabilidade, o pai ainda gozava de boa saúde e o tempo de sua morte estava num futuro indeterminado. Se o pai desse homem não estava morto, as palavras de Cristo devem ser compreendidas de forma figurada e não literal. É provável que o pedido desse pretenso seguidor fosse também uma desculpa para não seguir a Cristo ou uma tentativa de adiar o tempo quando seria necessário abandonar tudo para segui-Lo (cf. Lc.5:11; Lc.5:28). Se o pai já estivesse morto, é pouco provável que Cristo tivesse ordenado que ele negligenciasse o que, nos países orientais, até hoje se considera um dos deveres mais sagrados de um filho dedicado. Além disso, em lugares de clima quente, o sepultamento se realizava sem demora e, se de fato, o pai desse homem estivesse morto, é pouco provável que o filho estivesse ouvindo a Jesus. É óbvio que tanto o homem quanto Jesus se referiam à morte do pai no futuro. Esse homem tinha excesso de cautela, enquanto o primeiro tinha excesso de entusiasmo. Era como se dissesse a Cristo: “Eu gostaria de Te seguir, mas não posso fazer isso enquanto meu pai viver.” Em resposta, Cristo disse: “Reconheço teu dever para com teus pais, contudo, teu dever para com o reino dos Céus tem prioridade.” As demandas do evangelho transcendem as dos laços familiares, não que os últimos não sejam também importantes, mas sim que não devem se tornar uma desculpa para desconsiderar o chamado de Cristo ao serviço (ver com. de Mc.7:11-12; Lc.14:26).

Mt.8:22 22. Replicou-lhe, porém, Jesus: Segue-me, e deixa aos mortos o sepultar os seus próprios mortos.

Segue-Me. Ver com. de Mc.2:14.

Deixa aos mortos. Esta declaração parece um tanto dura, mas não é o caso, quando compreendida no contexto da época. Conforme observado (ver com. do v. Mt.8:21), estas palavras são em parte figuradas, considerando que o pai com toda probabilidade ainda vivia, e o momento de sua morte estava em um futuro indefinido. É possível que Cristo tenha querido dizer que os mortos espirituais deviam enterrar os mortos literais. No caso desse homem, havia o perigo de que o adiamento o despojasse de suas boas intenções, então, seria melhor que ele rompesse com suas relações anteriores, enquanto os impulsos corretos predominavam. O cristão, em especial aquele que deseja servir na causa de Cristo, deve agir prontamente quando Deus impressionar seu coração (ver At.8:26-27).

Discernindo o caráter desse homem, Cristo lhe apresentou para consideração um quadro da mudança fundamental que deveria ocorrer em sua vida se quisesse ter sucesso no discipulado. Ele teria que dar prioridade ao que era principal e relegar o que não era essencial a um lugar de importância secundária. A resposta de Cristo a seu pedido tinha o propósito de estimulá-lo à ação (ver Lc.9:60). Teria sido inadequado se Cristo tivesse invertido o conselho dado a cada um desses que queriam segui-Lo, pois teria encorajado o escriba a seguir sua inclinação natural de agir sem considerar devidamente o que estava envolvido, e o segundo homem, a adiar a ação em resposta à sua inclinação natural.

Mt.8:23 23. Então, entrando ele no barco, seus discípulos o seguiram.

Então. [Jesus acalma uma tempestade, Mt.8:23-27 = Mc.4:35-41 = Lc.8:22-25, Comentário principal: Mt]. Esta narrativa se inicia no v. Mt.8:18 e é interrompida pelos incidentes registrados nos v. Mt.8:19-22, então continua aqui (ver com. do v. Mt.8:18).

Entrando Ele no barco. Segundo o relato em Marcos, Cristo já estava no pequeno barco de pesca e simplesmente permaneceu ali, sem descer, para despedir o povo (Mt.4:1; Mt.4:36). Porém, dado que Mateus separou de seu contexto a história da tempestade no mar (ver com. de Mt.8:18), aparentemente se faz necessário registrar que Jesus entrou no barco (ver Mt.13:2). É provável que estivesse escurecendo quando os discípulos distanciaram o barco da margem (ver DTN, 334). Sem dúvida, esse era o “barquinho” posto à disposição de Jesus (ver com. de Mc.3:9). Vários outros barcos de pesca deixaram a margem ao mesmo tempo para atravessar o mar com Jesus (ver Mc.4:36).

Mt.8:24 24. E eis que sobreveio no mar uma grande tempestade, de sorte que o barco era varrido pelas ondas. Entretanto, Jesus dormia.

Eis. Ver com. de Mt.3:16.

Tempestade. Do gr. seismos, “tremor”, “comoção”, “tempestade” ou “terremoto”. A palavra sismógrafo provém dessa raiz. Nesse caso, seismos denota a turbulência do mar e a força terrível das rajadas furiosas de vento que agitavam o barco. O mar da Galileia é conhecido por suas tempestades repentinas de grande intensidade. Nesta ocasião, os ventos sopravam sobre as águas do lago desde os vales montanhosos junto à margem oriental (DTN, 334). Porém, a tarde tinha sido calma e os discípulos provavelmente não previram o mau tempo.

Varrido. Literalmente, “sendo coberto” ou “sendo escondido”. O barco estava se enchendo com tanta rapidez que os discípulos perderam a esperança de tirar a água antes que o barco afundasse por completo. Muitos deles eram pescadores experientes que tinham passado a maior parte da vida no mar da Galileia e que sabiam como lidar com um barco numa tempestade. Mas, nessa ocasião, toda experiência e habilidade que tinham não foram suficientes.

Jesus dormia. Apenas nesta passagem se registra que Jesus dormiu. Vencido pelo cansaço e pela fome de um dia extenuante (ver DTN, 333, 334), sem dúvida, Ele adormeceu rapidamente (ver com. de Mt.8:18; Mc.4:38).

Mt.8:25 25. Mas os discípulos vieram acordá-lo, clamando: Senhor, salva-nos! Perecemos!

Acordá-Lo. Os discípulos chamaram Jesus por duas vezes na escuridão, mas suas vozes se perderam no ruído da tempestade. Então a claridade de um repentino relâmpago lhes fez enxergar que Jesus ainda dormia (DTN, 334); então, “chegando-se a Ele, despertaram-No” (Lc.8:24). Assombrados com o fato de Jesus estar dormindo em meio à fúria do vendaval e surpresos pela aparente despreocupação com seus esforços desesperados para salvar o barco e a própria vida, dirigiram-se a Ele com tom de reprovação: “Não Te importa que pereçamos?” (Mc.4:38).

Salva-nos! Perecemos! Isto é, “salva-nos de uma vez; estamos prestes a perecer”. Este bem poderia ser o clamor de alguém que está sendo oprimido pelas tempestades da tentação. Poucos meses depois, Pedro clamaria aterrorizado: “Salva-me, Senhor!” (Mt.14:30), aparentemente esquecido de como Cristo tinha salvado todos eles nesta ocasião.

Mt.8:26 26. Perguntou-lhes, então, Jesus: Por que sois tímidos, homens de pequena fé? E, levantando-se, repreendeu os ventos e o mar; e fez-se grande bonança.

Homens de pequena fé. Embora os discípulos tivessem visto muitas evidências maravilhosas do poder divino, parece que, antes disso, Jesus não tinha demonstrado controle sobre as forças da natureza, e pode não ter lhes ocorrido que Ele pudesse fazer isso.

Grande bonança. A tempestade findou tão rapidamente quanto havia começado. Sem dúvida, o silêncio da natureza foi tão notável e impressionante quanto a inesperada fúria do vento e das ondas.

Mt.8:27 27. E maravilharam-se os homens, dizendo: Quem é este que até os ventos e o mar lhe obedecem?

Até os ventos. Isto é, além de poder para curar qualquer enfermidade, e até mesmo sobre a morte, Cristo tinha também poder sobre o vento e o mar. Parece que “maravilharam-se” de que as forças da natureza também se submetessem à vontade de Jesus. Eles foram testemunhas oculares do que aconteceu (ver Lc.1:2; 1Jo.1:1-2) e jamais pensaram, nem por um momento, em negar o que viram. Cristo ordenou e os elementos Lhe obedeceram. Hoje em dia, pessoas que se consideram sábias afirmam que isso foi mera coincidência, que a tempestade estava prestes a findar de qualquer forma e que Jesus falou assim que a fúria do vento já tinha começado a parar. Quem sabe eles poderiam repetir essa “mera coincidência”, sem omitir nenhum detalhe registrado no relato bíblico! Toda vez que Cristo realizava um milagre Sua reputação estava em jogo. Supondo que tivesse falhado uma vez sequer, como os discípulos falharam pelo menos em uma ocasião (ver Mt.17:16-20), o que as pessoas de Sua época e as de hoje pensariam? Assim como Cristo acalmou os ventos e as ondas da Galileia, Ele é capaz de acalmar as tempestades da vida que com tanta frequência caem de forma inesperada e com violência sobre a vida humana. Muitas vezes, a razão de não experimentarmos Seu poder em nossa vida é que somos “tímidos” e temos “pequena fé”.

Mt.8:28 28. Tendo ele chegado à outra margem, à terra dos gadarenos, vieram-lhe ao encontro dois endemoninhados, saindo dentre os sepulcros, e a tal ponto furiosos, que ninguém podia passar por aquele caminho.

Tendo Ele chegado. [A cura de dois endemoniados gadarenos, Mt.8:28-34 = Mc.5:1-20 = Lc.8:26-39. Comentário principal: Mc].

Mt.8:29 29. E eis que gritaram: Que temos nós contigo, ó Filho de Deus! Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo?

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:30 30. Ora, andava pastando, não longe deles, uma grande manada de porcos.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:31 31. Então, os demônios lhe rogavam: Se nos expeles, manda-nos para a manada de porcos.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:32 32. Pois ide, ordenou-lhes Jesus. E eles, saindo, passaram para os porcos; e eis que toda a manada se precipitou, despenhadeiro abaixo, para dentro do mar, e nas águas pereceram.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:33 33. Fugiram os porqueiros e, chegando à cidade, contaram todas estas coisas e o que acontecera aos endemoninhados.

Sem comentário para este versículo.

Mt.8:34 34. Então, a cidade toda saiu para encontrar-se com Jesus; e, vendo-o, lhe rogaram que se retirasse da terra deles.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:1 1. Entrando Jesus num barco, passou para o outro lado e foi para a sua própria cidade.

Entrando Jesus num barco. [A cura de um paralítico em Cafarnaum, Mt.9:1-8 = Mc.2:1-12 = Lc.5:17-26. Comentário principal: Mc]. Mateus 9:1 conclui a narrativa dos dois endemoniados de Gadara (Mt.8:28-9:1; ver com. de Mc.5:21). A divisão do capítulo deveria estar entre os v. 1 e 2 de Mateus 9.

Sua própria cidade. Isto é, Cafarnaum (ver com. de Mc.1:29).

Mt.9:2 2. E eis que lhe trouxeram um paralítico deitado num leito. Vendo-lhes a fé, Jesus disse ao paralítico: Tem bom ânimo, filho; estão perdoados os teus pecados.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:3 3. Mas alguns escribas diziam consigo: Este blasfema.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:4 4. Jesus, porém, conhecendo-lhes os pensamentos, disse: Por que cogitais o mal no vosso coração?

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:5 5. Pois qual é mais fácil? Dizer: Estão perdoados os teus pecados, ou dizer: Levanta-te e anda?

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:6 6. Ora, para que saibais que o Filho do Homem tem sobre a terra autoridade para perdoar pecados - disse, então, ao paralítico: Levanta-te, toma o teu leito e vai para tua casa.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:7 7. E, levantando-se, partiu para sua casa.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:8 8. Vendo isto, as multidões, possuídas de temor, glorificaram a Deus, que dera tal autoridade aos homens.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:9 9. Partindo Jesus dali, viu um homem chamado Mateus sentado na coletoria e disse-lhe: Segue-me! Ele se levantou e o seguiu.

Mateus. [A vocação de Mateus, Mt.9:9 = Mc.2:13-14 = Lc.5:27-28. Comentário principal: Mc].

Mt.9:10 10. E sucedeu que, estando ele em casa, à mesa, muitos publicanos e pecadores vieram e tomaram lugares com Jesus e seus discípulos.

A mesa. [Jesus come com pecadores, Mt.9:10-13 = Mc.2:15-17 = Lc.5:29-32. Comentário principal: Mc].

Mt.9:11 11. Ora, vendo isto, os fariseus perguntavam aos discípulos: Por que come o vosso Mestre com os publicanos e pecadores?

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:12 12. Mas Jesus, ouvindo, disse: Os sãos não precisam de médico, e sim os doentes.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:13 13. Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero e não holocaustos; pois não vim chamar justos, e sim pecadores [ao arrependimento].

Ide, porém, e aprendei. É provável que os escribas e fariseus não estivessem com seus rolos das escrituras e teriam que voltar à sinagoga ou a suas casas para estudar o tema que Cristo lhes sugeriu.

Misericórdia quero. Ou, “misericórdia desejo” (ver Os.6:6). Conforme empregado aqui, “misericórdia” pode significar caráter, isto é, os traços de caráter que Deus gostaria que Seu povo refletisse (ver com. de Mt.19:19; Mt.22:39). Do mesmo modo, “sacrifício” representa as formas de religião, que têm uma infeliz tendência a obscurecer a religião prática (ver 2Tm.3:5). Nesse sentido, “misericórdia” representa justiça pela fé e “sacrifício”, justiça pelas obras. As formas de religião sem o espírito vital da religião, diz Cristo, são inúteis (ver com. de Mc.7:7-9; Mc.7:13; Jo.4:23-24). Deus não ordenou o sistema cerimonial judaico porque em si representasse Seu ideal de vida religiosa. Em si, os sacrifícios antigos não tinham valor (ver Hb.9:9; Hb.10:1-11). O Senhor não Se agrada de formas externas somente (ver Mq.6:7). O que Deus requer é “que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus” (Mq.6:8). “Obedecer” sempre foi “melhor do que o sacrificar” (1Sm.15:22; ver com. de Mt.7:21-27; Mc.7:7-9).

Mt.9:14 14. Vieram, depois, os discípulos de João e lhe perguntaram: Por que jejuamos nós, e os fariseus [muitas vezes], e teus discípulos não jejuam?

Os discípulos de João. [Do jejum, Mt.9:14-17 = Mc.2:18-22 = Lc.5:33-39. Comentário principal: Mc].

Mt.9:15 15. Respondeu-lhes Jesus: Podem, acaso, estar tristes os convidados para o casamento, enquanto o noivo está com eles? Dias virão, contudo, em que lhes será tirado o noivo, e nesses dias hão de jejuar.

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Mt.9:16 16. Ninguém põe remendo de pano novo em veste velha; porque o remendo tira parte da veste, e fica maior a rotura.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:17 17. Nem se põe vinho novo em odres velhos; do contrário, rompem-se os odres, derrama-se o vinho, e os odres se perdem. Mas põe-se vinho novo em odres novos, e ambos se conservam.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:18 18. Enquanto estas coisas lhes dizia, eis que um chefe, aproximando-se, o adorou e disse: Minha filha faleceu agora mesmo; mas vem, impõe a mão sobre ela, e viverá.

Enquanto estas coisas lhes dizia. [O pedido de um chefe; A cura de uma mulher enferma, Mt.9:18-26 = Mc.5:21-43 = Lc.8:40-56. Comentário principal: Mc]. Mateus afirma que, durante o diálogo registrado nos v. Mt.9:14-17, Jairo (ver Mc.5:22) foi até Cristo. Isso junto à afirmação do livro O Desejado de Todas as Nações, p. 342, que diz que Jairo encontrou Cristo na casa de Mateus, deixa claro que há uma relação cronológica estreita entre o banquete na casa de Mateus, o protesto dos fariseus sobre Cristo comer com “publicanos e pecadores”, a questão do jejum e a ressurreição da filha de Jairo.

Faleceu agora mesmo. A partir da narrativa contida em Marcos (ver Mc.5:23; Mc.5:35) e Lucas (ver Lc.8:42; Lc.8:49) fica evidente que a menina não estava morta quando Jairo fez o pedido, mas estava agonizando, e morreria caso Cristo não interviesse. A declaração de Mateus não está em desarmonia com as de Marcos e Lucas. Não é possível dizer se o pai sabia da ressurreição do filho da viúva em Naim, que tinha ocorrido pouco antes disso (ver com. de Lc.7:11). É bem provável que ele tivesse ouvido o relato.

Mt.9:19 19. E Jesus, levantando-se, o seguia, e também os seus discípulos.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:20 20. E eis que uma mulher, que durante doze anos vinha padecendo de uma hemorragia, veio por trás dele e lhe tocou na orla da veste

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:21 21. porque dizia consigo mesma: Se eu apenas lhe tocar a veste, ficarei curada.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:22 22. E Jesus, voltando-se e vendo-a, disse: Tem bom ânimo, filha, a tua fé te salvou. E, desde aquele instante, a mulher ficou sã.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:23 23. Tendo Jesus chegado à casa do chefe e vendo os tocadores de flauta e o povo em alvoroço, disse:

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:24 24. Retirai-vos, porque não está morta a menina, mas dorme. E riam-se dele.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:25 25. Mas, afastado o povo, entrou Jesus, tomou a menina pela mão, e ela se levantou.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:26 26. E a fama deste acontecimento correu por toda aquela terra.

Sem comentário para este versículo.

Mt.9:27 27. Partindo Jesus dali, seguiram-no dois cegos, clamando: Tem compaixão de nós, Filho de Davi!

Dois cegos. [A cura de dois cegos, Mt.9:27-31. Ver Mc.8:22-26; Mc.10:46-52. Ver mapa, p. 220; sobre os milagres, ver p. 204- 210]. Este milagre, provavelmente, tenha ocorrido em Cafarnaum durante o outono de 29 d.C. A cura em Betsaida (ver Mc.8:22-26) aconteceu cerca de um ano depois e a de Bartimeu, em Jericó (ver Mc.10:46-52), mais de um ano e meio depois. Desde antigamente, a cegueira, muitas vezes causada por tracoma, é comum nas terras bíblicas.

Filho de Davi. O uso desta expressão indica que o cego reconhecia Jesus como o Messias (ver com. de Mt.1:1).

Mt.9:28 28. Tendo ele entrado em casa, aproximaram-se os cegos, e Jesus lhes perguntou: Credes que eu posso fazer isso? Responderam-lhe: Sim, Senhor!

Quando chegou à casa (ARC). Embora não esteja especificado, pode ter sido a casa de Pedro. O uso do artigo definido indica que era uma casa específica, talvez a que o próprio Jesus morava enquanto esteve em Cafarnaum (ver com. de Mc.1:29). Não se menciona a razão de Jesus não ter curado os cegos na rua.

Credes. Se os cegos não tivessem exercido fé, Cristo não teria exercido Seu poder em favor deles. A fé humana deve surgir para se encontrar e se unir com o poder de Deus a fim de que as bênçãos, físicas ou espirituais, sejam dadas e recebidas (ver Hb.11:6).

Mt.9:29 29. Então, lhes tocou os olhos, dizendo: Faça-se-vos conforme a vossa fé.

Então, lhes tocou. Sobre o significado e o propósito do toque de cura, ver com. de Mc.1:31.

Mt.9:30 30. E abriram-se-lhes os olhos. Jesus, porém, os advertiu severamente, dizendo: Acautelai-vos de que ninguém o saiba.

Porém, os advertiu severamente. Isto é, Jesus lhes ordenou com rigor. Sem dúvida, isso se refere à dura expressão no semblante e na voz de Jesus. Quanto ao propósito de Cristo em proibir a divulgação de alguns milagres, ver com. de Mc.1:43.

Mt.9:31 31. Saindo eles, porém, divulgaram-lhe a fama por toda aquela terra.

Divulgaram-Lhe. Comparar com o caso do leproso que desobedeceu à mesma ordem (ver com. de Mc.1:45).

Mt.9:32 32. Ao retirarem-se eles, foi-lhe trazido um mudo endemoninhado.

Ao retirarem-se. [A cura de um mudo endemoniado. A blasfêmia dos fariseus, Mt.9:32-34. Ver mapa, p. 220; sobre os milagres, ver p. 204-210]. O plural refere-se aos dois cegos que tinham acabado de ser curados, talvez na casa de Pedro (ver com. do v. Mt.9:28), e que estavam saindo no exato momento em que esse endemoniado foi levado até Jesus.

Foi-Lhe trazido. Quando uma pessoa é impedida de ir até Jesus por falta de habilidade ou de fé para a cura física ou espiritual, é bem-aventurada se tem alguém que se preocupa com ela o suficiente para levá-la a Jesus (cf. Mc.2:2-3).

Um mudo. Do gr. kophos, “apagado” (ver com. de Lc.1:22). Usado como substantivo, kophos podia significar tanto “mudo” como “surdo”, dependendo do contexto.

Endemoninhado. Sobre possessão demoníaca nos tempos bíblicos, ver com. de Mc.1:23.

Mt.9:33 33. E, expelido o demônio, falou o mudo; e as multidões se admiravam, dizendo: Jamais se viu tal coisa em Israel!

Falou o mudo. Esta era a evidência tangível de cura. Este foi o último milagre registrado em vários meses, sendo que o próximo foi o de alimentar 5 mil na primavera seguinte. Não se diz se Jesus se retirou a algum lugar no inverno, após a segunda viagem pela Galileia. A agitação popular provocada pelos muitos milagres tendia a obscurecer o principal objetivo de Cristo ao realizá-los: a propagação do reino dos céus no coração e na vida do ser humano.

Mt.9:34 34. Mas os fariseus murmuravam: Pelo maioral dos demônios é que expele os demônios.

Os fariseus murmuravam. Ver com. de Mt.12:24. Talvez desesperados para silenciar a Cristo ou colocar o povo contra Ele, os fariseus tentaram fazer com que cressem que Seu poder para realizar milagres era evidência de que Cristo estava unido com Satanás. O fato de Mateus não registrar resposta da parte de Jesus sugere a possibilidade de que os fariseus não tenham afirmado isso em Sua presença, mas sim entre o povo.

Mt.9:35 35. E percorria Jesus todas as cidades e povoados, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e enfermidades.

Percorria Jesus. [Jesus ia por toda parte fazendo o bem. A seara e os trabalhadores, Mt.9:35-38 = Lc.8:1-3. Comentário principal: Lc]. Visto que Mt.9:36 inicia a seção que trata da instrução de Cristo aos doze em preparação para a terceira viagem pela Galileia e que a seção termina com uma declaração da atividade de Cristo durante o tempo em que os doze percorriam as cidades e vilas dali (Mt.11:1), é provável que Mt.9:35 seja um resumo da segunda viagem pela Galileia. Mateus faz algo similar com relação à primeira viagem pela Galileia (ver com. de Mt.4:23).

Todas as cidades e povoados. Uma hipérbole hebraica comum. Tendo em vista que havia cerca de 200 vilas na Galileia (ver com. de Lc.8:1), teria sido difícil, ou mesmo impossível, para Jesus visitar todas durante seu breve ministério ali de pouco mais de um ano.

Ensinando. Sobre o ensino de Jesus na sinagoga, ver com. de Mc.1:39; Lc.4:15-16.

Sinagogas. Ver p. 44-46.

O evangelho do reino. Ver com. de Mc.1:1.

Toda sorte de doenças. Ver com. de Mt.4:23. Aos discípulos também foi dado esse poder quando Cristo os enviou para pregar (Mt.10:1).

Entre o povo (ARC). A evidência textual favorece (cf. p. 136) a omissão destas palavras aqui e sua inclusão em Mt.4:23.

Mt.9:36 36. Vendo ele as multidões, compadeceu-se delas, porque estavam aflitas e exaustas como ovelhas que não têm pastor.

Vendo Ele as multidões. Assim Mateus inicia seu relato da terceira viagem pela Galileia, realizada durante o inverno de 29-30 d.C. (ver DTN, 359, 364; ver com. de Mc.1:39). Pouco se fala sobre os eventos ocorridos na viagem. Quase toda a narrativa trata da instrução de Cristo aos doze em preparação para enviá-los a pregar. Não se registra nenhum incidente em particular do qual os discípulos tenham participado e a única experiência registrada de Cristo é sua segunda visita a Nazaré (Mt.13:54-58; sobre a relação da terceira viagem com as duas anteriores, ver com. de Mc.1:39). Na terceira viagem, os doze deveriam ir de dois em dois e aplicar os princípios observados no ministério de Jesus. Enquanto os doze saíram para pregar, o próprio Jesus também saiu, acompanhado por muitos outros discípulos (ver Lc.10:1; cf. DTN, 488). A referência às “multidões” é outra razão para o envio dos doze: as demandas sobre Cristo durante a segunda viagem deixou claro que os “trabalhadores” eram bem “poucos” (ver Mt.9:37). A terceira viagem marcou uma extensão importante do ministério de Cristo (ver DTN, 395).

Aflitas. Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a variante “cansadas” ou “abatidas”.

Exaustas. Do gr. rhipto, “lançar abaixo”, “arremessar” ou “deixar prostrado”. Aparentemente, o povo como um todo se sentia tão abandonado que não mais se esforçava para melhorar sua condição religiosa. Não tinha mais esperança. A palavra rhipto não se refere tanto à dispersão (ver KJV) das “ovelhas”, mas à sua condição de abandono.

Que não têm pastor. Ver Nm.27:17; 1Rs.22:17; Ez.34:5. Os encarregados dos rebanhos nos dias de Cristo não passavam de assalariados (ver Jo.10:12-13). Quando o Bom Pastor veio ao mundo, encontrou Suas ovelhas dispersas.

Mt.9:37 37. E, então, se dirigiu a seus discípulos: A seara, na verdade, é grande, mas os trabalhadores são poucos.

Então, Se dirigiu a Seus discípulos. O que Cristo diz (v. 37, 38) aos doze nesta ocasião é quase idêntico ao que falou, mais tarde, aos setenta, em circunstâncias similares (Lc.10:2; ver com. de Mc.2:10).

Seara. Empregava-se a figura da colheita, com frequência, como símbolo do grande juízo final (ver Mt.3:10; Mt.3:12; Mt.13:30; Mt.13:39). Mais de um ano antes, Jesus tinha usado a figura da colheita em relação ao Seu ministério com os samaritanos de Sicar (ver Jo.4:35-38).

Os trabalhadores são poucos. Quando há poucos trabalhadores para uma colheita abundante, muito grão bom inevitavelmente se perde. Até então, apenas um grupo de trabalhadores havia estado no campo colhendo grãos para o reino dos céus, e ficou claro que, a menos que planos maiores fossem traçados, boa parte da colheita, mesmo na pequena região da Galileia, jamais poderia ser reunida.

Mt.9:38 38. Rogai, pois, ao Senhor da seara que mande trabalhadores para a sua seara.

Rogai, pois. A oração para o Senhor da colheita não indica que Ele não Se preocupava ou não sabia da necessidade de mais trabalhadores. Os doze deviam orar por isso a fim de que o Senhor da colheita tivesse uma oportunidade de trazer ao coração deles a convicção de sua responsabilidade pessoal de satisfazer essa necessidade. O propósito da oração não é informar a Deus aquilo que de outra forma não saberia, nem insistir com Ele para que faça o que de outro modo não faria, mas sim condicionar nosso coração e nossa mente a cooperar com Ele. Sem dúvida, Cristo conduziu os discípulos em oração para enfatizar essa necessidade urgente, sentida claramente por todos os membros do grupo. Eles deviam orar e então sair com fé para cooperar com Deus na resposta a suas próprias orações (ver com. de Mt.10:10).

Mande. Aqui se expressa a urgência com que o “Senhor da colheita” deveria enviar trabalhadores dispostos.

Mt.10:1 1. Tendo chamado os seus doze discípulos, deu-lhes Jesus autoridade sobre espíritos imundos para os expelir e para curar toda sorte de doenças e enfermidades.

Tendo chamado. [Terceira viagem pela Galileia: A escolha dos doze apóstolos. Os seus nomes, Mt.10:1-4 = Mc.3:13-19 = Lc.6:12-16. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 217; gráfico, p. 228]. O relato do envio dos doze começa em Mt.9:36 (ver com. ali). A instrução dada nesta passagem consiste essencialmente de duas partes: conselhos que se aplicavam em particular à jornada missionária que se realizaria em seguida (Mt.10:5-15) e conselhos de natureza mais geral a todos que se envolvem no serviço de Cristo e de Seu reino (v. Mt.10:16-42; ver DTN, 352; ver com. de Mt.24:3).

Seus doze discípulos. Esta é a primeira vez que Mateus menciona os doze, por nome ou como um grupo. Com a expressão “Seus doze discípulos” fica claro que Mateus reconhece que os doze já existiam como um grupo oficial antes da terceira viagem pela Galileia. Deve-se notar que Mateus não diz que os doze foram apontados como apóstolos nesse momento, mas, simplesmente, que Jesus os chamou antes de enviá-los a pregar e curar.

Autoridade. Do gr. exousia (ver com. de Lc.1:35). Os doze receberam autoridade tanto para realizar milagres como para “pregar” o evangelho do reino (Mt.10:7). Antes disso, parece que os discípulos tinham apenas ajudado Jesus e não tinham realizado milagres, nem ensinado em público (ver DTN, 349).

Doenças. Ver com. de Mt.4:23.

Mt.10:2 2. Ora, os nomes dos doze apóstolos são estes: primeiro, Simão, por sobrenome Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão

Os nomes. Sobre os nomes de cada um dos doze, ver com. de Mc.3:16-19.

Apóstolos. Literalmente, “os enviados”. Sobre a indicação dos doze como “apóstolos” ver com. de Mc.3:13-19.

Mt.10:3 3. Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu

Lebeu, apelidado Tadeu (ARC). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a variante “Tadeu” ou “Tadeu, apelidado Lebeu” (ver com. de Mc.3:18).

Mt.10:4 4. Simão, o Zelote, e Judas Iscariotes, que foi quem o traiu.

Simão Cananeu (AA). O termo traduzido como “Cananeu” significa “o Zelote” (ARA) e não tem relação com a terra de Canaã (ver com. de Mc.3:18).

Mt.10:5 5. A estes doze enviou Jesus, dando-lhes as seguintes instruções: Não tomeis rumo aos gentios, nem entreis em cidade de samaritanos

A estes doze. [As instruções para os doze, Mt.10:5-42 = Mc.6:7-11 = Lc.9:1-5; Comentário principal: Mt]. Os doze, que até então tinham auxiliado Jesus em Seu ministério (ver DTN, 349), seriam enviados sozinhos a trabalhar. Tinham sido apontados como discípulos durante o verão de 29 d.C. (ver com. de Mt.5:1), seis meses antes (ver com. de Mt.9:36). Pedro, André, Tiago e João foram chamados para o discipulado na primavera de 29 d.C. (ver com. de Lc.5:1). Excetuando-se Tiago, Filipe e Bartolomeu, três deles haviam sido discípulos ocasionais desde o final do outono de 27 d.C. (ver com. de Jo.1:35-45). Os doze tinham estado com Jesus na segunda viagem pela Galileia, provavelmente no final do verão ou início do outono de 29 d.C. (ver com. de Mt.9:35; Lc.8:1). Portanto, tiveram a oportunidade de observar os métodos de Cristo, ouvir Seus ensinos e as instruções que, algumas vezes, lhes dava em particular. Quando os doze foram enviados sozinhos, foram de dois em dois (ver Mc.6:7; ver com. de Mt.3:14), irmão com irmão e amigo com amigo (DTN, 350).

Rumo aos gentios. Ou, “o caminho dos gentios”, isto é, qualquer estrada que conduzisse a uma comunidade na qual predominassem gentios. Por exemplo, os doze não deveriam visitar nenhuma das cidades de Decápolis, onde a maior parte da população era gentílica. É provável que o motivo dessa restrição fosse que Jesus não quisesse fazer nada que suscitasse desnecessariamente o preconceito contra Ele enquanto houvesse oportunidade de trabalhar pelos judeus. Além disso, os próprios discípulos não estavam preparados para trabalhar pelos vizinhos gentios e o preconceito que compartilhavam com todos os judeus contra os gentios, sem dúvida, teria efetivamente frustrado seus esforços, ainda que de forma involuntária. Essa proibição não foi imposta aos setenta quando foram enviados cerca de um ano depois; pelo contrário, eles iniciaram sua obra entre os samaritanos (ver DTN, 488). Naquele tempo, a situação tinha mudado. O próprio Jesus, que fora rejeitado pelo povo da Galileia, trabalhou em favor dos samaritanos e gentios; além disso, instruiu os discípulos a fazerem o mesmo (ver Mt.28:19-20; At.1:8).

Cidade de samaritanos. Sobre os samaritanos, ver p. 3, 4, 32. Na fonte de Jacó, Jesus tomou a iniciativa de estender aos samaritanos de Sicar o convite a crer nEle como o Messias (ver Jo.4:4-42). Contudo, até o momento, não há registros de nenhum outro ministério de Jesus em favor dos samaritanos. Uma última restrição quanto ao território que os doze deveriam ir foi que visitassem apenas as cidades e vilas onde Cristo já tinha estado (DTN, 351).

Mt.10:6 6. mas, de preferência, procurai as ovelhas perdidas da casa de Israel

Ovelhas perdidas. O Israel do AT muitas vezes foi retratado como ovelhas, e seus líderes, como pastores (ver Ez.34:2-16). Em Je.50:6, Deus fala de Seu povo como “ovelhas perdidas”. Isaías fala daqueles que pecaram como ovelhas desgarradas que se desviaram (Is.53:6). Jesus Se apresentou como o Pastor e, aqueles que ouvem Sua voz, chamou de ovelhas de Seu aprisco (ver Jo.10:1-16). Era necessário que a palavra de Deus fosse pregada, em primeiro lugar, aos judeus. Somente depois de a terem rejeitado é que Cristo e os apóstolos se voltaram aos gentios (ver At.13:46; At.18:6; At.28:28). Cristo destacou esse fato fundamental diante dos líderes judeus em Seu último dia de ensino no templo, na parábola dos lavradores maus (ver Mt.21:41; Mt.21:43).

Mt.10:7 7. e, à medida que seguirdes, pregai que está próximo o reino dos céus.

Pregai. Do gr. kerusso, “anunciar”, “proclamar” (ver DTN, 352).

Reino dos céus. Ver com. de Mt.4:17.

Mt.10:8 8. Curai enfermos, ressuscitai mortos, purificai leprosos, expeli demônios; de graça recebestes, de graça dai.

Curai enfermos. Cristo enumera os vários tipos de milagres que os discípulos tantas vezes O tinham visto realizar. Eles fariam tudo o que Ele havia feito. Demônios e até mesmo a morte se submeteriam a eles.

De graça recebestes. Simão, o mágico, tentou comprar poder divino (At.8:18-24), mas aprendeu que os dons de Deus não podem ser adquiridos com dinheiro. A água da vida deve ser tomada de graça por aqueles que a desejam (ver Ap.22:17). Os discípulos não deveriam ter lucro algum com a pregação do evangelho, porém, ao mesmo tempo, deviam recordar que “digno é o trabalhador do seu alimento” (ver com. de Mt.10:10).

Mt.10:9 9. Não vos provereis de ouro, nem de prata, nem de cobre nos vossos cintos

Provereis. Do gr. ktaomai, “buscar [para si]” ou “adquirir [para si]”. Eles deviam partir com fé, confiando que suas necessidades seriam supridas. Assim sendo, seus preparativos seriam simples e não haveria nada para distraí-los de sua tarefa. Deviam aceitar a hospitalidade que lhes fosse oferecida ao longo da viagem (ver v. Mt.10:10-13), mas não deviam esperar ou aceitar dons em excesso para suas necessidades imediatas. Em outras palavras, não deviam obter lucro de seu ministério.

Cobre. Ou, “bronze” (ver com. de Ex.25:3).

Cintos. Do gr. zone, “cinto” ou “faixa”, usado para atar o “manto” (do gr. himation), ou a veste exterior, ao redor do corpo (ver com. de Mt.5:40). Povos antigos costumavam carregar dinheiro nesse cinto ou faixa.

Mt.10:10 10. nem de alforje para o caminho, nem de duas túnicas, nem de sandálias, nem de bordão; porque digno é o trabalhador do seu alimento.

Alforje. Do gr. pera, “um saco de couro” ou “uma mochila”; em geral, usada por viajantes para levar alimento ou vestimenta.

Túnicas. Do gr. chitones, “túnicas” ou vestes interiores (ver com. de Mt.5:40). Os discípulos deviam levar apenas as vestes que usavam. Deviam se vestir como os lavradores comuns, entre os quais deviam trabalhar e ser um com eles. Assim, seu trabalho seria mais eficaz.

Sandálias. Em Mc.6:9, se diz que os discípulos deviam usar sandálias nessa viagem. O que Mateus parece indicar é que não deveriam carregar consigo um par extra (ver Lc.10:4).

Bordão. Na passagem paralela em Mc.6:8, eles são instruídos a não levarem nada além de um bordão (ver com. do v. Mt.10:9). É provável que Mateus quisesse dizer com isso que o discípulo que não tivesse um bordão não deveria considerar necessário levar um.

Trabalhador. Ou, “lavrador”. Os próprios discípulos eram os “trabalhadores” que deveriam orar ao Senhor para que enviasse trabalhadores (ver Mt.9:38).

Alimento. Do gr. trophe, “alimento” ou “sustento” (ver com. de Mt.3:4). No relato das instruções aos setenta (Lc.10:7), Lucas usa misthos, “salário” (comparar com 1Tm.5:18).

Mt.10:11 11. E, em qualquer cidade ou povoado em que entrardes, indagai quem neles é digno; e aí ficai até vos retirardes.

Quem neles é digno. Isto é, alguém que é estimado e respeitado por seus concidadãos. Habitar com pessoas dignas teria várias vantagens, uma delas é que isso inspiraria confiança da parte de outros da cidade.

Aí ficai. As instruções aos setenta especificamente os proibia de ir “de casa em casa” (Lc.10:7), isto é, não deviam aceitar hospedagem em várias casas enquanto estivessem numa cidade ou vila (ver DTN, 351), pois isso interferiria na missão. O povo poderia considerar que se mudar “de casa em casa” era indício de que os primeiros anfitriões não tinham recebido bem os mensageiros nem a mensagem e que não mais desejavam ter qualquer relação com eles. Hospedar-se num mesmo lugar indicaria estabilidade e seriedade.

Mt.10:12 12. Ao entrardes na casa, saudai-a

Ao entrardes. Deviam saudar assim que entrassem na casa. Embora essa instrução se aplicasse de forma especial à casa na qual os discípulos se hospedariam, incluía todas as casas visitadas durante o trabalho ali. Os discípulos deviam trabalhar de casa em casa e, por enquanto, não deviam realizar um ministério público nas sinagogas.

Saudai-a. Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a saudação: “Que a paz esteja nesta casa” (NTLH).

Mt.10:13 13. se, com efeito, a casa for digna, venha sobre ela a vossa paz; se, porém, não o for, torne para vós outros a vossa paz.

Se [...] a casa for digna. Isto é, se o lar manifestar hospitalidade pela prontidão em recebê-los.

Venha sobre ela a vossa paz. Em outras palavras, a bênção proferida ao entrarem (ver com. do v. Mt.10:12) devia ser confirmada pela presença dos discípulos no lar e o modo como fossem recebidos ali. Do contrário, a casa de forma alguma se beneficiaria das palavras pronunciadas.

Mt.10:14 14. Se alguém não vos receber, nem ouvir as vossas palavras, ao sairdes daquela casa ou daquela cidade, sacudi o pó dos vossos pés.

Sacudi o pó. Os discípulos não deviam perder tempo onde não fossem bem recebidos, mas deviam se apressar para encontrar os que os receberiam com alegria. Esse ato após se retirar de uma casa ou cidade servia como um protesto solene, não um ato rude. Ao sacudir a poeira de seus pés, os discípulos estavam simplesmente dizendo às pessoas que deviam aceitar a responsabilidade por sua decisão.

Mt.10:15 15. Em verdade vos digo que menos rigor haverá para Sodoma e Gomorra, no Dia do Juízo, do que para aquela cidade.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Menos rigor. Sodoma e Gomorra não tiveram a oportunidade de ter o ministério pessoal de Cristo, como a Galileia e a Judeia. As pessoas são responsáveis diante de Deus por toda a luz da verdade que tiveram, pois serão julgadas mediante isso (ver Sl.87:4; Sl.87:6; Tg.4:17; ver com. de Jo.15:22; Jo.15:24).

Sodoma. Sobre o pecado e a punição de Sodoma e Gomorra, ver com. de Gn.18:17-23; Gn.19:1-27. Sodoma e seu destino se tornaram símbolo de apostasia e do juízo divino (ver Is.1:9; Ez.16:48-50). Cristo a citou nessa perspectiva em várias ocasiões (ver Mt.11:23-24; Lc.10:12; Lc.17:29-30), da mesma forma que os autores das epístolas o fizeram (ver Rm.9:29; 2Pe.2:6; Jd.7; Ap.11:8).

Dia do Juízo. Ver com. de Mt.3:12.

Mt.10:16 16. Eis que eu vos envio como ovelhas para o meio de lobos; sede, portanto, prudentes como as serpentes e símplices como as pombas.

Eis. Ao concluir a exortação aos doze com respeito aos pontos particularmente aplicáveis à missão que estava diante deles (v. Mt.10:5-15), Jesus Se voltou aos problemas de natureza mais geral e deu instruções aplicáveis aos obreiros cristãos até o fim dos tempos (v. Mt.10:16-42; ver DTN, 352).

Como ovelhas. Ver com. do v. Mt.10:6. Os obreiros de Cristo devem mostrar certos traços característicos de ovelhas, em especial, a gentileza no trato com os demais.

Prudentes como as serpentes. Obreiros evangélicos devem estar alerta, ser rápidos para agir, quando há oportunidade, aperceberem-se dos perigos e das dificuldades que podem implicar um dado curso de ação. Devem ser prudentes na conduta e no modo de lidar com situações difíceis. Devem ser capazes de enxergar através das astúcias dos ímpios, sem praticar eles mesmos esses ardis. Porém, há certos traços característicos da serpente que não devem imitar, assim como algumas características da ovelha. Devem ser cautelosos como a serpente, mas não imitar sua astúcia.

Símplices. Do gr. akeraios, “sem mistura”, portanto, “puro” ou “inocente”. O obreiro cristão deve ser cauteloso como uma serpente e, ao mesmo tempo, inocente como uma pomba.

Mt.10:17 17. E acautelai-vos dos homens; porque vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão nas suas sinagogas

Acautelai-vos. Do gr. prosecho, “prestar atenção”. Cristo apresenta um exemplo concreto da cautela que deveria caracterizar o trabalho do obreiro cristão. Ele deve se acautelar dos homens, isto é, de homens cujos pensamentos não são guiados pelo Espírito Santo, pois estes respondem em maior ou menor grau às insinuações de Satanás.

Tribunais. Isto é, tribunais locais ou pequenos sinédrios, provavelmente eram compostos de 23 membros (ver com. de Mt.5:22). Tais tribunais eram encontrados em várias comunidades judaicas, exceto em Jerusalém, onde havia o grande Sínédrio.

E vos açoitarão. Este castigo era geralmente aplicado pelo diácono, ou chazzan (ver p. 44). A lei de Moisés prescrevia o castigo com açoites (Dt.25:1-3). Quarenta açoites era a pena máxima. Era costume não dar mais que 39, pois reter o último indicava misericórdia. Paulo recebeu esse castigo cinco vezes (2Co.11:24).

Mt.10:18 18. por minha causa sereis levados à presença de governadores e de reis, para lhes servir de testemunho, a eles e aos gentios.

Por Minha causa. A promessa do v. Mt.10:19 se aplica somente quando os cristãos são acusados por causa da fé e de atividades missionárias, não quando se envolvem em atividades impróprias (ver 1Pe.2:19-20).

Governadores e de reis. Durante os primeiros anos do cristianismo, governadores como Pilatos, Félix, Festo e Gálio julgaram obreiros cristãos acusados de serem anarquistas e perturbadores. Herodes Antipas, Herodes Agripa, Nero e Domiciano foram alguns dos reis e imperadores perante os quais cristãos tiveram que comparecer.

A eles. No sentido de “perante eles”. Muitos “governadores e reis”, bem como oficiais menos graduados, não teriam tido oportunidade de ouvir a verdade e observar o efeito de seus princípios na vida daqueles levados diante deles, se não fosse por sua posição.

Mt.10:19 19. E, quando vos entregarem, não cuideis em como ou o que haveis de falar, porque, naquela hora, vos será concedido o que haveis de dizer,

Cuideis. Do gr. merimnao, “estar ansioso” ou “preocupar-se com” (ver com. de Lc.10:41). Cristo não desculpa o descuido e a despreocupação da parte dos cristãos com respeito ao estudo das Escrituras, pois eles devem estar “sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão” para sua fé (1Pe.3:15). Devemos servir a Deus fielmente dia após dia, sem nos preocuparmos “com o dia de amanhã” (Mt.6:34). Devemos acreditar que Deus nos dará a força para enfrentar os problemas à medida que surgirem, contudo, ao mesmo tempo, devemos estudar com afinco a vontade divina revelada, a fim de estarmos preparados para toda e qualquer situação.

Mt.10:20 20. visto que não sois vós os que falais, mas o Espírito de vosso Pai é quem fala em vós.

Não sois vós os que falais. Obreiros cristãos não devem esquecer jamais de que falam como representantes ou embaixadores de Cristo (ver 2Co.5:19-20); e nunca devem apresentar suas teorias particulares como se fossem verdade. Se assim o fizerem, devem ser classificados como falsos profetas (ver com. de Mt.7:15).

Em vós. Isto é, por meio de vós.

Mt.10:21 21. Um irmão entregará à morte outro irmão, e o pai, ao filho; filhos haverá que se levantarão contra os progenitores e os matarão.

Um irmão. Tanto quanto possível, o cristão deve ter “paz com todos os homens” (Rm.12:18) e fazer um esforço sincero e perseverante não só para viver em paz com os familiares, mas, se possível, ganhá-los para Cristo (ver 1Co.7:13-16).

Mt.10:22 22. Sereis odiados de todos por causa do meu nome; aquele, porém, que perseverar até ao fim, esse será salvo.

Odiados de todos. Aqueles cuja vida testifica do poder de Cristo e da verdade do evangelho são muitas vezes odiados, mas devem pagar o mal com o bem. Todos os que vivem piedosamente podem esperar perseguição (ver Jo.16:33; 2Tm.3:12), pois os ímpios se ressentem diante da condenação de seus caminhos implícita na vida piedosa dos representantes de Cristo (ver 1Jo.3:12). Pessoas que vivem em desarmonia com os princípios que sabem ser corretos normalmente evitam se associar a pessoas de caráter reto.

Por causa do Meu nome. Ver com. do v. Mt.10:18.

Perseverar até o fim. Obviamente, quem desiste de uma corrida antes de chegar ao objetivo jamais pode esperar receber o prêmio. Entrar na corrida e permanecer nela são atitudes essenciais para se obter a vitória. Não é suficiente começar a caminhada cristã. Devemos permanecer nela “até ao Dia de Cristo Jesus” (Fp.1:6). Devemos concluir a carreira que Deus nos indicou, assim como Jesus, “o autor e consumador da fé” (ver Lc.9:51; Hb.12:2).

Mt.10:23 23. Quando, porém, vos perseguirem numa cidade, fugi para outra; porque em verdade vos digo que não acabareis de percorrer as cidades de Israel, até que venha o Filho do Homem.

Quando [...] vos perseguirem. Ver com. de Mt.5:10-12.

Fugi. Em certas circunstâncias, a fuga reflete covardia, noutras, prudência (cf. com. do v. Mt.10:16). O fator determinante é o resultado final para o reino dos céus, não conveniência pessoal ou o que as pessoas pensarão. Quando o trabalho provar ser inútil num lugar, embaixadores do reino devem se apressar para o próximo, na esperança de ali encontrar alguém disposto a ouvir. Não há virtude em sofrer perseguição como um meio de se obter mérito nos livros do Céu. Em Seu próprio ministério, Cristo repetidamente demonstrou o princípio recomendado aos doze e ilustrou circunstâncias que mostram em que se aplica esse princípio. Quando foi rejeitado pelo Sinédrio, depois de curar o paralítico de Betesda, Ele Se retirou para a Galileia (ver com. de Mt.4:12). Em ocasiões posteriores, o Mestre Se mudou de Nazaré para Cafarnaum (ver com. de Lc.4:30-31), da Galileia para a Fenícia (ver com. de Mt.15:21), de Magdala para Cesareia de Filipe (Mt.16:1-13) e da Judeia para Efraim (Jo.11:53-54). Quando os cristãos de Jerusalém foram perseguidos, após o apedrejamento de Estêvão, se espalharam por toda parte “pregando a palavra” (ver At.8:1-4).

Cidades de Israel. Conforme empregado no tempo de Cristo, o termo Israel não parece ter sido usado num sentido geográfico ou político, mas sim com referência ao povo (ver Mt.8:10; Lc.2:34; Jo.3:10; At.2:22).

Até que venha. É possível que Jesus esteja falando em termos gerais a todos os cristãos, indicando que haveria lugares nos quais trabalhar e pessoas prontas para receber a mensagem até que fosse “pregado este evangelho do reino por todo o mundo” (ver Mt.24:14; T6, 478).

Mt.10:24 24. O discípulo não está acima do seu mestre, nem o servo, acima do seu senhor.

O discípulo. Cristo provavelmente recitou um provérbio daquela época, que existe em outros idiomas, além do aramaico.

Mestre. Do gr. didaskalos, “professor”. A mesma palavra grega é empregada no v. Mt.10:25.

Mt.10:25 25. Basta ao discípulo ser como o seu mestre, e ao servo, como o seu senhor. Se chamaram Belzebu ao dono da casa, quanto mais aos seus domésticos?

Dono da casa. Do gr. oikodespotes ou, “senhor da casa” (ver com. de Lc.2:29). Isto é, Cristo, continua a ideia de Mt.10:24.

Belzebu. Não se sabe se esta palavra deve ser identificada com “Baal-Zebube”, o deus das moscas de Ecrom (ver com. de 2Rs.1:2), ou “Beelzebu”, em aramaico, “senhor da casa”. Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem “Beelzebu” (ver com. de Mt.12:24).

Mt.10:26 26. Portanto, não os temais; pois nada há encoberto, que não venha a ser revelado; nem oculto, que não venha a ser conhecido.

Sem comentário para este versículo.

Mt.10:27 27. O que vos digo às escuras, dizei-o a plena luz; e o que se vos diz ao ouvido, proclamai-o dos eirados.

As escuras. É provável que se refira à obscuridade relativa do pequeno círculo de discípulos.

Dizei-o a plena luz. Indicando talvez que os discípulos deviam propagar as lições que tinham aprendido particularmente.

Ao ouvido. Ideia paralela a “às escuras” da primeira parte do versículo.

Dos eirados. Uma metáfora da ampla circulação que deviam dar ao evangelho, paralela a “dizei-o a plena luz”. Os discípulos não deviam comprar a paz por meio do silêncio ou de um acordo.

Mt.10:28 28. Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo.

Matam. Aqueles que “matam o corpo” são os perseguidores mencionados nos v. Mt.10:18-25 e Mt.10:36. Somente Deus pode destruir “tanto a alma como o corpo” (sobre perseguição, ver com. de Mt.5:10-12).

Alma. Do gr. psyche, “fôlego”, “vida” ou “alma”. Psyche (plural, psychai) é traduzida 42 vezes no NT como “vida” ou “vidas” (ver Mt.2:20; Mt.6:25; Mt.16:25). A palavra é traduzida 51 vezes como “alma” ou “almas” (ver Mt.10:28; Mt.11:29; Mt.12:18). Em alguns desses casos, significa “pessoas” (ver, na ARC, At.7:14; At.27:37; 1Pe.3:20). Em outros, é traduzida como algo equivalente (ver 2Co.12:15, NVI; ver com. de Sl.16:10). Às vezes, refere-se às emoções (ver Mc.14:34; Lc.2:35), aos apetites naturais (ver Ap.18:14), à mente (ver At.14:2; Fp.1:27) ou ao coração (ver Ef.6:6). Não há nada na palavra psyche, mesmo remotamente, que indique uma entidade consciente capaz de sobreviver à morte do corpo e, portanto, imortal. Em nenhum dos casos de seu emprego na Bíblia, psyche se refere a uma entidade consciente capaz de existir de forma separada do corpo. A Bíblia não fala nada de uma alma consciente e viva, que supostamente sobrevive ao corpo (sobre o heb. nefesh, o equivalente do gr. psyche, ver com. de 1Rs.17:21; Sl.16:10; o que se diz de uma palavra se aplica a outra).

Inferno. Do gr. geenna (ver com. de Mt.5:22).

Mt.10:29 29. Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai.

Pardais. Do gr. strouthia, indicando qualquer pássaro pequeno, embora em especial os pardais. Ainda é comum a venda de pássaros pequenos nos mercados do Oriente.

Asse. Do gr. assarion, diminutivo derivado do latim as, 1/16 de um denário, isto é, 1/16 do salário de um dia de um trabalhador comum (ver p. 37).

Cairá em terra. Na passagem paralela em Lucas, afirma-se que “nenhum deles está em esquecimento diante de Deus” (Lc.12:6).

Sem o consentimento de vosso Pai. Isto é, sem que Deus note. Se Ele nota o dano que se faz a um pardal, ou a sua morte, quanto mais significa para Ele a dor ou a morte de um de Seus filhos e filhas!

Mt.10:30 30. E, quanto a vós outros, até os cabelos todos da cabeça estão contados.

Até os cabelos. Ninguém jamais se interessou tanto por si próprio a ponto de contar os fios de cabelo de sua própria cabeça. O Criador nos conhece muito mais intimamente do que nós mesmos.

Mt.10:31 31. Não temais, pois! Bem mais valeis vós do que muitos pardais.

Sem comentário para este versículo.

Mt.10:32 32. Portanto, todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai, que está nos céus

Que Me confessar. Literalmente, “confessar em mim”, devido ao sentido de unidade com Cristo. Quando habitamos nEle e Ele em nós, é que nossa confissão de fé “dá muito fruto” (ver Jo.15:1-8). Antes de entrar no jardim do Getsêmani, Cristo orou por essa comunhão íntima (ver Jo.17:23). Cristo testemunha diante do Pai sobre aqueles que testemunham dEle diante do mundo. Jesus é nossa testemunha, nosso embaixador diante do Pai, assim como devemos ser Suas testemunhas e embaixadores diante do mundo.

Mt.10:33 33. mas aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai, que está nos céus.

Sem comentário para este versículo.

Mt.10:34 34. Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada.

Não penseis. Jesus desfaz a opinião errônea que alguns dos discípulos aparentemente tinham de que a mensagem que levariam seria somente de paz. Eles não deviam se surpreender, no seu trabalho de casa em casa (ver com. dos v. Mt.10:11-13), se surgissem diferenças como resultado de seu ministério.

Trazer paz. Cristo é o Príncipe da Paz. Foi Ele quem trouxe a paz do Céu à Terra e a deu a todos os seres humanos (ver com. de Jo.14:27). Porém, quando alguém faz as pazes com Deus (ver Rm.5:1), é considerado pelo mundo como um inimigo (ver 1Jo.3:12-13). Cristo veio para reconciliar pecadores com Deus, mas, ao fazer isso, também, inevitavelmente, causou discórdia entre eles e os que recusam a oferta de paz (ver com. de Mt.10:22). O cristão jamais deve buscar a paz que vem mediante o acordo com o mal, tampouco se conformar com ela. Para o verdadeiro cristão não se trata de paz a qualquer custo.

Mt.10:35 35. Pois vim causar divisão entre o homem e seu pai; entre a filha e sua mãe e entre a nora e sua sogra.

Nora. Do gr. numphe, “jovem esposa”, “uma noiva”. Ainda hoje é comum no Oriente que um jovem casal more na casa dos pais do noivo, onde a noiva fica em sujeição à mãe do esposo. Assim, tanto nos tempos antigos como no presente, nas relações entre nora e sogra é comum surgirem dificuldades e, quando uma crê em Cristo e a outra se opõe a tal crença, podem se esperar problemas.

Mt.10:36 36. Assim, os inimigos do homem serão os da sua própria casa.

Os inimigos do homem. Quando alguém aceita a Cristo, seus amigos mais íntimos costumam se tornar seus inimigos mais amargos e implacáveis. Muitas vezes isso acontece, não somente em terras pagãs, mas também em países cristãos e entre cristãos professos que praticam a forma da religião, mas sabem pouco ou nada de seu poder para transformar a vida (ver 2Tm.3:5).

Mt.10:37 37. Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim não é digno de mim

Quem ama seu pai ou sua mãe. Jesus sancionou o que ordena o quinto mandamento e reprovou qualquer tentativa de escapar às obrigações dos filhos para com seus pais (ver com. de Mt.5:17-19; Mc.9-13). Contudo, o amor pelos pais nunca deve estar acima da obediência a Deus, caso os dois entrem em conflito. Amor e serviço a Deus devem ser a regra suprema da vida, “o grande e primeiro mandamento” (ver com. de Mt.22:36-37); mas a segunda tábua do decálogo, que contém o quinto mandamento, é “semelhante” à primeira em natureza e importância (ver com. de Mt.22:39).

Não é digno de Mim. Isto é, não é digno de ser chamado cristão. Nenhuma obrigação humana é desculpa válida para não tomar a cruz da lealdade, obediência e serviço (v. Mt.10:38) a Cristo.

Mt.10:38 38. e quem não toma a sua cruz e vem após mim não é digno de mim.

Quem não toma a sua cruz. Entre os romanos, a morte por crucifixão era reservada aos escravos e àqueles condenados pelos crimes mais hediondos. Portanto, pode-se dizer que os réus dessa sentença fatal eram detestados, odiados e execrados pela sociedade. O condenado à crucifixão geralmente carregava sua cruz até o lugar da execução. Tomar a cruz de Cristo e seguir após Ele significa sofrer sem reclamação ou arrependimento a censura de amigos e parentes e suportar a reprovação das pessoas com paciência e humildade. É resistir à “espada” da perseguição (ver v. Mt.10:34-37) nas mãos daqueles de quem se deveria esperar “paz”. Cristo reiterou esse princípio em várias ocasiões (ver Mt.16:24; Mc.8:34; Lc.9:23; Lc.14:27). Contudo, quem é chamado a tomar sua cruz e seguir a Cristo tem o supremo privilégio de compartilhar com Ele Seus sofrimentos. Não existe honra maior (DTN, 224, 225).

Vem após Mim. Isto é, pelo caminho do discipulado e do sofrimento.

Mt.10:39 39. Quem acha a sua vida perdê-la-á; quem, todavia, perde a vida por minha causa achá-la-á.

Quem acha. Isto é, quem deseja assegurar e desfrutar aquilo que, do ponto de vista humano, é essencial à felicidade e ao contentamento. O filho pródigo imaginou que, ao deixar seu lar, encontraria vida real (ver Lc.15:12-13). Mas, quando, por meio de amarga experiência e solene reflexão ele pôde ver a vida na sua perspectiva verdadeira, levantou-se e voltou para seu pai (Lc.15:17-20). Aqueles que creem que encontrarão vida preocupando-se em obter as coisas que este mundo tem a oferecer trabalham “pela comida que perece” (ver com. de Jo.6:27). Cristo repetiu o princípio desse versículo em mais de uma ocasião (Mt.16:25; Mc.8:35; Lc.9:24; Lc.17:33; Jo.12:25).

Vida. Do gr. psyche (ver com. do v. Mt.10:28).

Perdê-la-á. Alguém que estende a mão para agarrar as coisas sem valor desta vida normalmente percebe que desaparecem como bolhas de sabão nas mãos de uma criança.

Quem, todavia, perde. Isto é, quem está disposto a renunciar o prazer e as recompensas que este mundo tem a oferecer “preferindo ser maltratado junto com o povo de Deus a usufruir prazeres transitórios do pecado” (Hb.11:25). Tal pessoa tem um discernimento real dos valores. Como Paulo, está disposto a perder tudo que esta vida tem a oferecer em troca da suprema vantagem de conhecer a Jesus Cristo e compartilhar com Ele de Seus sofrimentos (ver Fp.3:8; Fp.3:10).

Por Minha causa. Ver com. do v. Mt.10:18.

Achá-la-á. Somente quando um grão de trigo é enterrado e morre é que ele pode dar à luz uma vida nova (ver com. de Jo.12:24-25). Somente quando o eu é enterrado no sulco da necessidade mundana é que o ser humano descobre o propósito real de sua existência.

Mt.10:40 40. Quem vos recebe a mim me recebe; e quem me recebe recebe aquele que me enviou.

Quem vos recebe. Cristãos são embaixadores do reino dos céus. Tudo o que dizem e fazem é considerado pelo povo deste mundo como expressão dos ideais do reino dos céus, e o modo como o mundo os trata, por serem embaixadores de Cristo, é visto por Cristo como se esse tratamento fosse dado a Si próprio.

Mt.10:41 41. Quem recebe um profeta, no caráter de profeta, receberá o galardão de profeta; quem recebe um justo, no caráter de justo, receberá o galardão de justo.

Recebe um profeta. Isto é, recebe um profeta em sua casa e o trata como um profeta.

No caráter de profeta. Isto é, porque é um profeta, ou é reconhecido como um profeta. A viúva de Sarepta sem dúvida recebeu Elias como um profeta, porque assim o considerava. Do contrário, é muito provável que se recusasse a lhe dar a hospitalidade que pediu dela (ver 1Rs.17:9-16). O mesmo aconteceu com a mulher sunamita, que recebeu Eliseu em seu lar (2Rs.4:8-10).

Galardão de profeta. Provavelmente uma recompensa digna de ser dada por um ou a um profeta. A viúva de Sarepta recebeu um amplo suprimento de comida em meio a uma seca, e seu filho foi ressuscitado (ver 1Rs.17:16; 1Rs.17:23). Do mesmo modo, a sunamita recebeu uma grande recompensa, pois Deus lhe deu um filho. E, quando este morreu, ela o recebeu de volta com vida (ver 2Rs.4:16-17; 2Rs.4:34-37).

Mt.10:42 42. E quem der a beber, ainda que seja um copo de água fria, a um destes pequeninos, por ser este meu discípulo, em verdade vos digo que de modo algum perderá o seu galardão.

Der a beber. Talvez usado como ilustração do menor serviço que se pode fazer a alguém. Com certeza, era algo mínimo, mas, muitas vezes, o mais importante e necessário nas terras bíblicas, onde a água sempre foi escassa.

Destes pequeninos. Não necessariamente em idade, mas também em importância.

Por ser este Meu discípulo. Em Mc.9:41, define-se o que significa fazer algo “em nome de” alguém. Ali se explica que dar um copo de água em nome de Cristo é dá-lo “porque sois de Cristo”.

Mt.11:1 1. Ora, tendo acabado Jesus de dar estas instruções a seus doze discípulos, partiu dali a ensinar e a pregar nas cidades deles

Tendo acabado Jesus. [Jesus prega nas cidades, Mt.11:1]. Isto é, quando Jesus terminou de dar as instruções aos doze, fato registrado no cap. 10. Deve-se notar que Mateus 11:1 pertence à narrativa de Mt.9:36-10:42, e não à do cap. 11 (ver com. de Mt.9:36).

Partiu dali. Depois de ter enviado os doze (ver com. de Mt.10:5), Jesus, acompanhado de outros discípulos, partiu para outra região da Galileia não visitada pelos doze (ver DTN, 360, 488; ver com. de Mt.9:36; Lc.10:1). Provavelmente João Batista tenha sido decapitado durante a terceira viagem, pois foi por volta desse período que Cristo soube de seu martírio (DTN, 360) e que os discípulos de João uniram seus esforços aos de Cristo (DTN, 361).

Mt.11:2 2. Quando João ouviu, no cárcere, falar das obras de Cristo, mandou por seus discípulos perguntar-lhe:

Quando João ouviu. [João envia mensageiros a Jesus, Mt.11:2-6 = Lc.7:18-23. Comentário principal: Lc].

Mt.11:3 3. És tu aquele que estava para vir ou havemos de esperar outro?

Sem comentário para este versículo.

Mt.11:4 4. E Jesus, respondendo, disse-lhes: Ide e anunciai a João o que estais ouvindo e vendo:

Sem comentário para este versículo.

Mt.11:5 5. os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e aos pobres está sendo pregado o evangelho.

Sem comentário para este versículo.

Mt.11:6 6. E bem-aventurado é aquele que não achar em mim motivo de tropeço.

Sem comentário para este versículo.

Mt.11:7 7. Então, em partindo eles, passou Jesus a dizer ao povo a respeito de João: Que saístes a ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento?

Em partindo eles. [Jesus dá testemunho de João; Ai das cidades impenitentes! Jesus, o Salvador dos humildes; Vinde a Mim, Mt.11:7-30 = Lc.7:24-35; Lc.10:13-15; Lc.10:21-22. Comentário principal: Mt]. Literalmente, “à medida que partiam”, indicando que o discurso sobre João começou quase no momento em que os mensageiros partiam. Aparentemente, essas palavras de recomendação não eram para João, nem para seus discípulos, pois teriam diminuído a força da mensagem que Ele tinha transmitido a João (ver com. de Lc.7:23).

A respeito de João. O testemunho de Jesus sobre João, registrado nos v. 7 a 19, algumas vezes é considerado como um discurso fúnebre. João foi decapitado cerca de seis meses depois, não muito antes da Páscoa de 30 d.C. (ver com. de Lc.3:19-20).

A ver. Do gr. theaomai, “ver atentamente” ou “contemplar”. Muitas das pessoas que estavam ouvindo Jesus tinham ouvido a pregação de João. Cristo lhes pediu para analisar sua própria reação diante dessa “lâmpada que ardia e alumiava” (Jo.5:35), para que pudessem apreciar melhor a mensagem de João com relação à mensagem que Jesus transmitia (sobre o ministério de João no deserto, ver com. de Mt.3:1; Lc.3:2).

Um caniço. As canas cresciam em abundância no vale do Jordão, onde se realizou a maior parte do ministério de João, e essa metáfora faria com que os que ouviam Jesus recordassem a pregação do Batista. A pergunta do Salvador poderia ser parafraseada da seguinte forma: “Fostes tão longe só para ver as canas que se moviam ao vento?” Certamente João não poderia ser comparado às canas, pois seu caráter não era débil e vacilante.

Mt.11:8 8. Sim, que saístes a ver? Um homem vestido de roupas finas? Ora, os que vestem roupas finas assistem nos palácios reais.

Roupas finas. O deserto seria o lugar mais improvável de se encontrar alguém vestido assim. O motivo de as multidões irem até João não era ver a última moda nem a roupa mais luxuosa, nem sequer tinham esperança de que ele pudesse dar esse tipo de roupa aos que se tornassem seus seguidores. A esperança de ganho material não influenciava as pessoas a responderem ao apelo do profeta do deserto.

Mt.11:9 9. Mas para que saístes? Para ver um profeta? Sim, eu vos digo, e muito mais que profeta.

Um profeta. Do gr. prophetes, de pro, “diante”, tanto de lugar quanto de tempo, e phemi, “falar”. Portanto, o profeta era em essência um porta-voz de Deus, um intérprete dos propósitos divinos para o ser humano (sobre o equivalente hebraico de profetes, ver com. de Gn.20:7). O profeta era um porta-voz, pois falava no lugar de Deus. Sua mensagem era dirigida aos seres humanos e predizia eventos futuros. O conceito moderno de que um profeta é basicamente alguém que prediz o futuro obscurece o fato de que alguns dos maiores profetas de todos os tempos falaram pouco ou nada sobre eventos futuros. Um profeta é simplesmente alguém que transmite uma mensagem de Deus.

Muito mais que profeta. João era o precursor pessoal do Messias (ver com. de Mt.3:3). A ele foi dada a tarefa mais importante de todos os tempos: apresentar o Messias ao mundo. João tinha todas as grandes qualidades de um verdadeiro profeta.

Mt.11:10 10. Este é de quem está escrito: Eis aí eu envio diante da tua face o meu mensageiro, o qual preparará o teu caminho diante de ti.

Este é. Cristo confirma que João Batista era aquele anunciado na profecia de Ml.3:1, e também, de Is.40:3-5; Ml.4:5-6.

Está escrito. O que se segue parece ser uma tradução livre de Ml.3:1.

Mt.11:11 11. Em verdade vos digo: entre os nascidos de mulher, ninguém apareceu maior do que João Batista; mas o menor no reino dos céus é maior do que ele.

Os nascidos de mulher. Aparentemente, uma expressão hebraica que significa “todos os seres humanos”.

Ninguém apareceu maior. Ver com. de Lc.1:15. Nenhum profeta superou João Batista em caráter, convicção e fidelidade. Além disso, nenhum profeta tinha tido privilégio maior do que o de ser arauto pessoal do Messias na Sua primeira vinda (ver DTN, 100). É bem provável que qualquer um dos profetas do AT tivesse sacrificado com alegria todo privilégio que pudesse ter pelo supremo privilégio de apresentar o Messias ao mundo. Como Abraão, todos aguardavam ansiosamente a vinda de Cristo e estavam felizes de vê-la pela fé (ver com. de Jo.8:56).

Menor. Isto é, em comparação com quem estivesse “no reino”, o reino da graça divina no coração dos seres humanos proclamado por João e Cristo, e que veio a esta Terra em pessoa por meio de Cristo.

Maior do que ele. Não maior que João em valor moral, coragem, caráter ou conquistas, mas no privilégio de se relacionar pessoalmente com o próprio Cristo. Em certo sentido, João estava apenas à porta do reino, olhando para dentro, enquanto esse mais humilde seguidor de Jesus estava na presença do Rei.

Mt.11:12 12. Desde os dias de João Batista até agora, o reino dos céus é tomado por esforço, e os que se esforçam se apoderam dele.

Dias de João. Isto é, o tempo em que Batista proclamou a vinda do Messias e o reino messiânico, provavelmente desde a primavera de 27 d.C. até a primavera de 29 d.C. (ver com. de Mt.3:1; ver gráfico, p. 227). Até agora, isto é, desde o tempo do aprisionamento de João, na primavera de 29 d.C. ao outono do mesmo ano (ver com. de Lc.7:18; sobre a relação cronológica do banquete de Mateus, ver com. de Mt.9:18; sobre a questão do jejum, ver Mc.2:18-22; quanto à visita dos discípulos de João a Jesus, ver Mt.11:7-30; DTN, 275-277).

O reino dos céus. Este era o tema da pregação de João, como foi mais tarde o de Jesus e Seus discípulos na terceira viagem pela Galileia (ver Mt.3:2; Mt.4:23; Mt.10:7; ver também com. de Mt.3:2).

É tomado por esforço. Do gr. biazo, “usar força” ou “aplicar força”. Há divergências quanto ao significado preciso da declaração. Alguns entendem que significa que as multidões lutavam com zelo para seguir Jesus; outros, que o reino da graça divina (ver com. de Mt.3:2) sofria violência no sentido de que muitos que seguiam João e Jesus o faziam com pouco ou nenhum entendimento real da natureza verdadeira do reino (ver com. de Mc.1:38). No final da terceira viagem pela Galileia, pouco tempo antes da Páscoa de 30 d.C. (DTN, 364), quando Cristo estava no auge da popularidade, houve uma tentativa de forçá-Lo a aceitar a coroa de um rei temporal (ver Jo.6:15; DTN, 378). Aqueles que ouviram João e Jesus tinham zelo suficiente, mas “não com entendimento” (Rm.10:2). O fato é que o verdadeiro reino era mal compreendido e seus propósitos, obstruídos por aqueles que fingiam ser amigos.

Mt.11:13 13. Porque todos os Profetas e a Lei profetizaram até João.

Os Profetas e a Lei. A ordem comum é “a Lei e os Profetas” (Mt.5:17; Mt.7:12; Mt.22:40; At.24:14), expressão judaica para o AT (ver com. de Lc.24:44).

Profetizaram até João. O significado não está claro. Talvez o contexto seja o melhor guia para interpretar este versículo. Cristo acabara de aclamar João como o maior dos profetas (ver com. do v. Mt.11:11), no sentido de que foi seu o privilégio de anunciar a vinda de quem todos os profetas tinham falado (ver Lc.24:27; Jo.5:39; Jo.5:46). Nesse sentido, todos os profetas do AT esperaram pela época de João e falaram do Messias que viria (1Pe.1:10-11). Portanto, é possível dizer que o ofício profético da época do AT teve seu clímax em João. Além disso, as palavras de Mt.11:14, de que João era quem “estava para vir”, podem ser consideradas como explicação do v. 13.

Mt.11:14 14. E, se o quereis reconhecer, ele mesmo é Elias, que estava para vir.

Se o quereis reconhecer. Isto é, aceitar a explicação dada a respeito da verdadeira identidade de João com relação à profecia do AT.

Ele mesmo é Elias. João não era Elias trazido dos céus (ver Jo.1:21), mas alguém que surgiu “no espírito e poder” de Elias (ver com. de Lc.1:17), com uma tarefa similar à dele: chamar as pessoas ao arrependimento (ver com. de Mt.3:2).

Mt.11:15 15. Quem tem ouvidos [para ouvir], ouça.

Quem tem ouvidos. Exortação solene usada muitas vezes por Cristo para enfatizar uma verdade importante que acabava de ser declarada (ver Mt.13:9; Mt.13:43; Lc.14:35; Ap.2:7; Ap.2:11). Num sentido geral, todos têm “ouvidos” e deviam dar atenção, mas talvez Cristo estivesse Se referindo principalmente à percepção espiritual por meio da qual os de coração sincero podem ver o verdadeiro significado e, como resultado, ser iluminados (cf. Is.3:9-10).

Mt.11:16 16. Mas a quem hei de comparar esta geração? É semelhante a meninos que, sentados nas praças, gritam aos companheiros:

A quem hei de comparar [...]? Fórmula judaica comum para introduzir uma parábola. Nos v. Mt.11:7-15, Jesus direcionou o pensamento das pessoas à natureza e ao propósito da missão de João. A partir dessa passagem (v. 16-24), Ele Se volta para a maneira como o povo de Israel recebeu Sua missão, em comparação com o modo como recebeu João e sua obra.

Esta geração. Lucas diz: “homens da presente geração” (Lc.7:31). Cristo Se refere ao povo de Israel, que tinha ouvido as mensagens de João, bem como as de Jesus e Seus poderosos milagres (Mt.11:21; Mt.11:23). “Esta geração” tinha recebido privilégios muito maiores do que todas as do AT. Mas, apesar dessas oportunidades sem precedentes, bem poucos tiveram “ouvidos” para ouvir (ver com. do v. Mt.11:15), para perceber o verdadeiro significado da missão de João Batista e da de Jesus. Por sua vez, os escribas e os fariseus rejeitaram abertamente a Cristo e O proclamaram um impostor (ver DTN, 213), embora ainda hesitassem em assumir a mesma atitude com relação a João Batista, ao menos, abertamente (ver Mt.21:23-27). Todos do povo comum “consideravam João como profeta” (Mc.11:32); depois ouviram a Cristo com prazer (ver Mc.12:37) e, finalmente, muitos deles concluíram que Ele também devia ser um profeta (ver Mt.16:13-14).

As observações de Cristo nestes versículos e nos seguintes se aplicam, da mesma forma, aos líderes judeus, em particular, e a Israel como um todo. João Batista serviu de ponte entre o AT e o NT (ver DTN, 220). O AT foi concluído com uma profecia de que ele viria (ver com. de Ml.3:1; Ml.4:5-6), e o NT se inicia com um registro do cumprimento dessa profecia (ver Mt.3:1-3; Mc.1:1-3). Todas as mensagens proféticas do AT centralizam-se na vinda do Messias e na preparação de um povo apto a encontrá-Lo (ver Mt.11:13-14). Com João, o Antigo Testamento atingiu seu clímax e abriu caminho ao Novo. A mesma geração que ouviu João também testemunhou a vinda do Messias e o estabelecimento de Seu reino; além disso, foi essa mesma geração que finalmente testemunhou o completo cumprimento de tudo que os profetas do AT tinham predito sobre Jerusalém e a nação judaica (ver com. de Mt.23:36; Mt.24:15-20; Mt.24:34).

Meninos. Literalmente, “pequenos”. A cena descrita é familiar a qualquer cidade ou vila do Oriente, onde a rua serve de pátio para brincadeiras bem como para mercado ou feira.

Praças. Do gr. agorai, “assembléias” ou “lugares de reuniões públicas”, lugares de reunião para comércio e diálogos. No princípio, as “praças” não tinham nada a ver com comércio, mas quando se fizeram construções para discussão de política se tornou basicamente um lugar para transações comerciais. Nas cidades, havia uma grande praça pública, ao passo que, nas vilas, as reuniões se davam nas ruas.

Mt.11:17 17. Nós vos tocamos flauta, e não dançastes; entoamos lamentações, e não pranteastes.

Tocamos flauta. Aparentemente essa figura é usada para se referir a grupos de crianças tocando. É evidente que um grupo queria imitar alguma ocasião festiva alegre, como um casamento.

Não dançastes. Caprichosas, as outras crianças se recusaram a tocar e não reagiram à proposta do outro grupo.

Entoamos lamentações. Do gr. threneo, “lamentar”. Usando a figura das crianças tocando (v. Mt.11:16), Mateus faz o primeiro grupo de crianças dizer: “Muito bem, muito bem, se não querem festejar, vamos tocar como para um funeral.” No Oriente era costume chorar pelos mortos de forma efusiva e dramática. Muitas vezes, pagavam-se pessoas para lamentarem e chorar no velório e, depois, na procissão do funeral (ver Mt.9:23; ver com. de Mc.5:38; Je.9:17).

Não pranteastes. Literalmente, “não batestes no peito com pesar”. Ao que parece, essa segunda proposta das crianças também não agradou a seus colegas de brincadeira, pois pareciam não aceitar nenhuma sugestão. O problema não era se eles gostavam de lamento ou de dança. Eles simplesmente não queriam fazer o que os outros pediam. A aplicação dessa metáfora é óbvia. As crianças que não se agradavam de nada representavam os escribas e fariseus, que criticavam tanto João quanto Jesus (ver com. dos v. Mt.11:18-19).

Mt.11:18 18. Pois veio João, que não comia nem bebia, e dizem: Tem demônio!

Não comia. Como um nazireu (ver com. de Mt.3:4), João se abstinha de comer e beber como outras pessoas o faziam livremente e, talvez, esperasse que os discípulos seguissem seu exemplo. Lucas diz: “não comendo pão, nem bebendo vinho” (Lc.7:33). A vida pessoal abstêmia e um tanto austera de João não era muito atrativa para o povo como um todo. Muitos aparentemente o consideravam um fanático e faziam disso uma desculpa para não buscar arrependimento e serem batizados por ele. O que incomodava a muitos era que João Batista reprovava seus excessos licenciosos. Essa repreensão estava implícita em sua vida exemplar e talvez explícita em seus ensinos. Para essa classe de pessoas, a religião e o modo de vida que João defendia pareciam tristes. Eles se cansaram de ser continuamente lembrados de que precisavam se arrepender. Para eles, o convite de João era um chamado à lamentação, e não tinham vontade de aceitá-lo (ver com. de Mt.11:17).

Tem demônio! Isto é, possuído pelo demônio, ou simplesmente, louco (ver com. de Mc.1:23). Esta foi a mesma acusação feita pelos líderes religiosos contra Cristo (ver com. de Mt.9:34). Em ambos os casos, era meramente uma desculpa para não aceitar a mensagem de arrependimento e vida nova.

Mt.11:19 19. Veio o Filho do Homem, que come e bebe, e dizem: Eis aí um glutão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores! Mas a sabedoria é justificada por suas obras.

O Filho do Homem. Ver com. de Mc.2:10.

Come e bebe. Ver Is.22:13; Mt.24:38.

Glutão e bebedor de vinho. A acusação era certamente exagerada e distorcida com o objetivo de indicar algo bem diferente daquilo que os fatos mostrariam. Sua amizade com pessoas reputadas como glutonas e beberronas permitiu que os críticos dissessem que Cristo fazia o mesmo. A tentativa dos judeus de forçar Jesus a seguir o jejum ritual foi um completo fracasso (ver Mc.2:15-17). Esses críticos aparentemente queriam jejuar quando lhes conviesse; eles não queriam saber da vida abstêmia de João, nem da associação normal de Jesus com as pessoas que necessitavam da ajuda que Ele viera trazer.

Amigo. Este era o ponto em questão. Jesus era amigo das pessoas a quem os críticos desprezavam e ignoravam.

Publicanos. Ver p. 53, 54; ver com. de Lc.3:12. Os críticos de Cristo questionavam Suas motivações. Enquanto Jesus buscava a companhia de “publicanos e pecadores”, a fim de persuadi-los a se tornarem como Ele, os críticos O acusavam de fazer isso para se parecer com eles.

Filhos (ARC). As evidências textuais se dividem (cf. p. 136) entre “obras” e “filhos”, mas o significado é o mesmo: a sabedoria deve ser julgada por seus resultados. Por isso, criticar João por uma coisa e Jesus pelo contrário (v. 18, 19) mostrava completa falta de sabedoria. Ambos tinham sido dirigidos pela sabedoria divina, e isso era evidente no resultado de suas obras. Como resultado da obra de João, muitos se arrependeram (ver Mt.21:31-32; Mc.11:32; Lc.7:29) e, como resultado do ministério de Jesus, multidões O ouviam com alegria (ver Mc.12:37).

Mt.11:20 20. Passou, então, Jesus a increpar as cidades nas quais ele operara numerosos milagres, pelo fato de não se terem arrependido:

Milagres. Ver p. 204.

Não se terem arrependido. Um estranho contraste com o modo como o povo de Nínive reagiu à pregação de Jonas (Jn.3:5). Muitas vezes os que têm mais luz a valorizam menos do que os que a têm em medida limitada.

Mt.11:21 21. Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sidom se tivessem operado os milagres que em vós se fizeram, há muito que elas se teriam arrependido com pano de saco e cinza.

Ai. Do gr. ouai, comumente traduzido como “ai”. A palavra reflete pesar, calamidade ou angústia.

Corazim. Mencionada apenas nesta passagem e em Lc.10:13. Não está incluída na lista de Josefo das cidades e vilas galileias. Talvez próxima a Cafarnaum e do mar da Galileia, Corazim é normalmente identificada com Khirbet Kerazeh, cerca de três quilômetros ao norte de Tell Hum (ver com. de Mt.4:13).

Betsaida. Do aramaico Beth tsayeda, “casa [ou lugar] de pesca [ou caça]”. Betsaida ficava no limite norte do mar da Galileia, um pouco a leste do lugar onde o rio Jordão desemboca no lago. Filipe, tetrarca (ver com. de Lc.3:1), reconstruiu a cidade e a chamou de Betsaida Julias, em honra à Júlia, filha do imperador Augusto (Josefo, Antiguidades, xviii.2.1). O único milagre registrado nessa vizinhança é a cura de um cego (ver Mc.8:22-26).

Tiro e Sidom. Ver vol. 2, p. 35-38. Poucos meses depois, Jesus faria uma breve visita aos limites de Tiro e Sidom (ver Mt.15:21-29).

Os milagres. Além do milagre registrado em Mc.8:22-26, nenhum milagre é registrado em Corazim ou Betsaida. Mas, sem dúvida, apenas alguns dos milagres de Cristo estão registrados nos evangelhos (ver Jo.20:30; Jo.21:25).

Pano de saco e cinza. Pano de saco era a veste comum dos que suplicavam por algum favor, dos que lamentavam por um morto. Era também símbolo de arrependimento (ver com. de Et.4:1).

Mt.11:22 22. E, contudo, vos digo: no Dia do Juízo, haverá menos rigor para Tiro e Sidom do que para vós outras.

Menos rigor. Ver com. de Mt.10:15. Deus julgará os seres humanos mediante as oportunidades que tiveram. A responsabilidade será avaliada em proporção direta ao modo como se fez uso da luz que Deus lhes deu.

Dia do Juízo. Ver com. de Mt.3:12.

Mt.11:23 23. Tu, Cafarnaum, elevar-te-ás, porventura, até ao céu? Descerás até ao inferno; porque, se em Sodoma se tivessem operado os milagres que em ti se fizeram, teria ela permanecido até ao dia de hoje.

Tu, Cafarnaum. Ver com. de Mt.4:13; Mc.2:1. A linguagem usada com referência a Cafarnaum é muito similar à usada com referência a Lúcifer, em Is.14:13; Is.14:15.

Elevar-te-ás, porventura, até ao céu? Cafarnaum parece ter se orgulhado de sua posição e poder como principal cidade judaica da Galileia (ver com. de Mt.4:13).

Inferno. Do gr. hades, de duas palavras gregas, a, “não”, e idein, “ver”, portanto, literalmente, “não visto”, significando o “[mundo] não visto”, o reino ou morada dos mortos; “morte” ou “túmulo”. No emprego judaico, sheol é a morada temporária de todos os mortos, tanto justos quanto ímpios (sobre a palavra sheol, ver com. de 2Sm.12:23; Pv.15:11; sobre “portas da morte”, ver com. de Sl.9:13). O emprego do NT da palavra hades é o mesmo de sheol no AT. É importante distinguir entre o “inferno” de hades e o da Geena, do gr. geenan, o “inferno” de fogo (ver com. de Mt.5:22). Na LXX, hades é a tradução comum para o heb. sheol, “sepultura”, como em Os.13:14 (NVI), em que sheol, “túmulo”, é um paralelo poético de maweth, “morte”. Neste versículo (Mt 11:23), “túmulo” e “morte” estão personificados. A palavra hades ocorre em muitas tumbas antigas na Ásia Menor, como “sepulcro de” fulano de tal (comparar com Is.14:15).

Sodoma. Ver com. de Mt.10:15.

Os milagres. Ver v. 20; ver p. 204.

Teria ela permanecido. Comparar com Je.17:25; Je.17:27, com relação a Jerusalém.

Mt.11:24 24. Digo-vos, porém, que menos rigor haverá, no Dia do Juízo, para com a terra de Sodoma do que para contigo.

Menos rigor. Ver com. de Mt.10:15.

Mt.11:25 25. Por aquele tempo, exclamou Jesus: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos.

Por aquele tempo. Não está claro se isto tem o propósito de indicar que os v. 25 a 30 foram ditos por Jesus na mesma ocasião que os v. Mt.11:7-24, isto é, depois da partida dos discípulos enviados por João (v. Mt.11:7), ou se “por aquele tempo” é apenas uma expressão literária geral que liga essas observações às anteriores (v. Mt.11:7-24). A passagem paralela em Lc.10:21-22 está especificamente localizada depois do retorno dos setenta (v. Lc.10:17; Lc.10:21), que, provavelmente, ocorreu no final do outono de 30 d.C., cerca de um ano depois do que sugere o contexto em Mateus. É evidente que Cristo pode ter dito palavras similares em ambas as ocasiões. Em Mateus, a visita dos discípulos de João (v. Mt.11:2-6), o testemunho de Jesus sobre João (v. Mt.11:7-19), os “ais” sobre os que rejeitaram sua mensagem (v. Mt.11:20-24) e Seu louvor a Deus pelos que a aceitaram (v. 25-30) ocorrem numa única sequência de ensinos, relacionados estreitamente à época do envio dos doze (Mt.9:36-11:1). De acordo com Ellen G. White (DTN, 342), o banquete na casa de Mateus ocorreu no dia em que Jesus curou a filha de Jairo, no final da segunda viagem pela Galileia (ver com. de Mt.9:18; Mc.5:21).

Mas foi depois do banquete de Mateus que os discípulos questionaram Jesus sobre o jejum (ver Mt.9:14-17; DTN, 275). E foi depois desse questionamento que dois dos discípulos de João perguntaram se Jesus era o Messias (DTN, 276). Além disso, foi imediatamente depois da partida dos dois discípulos que Jesus deu testemunho de João (DTN, 218). Com isso, parece que Mt.11:2-19 deve ser atribuído a uma ocasião cuja sequência, tanto de tempo quanto de pensamento, seja entre o fim da segunda viagem pela Galileia, provavelmente, no outono de 29 d.C. (ver com. de Lc.8:1), e a morte de João Batista, ocorrida no início da primavera seguinte, antes da Páscoa de 30 d.C. (ver com. de Lc.3:19-20). É óbvio que essa sequência não pode ser atribuída à época do envio dos setenta, que se deu mais de meio ano depois da morte de João, nem pode ser atribuída à parte inicial da segunda viagem, como se pode concluir a partir de Lc.7:17-19, pelas razões apresentadas aqui. Para os propósitos deste Comentário, o discurso de Mt.11:7-30 é considerado uma unidade e é atribuído ao inverno de 29 a 30 d.C. Foi parcialmente repetido durante o ministério na Pereia um ano mais tarde (ver DTN, 488; Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17).

Graças Te dou. Esta declaração reflete o louvor em reconhecimento à sabedoria divina ao fazer o que se declara no versículo. As circunstâncias eram aparentemente desencorajadoras (v. Mt.11:20-24), pois os líderes de Israel e muitos das grandes cidades se recusavam a aceitar a mensagem do evangelho. Contudo, Jesus encontrou motivo para Se alegrar com o fato de que a grande multidão “O ouvia com prazer” (ver Mc.12:37).

Pai. Ver com. de Mt.6:9.

Ocultaste. Esta passagem representa Deus escondendo a verdade de alguns e a revelando a outros. Contudo, é evidente que os “sábios e instruídos”, os líderes de Israel, tiveram mais oportunidades de entender a Jesus do que qualquer um de seus compatriotas. De fato, Jesus dedicou a primeira parte de Seu ministério à região da Judeia, o que deu aos líderes judeus uma oportunidade de avaliar a evidência de que Ele era o Messias da profecia (ver com. de Mt.4:12). Além disso, sendo instruídos nas Escrituras, eles, mais do que o povo comum semianalfabeto, deviam ter entendido o propósito da profecia e reconhecido seu cumprimento na pessoa e missão de Jesus (ver com. de Mt.2:4-6). Porém, os líderes de Israel escolheram rejeitar a luz que o Céu lhes dera (ver Os.4:6; DTN, 30). Deus não foi parcial.

Estas coisas. Talvez uma referência aos “milagres” de Cristo (v. Mt.11:21; Mt.11:23), realizados para fornecer evidências convincentes da validade de Sua mensagem (ver Jo.5:36; Jo.10:38; Jo.14:11; DTN, 406, 407). O significado de “estas coisas” estava oculto daqueles que escolheram não vê-las. Deus nunca impõe a verdade sobre aqueles que preferem não aceitá-la (ver com. de Mt.7:6).

Pequeninos. Do gr. nepios, “criança”, e por extensão indica algo ou alguém “infantil”, “simples”, “inapto”. Possivelmente do gr. nepeleo, “não ter poder”, “ser impotente” ou “fraco”. O termo se aplica de igual modo a uma criança ou qualquer pessoa que não tem habilidade ou entendimento. Na LXX, nepios, às vezes, é usado para traduzir o heb. pethi (ver com. de Sl.19:7; Sl.119:130). Os rabis instruídos olhavam para os pescadores e agricultores iletrados como “pequeninos” na lei. Na verdade, Cristo disse que, apesar de o povo ser considerado como pequenino, demonstrou mais entendimento em reconhecer nEle o cumprimento da profecia messiânica. Aqueles que não pretendiam saber muito demonstraram mais sabedoria do que os professos sábios da nação. É provável que os discípulos estivessem entre os “pequeninos” aos quais Cristo Se refere.

Mt.11:26 26. Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado.

Sem comentário para este versículo.

Mt.11:27 27. Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.

Entregue. Do gr. paradidomi, literalmente, “entregar [a outro]”. Cristo Se refere à Sua missão divina como representante do Pai para a salvação do mundo, como torna claro o restante do versículo. Desde a queda do homem “toda a comunhão entre o Céu e a raça decaída tem sido por meio de Cristo” (PP, 366). “Tudo” concernente à salvação deste mundo foi confiado a Ele. Cristo foi “enviado” pelo Pai e “veio” a esta Terra cumprir Sua vontade divina pela humanidade caída (ver Jo.4:34). Tendo cumprido Sua missão com êxito, Cristo recebeu “toda a autoridade” (Mt.28:18) para “salvar totalmente os que por Ele se chegam a Deus” com fé (Hb.7:25).

Meu Pai. Ver com. de Mt.6:9.

Conhece. O verbo grego indica certeza ou pleno conhecimento. É impossível para a mente humana compreender plenamente a sabedoria e o amor infinitos de Deus manifestados em Jesus.

E ninguém conhece. Satanás tinha levado o ser humano a crer que Deus era um senhor duro e exigente, embora, na realidade, Ele seja um Deus de amor (1Jo.4:8), “longânimo para convosco, não querendo que nenhum pereça” (2Pe.3:9; Ez.18:23; Ez.18:32; Ez.33:11). Cristo veio para revelar o Pai. Conhecer o Pai é amá-Lo e servi-Lo.

Senão o Filho. Esta declaração indica que mesmo os anjos não podem avaliar totalmente a bondade do caráter divino, embora o plano de salvação possibilite que eles, junto com todos os seres criados, o compreendam melhor. Somente Jesus pode revelar o Pai porque só Jesus O conhece intimamente.

O Filho quiser revelar. Ver com. do v. Mt.11:25.

Mt.11:28 28. Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei.

Vinde a Mim. Cristo queria dizer com isto que Seus ouvintes não deviam esperar encontrar o caminho da vida e da verdadeira sabedoria e descanso indo aos chamados “sábios” e “instruídos” (v. Mt.11:25). Eles não passam de “cegos, guias de cegos” (ver Mt.15:14). Em vez disso, eles deviam ir a Cristo. Apenas Cristo conhece o Pai; portanto só Ele pode revelá-Lo (ver com. de Mt.6:9). Com essas palavras, Jesus estendeu a todos da multidão (DTN, 328) um convite para se tornarem Seus discípulos. O convite para o discipulado inclui tomar o “jugo” de Jesus (Mt.11:29).

Cansados. Cristo não está Se referindo a trabalho físico, mas de alma e mente, que resulta em cansaço por preocupações e pesar. Esse convite tinha um significado especial para a multidão ouvinte, pois a religião de Israel tinha se corrompido até se tornar numa tentativa trabalhosa e sem sentido de se encontrar salvação pelas obras.

Sobrecarregados. Toda a humanidade carrega muitos fardos pesados, sendo o pecado o maior deles. Porém, além dos fardos comuns carregados por toda a humanidade, os escribas e fariseus tinham colocado muitos outros “fardos pesados” sobre o povo judeu, fardos “difíceis de carregar” (Mt.23:4). O povo estava “sobrecarregado” de tantas exigências rabínicas e toda uma vida seria curta demais para aprendê-las. Em vez de dar “alívio” àqueles que já carregavam o fardo pesado do pecado (DTN, 328), essas exigências serviam apenas para extinguir do povo qualquer fagulha de vida e esperança que pudesse restar. O povo que buscava ser consciencioso se queixava pelo fardo, ao passo que muitos – os “publicanos e pecadores” – desistiam por completo de qualquer esperança. Os últimos estavam fora dos limites da respeitabilidade religiosa e já não professavam religião alguma. Esses resultados infelizes e desencorajadores eram os males que Jesus queria aliviar.

Aliviarei. Do gr. anapausis, “interromper”, “cessar”, “descansar” ou “recrear”. Anapausis é a palavra comumente usada na LXX para se referir ao “descanso” do sábado. Anapausis se refere a uma interrupção temporária do trabalho, não à inatividade permanente. Aqueles que vão a Cristo não param de trabalhar, mas, em vez de trabalharem “pela comida que perece”, e ficarem totalmente cansados na tentativa, seu trabalho é “pela que subsiste para a vida eterna” (ver com. de Jo.6:27). Aqueles que pensam que obtêm a salvação levando fardos pesados “difíceis de carregar” ignoram que o “jugo” de Cristo é “suave” e Seu “fardo” é “leve” (Mt.11:30).

Mt.11:29 29. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma.

Tomai sobre vós o Meu jugo. Isto implica submissão à disciplina e à prática do modo de vida de Cristo. Originalmente, o jugo era um instrumento de serviço designado a tornar possível o esforço cooperativo. Porém, desde antigamente, o “jugo” se tornou sinal de submissão, em especial, diante de um conquistador. Alguns generais vitoriosos colocavam um jugo sobre duas lanças e obrigavam o exército inimigo a marchar por baixo dele em sinal de submissão. “Colocar-se debaixo do jugo” era uma expressão comum para designar submissão e servidão (cf. Je.27:1-11; Je.27:17; Je.28:1-14). O propósito de um jugo não era tornar mais pesadas as cargas para o animal que as levava, e sim mais leves; não mais difícil, e sim mais fácil de carregar. Desse modo se entende com mais clareza o verdadeiro significado da palavra “jugo”. Por “Meu jugo” Cristo quis dizer Seu modo de vida. O “jugo” de Cristo é nada mais que a vontade divina resumida na lei de Deus e enaltecida no Sermão do Monte (ver Is.42:21; DTN, 329; ver com. de Mt.5:17-22). A figura que Cristo empregou não era desconhecida de Seus ouvintes, pois os rabis também se referiam à Torah (ver com. de Dt.31:9) como um “jugo”, não no sentido de ser um fardo, mas como uma disciplina, um modo de vida ao qual as pessoas deviam se submete.

Manso. Do gr. praus, “gentil” ou “suave”. Os animais domésticos eram chamados de praus; eles eram submissos e inofensivos. Quem é “manso” só deseja o bem aos outros (ver com. de Mt.5:5).

Humilde. Quem é verdadeiramente humilde coloca os outros acima de si mesmo. Sendo manso e humilde, Cristo é um mestre compreensivo, e quem aprende dEle também será manso e humilde. O cristão que não aprendeu a ser manso e humilde não aprendeu na escola de Cristo (ver Fp.2:2-8).

Achareis descanso. Ver com. do v. Mt.11:28. Aqueles que acham o descanso do qual fala Jesus andarão nas “veredas antigas” e harmonizarão sua vida com “o bom caminho” da escolha de Deus (ver Je.6:16).

Alma. Do gr. psuchai, singular: psuche (ver com. de Mt.10:28).

Mt.11:30 30. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve.

Suave. Do gr. chrestos, “útil”, “bom”, “gentil” ou “agradável”; não “fácil”, no sentido de não ser difícil. Não há palavra do nosso idioma que seja equivalente a chrestos.

Meu fardo é leve. Quem verdadeiramente ama a Cristo se deleitará em fazer Sua vontade (ver com. de Sl.40:8). Aqueles que tomam o “jugo” da submissão ao Mestre, que aprendem na Sua escola, encontrarão o “descanso” de alma que Ele prometeu. O fardo pesado da justiça legalista, de tentar ganhar a salvação por méritos supostamente obtidos com obras, em vez de assegurá-la por meio dos méritos de Cristo, e o fardo ainda mais pesado do pecado, tudo isso desaparecerá.

Mt.12:1 1. Por aquele tempo, em dia de sábado, passou Jesus pelas searas. Ora, estando os seus discípulos com fome, entraram a colher espigas e a comer.

Por aquele tempo. [Jesus é senhor do sábado, Mt 12:1-8 = Mc.2:23-28 = Lc.6:1-5. Comentário principal: Mc. Ver mapa, p. 215]. Conforme empregada por Mateus, esta expressão não indica necessariamente uma relação cronológica particular entre o que precede e o que se segue. Em vez disso, é uma declaração geral, o que fica evidente a partir de Mt.14:1. O sermão à beira-mar, registrado no Mt.13, foi proferido no outono de 29 d.C. (ver com. de Mt.13:2), cerca de seis meses antes da morte de João Batista, mencionada em Mt.14:2.

Pelas searas. Literalmente, “pelos campos de cereais”.

Espigas. Poderia ser qualquer cereal, talvez trigo ou cevada. É interessante observar que todas as acusações feitas contra os discípulos de Cristo, conforme registradas no livro de Mateus, estavam relacionadas de uma forma ou de outra ao alimento (ver Mt.9:14; Mt.15:2).

Mt.12:2 2. Os fariseus, porém, vendo isso, disseram-lhe: Eis que os teus discípulos fazem o que não é lícito fazer em dia de sábado.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:3 3. Mas Jesus lhes disse: Não lestes o que fez Davi quando ele e seus companheiros tiveram fome?

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:4 4. Como entrou na Casa de Deus, e comeram os pães da proposição, os quais não lhes era lícito comer, nem a ele nem aos que com ele estavam, mas exclusivamente aos sacerdotes?

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:5 5. Ou não lestes na Lei que, aos sábados, os sacerdotes no templo violam o sábado e ficam sem culpa? Pois eu vos digo:

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:6 6. aqui está quem é maior que o templo.

Quem é maior. A evidência textual (cf. p. 136) favorece a variante “o que é maior” (NV1), neutro, em vez de “quem é maior”, masculino, que seria Cristo. “O que é maior”, porém, pode se referir ao verdadeiro espírito de adoração (ver Jo.4:23-24), despertado pela presença de Jesus, em contraste com os materiais de construção do templo e com as formas de adoração realizadas ali. Se o templo em si fosse isento de restrições sabáticas, como poderia o Mestre do templo, o dono da “casa”, e que, portanto, era “maior que o templo”, ser acusado de não observar o sábado? Para os judeus, o templo era mais sagrado que qualquer outra coisa na Terra. Contudo, Cristo afirma que Ele é maior até mesmo que o templo, uma afirmação audaciosa. Ele é “maior que o templo”, Ele é “Senhor do sábado”, uma das mais sagradas instituições religiosas (Mt.12:8). Cristo indica que tanto o templo quanto o sábado foram ordenados ao serviço do ser humano, não o contrário. O ser humano não foi criado para que pudesse haver alguém para adorar no templo e observar o sábado; em vez disso, essas coisas deviam ser para benefício do ser humano (ver com. de Mc.2:27).

Mt.12:7 7. Mas, se vós soubésseis o que significa: Misericórdia quero e não holocaustos, não teríeis condenado inocentes.

Misericórdia quero. Ver com. de Mt.9:13.

Condenado inocentes. A referência é aos discípulos. Com muita frequência, a ignorância quanto ao verdadeiro significado das Escrituras – em outras palavras, conceitos falsos da verdade – e o orgulho misturado aos ciúmes daqueles que conhecem e obedecem à verdade levam a crítica e perseguição (ver com. de Mt.5:10-12).

Mt.12:8 8. Porque o Filho do Homem é senhor do sábado.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:9 9. Tendo Jesus partido dali, entrou na sinagoga deles.

Tendo Jesus partido dali. [O homem da mão ressequida, Mt.12:9-14 = Mc.3:1-6 = Lc.6:6-11. Comentário principal: Mc e Lc]. Talvez em seguida, mas não necessariamente de imediato (ver com. do v. Mt.12:1). Não pode ter sido no mesmo sábado (ver com. de Lc.6:6).

Mt.12:10 10. Achava-se ali um homem que tinha uma das mãos ressequida; e eles, então, com o intuito de acusá-lo, perguntaram a Jesus: É lícito curar no sábado?

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:11 11. Ao que lhes respondeu: Qual dentre vós será o homem que, tendo uma ovelha, e, num sábado, esta cair numa cova, não fará todo o esforço, tirando-a dali?

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:12 12. Ora, quanto mais vale um homem que uma ovelha? Logo, é lícito, nos sábados, fazer o bem.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:13 13. Então, disse ao homem: Estende a mão. Estendeu-a, e ela ficou sã como a outra.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:14 14. Retirando-se, porém, os fariseus, conspiravam contra ele, sobre como lhe tirariam a vida.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:15 15. Mas Jesus, sabendo disto, afastou-se dali. Muitos o seguiram, e a todos ele curou,

Mas Jesus, sabendo disto. [Jesus Se retira, Mt.12:15-21 = Mc.3:7-12. Comentário principal: Mc]. Isto é, quando Jesus soube da conspiração entre os fariseus e os herodianos, depois da cura do homem da mão ressequida na sinagoga no dia de sábado (ver Mt.12:14; ver com. de Mc.3:6). Quanto mais aumentava Sua popularidade, mais forte era a oposição contra Ele (ver com. de Mt.4:24).

Afastou-Se. Provavelmente não até depois do dia de sábado, visto que uma longa jornada de sábado teria desnecessariamente posto os líderes judeus contra Ele (sobre “uma jornada do dia de sábado”, ver p. 38).

Mt.12:16 16. advertindo-lhes, porém, que o não expusessem à publicidade,

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Mt.12:17 17. para se cumprir o que foi dito por intermédio do profeta Isaías:

Dito por intermédio do profeta Isaías. Esta parece ser uma tradução livre, ou paráfrase de Is.42:1-4, embora possa ser uma citação da versão grega que se perdeu desde então. Os primeiros três versículos da citação seguem bem de perto o hebraico de Is.42:1-3, e Mt.12:21 segue quase exatamente a LXX da frase final de Is.42:4, omitindo as primeiras duas frases do versículo (ver com. de Is.42:1-4).

Anunciará juízo. Ou, “anunciará justiça” (NVI).

Mt.12:18 18. Eis aqui o meu servo, que escolhi, o meu amado, em quem a minha alma se compraz. Farei repousar sobre ele o meu Espírito, e ele anunciará juízo aos gentios.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:19 19. Não contenderá, nem gritará, nem alguém ouvirá nas praças a sua voz.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:20 20. Não esmagará a cana quebrada, nem apagará a torcida que fumega, até que faça vencedor o juízo.

A cana quebrada. Ou, “cana esmagada”. Jesus não considerava inúteis nem a cana quebrada nem a torcida fumegante; havia possibilidade de melhoria em ambos os casos.

Não esmagará. Enquanto houvesse a mínima esperança de restauração, Jesus trabalharia com diligência para “vivificar o espírito dos abatidos e vivificar o coração dos contritos” (Is.57:15).

Torcida que fumega. Do gr. linon, “linho”; portanto também sugere qualquer coisa feita de linho. Neste caso, “torcida” é provavelmente um pavio prestes a se apagar, mas o dono da lâmpada quer sua luz e não mede esforços para mantê-lo acesso.

Juízo. Ou, “justiça”.

Mt.12:21 21. E, no seu nome, esperarão os gentios.

Sem comentário para este versículo.

Mt.12:22 22. Então, lhe trouxeram um endemoninhado, cego e mudo; e ele o curou, passando o mudo a falar e a ver.

Então. [A cura de um endemoniado cego e mudo. A blasfêmia dos fariseus. Jesus Se defende, Mt.12:22-32 = Mc.3:22-30 = Lc.11:14-23. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 216; gráfico, p. 228]. O restante do cap. 12 de Mateus (v. 22-50) é uma das passagens mais difíceis de localizar na sequência de eventos do ministério de Cristo. Parece haver boas razões para crer que os v. 22 a 50 são um registro de um único incidente e da controvérsia subsequente que resultou dele. Visto que: (1) Aparentemente pouco tempo se passou entre a cura do endemoniado cego e mudo e a acusação dos fariseus (ver v. Mt.12:24). (2) O pedido por um sinal se repetiu pelo menos duas vezes durante o ministério de Cristo; aqui o incidente observado parece ter sido o primeiro (o segundo ocorreu em Magdala, conforme é declarado em Mt.15:39-16:5, provavelmente durante o verão de 30 d.C.).

Deve-se notar que esse pedido (Mt.12:38) por um sinal foi em resposta à negativa de Cristo de expelir demônios pelo poder de Belzebu. (3) O debate sobre o “espírito imundo” e os “outros sete espíritos” nos v. Mt.12:43-45 sem dúvida seguiram os ensinos dos v. 22 a 42 sem interrupção significativa, como se deduz do DTN, 323. (4) A visita da mãe e dos irmãos de Cristo, mencionada nos v. Mt.12:46-50, ocorreu enquanto “falava ainda Jesus ao povo” (v. Mt.12:46; cf. DTN, 325). De acordo com Mt.13:1, Cristo contou as parábolas do sermão à beira-mar, registrado no cap. Mt.13, no mesmo dia em que deu as instruções registradas em Mateus 12:22 a 50 (sobre evidência da relação cronológica estreita entre Mt 12:22-50 e Mt.13:1-58, ver com. de Mt.13:1; isso colocaria o debate registrado em Mt 12:22-50 no outono de 29 d.C.; ver com. de Mt.13:1; Mc.3:13).

Um endemoninhado. Houve pelo menos dois casos em que Cristo curou um endemoniado cego e mudo (ver DTN, 321; Mt.9:32-35; sobre possessão demoníaca, ver Nota Adicional a Marcos 1; Mc.1:45).

Mt.12:23 23. E toda a multidão se admirava e dizia: É este, porventura, o Filho de Davi?

A multidão se admirava. Ver com. de Mc.2:12.

Filho de Davi. Ver com. de Mt.1:1. A forma da pergunta no grego indica que se esperava uma resposta negativa (ver com. de Lc.6:39). É como se o povo dissesse: “Esse não pode ser o Filho de Davi [o Messias], pode?” Talvez compreendessem que o Messias da profecia faria os milagres que Cristo fez, mas acharam difícil ver em Jesus, alguém aparentemente comum, o Messias da profecia (cf. DTN, 197, 385). O fato de que muitos ouviam a Cristo com prazer (ver Mc.12:37), O reconheciam como um grande Mestre (ver Jo.3:2) e mesmo como um profeta (ver Mt.21:11) não significa necessariamente que O aceitassem como o Messias. Seus muitos milagres acenderam a chama da esperança no coração deles de que Ele pudesse ser o Messias (ver com. de Lc.24:21; cf. DTN, 406), mas as ideias preconcebidas de como o Messias devia ser (ver com. de Mt.4:17; Lc.4:19; cf. DTN, 30) apagava quase de imediato a débil chama.

Mt.12:24 24. Mas os fariseus, ouvindo isto, murmuravam: Este não expele demônios senão pelo poder de Belzebu, maioral dos demônios.

Os fariseus, ouvindo isto. A tênue esperança do povo sobre Jesus como o possível Messias (ver v. Mt.12:23) enfureceu os fariseus. Marcos fala desses fariseus como “os escribas, que haviam descido de Jerusalém” (Mc.3:22), provavelmente espiões enviados pelo Sinédrio para observar e relatar a respeito de Cristo (ver com. de Mc.2:6). Esses inimigos astutos de Jesus não podiam negar que um milagre genuíno tinha sido realizado, pois o homem curado passou “a falar e a ver” (Mt.12:22). Quanto maior a evidência da divindade de Jesus, maiores a raiva e o ódio deles, o que levou alguns a cometer o pecado imperdoável (ver com. dos v. Mt.12:31-32).

Este. Do gr. houtos. Esses fariseus mostraram seu desprezo se recusando a proferir o nome de Jesus e se referindo a Ele de forma desdenhosa como “este” (ver com. de Lc.14:30; Lc.15:2).

Belzebu. As evidências textuais se dividem (cf. p. 136) entre as variantes “Bezebul” e “Belzebu”. O significado do nome é debatido. Talvez o nome Belzebu venha do heb. baal zebul, possivelmente significando “senhor da grande casa [ou templo]” ou “senhor da casa celestial”. Várias tábuas de Ras Shamrah, de cerca de 1400 a.C., falam de “Zebul, príncipe da Terra”. Portanto, Belzebul pode significar “Baal é príncipe”. Sugeriu-se que os judeus possam ter mudado o nome de Beelzebul para Beelzebube, “senhor das moscas”, por desprezarem essa divindade pagã, o deus patrono de Ecrom (ver com. de 2Rs.1:2). Na cura do endemoniado cego e mudo, ficou evidente que o poder atuante era sobre-humano. Os espias se recusaram a admitir que Jesus era divino e tinha poder para realizar o milagre; portanto, devia estar associado ao demônio.

Mt.12:25 25. Jesus, porém, conhecendo-lhes os pensamentos, disse: Todo reino dividido contra si mesmo ficará deserto, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá.

Conhecendo-lhes os pensamentos. Ver com. de Mc.2:8.

Todo reino. Uma nação em guerra civil se enfraquece em relação a outras nações.

Casa. Talvez se refira a um território político como a “casa” daquele que ali governa, embora o princípio declarado fosse igualmente verdadeiro de uma “casa” no sentido de habitação familiar.

Mt.12:26 26. Se Satanás expele a Satanás, dividido está contra si mesmo; como, pois, subsistirá o seu reino?

Expele a Satanás. O inimigo estava envolvido num combate mortal com Cristo (ver Ap.12:7-9; Mt.4:1-11; Jo.12:31; Jo.16:11). O diabo não seria tolo de trabalhar contra si mesmo, confirmando as afirmações de seu arqui-inimigo, Cristo, cooperando com Ele na expulsão de demônios que ele próprio tinha infligido às pessoas. Com base em tal política, “seu reino” certamente ruiria. Dessa forma, Jesus reduziu o argumento dos fariseus ao absurdo, e Seu raciocínio foi tão claro e simples que todos puderam compreender.

Mt.12:27 27. E, se eu expulso demônios por Belzebu, por quem os expulsam vossos filhos? Por isso, eles mesmos serão os vossos juízes.

Por quem os expulsam vossos filhos? Ao mostrar quão absurdo era o argumento dos fariseus, Cristo os confronta com um dilema. Obviamente alguns fariseus declaravam ser capazes de exorcizar espíritos maus, ou Jesus não teria apresentado isso como um fato. Josefo relata que se realizavam ao menos tentativas (Antiguidades, viii.2.5 [45-49]). A palavra “filhos” não se refere à descendência natural dos homens aos quais Cristo falava, mas aos seus seguidores. No AT, alunos das escolas dos profetas eram chamados de “filhos dos profetas” (2Rs.6:1, ARC).

Mt.12:28 28. Se, porém, eu expulso demônios pelo Espírito de Deus, certamente é chegado o reino de Deus sobre vós.

Se, porém. Depois de mostrar quão absurda era a declaração dos fariseus (v. Mt.12:25-26) e os confrontar com um dilema ao qual não puderam responder (v. Mt.12:27), Cristo os conduziu à inevitável conclusão de que o que eles tinham atribuído a Satanás era, na realidade, nada mais que o poder de Deus (ver com. de v. Mt.12:24). Lucas fala desse poder como o “dedo de Deus” (Lc.11:20; Ex.8:19). Durante Seu ministério na Terra, os milagres de Cristo foram realizados pelo poder de Deus, por meio do ministério dos anjos (DTN, 143). Seus milagres atestaram que Ele era o Messias (ver DTN, 406) e, se o Messias estava ali (ver Mt.12:23), Seu “reino” não poderia estar longe.

É chegado. Literalmente, “chegou”.

Mt.12:29 29. Ou como pode alguém entrar na casa do valente e roubar-lhe os bens sem primeiro amarrá-lo? E, então, lhe saqueará a casa.

Como pode alguém entrar [...]? Nesta parábola, Cristo reforça a verdade declarada no v. Mt.12:28 de que era chegado “o reino de Deus” e que o reino de Satanás estava sendo invadido. Cristo é quem entra na “casa” ou no “reino” de Satanás (ver com. do v. Mt.12:25). Uma pessoa não entra na própria casa e “rouba” seus próprios “bens”; Satanás não expulsa Satanás (ver v. Mt.12:26). Portanto, alguém que entra na “casa” de Belzebu (ver com. do v. Mt.12:24), para “roubar-lhe os bens”, deve ser seu inimigo.

Valente. Literalmente, “o homem forte”, em outras palavras, Satanás.

Roubar-lhe os bens. Satanás reivindicou este mundo como dele, afirmando que lhe foi “entregue” (ver Lc.4:6). Nesse sentido, este mundo era sua “casa”, e os seres humanos nela constituíam seus “bens”. Cristo veio para libertar os cativos de Satanás, em primeiro lugar, da prisão do pecado (ver com. de Lc.4:18) e, finalmente, da prisão da morte (ver Ap.1:18). Ao expulsar demônios, Cristo estava tirando as vítimas de Satanás, isto é, seus “bens”.

Sem primeiro amarrá-lo. Quem vai amarrar um “valente” precisa ser mais valente ou forte do que ele (ver Lc.11:22). Apenas Deus é mais forte que Satanás. Portanto, diante da evidência de que Jesus está libertando os cativos de Satanás, deve-se entender que o poder de Deus está operando por meio de Jesus. Os milagres de Cristo testificam não de Sua aliança com Satanás, mas da guerra contra ele (ver DTN, 406).

Mt.12:30 30. Quem não é por mim é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha.

Não é por Mim. No grande conflito pela vida do ser humano não existe meio termo; a neutralidade é impossível (ver DTN, 324). Todo ser humano é patriota ou é traidor. Aquele que não está totalmente do lado de Cristo está totalmente do lado do inimigo, isto é, o peso de sua influência se inclina nessa direção. Estar quase, mas não totalmente, com Cristo é estar totalmente contra Ele. O que Cristo afirma não deve ser considerado uma contradição ao que se declara em Mc.9:40, “quem não é contra nós é por nós”, que significa simplesmente que aqueles que defendem a causa de Cristo não podem ser considerados “contra” Ele.

Mt.12:31 31. Por isso, vos declaro: todo pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens; mas a blasfêmia contra o Espírito não será perdoada.

Todo pecado. Até a “blasfêmia” pode ser perdoada, com uma exceção.

Blasfêmia. Nessa situação em particular, Cristo Se refere a um grupo de fariseus que tinha atribuído o poder do Espírito Santo (ver com. do v. Mt.12:28) ao diabo (v. Mt.12:24), sabendo que a acusação era falsa (ver DTN, 322). Foi essa rejeição deliberada de luz que os estava conduzindo, passo a passo, à “blasfêmia contra o Espírito Santo”. É importante observar que a declaração dos fariseus surgiu como o clímax de um longo processo de rejeição das evidências cada vez mais claras da divindade de Jesus (ver DTN, 213, 538), processo que se iniciou no nascimento de Jesus (ver DTN, 63), mas que se tornou mais intenso à medida que Seu ministério progredia. Quanto mais clara a evidência, mais forte a oposição contra Ele (cf. Os.4:6). O passar do tempo e cada encontro com Jesus serviram apenas para revelar a hipocrisia deles. Eles se tornaram mais e mais amargos e falavam de forma cada vez mais violenta, até declararem abertamente que Cristo estava possesso de demônio e trabalhava em colaboração com Satanás, como um de seus cúmplices (cf. T5, 634). A partir de então, estavam sob o controle do poder a que acusaram a Cristo de estar sujeito (DTN, 323).

A blasfêmia contra o Espírito Santo, ou o pecado imperdoável, consiste da resistência progressiva à verdade, culminando numa decisão final e irrevogável contra ela, de forma deliberada no pleno conhecimento de que, ao fazer isso, decide-se buscar o caminho oposto à vontade divina. A consciência é cauterizada pela resistência contínua às impressões do Espírito Santo, e quem está nessa situação dificilmente percebe que tomou uma decisão fatal. Para uma pessoa assim, não há como decidir agir em harmonia com a vontade de Deus (ver DTN, 324). Portanto, se a pessoa sente o temor de ter cometido o “pecado imperdoável” significa que, na verdade, não o cometeu. A pessoa mais miserável do mundo é aquela cuja consciência é atormenta por fazer o que é errado quando sabe que deveria fazer o certo. Uma experiência cristã miserável é em geral o resultado de não se viver à altura da luz que tem. A pessoa cuja consciência a perturba pode solucionar o problema das seguintes maneiras: (1) rendendo-se ao poder transformador do Espírito Santo e respondendo aos impulsos do Espírito de modo a corrigir os erros cometidos contra Deus e contra o próximo, ou (2) pode cauterizar sua consciência e eliminar seus dolorosos impulsos, silenciando o Espírito Santo (ver Ef.4:30).

A pessoa que escolhe o último caminho não pode se arrepender, pois sua consciência se torna insensível para sempre e ela não tem vontade de se arrepender. Colocou-se deliberadamente além do alcance da graça divina. O persistente mau uso do livre-arbítrio resulta na perda do poder para discernir entre o bem e o mal. O mau finalmente parece ser bom, e o bom parece ser mau (ver Mq.3:2; ver com. de Is 5:20). Tal é o engano do pecado.A consciência é chamada de os olhos de Deus na mente do ser humano. E um monitor divinamente implantado que impulsiona a sempre viver em obediência à luz revelada. Corromper ainda que o mínimo a consciência é correr risco de morte eterna. A desobediência deliberada e persistente a Deus finalmente se torna um hábito que não pode ser abandonado (ver DTN, 324; comparar com o processo chamado de endurecimento do coração, ver com. de Ex.4:21).

Não será perdoada. Não porque Deus não esteja disposto a perdoar, mas porque quem comete esse pecado não deseja ser perdoado, e esse desejo é vitalmente necessário para o perdão. A pessoa prejudicou severamente sua linha de comunicação com o Céu, a fim de que não fosse mais incomodada com os chamados de advertência do Espírito Santo.

Mt.12:32 32. Se alguém proferir alguma palavra contra o Filho do Homem, ser-lhe-á isso perdoado; mas, se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será isso perdoado, nem neste mundo nem no porvir.

Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Ser-lhe-á isso perdoado. Comparar com a oração que Cristo fez pelo perdão dos soldados que O pregaram na cruz (ver Lc.23:34). Muitos dos sacerdotes e líderes do povo, junto com milhares de outros, finalmente “creram nEle” e, depois do Pentecostes, ficaram do lado dos discípulos (ver Jo.12:42; At.6:7). Foram perdoados porque antes não tinham discernido completamente o caráter divino de Jesus (DTN, 322). O fato de não terem reconhecido Jesus como o Messias da profecia, devido à má compreensão das profecias do AT (DTN, 30), não os deixou insensíveis à verdade e, quando viram a verdade em Cristo Jesus, colocaram-se corajosamente ao Seu lado. Não lhe será isso perdoado. Ver com. do v. Mt.12:31.

Neste mundo. Literalmente, “nesta era” (ver com. de Mt.13:39).

Nem no porvir. Isto é, a “era” porvir, ou a vida futura. Não haverá um segundo tempo de graça.

Mt.12:33 33. Ou fazei a árvore boa e o seu fruto bom ou a árvore má e o seu fruto mau; porque pelo fruto se conhece a árvore.

Ou. [Árvores e seus frutos, Mt.12:33-37 = Lc.6:43-45].

Os fariseus eram inconsistentes. Eles tinham atribuído a libertação da possessão demoníaca – certamente algo “bom” ­– aos próprios demônios (ver v. Mt.12:24). Se os frutos são bons, a árvore também deve ser boa.

A árvore. Conforme torna evidente o contexto, Jesus Se refere a Si mesmo. A cura do endemoniado cego e mudo (v. Mt.12:22) foi o “fruto”, e ninguém que testemunhou o milagre poderia negar que o “fruto” era “bom”. Porém, os fariseus atribuíram esse bom “fruto” a uma “árvore” má, a “Belzebu, maioral dos demônios” (v. Mt.12:24). Mas Jesus declarou que somente um bom caráter pode produzir “coisas boas”, assim como um caráter mau produz “coisas más” (v. Mt.12:35). Uma “árvore boa” sempre será conhecida por seu “fruto bom”, e uma “árvore má” por seu “fruto mau” (ver com. de Mt.7:16-20). Assim, os fariseus foram inconsistentes em atribuir o bom “fruto” a uma “árvore má”. Com frequência, o AT compara alguém, ou um povo, a uma árvore (ver com. de Jz.9:8-10; Sl.1:3; Is.56:3; Dn.4:10). Mais tarde, Jesus Se comparou a uma “videira”, Seus discípulos, aos “ramos” e aqueles que seriam ganhos para o reino com os “frutos” (ver Jo.15:5-8; sobre outros exemplos do emprego da mesma figura para representar e ensinar verdades diferentes, ver com. de Mt.13:33).

Mt.12:34 34. Raça de víboras, como podeis falar coisas boas, sendo maus? Porque a boca fala do que está cheio o coração.

Raça de víboras. Ou, “descendência de víboras” (ver com. de Mt.3:7).

Como podeis [...]? O “fruto” (v. Mt.12:33), ou a “raça” (v. 34), dos fariseus não era bom. As coisas que falavam ­– seu fruto – eram más, e isso, por sua vez, apontava para uma fonte má. Agiam como víboras, eram “raça de víboras” (ver com. de Jo.8:44).

Cheio o coração. As palavras são em maior ou menor grau um reflexo do que está na mente. As palavras blasfemas dos fariseus (v. Mt.12:24) não eram acidentais, mas representavam o que estava no seu coração. As palavras revelam os pensamentos.

Mt.12:35 35. O homem bom tira do tesouro bom coisas boas; mas o homem mau do mau tesouro tira coisas más.

O homem bom. Aplicação literal do princípio declarado no v. Mt.12:33 sob a figura de uma árvore.

Tesouro. Do gr. thesauros, “cofre [para joias]”, “uma tesouraria”, “um armazém” (ver com. de Mt.2:11). Neste caso, refere-se à mente como um armazém onde se guardam o conhecimento e a experiência acumulados e as atitudes e emoções cultivadas, a fim de empregá-los para enfrentar os problemas da vida.

Do seu coração (ACF). A evidência textual favorece (cf. p. 136) a omissão destas palavras.

Tira. Literalmente, “lança fora”.

Mt.12:36 36. Digo-vos que de toda palavra frívola que proferirem os homens, dela darão conta no Dia do Juízo

Frívola. Literalmente, “que não trabalha”, “improdutiva”, “inútil” e, portanto, como neste caso, “perniciosa”. Ao acusarem a Cristo de expulsar demônios em nome do príncipe dos demônios (v. Mt.12:24), os fariseus tinham mentido deliberadamente.

Darão conta. Todos são responsáveis pelo modo como usam o livre-arbítrio.

Dia do Juízo. Ver com. de Mt.3:12.

Mt.12:37 37. porque, pelas tuas palavras, serás justificado e, pelas tuas palavras, serás condenado.

Justificado. Isto é, “declarado justo” ou “ser vindicado”. Isto só acontece quando as palavras de uma pessoa estão em harmonia com seu conhecimento da verdade. Do contrário, a pessoa provará ser hipócrita, e como tal está “condenada”.

Mt.12:38 38. Então, alguns escribas e fariseus replicaram: Mestre, queremos ver de tua parte algum sinal.

Então. [O sinal de Jonas, Mt.12:38-42 = Lc.11:29-32]. Sobre a relação dos v. 38 a 42 com a seção anterior do cap. 12, ver com. do v. Mt.12:22.

Alguns escribas. Quase todo o capítulo trata da oposição dos fariseus a Cristo (ver v. Mt.12:2; Mt.12:14; Mt.12:24; Mt.12:38). Somente os v. Mt.12:46-50 falam de outro assunto (sobre os escribas, ver p. 43; ver com. de Mc.1:22).

Fariseus. Ver p. 39, 40.

Mestre. Do gr. didaskalos, “professor”. Ao se referirem a Jesus como “Mestre”, os escribas e fariseus não admitiram que Ele fosse um. Ele ensinava, e didaskalos era a forma popular de se dirigir a alguém que ensinava.

Algum sinal. O outro pedido por um sinal, registrado em Mt.16:1-5, provavelmente se deu durante o verão de 30 d.C., mais ou menos nove meses após o incidente registrado aqui. Tendo em vista o notável milagre que acabara de ser realizado (Mt.12:22-23; DTN, 321), o pedido por um “sinal” (ver p. 204; ver com. de Lc.2:12) não passava de um insulto. Indicava que o que acontecera não era um milagre e insinuava sutilmente que Cristo ainda não tinha dado nenhuma evidência que atestasse suas pretensões sobrenaturais. Que tipo de “sinal” queriam ou esperavam? Possivelmente quisessem ver algum portento no céu (ver Jl.2:30; Ap.13:13), ou um “sinal” tal como aqueles pelos quais Moisés confirmou sua missão perante faraó (ver Ex.7:9-13).

Talvez considerassem que um sinal assim fosse uma demonstração convincente de poder sobrenatural. Durante o julgamento de Cristo perante o Sinédrio, os líderes judeus novamente pediram um milagre (DTN, 704, 705). Herodes fez uma exigência similar e prometeu libertar Jesus se desse esse “sinal” (DTN, 729). A falta de sinceridade em todos esses pedidos é confirmada a partir do fato de que nenhum daqueles que os fizeram reagiram de forma favorável aos milagres que Cristo realizou. Cada evidência de Sua divindade só os tornava ainda mais determinados a silenciá-Lo, até que, finalmente, a ressurreição de Lázaro serviu para que redobrassem seus esforços para matá-Lo.

Mt.12:39 39. Ele, porém, respondeu: Uma geração má e adúltera pede um sinal; mas nenhum sinal lhe será dado, senão o do profeta Jonas.

Geração. Ver com. de Mt.11:16; Mt.23:36.

Má e adúltera. Eram “adúlteros” no sentido de que tinham quebrado o elo que os unia a Deus como Seu povo escolhido. No AT, a apostasia era comumente chamada de adultério (ver com. de Sl.73:27).

Nenhum sinal. Um povo duro e apóstata não tinha direito de pedir um sinal e, mesmo que o testemunhassem, não o aceitariam. Não havia nada a se ganhar, lançando pérolas aos porcos (ver com. de Mt.7:6). Em “Moisés e os Profetas” (ver Lc.16:31) havia luz suficiente para conduzir o ser humano no caminho da salvação; e a razão básica pela qual os escribas e fariseus se recusaram a aceitar a Cristo era que não tinham crido nas profecias do AT que testificavam dEle (ver Jo.5:45-47).

Jonas. Em que sentido o profeta Jonas era um “sinal”? A resposta está nos aspectos do ministério de Jonas comentados por Cristo. O primeiro foi seu encontro com o monstro das profundezas (v. Mt.12:40); o segundo, sua pregação exitosa ao povo de Nínive (v. Mt.12:41).

Mt.12:40 40. Porque assim como esteve Jonas três dias e três noites no ventre do grande peixe, assim o Filho do Homem estará três dias e três noites no coração da terra.

Porque assim como esteve Jonas. A ressurreição de Cristo foi o milagre supremo de Sua missão na Terra, e Ele dirige Seus críticos para esse grande acontecimento futuro.

Três dias. Ver p. 245-249.

Do grande peixe. Do gr.

ketos, que quer dizer qualquer monstro marinho ou peixe gigante, não necessariamente uma “baleia” (ver com. de Jn.1:17; Jn.2:1). A constelação da Baleia (Cetus) representa um monstro marinho e seu nome latino é simplesmente uma transliteração do gr.

ketos.

Coração da terra. Sem dúvida, Cristo Se refere ao tempo em que passaria na tumba de José, desde a tardinha de sexta-feira até o domingo de manhã.

Mt.12:41 41. Ninivitas se levantarão, no Juízo, com esta geração e a condenarão; porque se arrependeram com a pregação de Jonas. E eis aqui está quem é maior do que Jonas.

Ninivitas. O “sinal do profeta Jonas” (v. Mt.12:39) consistia não só do fato de ter saído de forma milagrosa do “ventre do grande peixe”, mas também de seu ministério exitoso entre o povo de Nínive, capital da antiga Assíria (ver DTN, 406).

Ninivitas Se levantarão. Isto é, serão testemunhas no juízo final. Sugeriu-se que a expressão aramaica que Cristo empregou originalmente significava “acusar”.

Esta geração. Ver com. de Mt.11:16; Mt.23:36; Mt.24:34.

Porque se arrependeram. Não se sabe se Jonas contou ou não às pessoas de Nínive sobre sua experiência com o monstro marinho. A Bíblia não diz nada a esse respeito. O importante é que os ninivitas “se arrependeram” a despeito de Jonas não ter realizado milagres. Aceitaram sua mensagem pela autoridade que demonstrava, porque atingiu o coração deles (ver Jn.3:5-10). O mesmo deveria ter acontecido no caso dos escribas e fariseus, pois a mensagem que Cristo pregava certamente levava consigo evidência convincente de Sua autoridade (ver com. de Mc.1:22; Mc.1:27). Porém, além das palavras que transmitia, Ele operou milagres, e esses constituíram um testemunho adicional de que Suas palavras eram verdadeiras (ver Jo.5:36). Porém, apesar de todas essas evidências, os escribas e fariseus ainda se recusaram a acreditar nas evidências apresentadas.

Maior do que Jonas. Isto é, o próprio Cristo (ver com. do v. Mt.12:6).

Mt.12:42 42. A rainha do Sul se levantará, no Juízo, com esta geração e a condenará; porque veio dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão. E eis aqui está quem é maior do que Salomão.

A rainha do Sul. A rainha de Sabá, que visitou a corte de Salomão (ver com. de 1Rs.10:1; 1Rs.10:3; 1Rs.10:9).

A sabedoria de Salomão. Ver com. de 1Rs.3:12. A sabedoria divina, revelada por intermédio de Salomão, convenceu a rainha de Sabá de que Deus estava com ele. E, como Jonas (ver com. do v. Mt.12:41), Salomão não realizou nenhum milagre; suas palavras foram suficientes. Se as palavras de Jonas e de Salomão foram evidências convincentes de que Deus falava por meio deles, Jesus indicou que Suas palavras deviam, do mesmo modo, ser provas suficientes.

Maior do que Salomão. Ver com. dos v. Mt.12:6; 42.

Mt.12:43 43. Quando o espírito imundo sai do homem, anda por lugares áridos procurando repouso, porém não encontra.

Espírito imundo. [A estratégia de Satanás, Mt 12:43-45 = Lc.11:24-26].

Sinônimo de “demônio”. Os comentários de Cristo (v. 43-45) podem ser considerados como uma continuação da explanação sobre o pecado imperdoável (v. Mt.12:31-37). A linha de pensamento de Cristo foi interrompida (ver v. Mt.12:38-42) pela exigência de um sinal e, então, Ele continua de onde parou, depois de ter respondido ao pedido. Esse conselho (v. 43-45) se aplica em especial àqueles que ouviram a mensagem do evangelho com prazer, mas não se entregaram ao Espírito Santo (DTN, 323). Estes ainda não tinham cometido o pecado imperdoável, e Jesus lhes advertiu a não fazê-lo (sobre possessão demoníaca, ver Nota Adicional a Marcos 1; Mc.1:45; sobre as parábolas, ver p. 197-204). No caso de uma doença, as recaídas resultam numa condição bem mais grave do que a original. A força física, já diminuída em grande parte, torna-se impotente diante do renovado ataque da enfermidade. A recaída com frequência se deve ao fato de o paciente não perceber sua fraqueza física e confiar demais em si mesmo. Ao nos recuperarmos da doença do pecado, devemos confiar totalmente nos méritos e no poder de Cristo.

Lugares áridos. Regiões desérticas, onde o espírito não encontraria seres humanos – nenhuma “casa” (v. Mt.12:44). Portanto, estaria intranquilo por não ter um lar.

Mt.12:44 44. Por isso, diz: Voltarei para minha casa donde saí. E, tendo voltado, a encontra vazia, varrida e ornamentada.

Voltarei. A expressão “espírito imundo” (v. Mt.12:43) indica que sua ausência podia ser temporária. É provável que Cristo tinha em mente o homem do qual expulsara um demônio pouco tempo antes (ver com. do v. Mt.12:22). Talvez esse homem estivesse entre os ouvintes, e essa pode ter sido uma advertência para ele em particular, bem como aos ouvintes em geral. Certamente o foi para os fariseus (ver v. Mt.12:31-37).

Vazia, varrida e ornamentada. A condição da “casa”, isto é, pessoa, restaurada à situação antes de o demônio se estabelecer ali. A religião cristã não consiste basicamente em se abster do mal, mas em aplicar a mente e a vida de forma inteligente e diligente ao que é bom. O cristianismo não é uma religião negativa que consiste de várias proibições, mas uma força positiva e construtiva para o bem. Não é suficiente que demônios, quer literais ou simbólicos, sejam expulsos do coração e da mente; o Espírito de Deus deve entrar na vida e ser posto no controle do pensamento e da conduta (ver 2Cr.6:16; Ef.2:22). Não é suficiente odiar o mal; devemos amar e cuidar do que é bom (ver Am.5:15; 2Ts.2:10; ver com. de Mt.6:24).

O infeliz representado pela “casa” não se colocou do lado de Deus de forma positiva. Suas intenções eram boas. Não imaginava que o espírito imundo voltaria e, portanto, falhou em entregar a “casa” ao controle de Cristo. A submissão a Cristo não lhe possibilitaria usar a “casa” como quisesse, por isso decidiu, ao menos por um tempo, viver a vida como bem entendesse. Se tivesse se entregado a Cristo, um novo poder teria estado no controle (ver Rm.6:16), e o espírito imundo jamais teria entrado. Nossa única segurança está na entrega total do coração a Cristo, a fim de que Ele possa entrar e viver vida perfeita em nós (Gl.2:20; Ap.3:20). Essa parábola é uma advertência solene contra simples melhorias; não é suficiente evitar o mal, devemos ativamente buscar “as coisas lá do alto” (Cl.3:1-2).

Mt.12:45 45. Então, vai e leva consigo outros sete espíritos, piores do que ele, e, entrando, habitam ali; e o último estado daquele homem torna-se pior do que o primeiro. Assim também acontecerá a esta geração perversa.

Outros sete espíritos. Sete, o número simbólico que designa plenitude, indica completa possessão demoníaca.

Ultimo estado. Muitas vezes, aqueles que foram curados da doença do pecado sofrem uma recaída e se tornam mais fracos espiritualmente do que estavam antes. Sem perceber quão cuidadosos devem ser para evitar a tentação e se cercar de boas influências, expõem-se desnecessariamente às tentações do mundo, muitas vezes, com resultados fatais (ver DTN, 256). Assim foi com Saul, que, embora uma vez tivesse estado sob o poder e a influência do Espírito Santo (ver 1Sm.10:9-13), não se submeteu total e completamente a Deus e, como resultado, foi exposto ao controle de um espírito mau (ver 1Sm.16:14; 1Sm.18:10; 1Sm.19:9) que, finalmente, o levou ao suicídio. Assim foi também com Judas, que em princípio esteve suscetível à influência de Cristo, mas que não submeteu a vida exclusivamente a essa influência (DTN, 294, 717; ver com. de Mt.13:7).

Esta geração perversa. Ver v. Mt.12:39; ver com. de Mt.11:16; Mt.23:36. Os líderes de Israel estavam rejeitando a luz que lhes fora dada.

Mt.12:46 46. Falava ainda Jesus ao povo, e eis que sua mãe e seus irmãos estavam do lado de fora, procurando falar-lhe.

Falava ainda. [A família de Jesus, Mt.12:46-50 = Mc.3:31-35 = Lc.8:19-21. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 216; gráfico, p. 228]. Ver Lc.11:27-28.

Sua mãe. Embora, sem dúvida, estivesse preocupada com seu filho, Maria tinha fé nEle, uma fé não compartilhada pelos irmãos de Jesus (ver Jo.7:5). Foi ideia deles, não dela, impedir que Cristo trabalhasse mais em favor do povo (ver DTN, 321). Esperavam que Ele se rendesse ao apelo persuasivo de Maria, pois não criam que Ele os ouviria (cf. DTN, 87).

Seus irmãos. Os escritores do evangelho deixam claro que esses eram filhos de José de um casamento anterior. O fato de Jesus ter confiado Sua mãe aos cuidados de João (ver Jo.19:26-27) indica que os “irmãos” (e irmãs) de Jesus não eram filhos de Maria. A atitude e o relacionamento desses irmãos com Jesus mostram que eram mais velhos que Cristo. Eles tentaram impedi-Lo (ver com. de Mc.3:21), trataram-No com escárnio (ver Jo.7:3-4) e interferiram em Sua missão (cf. Mc.3:31) de uma forma que apenas irmãos mais velhos ousariam fazer naquela época. Para alguém familiarizado com a vida nas terras bíblicas, esse argumento por si só parece conclusivo.

Os registros dos evangelhos afirmam que os irmãos eram filhos de José, mas não de Maria (ver DTN, 86, 87, 90, 321). Embora esses “irmãos” não cressem em Jesus nessa ocasião (Jo.7:3-5), mais tarde, aceitaram-No e foram contados entre Seus seguidores (ver com. de At.1:14). Nessa época, os irmãos de Jesus estavam preocupados com os relatos que ouviam sobre Sua obra, em especial, o fato de que Jesus quase não tinha tempo para comer e dormir. Pensaram que era imprudente em Suas atividades (DTN, 321) e tentaram persuadi-Lo a seguir as ideias que eles tinham sobre como devia proceder (DTN, 326). Sem dúvida, também estavam preocupados por causa da relação cada vez mais tensa entre Ele e os líderes judeus.

Do lado de fora. Não está claro se isto significa “do lado de fora” da multidão que rodeava Jesus, ou da casa mencionada um pouco adiante na narrativa (ver com. de Mt.13:1).

Mt.12:47 47. E alguém lhe disse: Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e querem falar-te.

Alguém Lhe disse. A evidência textual se divide (cf. p. 136) entre a inclusão e a omissão deste versículo, embora todos os manuscritos contenham as declarações paralelas de Mc.3:32 e Lc.8:20. O contexto favorece sua inclusão.

Mt.12:48 48. Porém ele respondeu ao que lhe trouxera o aviso: Quem é minha mãe e quem são meus irmãos?

Quem é Minha mãe [...]? Ver com. de Jo.2:4. Está claro que Jesus era dedicado à sua mãe (ver Jo.19:26-27). Seu ponto de vista do dever dos filhos para com os pais também é apresentado claramente em Seus ensinos (ver Mc.7:9-13). O que Ele quer dizer com essa indagação é que mesmo aqueles mais íntimos e mais queridos para Ele não tinham o direito de interferir na Sua obra ou dizer como devia ser realizada (cf. Mt.16:23; ver com. de Lc.2:49).

Mt.12:49 49. E, estendendo a mão para os discípulos, disse: Eis minha mãe e meus irmãos.

Os discípulos. Incluindo não só os doze, mas muitos outros (ver com. de Mc.3:13; Lc.10:1). Contudo, os doze eram, num sentido especial, “membros da família de Jesus” (DTN, 349), e Jesus era a cabeça da família (ver 1Co.11:3; Ef.5:23).

Mt.12:50 50. Porque qualquer que fizer a vontade de meu Pai celeste, esse é meu irmão, irmã e mãe.

Vontade de Meu Pai. Ver com. de Mt.7:21; Lc.8:21.

Meu irmão. Jesus faz uma aplicação pessoal ao usar esses substantivos no singular. Todos os que reconhecem a Deus como Pai são membros de “toda família, tanto no Céu como sobre a terra” (Ef.3:15). Os laços que unem os cristãos ao Pai celestial e uns aos outros são mais fortes e verdadeiros, até do que laços de sangue, e mais duradouros. Eis uma clara negativa de que os cristãos devam dar atenção especial a Maria (ver com. de Lc.11:28).

Mt.13:1 1. Naquele mesmo dia, saindo Jesus de casa, assentou-se à beira-mar;

Naquele mesmo dia. [O sermão junto ao mar; A parábola do semeador; do joio; do grão de mostarda; do fermento; do tesouro escondido; da pérola; da rede; e das coisas novas e velhas, Mt.13:1-52 = Mc.4:1-34 = Lc.8:4-18; Lc.13:18-21. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 219; gráfico, p.231; sobre os milagres, ver p. 197-204]. Isto é, no mesmo dia em que ocorreram os eventos registrados em Mt.12:22-50 (ver com. de Mt.12:22). Os eventos registrados em Mt.8:18-27 se deram ao final desse mesmo dia (ver Mc.4:35; ver com. Mt.8:18). Embora não haja provas de que, nesse dia, Jesus estivesse mais ocupado do que nos demais, o registro completo dele ganhou o nome de “o dia cheio”. Foi um desses dias comuns em que Jesus mal tinha tempo para comer ou descansar (ver DTN, 333).

Saindo Jesus de casa. Isso indica que os eventos registrados em Mt.12:22-50, que ocorreram mais cedo no mesmo dia, se deram em alguma casa, talvez na de Pedro, em Cafarnaum (ver com. de Mc.1:29), próximo ao limite norte da planície de Genesaré, ou talvez em alguma casa em Magdala, próximo à fronteira ao sul (ver DTN, 405).

Assentou-Se. Posição usual dos rabis ao ensinar (ver p. 46; ver com. de Lc.4:20).

À beira-mar. Provavelmente, em algum lugar ao longo da margem do mar da Galileia, entre Cafarnaum e Magdala, onde a planície de Genesaré chega ao lago (ver PJ, 34).

Mt.13:2 2. e grandes multidões se reuniram perto dele, de modo que entrou num barco e se assentou; e toda a multidão estava em pé na praia.

Grandes multidões. Sobre as grandes multidões que seguiam Jesus durante a segunda viagem pela Galileia, no outono de 29 d.C., ver com. de Mt.8:1; Mt.8:18; Mt.12:15. Nessa ocasião, a multidão se aglomerou próximo a Jesus, de modo que Ele teve que entrar num barco.

Num barco. Parece que (ver PJ, 34), quando Jesus deixou a casa (v. Mt.13:1), Ele foi para a margem, esperando entrar no barco e cruzar o lago em seguida. Mas os apelos urgentes dos enfermos e as necessidades do povo de escutar as palavras da verdade O detiveram (ver PJ, 33-34; cf. Mt.9:36).

Na praia. Do gr. aigialos, “uma praia”, ou “uma margem”.

Mt.13:3 3. E de muitas coisas lhes falou por parábolas e dizia: Eis que o semeador saiu a semear.

De muitas coisas lhes falou. Até então, Cristo tinha algumas vezes feito uso de breves ilustrações que podiam ser chamadas de parábolas (ver Mt.7:24-27). Neste caso, pela primeira vez (DTN, 333; PJ, 20), Ele fez das parábolas o meio principal de transmitir a verdade. Talvez o Sermão do Monte tivesse sido proferido não mais que duas semanas antes (ver com. de Mt.5:1). Era provavelmente o outono de 29 d.C. e, do outro lado da planície de Genesaré, região mais fértil de toda a Galileia (ver com. de Lc.5:1), se podiam ver lavradores semeando o grão do inverno (PJ, 34; ver vol. 2, p. 92; um resumo dos eventos desse dia atarefado encontra-se no com. de Mt.12:22; Mt.13:1). Ao menos dez parábolas foram proferidas nessa ocasião. Às oito registradas em Mateus, Marcos acrescenta a da candeia (Mc.4:21-23) e a da semente (v. Mc.4:26-29). Consideradas como um todo, as parábolas conforme registradas em Mateus, apresentam diferentes aspectos do reino dos céus.

O semeador. Enquanto Cristo falava (PJ, 34), era possível ver lavradores espalhando sementes no solo fértil da planície de Genesaré, que se estende das águas azuis do mar da Galileia até as colinas. Embora seja conhecida como parábola do semeador, poderia ser chamada de “parábola dos solos”, ou “do semeador, da semente e dos solos”. Sua característica peculiar não é o semeador nem a semente, os quais também figuram na parábola do joio (v. Mt.13:24-30), mas sim os quatro tipos de solo nos quais a semente caiu quando semeada. A parábola enfatiza o modo como a semente foi recebida pelos quatro tipos de solo, bem como o efeito que isso teve no crescimento da semente (ver PJ, 43). A habilidade do semeador e a qualidade da semente são os mesmos com relação a cada um dos quatro tipos de solo (ver com. do v. Mt.13:8).

A verdade particular representada pela semente nessa parábola é a natureza da missão de Cristo na Terra como o Messias. Em maior ou menor grau, a verdadeira natureza do reino de Cristo era um mistério (ver v. Mt.13:11), pois o orgulho humano tinha obscurecido a compreensão popular das profecias messiânicas. O povo judeu esperava que o Messias viesse como um poderoso conquistador, que ocupasse o trono de Davi e subjugasse todas as nações perante os judeus (ver DTN, 30; ver com. Lc.4:19). Mas, na parábola do semeador, Jesus apresenta a verdadeira natureza de Sua missão, o fato de ter vindo não para subjugar os pagãos a Israel, mas para subjugar o coração das “ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mt.15:24). Ele ja tinha apresentado essa mesma verdade de forma mais solene no Sermão do Monte (ver com. de Mt.5:2).

Saiu. No antigo Oriente Médio, assim como nos dias atuais, em alguns lugares dessa região, lavradores costumavam viver juntos em vilas para se protegerem contra ladrões. Pela manhã, ao raiar do dia, saíam de suas vilas para os campos ao redor e ao entardecer retornavam para casa. Do mesmo modo Cristo, o semeador da verdade, “saiu” do lado do Pai, no Céu, para este mundo, o “campo” (ver v. Mt.13:38), a fim de que pudesse “dar testemunho da verdade” (Jo.18:37; Jo.10:10).

Mt.13:4 4. E, ao semear, uma parte caiu à beira do caminho, e, vindo as aves, a comeram.

A beira. Não no caminho da vila para os campos, mas num caminho ao longo do limite do campo, ou num caminho que cruzava o campo e levava a campos mais distantes. Por causa da superfície dura do caminho, a semente fica exposta e não tem sequer a chance de germinar. Os ouvintes da beira do caminho são superficiais, sobre os quais a verdade do evangelho não tem efeito. Conforme o dito popular, aquilo que ouvem entra por um ouvido e sai pelo outro. Não percebem sua necessidade pessoal do evangelho. Não prestam atenção, não compreendem (v. Mt.13:19). Parece que a verdade não lhes faz sentido.

Aves. Isto é, as aves que sempre estão presentes no momento de arar o solo e semear a semente. De acordo com Mateus, as aves representam “o maligno” (v. Mt.13:19); de acordo com Marcos, Satanás (Mc.4:15); e, segundo Lucas, o diabo (Lc.8:12).

Mt.13:5 5. Outra parte caiu em solo rochoso, onde a terra era pouca, e logo nasceu, visto não ser profunda a terra.

Solo rochoso. Ao que tudo indica, isso não se refere ao solo coberto por pedras soltas, mas a rochas bem próximas à superfície, cobertas por uma fina camada de terra. Com exceção de alguns lugares favoráveis, esse tipo de solo limitava em boa medida o valor e a utilidade das terras para agricultura na Palestina. A semente do evangelho que cai no coração de ouvintes representados pelo solo rochoso encontra terra suficiente para germinar, mas de pouca profundidade e, com isso, o efeito do evangelho é no máximo superficial. O evangelho toca as emoções dessas pessoas, que reagem a ele prontamente, mas essa impressão passa da mesma forma que as instáveis emoções que a causaram. A rocha do egoísmo (ver PJ, 46) impede o evangelho de operar uma reforma na vida. Todo o esforço para servir a Cristo é estorvado pelo propósito fundamental de servir ao eu (ver PJ, 50), de modo que o evangelho tem pouca ou nenhuma influência. Ouvintes representados pelo solo rochoso tendem a seguir suas inclinações.

Qualquer convicção que tenham se baseia na inclinação em vez de no princípio. É evidente que a verdade lhes comove em certa medida; admitem que ela é boa; mas amam a si mesmos. Aceitam o que lhes parece bom no momento, mas não avaliam o preço do discipulado; não aplicam os princípios do evangelho à vida, e não lhes dão oportunidade de reformar seus padrões de pensamento e ação. Não estão dispostos a encarar o fato de que seus hábitos devem ser mudados.

A terra era pouca. As pedras que ficavam logo abaixo da superfície do solo absorviam o calor e tiravam a umidade do solo acima dele.

Logo. Isto é, “imediatamente”. O calor adicional no solo refletido pelas pedras causou rápida germinação. Contudo, a terra não era profunda para reter umidade e alimentar as raízes.

Mt.13:6 6. Saindo, porém, o sol, a queimou; e, porque não tinha raiz, secou-se.

Secou-se. A germinação foi rápida, assim como a morte. A única esperança para ouvintes de solo pedregoso é nascer de novo (PJ, 48). A influência superficial do evangelho sobre eles não os faz confessar e abandonar o pecado (ver com. do v. Mt.13:5). Não experimentam a justificação. Sua reação ao evangelho não resulta em conversão.

Mt.13:7 7. Outra caiu entre os espinhos, e os espinhos cresceram e a sufocaram.

Espinhos. Do gr. akantha, “espinho” ou “sarça”; akantha também é usado com referência a qualquer planta espinhosa, como o cardo. Em Lucas, Jesus define os espinhos da vida do cristão como os “cuidados, riquezas e deleites da vida” (Lc.8:14; Mt.13:22). No solo espinhoso, as plantas tenras não secam tão rapidamente quanto no rochoso. Do mesmo modo, a experiência dos cristãos representados pelo solo espinhoso vai além dos ouvintes representados pelo solo rochoso. Eles têm o que parece ser um começo real e, aparentemente, experimentam justificação e o novo nascimento. Mas logo se cansam “de fazer o bem” (Gl.6:9) e não se deixam levar “para o que é perfeito” (Hb.6:1). Absorvidos pelos prazeres deste mundo e na busca de suas atrações, deixam de eliminar da vida as tendências e os traços de caráter que respondem à tentação. São como a pessoa que foi liberta da possessão demoníaca apenas para ser tomada de novo por sete espíritos imundos (ver com. de Mt.12:43-45). Muitas das coisas que atraem os ouvintes representados pelo solo espinhoso e que absorvem sua atenção podem não ser em si mesmas prejudiciais. Mas tais pessoas se tornam tão atraídas por este mundo que não têm tempo de se preparar para a eternidade.

Os espinhos cresceram. Os espinhos impediram que o trigo amadurecesse (ver Lc.8:14). Do mesmo modo, interesses seculares impedem que os frutos do Espírito (Gl.5:22-23) amadureçam. A religião é relegada à posição subordinada de ser apenas um interesse entre muitos. Por falta de cultivo, seca e finalmente morre. Os ouvintes do solo espinhoso precisam de uma transformação moral (PJ, 50). Para eles, a justificação é o todo e a substância da religião e não percebem que a vida do cristão consiste essencialmente no processo conhecido como santificação, pelo qual os maus traços de caráter e as tendências pecaminosas são substituídos pelo padrão de vida perfeito de Jesus Cristo (ver com. de Gl.2:20).

Mt.13:8 8. Outra, enfim, caiu em boa terra e deu fruto: a cem, a sessenta e a trinta por um.

Boa terra. Isto não significa que o coração do ser humano seja naturalmente bom antes que as sementes da verdade divina o tenham tornado assim, pois “Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar segundo a Sua boa vontade” (Fp.2:13). No ser humano “não habita bem nenhum” (Rm.7:18). A “terra” é “boa” simplesmente porque cede diante do arado da verdade, porque responde à influência enternecedora do Espírito Santo.

Deu fruto. Ver com. de Mt.7:16-20. Isto se refere ao fruto do caráter (ver com. de Gl.5:22-23). O fruto do Espírito manifestado exteriormente é evidência de uma experiência cristã saudável. No coração dos ouvintes à beira do caminho, a verdade não encontra resposta. No caso dos ouvintes representados pelo solo pedregoso, a verdade não produziu nada mais que um impulso momentâneo. Com os ouvintes do solo espinhoso foi uma resposta que começou bem, mas secou em face da dificuldade e oposição. Mas, no coração dos ouvintes da boa terra, a resposta é permanente e eficaz. O resultado é uma vida transformada segundo o padrão da vida perfeita de Jesus Cristo. O cristão de êxito não depende de circunstâncias; ele persevera até o fim (ver Mt.24:13).

A cem. Esta seria uma produção verdadeiramente notável (ver com. de Gn.26:12). Marcos inverte a ordem e começa pelo rendimento menor, ao passo que Lucas omite os rendimentos menores.

Mt.13:9 9. Quem tem ouvidos [para ouvir], ouça.

Ouvidos [para ouvir]. Ver com. de Mt.11:15; Mt.13:13-18.

Mt.13:10 10. Então, se aproximaram os discípulos e lhe perguntaram: Por que lhes falas por parábolas?

Então, se aproximaram os discípulos. Parece que Mateus, em harmonia com seu costume, associa a explicação em particular de Cristo aos discípulos, dada certamente num momento posterior, com a própria parábola, a fim de preservar a ordem dos temas. Marcos menciona especificamente que a explicação foi dada quando “Jesus ficou só” com os doze e alguns dos outros discípulos (ver Mc.4:10).

Por parábolas. Ver com. do v. Mt.13:3.

Mt.13:11 11. Ao que respondeu: Porque a vós outros é dado conhecer os mistérios do reino dos céus, mas àqueles não lhes é isso concedido.

É dado. O solo não cultivado do coração dos discípulos tinha sido aberto pelo arado do Espírito Santo (ver com. de Os.10:12), e os discípulos receberam a semente da verdade com alegria. Apenas aquele que “quiser fazer a vontade dEle conhecerá a respeito da doutrina” (Jo.7:17). A percepção da verdade não depende tanto do intelecto, mas do desejo sincero.

Mistérios. Isto é, coisas que estão ocultas aos que não estão interessados sinceramente em conhecer a verdade. Não são mistérios no sentido de não poderem ser entendidos ou que são deliberadamente ocultados a alguns e abertos a outros. O evangelho é “loucura” para alguns (ver 1Co.1:23) porque “o homem natural”, sem ter recebido a influência do Espírito Santo, não tem condição de entender “as coisas do Espírito de Deus” (ver 1Co.2:14). A razão de não poder recebê-las é que “elas se discernem espiritualmente”, e lhe falta o discernimento ou a percepção para entender seu significado. A percepção espiritual vem somente por meio da operação do Espírito Santo (ver Jo.16:13; Mt.16:17).

Não lhes é isso concedido. Ver com. do v. Mt.13:12. De acordo com Marcos, o mistério do reino não é para “os de fora” (ver Mt.4:11), isto é, para os que estão fora do círculo de seguidores. Não há propósito em revelar a verdade àqueles que preferem não tê-la (ver com. de Mt.7:6). Somente os que “têm fome e sede de justiça” “serão fartos” (ver com. de Mt.5:6).

Mt.13:12 12. Pois ao que tem se lhe dará, e terá em abundância; mas, ao que não tem, até o que tem lhe será tirado.

Ao que tem. Isto é, quem deseja sinceramente a verdade (ver com. de Mt.13:11; Mc.4:24). O solo deve estar pronto, ao menos em parte, para receber a semente com proveito. Os que colocaram em prática a verdade que lhes foi revelada receberão mais verdade. Quem é receptivo no sentido espiritual terá infinitamente mais benefícios de qualquer apresentação da verdade do que aquele que é inteligente, mas que não quer receber as coisas espirituais. Os maravilhosos dons do Céu são para aqueles que os desejam sinceramente (ver DTN, 827).

Até o que tem. Isto é, “até aquilo que julga ter” (Lc.8:18). Quem negligencia aumentar a pequena capacidade que tem para perceber a verdade perderá até essa pequena capacidade.

Mt.13:13 13. Por isso, lhes falo por parábolas; porque, vendo, não vêem; e, ouvindo, não ouvem, nem entendem.

Por isso, lhes falo. Ver com. do v. Mt.13:3. O propósito de Cristo não era ocultar a verdade daqueles cuja percepção espiritual era deficiente (ver PJ, 105), mas penetrar sua mente e seu coração embotados, na esperança de gerar a capacidade de receber mais verdade (ver Lc.8:16). Cristo veio a este mundo “dar testemunho da verdade”, não para obscurecê-la (Jo.18:37). A razão por que alguns não produziram fruto não está no Semeador nem na semente, mas no solo (ver com. de Mt.13:3).

Vendo, não veem. Ver com. do v. Mt.13:15. Embora essas pessoas pareçam ver, e creem que veem, na verdade, não veem coisa alguma. Por que dizem, “nós vemos”, enquanto na verdade estão cegas, seu pecado “subsiste” (Jo.9:41). São voluntariamente cegas (ver com. de Os.4:6). Sua percepção, como a dos ouvintes à beira do caminho, é superficial (ver com. de Mt.13:4-5). A visão natural não vem acompanhada de uma percepção espiritual equivalente.

Nem entendem. Os fariseus discerniam o significado das parábolas de Cristo, mas fingiam não entender (ver PJ, 35). Recusavam as mais claras palavras de Cristo porque não queriam recebê-las, portanto a culpa deles era maior que a dos demais. Cegaram seus olhos espirituais e se fecharam em trevas (ver com. de Mt.12:31).

Mt.13:14 14. De sorte que neles se cumpre a profecia de Isaías: Ouvireis com os ouvidos e de nenhum modo entendereis; vereis com os olhos e de nenhum modo percebereis.

Neles se cumpre. Literalmente, “neles se enche”, como uma taça.

A profecia de Isaías. Esta citação de Is.6:9-10, no grego (Mt.13:14-15), é idêntica ao texto da LXX (ver com. de Is.6:9-10).

Mt.13:15 15. Porque o coração deste povo está endurecido, de mau grado ouviram com os ouvidos e fecharam os olhos; para não suceder que vejam com os olhos, ouçam com os ouvidos, entendam com o coração, se convertam e sejam por mim curados.

O coração deste povo. Isto é, sua mente.

Está endurecido. Sobre o sentido desta expressão, ver com. de Ex.4:21.

De mau grado ouviram com os ouvidos. Literalmente, “ouviram mal com os ouvidos”. Estavam sonolentos e parecia impossível despertá-los.

Para não suceder que. Como em Is.6:10, estas palavras são ditas em tom de ironia. Não era a vontade de Deus que alguém estivesse nessa condição, nem que não pudesse entender e ser convertido. A condição dos líderes judeus foi resultado natural de sua própria conduta e modo de vida. Conforme enfatizado na parábola, era também obra de Satanás (ver com. de Mt.13:4). O povo de quem Isaías falou, era formado por ouvintes à “beira do caminho”. Na verdade, foi Satanás quem “cegou o entendimento dos incrédulos” (ver 2Co.4:4). Não é a luz do Céu que cega o ser humano, mas sim as trevas (ver 1Jo.2:11). As vistas que permanecem por um longo tempo na escuridão normalmente não enxergam bem na presença de luz. De fato, olhos habituados às trevas tendem a evitar a luz.

Mt.13:16 16. Bem-aventurados, porém, os vossos olhos, porque vêem; e os vossos ouvidos, porque ouvem.

Bem-aventurados. Ou, “felizes” (ver com. de Ml.5:3). Por outro lado, os que têm olhos e não veem, e ouvidos, mas não ouvem, são infelizes. A verdadeira felicidade vem somente quando os olhos espirituais “veem” a luz da verdade. Aqueles que não têm essa percepção não podem ser felizes.

Mt.13:17 17. Pois em verdade vos digo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes e não viram; e ouvir o que ouvis e não ouviram.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Desejaram ver. Isto é, ver o Messias e Seu reino. Essa foi a esperança de todos os santos de outrora (ver 1Pe.1:10-11), que “morreram na fé, sem ter obtido as promessas; vendo-as, porém, de longe, e saudando- as” (Hb.11:13).

Mt.13:18 18. Atendei vós, pois, à parábola do semeador.

Atendei vós, pois. O comentário principal dos v. 18 a 23 aparece em relação com os v. Mt.13:3-9. A explicação da parábola do semeador ensinada por Cristo (v. 18-23), provavelmente numa ocasião posterior (ver com. do v. Mt.13:10), deve ser considerada como um padrão dos princípios que regem a interpretação de todas as parábolas (ver p. 199, 200).

Mt.13:19 19. A todos os que ouvem a palavra do reino e não a compreendem, vem o maligno e arrebata o que lhes foi semeado no coração. Este é o que foi semeado à beira do caminho.

Sem comentário para este versículo.

Mt.13:20 20. O que foi semeado em solo rochoso, esse é o que ouve a palavra e a recebe logo, com alegria

Logo. Do gr. euthus, “de uma vez”, “imediatamente”.

Mt.13:21 21. mas não tem raiz em si mesmo, sendo, antes, de pouca duração; em lhe chegando a angústia ou a perseguição por causa da palavra, logo se escandaliza.

Angústia. Ou, “sofrimento”.

Escandaliza. Do gr. skandalizo, “fazer tropeçar” (ver com. de Mt.5:29).

Mt.13:22 22. O que foi semeado entre os espinhos é o que ouve a palavra, porém os cuidados do mundo e a fascinação das riquezas sufocam a palavra, e fica infrutífera.

Sem comentário para este versículo.

Mt.13:23 23. Mas o que foi semeado em boa terra é o que ouve a palavra e a compreende; este frutifica e produz a cem, a sessenta e a trinta por um.

Compreende. Marcos diz “recebem” (Mc.4:20) e Lucas, “retêm” (Lc.8:15).

Mt.13:24 24. Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante a um homem que semeou boa semente no seu campo

Outra parábola. A parábola do joio foi registrada apenas por Mateus. Ela indica que nem todos os que professam aceitar os princípios do reino dos céus são de fato o que aparentam. Judas era um desses. Os que se tornam discípulos de Cristo não devem se surpreender de encontrar no “reino dos céus” – o reino da graça divina nesta Terra (ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17) – alguns cujas vidas não foram transformadas pelo evangelho. Cristo queria que soubéssemos que tais não foram semeados por Ele, que a vida deles não é produto da semente do evangelho. Sua presença na igreja se deve ao fato de que “um inimigo” os “semeou” ali, com o duplo propósito de pôr em risco o “trigo” (ver com. de Mt.13:29) e desonrar e arruinar o dono do “campo”.

Propôs. Literalmente, “colocou diante”.

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:3.

Semeou boa semente. Como na parábola anterior, o próprio Jesus é o semeador da verdade divina. A semente que Ele veio semear é “boa semente”. Ele não deve ser culpado pelo fato de, posteriormente, ter sido descoberto joio crescendo no campo. Enquanto a parábola anterior lidava principalmente com o recebimento da semente da verdade, esta trata de seu desenvolvimento. É animador lembrar que a presença do joio entre o trigo não fez com que trigo algum se transformasse em joio.

No seu campo. Este “campo” é o “mundo” (ver v. Mt.13:38). É verdade que no mundo hoje existe “joio” e “trigo”, pessoas más e pessoas boas. Mas isso é de se esperar. Cristo Se refere principalmente a Sua igreja, o “campo” especial de Deus (ver PJ, 70). Deve-se notar que essa parábola representa o “reino dos céus”, isto é, o reino presente da graça divina, a igreja de Deus na Terra.

Mt.13:25 25. mas, enquanto os homens dormiam, veio o inimigo dele, semeou o joio no meio do trigo e retirou-se.

Enquanto os homens dormiam. O inimigo não pode ser visto pelos olhos mortais. O ser humano vê apenas os resultados de sua obra, assim como vê os resultados da obra do Espírito Santo (ver com. de Jo.3:8).

O inimigo dele. Isto é, “o diabo” (v. Mt.13:39), que é Satanás, nosso “adversário” (ver com. de Zc.3:1). Tudo o que é bom na Terra vem de Deus. Tudo o que é mau, em última instância, resulta da semente que o diabo semeou no coração humano.

Semeou. Literalmente, “semeou sobre”; isto é, semeou o joio sobre o grão de trigo semeado antes. Em algumas partes do Oriente, ainda hoje, essa é uma forma de se vingar de alguém.

Joio. Do gr. zizania, provavelmente da espécie Lolium temulentum. Esta planta comum na Palestina cresce até cerca de 60 centímetros. Em seus estágios iniciais não é possível distingui-la do trigo; somente quando a planta amadurece e as sementes ficam escuras ela se torna distinguível. Essas sementes são venenosas e, se ingeridas, produzem fortes náuseas, diarreia, convulsões e até a morte. O joio é descrito como “os filhos do maligno” (v. Mt.13:38), porque se assemelham a ele em caráter. Essa parábola representa muito bem a verdade espiritual que Cristo desejava ilustrar.

Mt.13:26 26. E, quando a erva cresceu e produziu fruto, apareceu também o joio.

Produziu fruto. Ver com. do v. Mt.13:25 (comparar com Mt.7:20: “pelos seus frutos os conhecereis”).

Mt.13:27 27. Então, vindo os servos do dono da casa, lhe disseram: Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde vem, pois, o joio?

Os servos. Cristo não explicou quem os servos representam na parábola, talvez uma boa indicação de que sua identidade não tem importância para a verdade que a parábola representa. A presença deles é meramente acidental na narrativa (ver p. 199, 200).

Dono da casa. Do gr. oikodespotes (ver com. de Lc.2:29). Aquele que semeou a boa semente é o “Filho do Homem” (Mt.13:37). Essa identificação vincula intimamente a parábola do joio à do semeador (ver com. do v. Mt.13:3).

Donde vem [...]? Ver com. do v. Mt.13:25.

Mt.13:28 28. Ele, porém, lhes respondeu: Um inimigo fez isso. Mas os servos lhe perguntaram: Queres que vamos e arranquemos o joio?

Um inimigo. Ver com. do v. Mt.13:25.

Mt.13:29 29. Não! Replicou ele, para que, ao separar o joio, não arranqueis também com ele o trigo.

Não arranqueis. O caráter dos dois ainda não estava maduro e seria desastroso tentar fazer o que os servos propuseram. Ainda não era possível ajuntar o joio sem prejudicar o trigo e impedir alguns deles de amadurecerem. Do mesmo modo, Cristo permitiu que Judas se tornasse um discípulo, pois, do contrário, os demais, não reconhecendo seu verdadeiro caráter, teriam questionado a atitude do Mestre (ver DTN, 294; ver com. do v. Mt.13:24). Até o final de Seu ministério, Cristo nunca repreendeu Judas abertamente, pois os discípulos, que o estimavam e admiravam, teriam se sentido inclinados a simpatizar com ele (ver DTN, 563). Além disso, Judas poderia dizer que sua vingança era justificada.

Mt.13:30 30. Deixai-os crescer juntos até à colheita, e, no tempo da colheita, direi aos ceifeiros: ajuntai primeiro o joio, atai-o em feixes para ser queimado; mas o trigo, recolhei-o no meu celeiro.

Crescer juntos. Ver com. do v. Mt.13:24. Ambas as classes de pessoas estarão juntas na igreja até o fim. Ao que tudo indica, Cristo não considerou que o trigo corresse perigo com essa situação. A sabedoria humana teria talvez excluído Judas do círculo íntimo dos discípulos de Cristo, os doze, por temer que sua influência impedisse os demais de atingir o propósito de Cristo para eles. Porém, nada no registro dos evangelhos indica que sua influência sobre eles fosse mais que temporária; em nenhum caso foi decisiva. Judas escolheu ser contado com os doze, e Jesus lhe deu os mesmos privilégios e oportunidades que deu aos outros para o desenvolvimento de seu caráter. A obra de ajuntar o joio e queimá-lo será cumprida pelos anjos no tempo da “colheita”, “na consumação do século” (ver v. Mt.13:39-42), não pelos “servos” antes disso (v. Mt.13:28-30). Através dos séculos, e mesmo hoje, muitos professos cristãos zelosos pensam que é seu dever ajuntar e queimar, ou perseguir, aqueles a quem consideram hereges. Mas Cristo nunca comissionou tal tarefa a Seus representantes terrenos. Isso não quer dizer que a igreja não deva tomar nenhuma atitude quanto àqueles cuja vida ou ensinos já revelem o fruto do mal. Mas a natureza de tal atitude é claramente apresentada nas Escrituras (ver com. de Mt.18:15-20; cf. Rm.16:17; Tt.3:10-11), e ninguém tem o direito de ultrapassar os limites prescritos ou tentar realizar agora o que Deus disse que fará no fim dos tempos.

Colheita. “A ceifa é a consumação do século” (v. Mt.13:39). Ela começa no final do tempo da graça (ver PJ, 72; ver com. de Mt.3:12).

Ceifeiros. Isto é, os anjos (ver v. Mt.13:39). É significativo que os servos (v. Mt.13:27) não sejam representados como os ceifeiros.

Primeiro o joio. Era de se esperar que o trigo fosse ajuntado antes que o joio fosse queimado. Talvez a razão de Cristo mencionar a queima do joio em primeiro lugar é que, na consumação do século, os ímpios receberão sua recompensa antes de os santos receberem a deles (ver 2Pe.3:7-13; Ap.20:9-10; Ap.20:14-15; Ap.21:1).

Atai-o em feixes. Como observado antes, a colheita começa no final do tempo da graça (PJ, 72). Então, a ira de Deus será derramada sobre os impenitentes (ver Ap.15:1), e as sete últimas pragas concluirão o processo de ajuntar o joio em feixes para ser queimado.

Para ser queimado. Toda semente produz uma colheita de sua espécie. Não resta mais nada a não ser queimar o joio, para que as sementes do mal não voltem a brotar e outra vez submerjam o mundo em aflição e conflito. É importante notar que o joio continua sendo joio e acaba no fogo. Não haverá uma segunda chance para os maus.

Mt.13:31 31. Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante a um grão de mostarda, que um homem tomou e plantou no seu campo

Outra parábola. A parábola do grão de mostarda conforme apresentada em Lucas é basicamente idêntica às registradas em Mateus e Marcos, embora mais breve, e faz parte do ministério na Pereia, cerca de um ano mais tarde, quando Cristo repetiu muitos de Seus ensinos (DTN, 488).

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:3; Lc.4:19.

Grão de mostarda. Provável referência à

Sinapis nigra, ou mostarda negra, que cresce em abundância na Palestina e também é cultivada com frequência por suas sementes, usadas como condimento. Na literatura judaica, o grão de mostarda é utilizado para indicar algo diminuto.

Tomou e plantou. A mostarda da parábola não era selvagem, isto é, não crescia acidentalmente.

Seu campo. Embora Satanás, o inimigo, reivindique este mundo como seu, o “campo” pertence a Deus. Isso se aplica em especial à igreja, à qual talvez esta passagem se refira (ver PJ, 70).

Mt.13:32 32. o qual é, na verdade, a menor de todas as sementes, e, crescida, é maior do que as hortaliças, e se faz árvore, de modo que as aves do céu vêm aninhar-se nos seus ramos.

A menor de todas as sementes. O grão de mostarda era o menor grão semeado na Palestina, muito menor que o de trigo ou de cevada, por exemplo. Mas sua planta, quando desenvolvida, era maior que as demais. Os líderes judeus olhavam com desdém para a multidão heterogênea que ouvia a Jesus, em particular, os poucos lavradores e pescadores analfabetos que, como Seus discípulos, se assentavam próximo dEle. Concluíram que Jesus não poderia ser o Messias e que o “reino” que proclamava, composto desse grupo insignificante de seguidores, jamais chegaria a ser algo. Jesus não poderia ter escolhido representação melhor do que o insignificante grão de mostarda para ilustrar a forma como os ímpios viam Seu “reino”.

E se faz árvore. A Sinapis nigra, ou mostarda negra, da Palestina (ver com. do v. Mt.13:31), em geral, chega a medir cerca de um metro, com galhos de mais de 2 cm de espessura. A figura de uma “árvore” representa o triunfo da mensagem do evangelho no mundo. O reino e seus súditos podem parecer insignificantes, mas, segundo Cristo, não será assim para sempre.

Mt.13:33 33. Disse-lhes outra parábola: O reino dos céus é semelhante ao fermento que uma mulher tomou e escondeu em três medidas de farinha, até ficar tudo levedado.

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17. Nesta parábola, o reino dos céus é representado pelo fermento. Assim como a parábola do grão de mostarda representa o extenso crescimento do reino em números, a parábola do fermento representa o crescimento em profundidade e qualidade de cada membro do reino. Do ponto de vista humano, os lavradores e pescadores analfabetos, que, nessa época, eram praticamente os únicos seguidores do humilde Galileu, podiam parecer pouco promissores. Mas quem os considerava assim não contava com o poder transformador e enobrecedor do evangelho.

Fermento. Assim como o fermento leveda toda a massa onde é espalhado, os ensinos de Cristo penetram a vida daqueles que os recebem e estão dispostos a ser transformados por eles. Na época do AT, o fermento simbolizava o mal. Antes da Páscoa, todo fermento devia ser retirado do lar, pois era símbolo do pecado (ver com. de Lv.23:6). O próprio Cristo Se referiu ao fermento nesse sentido, falando do “fermento dos fariseus e saduceus” (Mt.16:6; Mt.16:12; 1Co.5:6-8). Mas o fermento não pode simbolizar o pecado na parábola ensinada nessa ocasião, pois, finalmente, toda a massa ficou levedada, e Cristo certamente não estaria dizendo com isso que Seu reino se tornaria por completo permeado com o mal. O “pão” se perderia. Além disso, é ilógico supor que um mesmo símbolo deve sempre se referir à mesma coisa. Por exemplo, tanto Satanás (1Pe.5:8) quanto Cristo (Ap.5:5) são retratados como um leão (ver com. de Mt.12:33).

Uma mulher. A presença da mulher é meramente incidental. Ela é citada apenas para completar o relato (ver p. 199, 200).

Medidas. Do gr.

saton. Três “medidas” seriam cerca de 32 litros, o suficiente para uma grande quantidade de pão. A quantidade de farinha não tem significado na parábola.

Mt.13:34 34. Todas estas coisas disse Jesus às multidões por parábolas e sem parábolas nada lhes dizia

Todas estas coisas. Isto é, as verdades do reino, em especial, as apresentadas por parábolas (ver com. dos v. Mt.13:10-16; Mt.13:36).

Mt.13:35 35. para que se cumprisse o que foi dito por intermédio do profeta: Abrirei em parábolas a minha boca; publicarei coisas ocultas desde a criação [do mundo].

Para que se cumprisse. Ver com. de Mt.1:22.

Abrirei em parábolas a Minha boca. Esta citação é do Sl.78:2.

Coisas ocultas. Paulo fala do “mistério guardado em silêncio nos tempos eternos”, sendo “manifesto” “por meio das Escrituras proféticas” (Rm.16:25-26). Em outra passagem, ele define esse “mistério” como “Cristo em vós, a esperança da glória” (Cl.1:26-27). Foi “oculto” não porque Deus estivesse indisposto ou despreparado para revelá-lo, mas porque o ser humano não estava preparado para recebê-lo.

Criação. Do gr.

katabole, “lançar abaixo” ou “estabelecer”.

Mt.13:36 36. Então, despedindo as multidões, foi Jesus para casa. E, chegando-se a ele os seus discípulos, disseram: Explica-nos a parábola do joio do campo.

Então. Assim como a parábola do semeador, Mateus registra a interpretação do próprio Jesus sobre a parábola do joio, tornando claro que a explicação foi dada num momento posterior à parábola, portanto, não na presença da multidão (ver com. do v. Mt.13:10). Jesus não interrompeu Seu sermão à beira-mar para voltar para casa e explicar as parábolas aos discípulos.

Despedindo as multidões. Ou, “deixou a multidão”.

Casa. Talvez a casa de Pedro em Cafarnaum (ver com. de Mc.1:29).

Mt.13:37 37. E ele respondeu: O que semeia a boa semente é o Filho do Homem

Ele respondeu. Sobre a explicação da parábola do joio, ver com. dos v. Mt.13:24-30.

O Filho do Homem. Ver com. de Mc.2:10.

Mt.13:38 38. o campo é o mundo; a boa semente são os filhos do reino; o joio são os filhos do maligno

Do maligno. Cerca de um ano depois, Cristo acusou abertamente os líderes judeus de serem filhos do diabo (ver Jo.8:41; Jo.8:44).

Mt.13:39 39. o inimigo que o semeou é o diabo; a ceifa é a consumação do século, e os ceifeiros são os anjos.

Século. Do gr. aion, “era”. As nuanças de significado inerentes à palavra aion ficam evidentes a partir das diferentes formas de se traduzir essa palavra no NT: “mundo” (Mt.12:32; Mt.13:22; Mc.4:19), “séculos” (Ef.2:7; Cl.1:26), “eterno” (Ef.3:11), “nunca mais” (Mt.21:19), “para sempre” (Lc.1:55; Mc.3:29) e, quando usada na forma negativa, “nunca” (Jo.4:14; sobre a forma adjetiva, aionios, “eterno”, ver com. de Mt.25:41; Mc.9:43). Em aion, a ideia de “mundo” é do ponto de vista de tempo, ao passo que no grego kosmos, “mundo”, é do ponto de vista de espaço (ver Mt.4:8; Mt.5:14; Mt.13:35; Mt.13:38), salvo um caso (2Pe.3:3) em que é considerado do ponto de vista de espaço. As Escrituras em geral falam do fim do aion (ver Mt.13:39; Mt.24:3; Mt.28:20), em vez do fim do kosmos (sobre a palavra kosmos, ver com. de Mt.4:8). Outra palavra grega comumente traduzida como “terra” ou “mundo” é oikoumene, que se refere em específico ao “mundo habitado”, isto é, na perspectiva do mundo como um lar para a raça humana (ver Mt.24:14; Lc.2:1; Lc.4:5).

Os ceifeiros são os anjos. Ver Mt.24:31; 1Ts.4:16-17.

Mt.13:40 40. Pois, assim como o joio é colhido e lançado ao fogo, assim será na consumação do século.

Sem comentário para este versículo.

Mt.13:41 41. Mandará o Filho do Homem os seus anjos, que ajuntarão do seu reino todos os escândalos e os que praticam a iniqüidade

Escândalos. “Causa de tropeço” (ver com. de Mt.5:29).

Mt.13:42 42. e os lançarão na fornalha acesa; ali haverá choro e ranger de dentes.

Fornalha acesa. Comparar com o v. Mt.13:50. Uma expressão que se refere ao fogo dos últimos dias, chamado também de fogo de geena (ver com. de Mt.5:22).

Choro e ranger de dentes. Descrição do remorso dos ímpios quando se despertarem para o fato de que seus maus caminhos resultaram na perdição eterna.

Mt.13:43 43. Então, os justos resplandecerão como o sol, no reino de seu Pai. Quem tem ouvidos [para ouvir], ouça.

Resplandecerão. Do gr. eklampo, indicando a ideia de luz que irrompe com brilho repentino, como o sol surgindo por trás de uma nuvem escura. Observa-se um vívido contraste entre as trevas que cercam os ímpios e a alegria que marca os salvos.

Ouvidos [para ouvir]. Ver com. de Mt.11:15.

Mt.13:44 44. O reino dos céus é semelhante a um tesouro oculto no campo, o qual certo homem, tendo-o achado, escondeu. E, transbordante de alegria, vai, vende tudo o que tem e compra aquele campo.

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:3.

Tesouro oculto. Esta parábola, registrada apenas em Mateus, ilustra o valor da salvação prometida no evangelho, junto com o esforço exigido de quem deseja assegurá-la. Nesse caso, o “campo” representa as Escrituras. Devido à frequente turbulência política e à incerteza econômica da Antiguidade, era comum enterrar objetos de valor, que assim muitas vezes permaneciam após a morte do dono. Quem adquiria a terra não sabia do tesouro enterrado e, ao encontrá-lo, provavelmente não teria direito a ele. Nesse caso, é claro que o dono da terra nada sabia sobre o tesouro enterrado, ou o teria reivindicado antes de vender a propriedade. De acordo com a lei de Moisés, quem encontrasse o que outro tinha perdido, deveria devolver (ver com. de Lv.6:3-4). Mas, nesse caso, aparentemente, o proprietário original já teria morrido havia muito tempo, e o tesouro não poderia ser devolvido a ele. Assim, quem o encontrasse tinha tanto direito a ele quanto qualquer um e, legalmente, o proprietário do campo era dono do tesouro (ver com. de Mt.6:19-20).

Escondeu. A pessoa que encontrou o tesouro o colocou de volta onde tinha sido escondido, a fim de protegê-lo e assegurar que o procedimento para adquiri-lo fosse legal. Deve-se notar que Cristo não necessariamente recomenda a atitude do homem que encontrou o tesouro, nem a condena. Se existe algum questionamento quanto ao proceder desse homem, deve-se recordar que, para o propósito da parábola, seu caráter não tem nada a ver com o ponto principal que Cristo procura apresentar: o valor do tesouro celestial e o esforço necessário para obtê-lo (ver p. 199, 200).

Mt.13:45 45. O reino dos céus é também semelhante a um que negocia e procura boas pérolas

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:3.

Um que negocia. Do gr. emporos, “um negociante”, alguém que viaja e compra, em contraste com um kapelos, “revendedor” ou “pequeno negociante”. Enquanto a parábola do tesouro escondido ilustra a experiência daqueles que encontram a verdade sem ter a intenção de buscá-la, a parábola da pérola representa os que desejam a verdade com sinceridade (PJ, 116). O “que negocia” era mercador de pérolas; esse era seu negócio. Ao negociar, almejava comercializar somente o melhor. Assim como esse mercador, homens e mulheres em geral passam anos fazendo o melhor com a luz que possuem, sem se dar conta de que lhes falta um propósito na vida. Com forte anseio no coração, buscam a resposta para a existência e, ao final, a encontram.

Procura boas pérolas. O mercador representa principalmente as pessoas que estão em busca de um Salvador, embora, além disso, represente Cristo em busca do ser humano. Nada tem mais valor, ou deve ser buscado com mais diligência do que o próprio Cristo. Por outro lado, nada é mais valioso para o Céu do que a afeição e a devoção dos seres criados. Mesmo quando o ser humano caiu em pecado, ele teve tanto valor aos olhos do Céu, que Deus deu Seu próprio Filho para buscá-lo e restaurá-lo ao favor divino, disponibilizando com esse dom os recursos ilimitados da Onipotência.

Mt.13:46 46. e, tendo achado uma pérola de grande valor, vende tudo o que possui e a compra.

De grande valor. Isto é, por causa de seu valor transcendente. Em harmonia com o significado primordial desta parábola, a “pérola de grande valor” é Jesus Cristo, “o mais distinguido entre dez mil” (Ct.5:10). No caso da pérola, era o tamanho, a forma e o brilho que lhe conferiam valor. Quanto a Jesus, é a perfeição de caráter e a plenitude do amor divino. O negociante de pérolas deve ter encontrado satisfação suprema em possuir a pérola inestimável. Ela era dele. Aquele que encontra em Cristo a resposta para todos os anseios de seu coração, que encontra nEle o caminho da vida, o objetivo da existência, encontrou o maior tesouro.

Vende tudo. Embora a salvação não possa ser comprada, ela custa tudo o que alguém pode ter. Assim como o fez Paulo, aquele que realmente encontra a Cristo está disposto a perder “todas as coisas” a fim de “ganhar a Cristo” (Fp.3:8). Conhecer a Cristo é preencher um vazio na vida que nada mais pode suprir. Conhecê-Lo significa ter vida eterna (Jo.17:3).

E a compra. Pelo preço do eu, do orgulho e da ambição e dos hábitos errôneos. O preço da paz com Deus é tudo o que um homem tem, mas vale infinitamente mais. O ser humano compra a salvação pelo custo de coisas que, por si mesmas, não têm valor permanente e, portanto, nada perde na negociação.

Mt.13:47 47. O reino dos céus é ainda semelhante a uma rede que, lançada ao mar, recolhe peixes de toda espécie.

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:3.

Rede. Do gr. sagene, em contraste com amphiblestron, que podia ser lançada (ver Mt.4:18). Esta palavra se refere a uma rede larga e pesada; era levada mar adentro e se arrastava em forma de semicírculo até a costa. Essa rede de arrastão representa o evangelho, isto é, os esforços dos pescadores de homens (ver com. de Lc.5:10) para ganhar outros para Cristo.

Mar. O único meio no qual a rede de pesca teria utilidade seria em águas profundas. O mar não tem importância para a interpretação da parábola (ver p. 199, 200).

Toda espécie. Toda classe de pessoas é reunida pela rede do evangelho: homens e mulheres com objetivos, atitudes e personalidades diferentes. Jesus não fazia “acepção de pessoas” (At.10:34), recebia todos que iam a Ele. Ele Se associou com publicanos e pecadores, para ganhá-los para Seu reino (ver com. de Mc.2:16-17). Estava disposto a ser conhecido como “amigo de publicanos e pecadores” (ver com. de Mt.11:19) se com isso pudessem apreciar Sua amizade celestial.

Mt.13:48 48. E, quando já está cheia, os pescadores arrastam-na para a praia e, assentados, escolhem os bons para os cestos e os ruins deitam fora.

Arrastam-na para a praia. Ver com. do v. Mt.13:47.

Escolhem os bons. O processo de separação se deu depois que a rede tinha recolhido todos os peixes que podia pescar. Deus avalia o caráter com base na vida da pessoa se ela vive em harmonia com toda a luz que tem resplandecido sobre seu caminho, e em seu conhecimento e habilidade, se tem cooperado com os agentes celestiais em moldar o caráter segundo o exemplo perfeito de Jesus (ver com. de Ec.12:13-14; Mq.6:8; Mt.7:21-27).

Ruins. Do gr. sapros, que aplicado a peixe quer dizer peixe “podre” ou “pútrido”; “impróprio para consumo”. A parábola da rede enfatiza a separação final dos “bons” e “ruins” com base no caráter.

Mt.13:49 49. Assim será na consumação do século: sairão os anjos, e separarão os maus dentre os justos,

Consumação do século. Literalmente, “fim da era” (ver com. do v. Mt.13:39).

Os anjos. Ver v. Mt.13:41.

Separarão os maus. Ver com. do v. Mt.13:48; cf. Mt.25:32-33.

Mt.13:50 50. e os lançarão na fornalha acesa; ali haverá choro e ranger de dentes.

Fornalha acesa. Ver com. do v. Mt.13:42.

Choro e ranger de dentes. Ver com. do v. Mt.13:42.

Mt.13:51 51. Entendestes todas estas coisas? Responderam-lhe: Sim!

Todas estas coisas. Isto é, as verdades representadas pelas parábolas ditas nessa ocasião em particular (cf. v. Mt.13:34).

Sim! A evidência textual favorece (cf. p. 136) a omissão da palavra “Senhor” (ARC).

Mt.13:52 52. Então, lhes disse: Por isso, todo escriba versado no reino dos céus é semelhante a um pai de família que tira do seu depósito coisas novas e coisas velhas.

Todo escriba. Os “escribas” não eram secretários, mas os mestres oficiais da lei (ver p. 43). Cristo não Se refere aos escribas profissionais, ou mestres, de Seus dias, mas aos discípulos no papel de mestres ou “apóstolos” (ver com. de Mc.3:14). “Todo escriba”, neste caso, significa todo homem ou mulher que ensina os tesouros da Palavra de Deus a outros. Cristo fala não da habilidade dos doze de compreender “todas estas coisas” (Mt.13:51), mas da habilidade deles de transmiti-las a outros.

Versado. Literalmente “que foi feito discípulo”, no sentido de ter recebido uma preparação completa daquilo que um discípulo deve saber e entender. Os escribas profissionais dos dias de Cristo conheciam a letra da lei de Moisés, mas nada sabiam de seu espírito. Cristo fez essa distinção no Sermão do Monte, em especial em Mt.5:17-48 (ver com. de Mt.5:17; Mt.5:20-21). O cristianismo foi edificado “sobre o fundamento dos apóstolos e profetas” (Ef.2:20), que inclui tudo o que foi revelado aos profetas do passado e tudo o que Cristo revelou pessoalmente a Seus discípulos (ver Hb.1:1-2).

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:2.

Pai de família. Do gr. oikodespotes, isto é, “senhor da casa” (ver com. de Lc.2:29). Este termo designa os discípulos como possuidores do “depósito” do evangelho. A eles foram confiadas essas coisas, e Deus espera que eles as apresentem quando necessário. Num sentido especial, todo cristão que ensina a palavra de Deus a outros é o “pai de família” da parábola (ver PJ, 131).

Do seu depósito. Isto é, do lugar onde se guarda o tesouro (ver com. de Mt.2:11).

Coisas novas e coisas velhas. Por “velhas”, Cristo Se refere a toda vontade de Deus revelada “outrora [...] aos pais, pelos profetas” (Hb.1:1; ver com. Dt.31:9; Pv.3:1). Por “novas”, Ele Se refere a Seus ensinos (ver Hb.1:2; ver com. Mc.2:22; Mc.7:1-13). É importante observar que, nessa ocasião ou em qualquer outra, Jesus nunca depreciou o valor do AT ou insinuou que, no futuro, ele teria menos força (ver com. de Mt.5:17-18; Lc.24:27; Lc.24:44; Jo.5:39). O AT não foi invalidado pelo NT, mas ampliado e revitalizado. Ambos foram inspirados por Cristo e estão cheios da verdade para quem a busca com sinceridade. O AT revela o Cristo que viria; o NT revela o Cristo que veio. O AT e o NT não se excluem mutuamente nem se opõem um ao outro, como o arqui-inimigo de ambos tem persuadido alguns cristãos a acreditar. Eles se complementam.

Mt.13:53 53. Tendo Jesus proferido estas parábolas, retirou-se dali.

Tendo Jesus proferido estas parábolas. [Jesus prega em Nazaré. É rejeitado pelos Seus, Mt.13:53-58 = Mc.6:1-6 = Lc.4:16-30. Comentário principal: Mc.] Assim termina o relato do sermão à beira- mar (ver com. do v. Mt.13:1).

Retirou-Se dali. Ver com. de Mt.8:18.

Mt.13:54 54. E, chegando à sua terra, ensinava-os na sinagoga, de tal sorte que se maravilhavam e diziam: Donde lhe vêm esta sabedoria e estes poderes miraculosos?

Sem comentário para este versículo.

Mt.13:55 55. Não é este o filho do carpinteiro? Não se chama sua mãe Maria, e seus irmãos, Tiago, José, Simão e Judas?

Sem comentário para este versículo.

Mt.13:56 56. Não vivem entre nós todas as suas irmãs? Donde lhe vem, pois, tudo isto?

Sem comentário para este versículo.

Mt.13:57 57. E escandalizavam-se nele. Jesus, porém, lhes disse: Não há profeta sem honra, senão na sua terra e na sua casa.

Sem comentário para este versículo.

Mt.13:58 58. E não fez ali muitos milagres, por causa da incredulidade deles.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:1 1. Por aquele tempo, ouviu o tetrarca Herodes a fama de Jesus

O tetrarca Herodes. [A morte de João Batista, Mt 14:1-12 = Mc.6:14-29 = Lc.9:7-9. Comentário principal: Mc. Ver gráficos, p. 28, 225, 231].

Mt.14:2 2. e disse aos que o serviam: Este é João Batista; ele ressuscitou dos mortos, e, por isso, nele operam forças miraculosas.

Aos que o serviam. Expressão em geral usada para se referir a criados, mas, neste caso, aos cortesãos de Herodes.

Mt.14:3 3. Porque Herodes, havendo prendido e atado a João, o metera no cárcere, por causa de Herodias, mulher de Filipe, seu irmão

Prendido e atado a João. [João é aprisionado, Mt 14:3-5 = Lc.3:19-20. Comentário principal: Lc].

Mt.14:4 4. pois João lhe dizia: Não te é lícito possuí-la.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:5 5. E, querendo matá-lo, temia o povo, porque o tinham como profeta.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:6 6. Ora, tendo chegado o dia natalício de Herodes, dançou a filha de Herodias diante de todos e agradou a Herodes.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:7 7. Pelo que prometeu, com juramento, dar-lhe o que pedisse.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:8 8. Então, ela, instigada por sua mãe, disse: Dá-me, aqui, num prato, a cabeça de João Batista.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:9 9. Entristeceu-se o rei, mas, por causa do juramento e dos que estavam com ele à mesa, determinou que lha dessem

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:10 10. e deu ordens e decapitou a João no cárcere.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:11 11. Foi trazida a cabeça num prato e dada à jovem, que a levou a sua mãe.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:12 12. Então, vieram os seus discípulos, levaram o corpo e o sepultaram; depois, foram e o anunciaram a Jesus.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:13 13. Jesus, ouvindo isto, retirou-se dali num barco, para um lugar deserto, à parte; sabendo-o as multidões, vieram das cidades seguindo-o por terra.

Ouvindo isto. [A primeira multiplicação de pães e peixes, Mt 14:13-21 = Mc.6:30-44 = Lc.9:10-17 = Jo.6:1-13. Comentário principal: Mc e Jo]. Mateus se refere à morte de João Batista, cujo relato está nos v. Mt.14:1-12. Parece que Jesus recebeu a notícia da morte de João no final da terceira viagem pela Galileia, ao retornar a Cafarnaum. Mateus se refere a isso como uma das razões que fizeram Jesus ir para o outro lado do lago (ver com. de Mc.6:30).

Mt.14:14 14. Desembarcando, viu Jesus uma grande multidão, compadeceu-se dela e curou os seus enfermos.

Desembarcando. Provavelmente do barco com o qual tinham cruzado o lago.

Mt.14:15 15. Ao cair da tarde, vieram os discípulos a Jesus e lhe disseram: O lugar é deserto, e vai adiantada a hora; despede, pois, as multidões para que, indo pelas aldeias, comprem para si o que comer.

Ao cair da tarde. Isto é, ao entardecer (ver com. de Mc.6:35).

Mt.14:16 16. Jesus, porém, lhes disse: Não precisam retirar-se; dai-lhes, vós mesmos, de comer.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:17 17. Mas eles responderam: Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:18 18. Então, ele disse: Trazei-mos.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:19 19. E, tendo mandado que a multidão se assentasse sobre a relva, tomando os cinco pães e os dois peixes, erguendo os olhos ao céu, os abençoou. Depois, tendo partido os pães, deu-os aos discípulos, e estes, às multidões.

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:20 20. Todos comeram e se fartaram; e dos pedaços que sobejaram recolheram ainda doze cestos cheios.

Dos pedaços. Isto é, “os pedaços que sobraram” (ver com. de Mc.6:43).

Mt.14:21 21. E os que comeram foram cerca de cinco mil homens, além de mulheres e crianças.

Mulheres e crianças. Mateus quer dizer que não foram contados, não que não tenham comido.

Mt.14:22 22. Logo a seguir, compeliu Jesus os discípulos a embarcar e passar adiante dele para o outro lado, enquanto ele despedia as multidões.

Logo a seguir. [Jesus anda por sobre o mar, Mt 14:22-33 = Mc.6:45-52 = Jo.6:15-21. Comentário principal: Mt e Jo. Ver mapa, p. 220; gráfico, p. 231; sobre milagres, ver p. 204-210]. Do gr. eutheos, “imediatamente”. Isto aconteceu no mesmo dia do milagre da multiplicação dos pães e peixes que alimentou cinco mil, como deixaram claro os escritores dos evangelhos. Esses eventos provavelmente aconteceram ao final de março ou começo de abril de 30 d.C.

Compeliu. Do gr. anagkazo, “compelir” ou “obrigar” (ver com. de Lc.14:23). Essa foi a primeira vez em que Jesus achou necessário falar aos discípulos com tal autoridade e força (DTN, 378). As palavras eutheos, “imediatamente”, e anagkazo, “compelir”, indicam tanto pressa e urgência da parte de Jesus, quanto hesitação e relutância da parte dos discípulos. A razão para essa relutância está clara em Jo.6:15 (ver DTN, 377, 378; ver com. Mc.6:42). Convencida de que Jesus era o Messias prometido ou o Libertador de Israel, a multidão estava inclinada a coroá-Lo rei ali mesmo. Percebendo o sentimento da multidão, os discípulos tomaram a iniciativa e estiveram a ponto de proclamá-Lo rei de Israel. Judas foi o primeiro dos doze a perceber a importância do sentimento popular e foi ele quem iniciou o projeto de coroar a Cristo como rei (DTN, 718). Essa ação precipitada teria feito concluir prematuramente a missão terrena de Cristo. Foi necessária uma atitude imediata e decisiva da parte de Jesus a fim de apaziguar o sentimento popular do povo e controlar os discípulos.

Passar adiante dEle. O grupo que Jesus direcionou para precedê-Lo ao outro lado do lago incluía Seus discípulos e alguns outros (ver DTN, 382).

O outro lado. Jesus, Seus discípulos e a grande multidão estavam na margem nordeste do mar da Galileia, pouca distância a leste da cidade de Betsaida (ver com. de Mt.11:21). “O outro lado” seria o lugar de onde tinham partido pela manhã. Os discípulos partiram para Cafarnaum (ver Jo.6:17). Não está de todo claro por que Marcos afirma que eles estavam indo “a Betsaida” (Mc.6:45), a menos que quisesse dizer que partiriam naquela direção a caminho de Cafarnaum. Eles estavam a pouca distância de Betsaida e teriam que passar diretamente por ela no retorno para Cafarnaum. Não há evidência alguma de outra “Betsaida” na margem ocidental do lago, como alguns comentaristas criam antigamente. Na verdade, o vento (ver Mt.14:24) os afastou de seu destino pretendido (DTN, 380, 381), em vez de aproximá-los dele.

Mt.14:23 23. E, despedidas as multidões, subiu ao monte, a fim de orar sozinho. Em caindo a tarde, lá estava ele, só.

Ao monte. Isto é, nas colinas acima do lago, na margem nordeste.

A fim de orar. Ver com. de Mc.1:35; Mc.3:13. Nos montes, Jesus passou várias horas (ver DTN, 379), contudo, não perdeu de vista os discípulos no lago (ver DTN, 381). Nessa ocasião, Sua oração teve um propósito duplo: primeiramente por Si mesmo, para que soubesse como tornar claro o verdadeiro propósito de Sua missão ao povo; e, em segundo lugar, por Seus discípulos, devido à prova e desilusão pela qual passariam (ver com. de Mt.14:24).

Caindo a tarde. Esta foi a chamada “segunda tarde”, desde cerca do pôr do sol até a noite (ver com. de Mc.6:34), em contraste com a chamada “primeira tarde”, desde o declínio do sol, cerca do meio da tarde, até o pôr do sol. Era quase noite quando os discípulos finalmente partiram no barco (ver DTN, 380).

Lá estava Ele só. Não no sentido físico apenas. Jesus estava “só” também no sentido de que nem os discípulos O compreendiam. No silêncio dos montes e sob o céu estrelado, Jesus teve comunhão com o Pai (ver com. de Mc.1:35).

Mt.14:24 24. Entretanto, o barco já estava longe, a muitos estádios da terra, açoitado pelas ondas; porque o vento era contrário.

A muitos estádios da terra. A evidência textual (cf. p. 136) favorece esta variante, em vez de “no meio do mar” (ARC). Os discípulos tinham remado entre 25 e 30 estádios (Jo.6:19), de quatro a cinco quilômetros quando Jesus os alcançou. Em circunstâncias normais, teriam percorrido essa distância em mais ou menos uma hora, mas nessa ocasião levaram aproximadamente oito horas (ver com. de Mt.14:25). Isso é uma evidência do forte vento que eles encontraram enquanto cruzavam o lago. A distância até Cafarnaum era de aproximadamente seis quilômetros, mas o vento os levou bem mais ao sul do que pretendiam, com o resultado de que chegaram à margem ao sul de Cafarnaum, na planície de Genesaré (ver Mt.14:34; ver com. Lc.5:1), uma distância cerca de duas vezes o curso direto para Cafarnaum.

Açoitado. Literalmente, “afligido” ou “atormentado”. Marcos diz que estavam “em dificuldade a remar”. Em Mc.6:48, a expressão traduzida como “em dificuldade” provém da mesma palavra grega aqui traduzida como “açoitado”. O forte vento da tempestade tornava impraticável usar a vela, e é provável que tenham preferido remar.

O vento era contrário. Se os discípulos tivessem cruzado o lago quando Jesus lhes disse para irem, talvez tivessem escapado da tempestade. Mas sua obstinação fez com que demorassem para partir, até que fosse quase noite (ver DTN, 379, 380). Cerca de oito horas depois (ver com. do v. Mt.14:25), estavam lutando pela vida. Judas tinha encabeçado o projeto de tornar Cristo rei à força e, sem dúvida, se ressentiu mais que os outros com a ordem de embarcarem para o outro lado antes do Mestre (ver v. Mt.14:22; DTN, 718). Judas parece ter sido o principal responsável por confundir o pensamento de seus colegas e difundir o descontentamento que enchia o coração deles (ver DTN, 719, 380). À medida que os discípulos, em obediência a Cristo, saíam para cruzar o lago, sentimentos de humilhação, desapontamento, ressentimento e impaciência lhes perturbavam o coração. Pode-se dizer que a hesitação na praia produziu a descrença. O vento era contrário assim como o coração deles; mas, pela providência divina, o mar tempestuoso se tornou o meio de acalmar a tempestade interior. Muitas vezes, também nos encontramos à deriva num mar sombrio e tempestuoso de problemas.

Mt.14:25 25. Na quarta vigília da noite, foi Jesus ter com eles, andando por sobre o mar.

Na quarta vigília. Desde a Antiguidade, os judeus dividiam a noite em três vigílias (ver com. de Lm.2:19), mas, sob o governo romano, adotaram o sistema de quatro vigílias.

Foi Jesus ter com eles. De acordo com Marcos, a intenção de Jesus era passar adiante deles, ou ao menos queria que os discípulos pensassem que Ele queria assim (ver Mc.6:48; DTN, 381). De forma similar, em Emaús, “fez Ele menção de passar adiante” (Lc.24:28). Por toda a noite, Ele não os perdeu de vista, e Jesus foi ter com eles apenas quando desistiram de lutar e clamaram por socorro.

Mt.14:26 26. E os discípulos, ao verem-no andando sobre as águas, ficaram aterrados e exclamaram: É um fantasma! E, tomados de medo, gritaram.

Os discípulos, ao verem-No. Todos O viram (Mc.6:50). Não foi alucinação da parte de um ou dois deles.

Aterrados. É provável que a crença em fantasmas fosse comum (ver Josefo, Guerra dos Judeus, i.30.7 [599]). Ao que parece, a superstição popular não havia sido apagada por completo da mente dos discípulos.

É um fantasma! Do gr. phantasma, “uma aparição”. Um phantasma era algo que não poderia ser explicado com base no fenômeno natural.

Medo. Em princípio, os discípulos gritaram de medo, mas quase de imediato reconheceram que o suposto “fantasma” era Jesus, e outra vez gritaram, desta vez, por ajuda. Jesus falou com eles quando pediram socorro (ver Mc.6:48-49).

Mt.14:27 27. Mas Jesus imediatamente lhes disse: Tende bom ânimo! Sou eu. Não temais!

Sem comentário para este versículo.

Mt.14:28 28. Respondendo-lhe Pedro, disse: Se és tu, Senhor, manda-me ir ter contigo, por sobre as águas.

Respondendo-Lhe Pedro. Somente Mateus registra a experiência constrangedora e quase fatal de Pedro nessa ocasião. Pedro era responsável pelo negócio de pesca no qual pelo menos quatro dos discípulos estavam envolvidos antes de se tornarem seguidores de Jesus (ver com. de Mc.3:16). Por isso, talvez fosse natural para Pedro e para os outros que ele fosse porta-voz de todo o grupo. Seu espírito natural de liderança, nesta ocasião como em muitas outras, levou à confiança demasiada e a uma atitude impulsiva e desajuizada (ver Mt.16:21-23; Mt.17:4; Mt.26:33-35; Mt.26:69-75; Jo.18:10-11; Jo.20:2-6; Gl.2:11-14; sobre o caráter de Pedro, ver com. Mc.3:16).

Se és Tu. Pedro não tinha dúvidas, pois do contrário dificilmente teria ousado caminhar sobre as ondas agitadas pelo vento.

Manda-me ir ter contigo. Pedro estava pronto a fazer o que Jesus pedisse, mas não o faria sem ter a certeza de que Ele o aprovaria.

Mt.14:29 29. E ele disse: Vem! E Pedro, descendo do barco, andou por sobre as águas e foi ter com Jesus.

Ele disse: Vem! É bem provável que Cristo não tivesse a intenção de que Pedro caminhasse sobre as águas. Mas, se sua fé imperfeita inspirava tal atitude, Jesus estava pronto a aceitá-la (ver com. de Mt.12:20).

Andou por sobre as águas. Pedro saiu do barco com fé. Foi a fé que o susteve nas águas da Galileia. Mas a fé estava operante apenas enquanto mantivesse o olhar fixo em Jesus.

Mt.14:30 30. Reparando, porém, na força do vento, teve medo; e, começando a submergir, gritou: Salva-me, Senhor!

Reparando, porém, na força do vento. Parece que Pedro tinha se esquecido, por um momento, do vento e das ondas. À medida que seus pés se acostumavam a caminhar na superfície da água, ele evidentemente pensou em seus companheiros no barco e imaginou o que eles achavam de sua mais nova habilidade. Ao olhar de volta para o barco, perdeu Jesus de vista. Nesse momento, ele estava entre duas ondas e quando voltou seu olhar de novo na direção de Jesus já não pôde vê-Lo (ver DTN, 381). Tudo o que viu foi a agitação das ondas e o vento. Naquele breve instante, o orgulho minou sua fé, e ele não pôde mais se manter em pé.

Teve medo. Não precisamos temer enquanto mantivermos nosso olhar fixo em Jesus e confiarmos na graça e no poder dEle, mas quando olhamos para o eu e para os outros temos boas razões para temer.

Começando a submergir. Como pescador a vida toda, Pedro sabia nadar (ver Jo.21:7). Mas num mar como aquele, no qual um barco não estava seguro, era ainda menos seguro para nadar.

Salva-me, Senhor! A forma do verbo em grego indica a urgência do pedido de Pedro.

Mt.14:31 31. E, prontamente, Jesus, estendendo a mão, tomou-o e lhe disse: Homem de pequena fé, por que duvidaste?

Prontamente. Não há demora da parte de Deus para responder a oração sincera por livramento das ondas da tentação que sempre ameaçam a alma.

Homem de pequena fé. Com amor, Jesus primeiramente salvou Pedro e depois reprovou sua falta de confiança. Ele não o censurou por ter tentado caminhar sobre as ondas, mas por perder a fé. Em parte, Pedro entendeu e valorizou a lição dada por Jesus. Mas se ele a tivesse aprendido plenamente não teria, um ano depois, falhado em sua grande prova (Mt.26:69-75; cf. DTN, 382).

Duvidaste. Do gr. distazo, “hesitar”, “estar em dúvida” ou “vacilar”. Uma pessoa hesita quando tem dúvida quanto a que direção ou atitude tomar. “Ninguém pode servir a dois senhores” (ver com. de Mt.6:24) ou se sentir confortável mesmo com a tentativa de fazê-lo.

Mt.14:32 32. Subindo ambos para o barco, cessou o vento.

Subindo ambos. De mãos dadas com Jesus, Pedro voltou para o barco com seus companheiros, calado e submisso (ver DTN, 381).

Cessou o vento. Literalmente, “o vento se enfraqueceu” (ver Mt.8:26). A tempestade tinha cumprido seu propósito (ver com. de Mt.14:24); pensamentos de impaciência e ressentimento para com Jesus tinham sido dissipados do coração dos discípulos.

Mt.14:33 33. E os que estavam no barco o adoraram, dizendo: Verdadeiramente és Filho de Deus!

E [...] O adoraram. Ver com. de Mt.2:11; Mt.8:2. Essa foi a primeira, embora de forma alguma a última, ocasião (ver Mt.20:20; Mt.28:9; Lc.24:52) em que os discípulos adoraram a Cristo. Os magos fizeram isso (ver Mt.2:11), como também várias pessoas que Jesus curou (ver Mt.8:2; Mt.15:25). Mas, nesse caso, os discípulos confessaram pela primeira vez que Jesus era Filho de Deus e Lhe prestaram a adoração que se prestava a Deus. Além disso, Jesus aceitou a adoração deles. Talvez, essa confissão de fé tenha sido a mais significativa, tendo em vista as dúvidas e temores dos discípulos durante a noite anterior (ver com. de Mt.14:24).

És Filho de Deus! Ver com. de Lc.1:35.

Mt.14:34 34. Então, estando já no outro lado, chegaram a terra, em Genesaré.

Genesaré. [Jesus em Genesaré, Mt 14:34-36 = Mc.6:53-56]. Evidentemente, neste caso, refere-se à região, ou planície de Genesaré, em vez de as dez cidades com esse nome (sobre a planície de Genesaré, ver com. de Lc.5:1). Antigamente, a cidade de Quinerete estava situada ao longo das margens desta planície, e alguns defendem que o nome Genesaré veio originalmente de Quinerete. Até onde se sabe, essa cidade, cujas ruínas são conhecidas atualmente como Tell el Oreimeh, tinha deixado de existir na época de Cristo.

Mt.14:35 35. Reconhecendo-o os homens daquela terra, mandaram avisar a toda a circunvizinhança e trouxeram-lhe todos os enfermos

Reconhecendo-O. Isto é, quando perceberam que era Jesus que estava de novo entre eles.

Enfermos. Ver com. de Mc.1:34.

Mt.14:36 36. e lhe rogavam que ao menos pudessem tocar na orla da sua veste. E todos os que tocaram ficaram sãos.

Tocar na orla da Sua veste. Ver com. de Mc.5:27-28. Sobre o contexto cronológico de Mt.14:35-36, ver com. de Mt.15:1.

Mt.15:1 1. Então, vieram de Jerusalém a Jesus alguns fariseus e escribas e perguntaram:

Então, vieram. [Jesus e a tradição dos anciãos. O que contamina o homem, Mt 15:1-20 = Mc.7:1-23. Comentário principal: Mc]. Sobre o uso de “então”, ver com. de Mt.4:1.

Mt.15:2 2. Por que transgridem os teus discípulos a tradição dos anciãos? Pois não lavam as mãos, quando comem.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:3 3. Ele, porém, lhes respondeu: Por que transgredis vós também o mandamento de Deus, por causa da vossa tradição?

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:4 4. Porque Deus ordenou: Honra a teu pai e a tua mãe; e: Quem maldisser a seu pai ou a sua mãe seja punido de morte.

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Mt.15:5 5. Mas vós dizeis: Se alguém disser a seu pai ou a sua mãe: É oferta ao Senhor aquilo que poderias aproveitar de mim

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Mt.15:6 6. esse jamais honrará a seu pai ou a sua mãe. E, assim, invalidastes a palavra de Deus, por causa da vossa tradição.

Jamais honrará. A primeira frase do v. 6, como está na ARA, na verdade, dá sequência e completa o pensamento do v. Mt.15:5. O v. 6 deveria começar com as palavras: “Assim fizestes”.

Mandamento. A evidência textual (cf. p. 136) favorece a variante “palavra”.

Mt.15:7 7. Hipócritas! Bem profetizou Isaías a vosso respeito, dizendo:

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Mt.15:8 8. Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:9 9. E em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens.

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Mt.15:10 10. E, tendo convocado a multidão, lhes disse: Ouvi e entendei:

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:11 11. não é o que entra pela boca o que contamina o homem, mas o que sai da boca, isto, sim, contamina o homem.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:12 12. Então, aproximando-se dele os discípulos, disseram: Sabes que os fariseus, ouvindo a tua palavra, se escandalizaram?

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:13 13. Ele, porém, respondeu: Toda planta que meu Pai celestial não plantou será arrancada.

Toda planta. Aqui, significando toda tradição, todos os “mandamentos de homens” (v. Mt.15:9; ver com. de Mc.7:3; Mc.7:13; Mc.7:15).

Mt.15:14 14. Deixai-os; são cegos, guias de cegos. Ora, se um cego guiar outro cego, cairão ambos no barranco.

Barranco. De preferência, “cova” ou “buraco”.

Mt.15:15 15. Então, lhe disse Pedro: Explica-nos a parábola.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:16 16. Jesus, porém, disse: Também vós não entendeis ainda?

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:17 17. Não compreendeis que tudo o que entra pela boca desce para o ventre e, depois, é lançado em lugar escuso?

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:18 18. Mas o que sai da boca vem do coração, e é isso que contamina o homem.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:19 19. Porque do coração procedem maus desígnios, homicídios, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:20 20. São estas as coisas que contaminam o homem; mas o comer sem lavar as mãos não o contamina.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:21 21. Partindo Jesus dali, retirou-se para os lados de Tiro e Sidom.

Partindo Jesus dali. [A mulher cananeia, Mt 15:21-28 = Mc.7:24-30. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 218; gráficos, p. 226, 228; sobre milagres, ver p. 204-210]. O incidente seguinte ocorreu provavelmente no fim da primavera de 30 d.C., possivelmente no mês de maio. Com a alimentação dos 5 mil e o sermão sobre o Pão da Vida, na sinagoga de Cafarnaum (ver com. de Jo.6:1, A terceira jornada pela Galileia alarmou muito os líderes judeus (DTN, 395; ver com. de Mc.6:14). Após a Páscoa, uma delegação de Jerusalém confrontou Jesus com a acusação de que Ele estava transgredindo as exigências religiosas (Mc.7:1-23). Mas Ele os silenciou revelando sua hipocrisia, e eles foram embora encolerizados (DTN, 398). A atitude e as ameaças deles deixaram claro que Sua vida estava em perigo (DTN, 398, 401). Assim, em harmonia com o conselho que já havia dado aos discípulos, Ele Se retirou da Galileia por um tempo (ver com. de Mt.10:14; Mt.10:2), como havia feito na Judeia no ano anterior, quando foi rejeitado pelos líderes de lá (ver com. de Mt.4:12). Essa retirada para o norte marca o início de um novo período no ministério de Cristo e o fim de Seu ministério na Galileia, ao qual Ele dedicou cerca de um ano, aproximadamente da Páscoa de 29 d.C. à de 30 d.C.

Isso foi menos de um ano antes de Sua morte. Embora a circunstância imediata que levou Jesus a Se retirar para a região da Fenícia tenha sido o encontro com os escribas e fariseus de Jerusalém, a viagem também tinha objetivos positivos. Jesus tinha um propósito definido, não só ao deixar a Galileia, mas também ao ir para a região geral da Fenícia. Após ter sido rejeitado pelos judeus, tanto na Judeia como na Galileia, Cristo procurou uma oportunidade para instruir os discípulos a trabalhar pelos não judeus. Os pagãos necessitavam do evangelho, por isso Ele ensinou uma série de lições destinadas a levar os discípulos a perceber as necessidades das nações e o fato de que elas também eram candidatas ao reino dos céus. A retirada para a Fenícia proporcionou uma excelente oportunidade para essa instrução (DTN, 400). Jesus operou somente um milagre durante essa visita à Fenícia. Claramente, no entanto, essa visita não foi uma viagem missionária no sentido que tiveram as três jornadas pela Galileia, pois, ali chegando, Jesus procurou Se manter incógnito (Mc.7:24).

Para os lados. Do gr. mere, “distrito”, “divisão” ou “região”. Jesus Se retirou para as montanhas da fronteira entre a Galileia e a Fenícia (DTN, 399), de onde podia ver as cidades de Tiro e Sidom, distante cerca de 37 km na planície costeira abaixo. A área pertencia à província romana da Síria (ver vol. 2, p. 54).

Tiro e Sidom. Ver vol. 1, p. 107, 108; vol. 2, p. 51-53; ver com. de Gn.10:15. Por séculos, antes do domínio romano, os fenícios tinham sido os líderes comerciais do mundo.

Mt.15:22 22. E eis que uma mulher cananéia, que viera daquelas regiões, clamava: Senhor, Filho de Davi, tem compaixão de mim! Minha filha está horrivelmente endemoninhada.

Uma mulher cananeia. Os fenícios pertenciam a uma antiga etnia cananeia; na verdade, eles se chamavam cananeus (ver com. de Gn.10:6; Gn.10:18). Foram os gregos que os chamaram de fenícios, aparentemente a partir do nome de um corante roxo (gr. phoinix) que os gregos compravam deles durante os primeiros tempos do comércio fenício na região do Egeu (ver vol. 2, p. 52, 53). Os cananeus eram de ascendência camita, mas logo, durante sua residência no território da Palestina, adotaram a língua semítica e absorveram tanto da cultura semita que se pensava que eles eram de origem semita. Os judeus eram semitas, e há grandes semelhanças entre a linguagem e as características gerais da cultura dos hebreus e dos povos cananeus. Essa foi a quarta ocasião registrada nos evangelhos em que Jesus ministrou aos não judeus. A primeira foi em Sicar, em Samaria (Jo.4:5-42); a segunda, em Cafarnaum (Lc.7:1-10); e a terceira, nas proximidades de Gergesa (Mc.5:1-20). Naturalmente, os samaritanos eram parcialmente israelitas e, embora o ministério de Jesus por eles não fosse bem visto, não trouxe sobre Ele a censura que o trabalho pelas nações totalmente pagãs o traria. O centurião era amigável para com os judeus e acreditava que eles tinham a verdadeira religião. O milagre que Cristo operou por ele foi de acordo com o pedido dos líderes dos próprios judeus. A cura dos endemoniados de Gerasa (ou Gergesa) não poderia ser interpretada pelos judeus como um contato intencional da parte de Cristo com os pagãos. Ao contrário, podiam entender isso como um impulso emergencial de Cristo, como autodefesa. Além disso, recusou-Se a permitir que os homens libertos dos demônios se associassem a Ele como discípulos. Mesmo neste episódio, com a mulher siro-fenícia, Jesus não foi trabalhar abertamente pelo povo da região (Mc.7:24). Ela foi a Ele e insistiu em seu pedido. O trato de Cristo com os não judeus da Palestina foi uma exceção em Seu ministério, visto que Seus esforços se concentravam nas “ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mt.15:24). Para que o trabalho pelo povo escolhido alcançasse qualquer medida de sucesso, era necessário que Ele, ao menos aparentemente, cumprisse o costume, a fim de que os líderes judeus não tivessem a oportunidade de acusá-Lo de quebrar as barreiras que tinham erguido contra os gentios, por mais erradas que fossem, em muitos aspectos (ver vol. 4, p. 15-20). De outro modo, Ele teria destruído Sua influência sobre as mesmas pessoas pelas quais viera trabalhar. Hoje, os obreiros cristãos devem considerar todos como seus iguais diante de Deus, lembrando “que Deus não faz acepção de pessoas” (At.10:34).

Regiões. Do gr. horia, “fronteiras”, neste caso, uma região delimitada por fronteiras (ver com. do v. Mt.15:21). Jesus estava na região de Tiro e Sidom. A mulher era dessa região e o incidente aqui registrado ocorreu nesse território. Quando a mulher encontrou Jesus, ela se prostrou diante dEle (Mc.7:25), na postura habitual oriental assumida quando se apresentava uma petição a um superior (ver com. de Mt.4:9; Mt.8:2).

Filho de Davi. Ver com. de Mt.1:1. É surpreendente que uma mulher pagã se dirigisse a Jesus usando esse título, que implicava o reconhecimento dEle como o Messias. Muitos judeus viviam na Fenícia, e a notícia dos feitos maravilhosos de Jesus já circulava havia muito tempo entre eles (Mc.3:8; Lc.6:17). Aparentemente, foi por esses judeus residentes na Fenícia que a mulher tinha ouvido falar de Jesus (DTN, 400).

Tem compaixão. Do gr. eleeo, (ver com. de Mt.5:7).

Horrivelmente endemoninhada. Literalmente, “gravemente demonizada”, ou, mais livremente, “severamente possuída por um demônio” (ver Nota Adicional a Marcos 1; Mc.1:45).

Mt.15:23 23. Ele, porém, não lhe respondeu palavra. E os seus discípulos, aproximando-se, rogaram-lhe: Despede-a, pois vem clamando atrás de nós.

Não lhe respondeu palavra. O propósito de Cristo era ensinar aos discípulos uma lição sobre o trabalho pelos não judeus, representando o contraste entre a atitude costumeira dos judeus e a Sua (ver com. do v. Mt.15:21). O rabino judeu típico teria feito precisamente o que os discípulos propuseram, mandando-a embora sem sequer dar uma resposta direta ao seu pedido. O favor com que o próprio Jesus considerava os gentios como pessoas qualificadas aos privilégios do reino dos céus é evidente pelo que Ele tinha dito sobre eles (Lc.4:26-27), bem como no que havia feito por eles em ocasiões anteriores. De forma alguma Jesus compartilhava a estreita exclusividade que os judeus sentiam em relação aos gentios (ver com. de Mt.15:22; Mt.15:26).

Seus discípulos, aproximando-se. Eles não gostaram da publicidade provocada pelos apelos fervorosos dessa mulher gentia, que eles consideravam não mais digna do que um cão (ver com. de Mt.10:5). Ela não era apenas uma estranha, ela era uma mulher. E não só isso, ela era uma estrangeira. No conceito deles acerca da comissão evangélica, ainda não havia lugar para mulheres estranhas e estrangeiras.

Mt.15:24 24. Mas Jesus respondeu: Não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel.

Não fui enviado. Ver com. do v. Mt.15:21. Isto é, Jesus foi enviado principalmente aos judeus, embora, quando a ocasião se oferecia, Ele não negasse aos gentios as bênçãos que concedia a Seu próprio povo (ver vol. 4, p. 13-17). Não foi até muitos anos depois de Cristo ter ascendido ao Céu que os cristãos judeus compreenderam plenamente que Deus considera todas as pessoas, em todos os lugares, qualificadas para se tornarem cidadãs do reino dos céus (ver At.9:9-18; At.9:32-35; At.10:1-48; At.15:1-29; Rm.1:16; Rm.9:24).

Ovelhas perdidas. Ver com. de Mt.10:6.

Mt.15:25 25. Ela, porém, veio e o adorou, dizendo: Senhor, socorre-me!

Adorou. Literalmente, “prostrou-se” (ver com. de Mt.8:2). Essa postura típica oriental de súplica podia ser assumida diante de objetos de culto ou até mesmo diante de outros seres humanos, especialmente diante de superiores cujo favor era pedido (ver com. de Et.3:2). O fato de essa mulher usar o título messiânico “filho de Davi” (ver com. de Mt.1:1; Mt.15:22) implica que ela tinha uma noção de quem realmente era Jesus. Não há como afirmar se ela usou o termo simplesmente porque seus vizinhos judeus o usavam ao comentar as maravilhas de Cristo, ou se expressava uma medida de fé de sua parte de que Jesus era o Messias.

Mt.15:26 26. Então, ele, respondendo, disse: Não é bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos.

Não é bom. Ou seja, não é justo ou adequado. Aqui, Cristo expressa a atitude característica judaica de que os gentios eram indignos das bênçãos divinas.

Pão. Isto é, o “pão” da salvação (Jo.6:32) que Deus confiou aos judeus, Seus “filhos”, para distribuição entre os gentios, mas que os judeus estavam egoisticamente escondendo para si (PJ, 291-293).

Cachorrinhos. Do gr. kunaria, “câezinhos”, aqui utilizado como referência aos gentios (ver com. de Mt.7:6). Os judeus sentiam que as bênçãos da salvação seriam desperdiçadas se fossem dadas aos gentios, que, de acordo com a opinião deles, não tinham a capacidade de apreciar essas bênçãos ou de se beneficiar delas. Pode-se conceber que a atitude de desdém assumida por Cristo para com a mulher poderia tê-la desencorajado, mas, sem dúvida, Ele tinha confiança de que sua fé não desfaleceria (ver 1Co.10:13). Ela parecia certa de que Cristo poderia atender ao desejo de seu coração, se Ele o quisesse (ver com. de Mc.1:40). Para ela, orgulho e preconceito não significavam nada, e ela não deixaria que isso a detivesse. Sua fé e perseverança são realmente louváveis.

Mt.15:27 27. Ela, contudo, replicou: Sim, Senhor, porém os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos.

Sim, Senhor. Ou, “verdade, Senhor”. Por trás da aparente indiferença de Jesus ao apelo sincero da mulher (ver com. de Mt.15:23; Mt.15:26), ela aparentemente detectou a terna compaixão de Seu grande coração de amor. O próprio fato de Ele discutir o assunto com ela – em vez de despedi-la abruptamente, como os rabinos o teriam feito – evidentemente lhe deu coragem para crer que Ele atenderia ao seu apelo. Sua voz não tinha nenhum traço de impaciência e Seu rosto revelava apenas a serena dignidade e infinita ternura que marcavam Seu semblante.

Migalhas. Do gr. psichia, diminutivo que significa “pequenos pedaços”, ou “migalhas”. Até mesmo os “cachorrinhos” (ver com. do v. Mt.15:26) tem direito aos “pequenos” pedaços que seus senhores lhes atiram. A mulher notável estava pronta para aceitar qualquer nível necessário de humanidade que Cristo lhe atribuísse, sem ao menos discutir a questão, se Ele tão somente atendesse ao seu pedido (ver com. de Mc.1:40-45, sobre a persistência de um leproso em face de grandes obstáculos).

Mt.15:28 28. Então, lhe disse Jesus: Ó mulher, grande é a tua fé! Faça-se contigo como queres. E, desde aquele momento, sua filha ficou sã.

Grande é a tua fé. Ela passou no teste, sua fé permaneceu firme. Ela tinha certeza de que Cristo concederia o dom da saúde à sua filha (comparar com o elogio de Cristo ao centurião, ver com. de Lc.7:9).

Desde aquele momento. Como o filho do oficial (Jo.4:43-54) e o servo do centurião (Lc.7:1-10), a filha da mulher cananeia foi curada à distância, não na presença imediata de Cristo e, como em cada um dos outros casos, a cura foi imediata e definitiva.

Mt.15:29 29. Partindo Jesus dali, foi para junto do mar da Galiléia; e, subindo ao monte, assentou-se ali.

Partindo Jesus dali. [Jesus volta para o mar da Galileia e cura muitos enfermos, Mt 15:29-31 = Mc.7:31-37. Comentário principal: Mc].

Mt.15:30 30. E vieram a ele muitas multidões trazendo consigo coxos, aleijados, cegos, mudos e outros muitos e os largaram junto aos pés de Jesus; e ele os curou.

E os largaram. Não de forma grosseira, mas, aparentemente, com um gesto que denotava determinação. Eles confiavam os doentes e sofredores à misericórdia de Cristo.

Mt.15:31 31. De modo que o povo se maravilhou ao ver que os mudos falavam, os aleijados recobravam saúde, os coxos andavam e os cegos viam. Então, glorificavam ao Deus de Israel.

Sem comentário para este versículo.

Mt.15:32 32. E, chamando Jesus os seus discípulos, disse: Tenho compaixão desta gente, porque há três dias que permanece comigo e não tem o que comer; e não quero despedi-la em jejum, para que não desfaleça pelo caminho.

Chamando [...] Seus discípulos. [A segunda multiplicação de pães e peixes, Mt 15:32-39 = Mc.8:1-10. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 218; gráfico, p. 228; sobre milagres, ver p. 204-210]. Sobre eventos imediatamente anteriores a este, ver com. do v. Mt.15:21. Sobre o contexto deste milagre, um milagre anterior na mesma localidade e a relação entre os dois incidentes, ver com. de Mc.5:1; Mc.5:18-20. Para uma comparação entre os dois incidentes, ver Nota Adicional a Mateus 15; Mt.15:39. O tempo era, provavelmente, o início do verão do ano 30 d.C., talvez no fim de junho ou início de julho.

Tenho compaixão. O Salvador sempre é tocado pelo sofrimento humano (Hb.4:15).

Gente. Gentios, em sua maioria, se não exclusivamente (DTN, 405). Originalmente, eram preconceituosos contra Jesus. Porém, nessa ocasião, eles pareciam não só amigáveis, mas intensamente interessados no que Ele tinha a dizer.

Três dias. De acordo com o cálculo oriental, esse seria um dia cheio e todas as horas do dia anterior e do dia seguinte (ver p. 246-248). As pessoas tinham levado comida para pelo menos um dia, até dois, pois Jesus não teve preocupação até o terceiro dia.

Não quero. Literalmente, “não estou disposto”.

Para que não desfaleça. As pessoas estavam com fome, e Jesus se interessava pelo bem-estar físico delas, assim como com o espiritual.

Mt.15:33 33. Mas os discípulos lhe disseram: Onde haverá neste deserto tantos pães para fartar tão grande multidão?

Os discípulos Lhe disseram. Comparar com Mc.6:35-37.

Mt.15:34 34. Perguntou-lhes Jesus: Quantos pães tendes? Responderam: Sete e alguns peixinhos.

Quantos pães tendes? Ver com. de Mc.6:38.

Alguns peixinhos. Não eram muitos e, aos olhos dos discípulos, eram tão poucos que nem mereciam ser contados.

Mt.15:35 35. Então, tendo mandado o povo assentar-se no chão,

Chão. Sobre o fato significativo de a relva não ser mencionada, como na narrativa da alimentação dos cinco mil, ver Nota Adicional a Mateus 15; Mt.15:39.

Mt.15:36 36. tomou os sete pães e os peixes, e, dando graças, partiu, e deu aos discípulos, e estes, ao povo.

Dando graças. Ver com. de Mc.6:41.

Mt.15:37 37. Todos comeram e se fartaram; e, do que sobejou, recolheram sete cestos cheios.

Todos comeram. Ver com. de Mc.6:42.

Cestos. Do gr. spurides, cestos grandes feitos de corda ou vime (ver com. de Mc.6:43).

Mt.15:38 38. Ora, os que comeram eram quatro mil homens, além de mulheres e crianças.

Quatro mil homens. Na alimentação dos cinco mil, mais de 10 mil pessoas estavam presentes, incluindo mulheres e crianças (DTN, 809). Se a proporção foi a mesma neste episódio, teria havido mais de 8 mil pessoas, incluindo homens, mulheres e crianças.

Mt.15:39 39. E, tendo despedido as multidões, entrou Jesus no barco e foi para o território de Magadã.

Magdala (ARC). A evidência textual favorece (cf. p. 136) a variante “Magadã” (ARA). Marcos menciona Dalmanuta (Mc.8:10). Pode ser que houvesse vários nomes para a mesma localidade. A maioria das autoridades modernas tende a registrar a ortografia Magdala e tenta identificá-la com Mejdel, na costa ocidental, entre Cafarnaum e Tiberíades. As ruínas de Mejdel estão localizadas perto do limite sul da planície de Genesaré.

NOTA ADICIONAL A MATEUS 15.

Críticos têm muitas vezes afirmado que a alimentação dos quatro mil não é um evento diferente da alimentação dos cinco mil. Eles apontam para muitos detalhes semelhantes e, principalmente, para a atitude dos discípulos quando Cristo propôs alimentar tão grande multidão em uma região escassamente povoada. No entanto, vários outros detalhes indicam que são dois incidentes semelhantes, como os escritores dos evangelhos afirmam, e não duas versões de um único incidente, como os críticos entendem. Os pontos de semelhança podem ser relacionados como: (1) a região em que ocorreu o milagre: a costa leste ou nordeste da Galileia; (2) uma grande multidão reunida em uma colina, em campo aberto, para ouvir Jesus; (3) a falta de alimento e a simpatia de Jesus pelo povo naquela situação; (4) o diálogo de Jesus com os discípulos, implicando que eles deveriam tomar a iniciativa de fornecer o alimento; (5) a resposta incrédula dos discípulos e a pergunta de Jesus quanto às fontes disponíveis; (6) a multidão sentada no chão; (7) a bênção, o partir e a distribuição dos pães e dos peixes; (8) o alimento excedente; (9) a despedida da multidão; e (10) o retorno para a costa ocidental do lago.

Os pontos de divergência são estes: (1) em um, a chegada pelo mar; no outro, por terra, como sugere o contexto; (2) um, perto de Betsaida Julia; o outro, provavelmente mais ao sul, perto de Gergesa; (3) em um, os judeus que estavam a caminho para assistir à Páscoa (DTN, 364); no outro, os gentios que viviam na região (DTN, 404); (4) em um, o ensino com a duração de um dia; no outro, o ensino com a duração de três dias; (5) as circunstâncias que levaram Jesus à região: em um, a fim de ficar a sós com os discípulos; no outro, Jesus já estava na região curando as pessoas; (6) tempo: em um, logo após a terceira viagem pela Galileia; no outro, depois de uma viagem à Fenícia; (7) em um, a multidão se reuniu no calor do momento e não tinha provisões; no outro, a multidão aparentemente tinha provisões para um dia ou dois e, portanto, tinha se preparado conforme um planejamento anterior; (8) em um, cinco mil; em outro, quatro mil; (9) em um, os discípulos apresentaram o problema e propuseram despedir as multidões para casa; em outro, Jesus apresentou o problema, sugerindo que era dever dos discípulos fazer alguma coisa; (10) em um, a relva era verde; no outro, não há menção à vegetação; (11) em um, é descrita a disposição ordenada dos assentos; no outro, não se menciona como o povo se assentou;

(12) o tipo de cestos usados para recolher o excedente: em um, kophinoi; no outro, spurides; (13) a quantidade recolhida: em um, 12 kophinoi; no outro, 7 spurides; (14) em um, Jesus envia os discípulos à frente para atravessar o lago e Se retira para as montanhas a fim de orar; no outro, Ele os acompanha; (15) destino: em um, Cafarnaum ou Genesaré; no outro, Magdala; (16) em um, seguido por uma tempestade no lago; no outro, sem mencionar a travessia tempestuosa; (17) em um, o incentivo que levou a multidão a se ajuntar foi que alguns tinham visto Jesus partir; no outro, alguns tinham ido de grande distância e não teriam tomado conhecimento da reunião, nem podiam alcançá-la, a não ser mediante planejamento anterior. A natureza incidental dos vários pontos de diferença impede que se considere uma origem comum para as duas narrativas nem qualquer intenção por parte dos escritores dos evangelhos de criar duas histórias a partir de uma original. Deve-se notar, também, que os pontos de semelhança são, em sua maioria, de natureza geral, enquanto os pontos de divergência, em grande parte, tratam de detalhes específicos. Além disso, são mais os pontos de diferença que os de semelhança.

Alguns dos pontos diferentes mais significativos são particularmente dignos de nota: 1. Na alimentação dos cinco mil, havia muita relva (Mt.14:19; Mc.6:39; Jo.6:10), enquanto, com os quatro mil nenhum dos evangelhos menciona a relva. O primeiro milagre ocorreu poucos dias antes da Páscoa, provavelmente na última parte de março ou no início de abril, do ano 30 d.C. (ver com. de Mc.6:30). Na Palestina, as últimas chuvas significativas caíam em março e, em geral, a relva secava com a chegada da estação seca, algumas semanas mais tarde (ver vol. 2, p. 94). Tanto Mateus quanto Marcos registram incidentes que, tomados em seu contexto, deixam claro que houve um lapso de tempo de pelo menos várias semanas entre os dois milagres (ver com. de Mc.7:1; Mt.15:21). A relva estaria marrom e seca no momento do segundo milagre. Esses dois pontos independentes e acidentais das duas narrativas tendem a se confirmar mutuamente, considerando que se o inverso fosse verdade – caso a relva fosse mencionada no segundo caso, mas não no primeiro – aparentaria uma discrepância.

2. Os cestos da primeira ocasião foram kophinoi, pequenos cestos de mão, e os da segunda ocasião, spurides, grandes (ver com. de Mc.6:43). No caso dos cinco mil, os discípulos carregavam kophinoi, ou pequenos cestos de mão, como os judeus usavam em viagens curtas, e a primeira ocasião envolveu uma viagem de cerca de 16 km em menos de 24 horas. A segunda ocasião foi precedida por uma jornada de 80 a 120 km, através de território predominantemente gentio, o que exigiu várias semanas. Em viagem por território gentio, em que os judeus evitavam a compra de alimentos dos pagãos, os discípulos transportavam spurides maiores (ver com. de Mc.6:43). Se os grandes cestos tivessem sido utilizados com os cinco mil, em uma viagem muito breve, e os cestos menores, em uma viagem mais longa, pareceria haver uma discrepância. O fato de Jesus Se referir mais tarde a ambas as ocasiões e de fazer novamente a distinção entre os kophinoi e os spurides atesta a distinção entre os dois milagres (Mt.16:9-10; Mc.8:19-20). Alguns sugerem que a diferença entre os dois tipos de cestos era quanto ao formato, não ao tamanho. Seja qual for, os escritores dos evangelhos mantiveram a distinção no decorrer dos relatos.

3. O fato de a multidão permanecer com Jesus durante três dias na segunda ocasião e de, aparentemente, não ficar sem comida até o terceiro dia favorece a suposição de que estava preparada para permanecer por pelo menos um ou dois dias. Em outras palavras, as pessoas sabiam que se encontrariam com Jesus e, aparentemente, esperavam passar algum tempo com Ele. O fato adicional de alguns deles serem “de longe” (Mc.8:3) aponta para uma reunião planejada, o que não aconteceu com a primeira. Mas a narrativa do evangelho fornece involuntariamente uma explicação completamente satisfatória de como o povo passou a se reunir dessa forma, embora esse fato não seja relatado em conexão com a própria história: os dois endemoniados curados contaram sua história ao longo de Decápolis (Mc.5:20; Lc.8:39). Eles haviam sido sinceros e zelosos em seu trabalho, de modo que em toda a região havia um grande desejo de ver Jesus (cf. Lc.8:40; DTN, 404). Muitos meses depois, quando Ele voltou, os dois endemoniados curados, bem como outros, se uniram na divulgação da notícia. Possivelmente, com o consentimento prévio de Jesus, eles convocaram o povo de longe e de perto.

O principal motivo para os críticos negarem a distinção entre os dois milagres é o fato de que os discípulos estavam tão despreparados para essa manifestação do poder de Cristo como na ocasião anterior (Mt.15:33; Mc.6:35-37). Além disso, haviam se passado, no máximo, não mais de três meses, possivelmente quatro, desde o milagre anterior, e parece difícil acreditar que os discípulos teriam sido tão lentos de raciocínio como parecem ter sido nessa ocasião. No entanto, a primeira multidão era composta exclusivamente de judeus que, presumivelmente, eram qualificados para o “pão do céu”. Nesta segunda vez, a multidão era composta exclusivamente de gentios (DTN, 404, 405). O próprio Jesus havia afirmado fazia pouco que “não é bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos” (Mt.15:26). Essa afirmação não se aplicava literalmente mais do que em sentido figurado, contudo, em sua dificuldade de compreensão (cf. Mt.16:6-11), os discípulos evidentemente a tomaram literalmente. Não se haviam passado 24 horas, e Jesus os repreendeu novamente por serem tão lentos para compreender o sentido de Suas palavras (v. Mt.15:9-12). Para os discípulos, o mais surpreendente e inesperado não foi que Jesus pudesse fornecer o pão, mas que Ele fizesse isso pelos gentios.

Mt.16:1 1. Aproximando-se os fariseus e os saduceus, tentando-o, pediram-lhe que lhes mostrasse um sinal vindo do céu.

Fariseus. [Os fariseus e os saduceus pedem um sinal do céu. O fermento dos fariseus e saduceus, Mt 16:1-12 = Mc.8:11-21. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 218; gráfico, p. 228]. Houve pelo menos duas ocasiões em que Jesus discutiu a demanda por “um sinal do céu”. A primeira foi em conexão com o sermão junto ao mar, provavelmente no outono de 29 d.C. (ver com. de Mt.12:22; Mt.12:38-39). Esta ocasião de Mateus 16:1 a 4 ocorreu cerca de nove meses mais tarde, ou ainda mais, provavelmente, no início do verão de 30 d.C. (sobre os incidentes imediatamente anteriores a este, a segunda ocasião em que um sinal foi exigido, ver com. de Mt.15:21; Mt.15:32).

E os saduceus. Pela primeira vez, os saduceus se uniram aos fariseus na tentativa de silenciar Jesus. Algumas semanas antes, Jesus partiu da Galileia para evitar esses críticos malignos (ver com. de Mt.15:21). Quase no momento em que, mais uma vez, punha os pés em solo galileu, eles renovavam o ataque contra Ele.

Tentando-O. Do gr. peirazo (ver com. de Mt.4:1). Tendo anteriormente confrontado Jesus com essa questão, sem dúvida, eles supunham qual deveria ser Sua resposta (ver com. de Mt.12:38). Ele Se recusaria, e essa recusa seria usada por seus inimigos para convencer o povo de que Ele não era o Messias. Eles colocaram Jesus à prova, assim como Satanás fizera no deserto (ver com. de Mt.4:7), não com o desejo sincero de ver algo que pudesse convencê-los, mas sim com a esperança de que deixasse de fazer e, assim, dar-lhes uma oportunidade de denunciá-Lo e negar Suas reivindicações. Obviamente, Jesus tinha poder para operar esses milagres, mas Ele sempre Se recusou a fazer assim (ver com. de Mt.4:3-11; Mt.7:6). Ele tinha poder para tanto, mas Se recusava, porque isso seria incompatível com o princípio (DTN, 366).

Sinal. Ver p. 204.

Do céu. Ver com. de Mt.12:38-39. A esta altura, Jesus tinha operado todos os tipos de milagres, incluindo demonstrações de poder sobre doenças, demônios, morte e forças da natureza. Cada milagre tinha sido Sua resposta a uma necessidade genuína (DTN, 366). O fato de cada milagre resultar em bênção para a humanidade era a melhor evidência possível do poder divino pelo qual todos os Seus milagres eram operados. Mas os fariseus e saduceus queriam “um sinal do céu” e negavam que os muitos milagres que Jesus operara fossem provas suficientes da origem divina de Sua missão. Aparentemente, procuravam um sinal totalmente fora do controle humano, como um trovão fora de hora (ver com. de 1Sm.12:17), fogo do céu (ver com. de 2Rs.1:10) ou o sol parar (ver com. de Js.10:12); e estavam prontos a afirmar que, a menos que Jesus fizesse isso, Ele não era mesmo tão grande quanto os antigos profetas, como Samuel ou Elias.

Embora eles tivessem conhecimento do anúncio do anjo aos pastores de Belém (Lc.2:8-14), da estrela que levou os magos a Jerusalém (Mt.2:1-6) e da pomba que desceu e a voz do céu (Mt.3:16-17) - todos milagres que poderiam ser classificados como “sinais do céu” - eles se recusavam a reconhecer essas evidências diretas de que Jesus era o Filho de Deus (ver com. de Mt.13:13-16). Eles estavam sem conhecimento porque optaram por rejeitar a luz (ver com. de Os.4:6).

Mt.16:2 2. Ele, porém, lhes respondeu: Chegada a tarde, dizeis: Haverá bom tempo, porque o céu está avermelhado

Chegada a tarde. Evidências textuais (cf. p. 136) apoiam a omissão do restante do v. 2, começando com estas palavras, bem como de todo o v. Mt.16:3. Lc.12:54-56 é semelhante a este texto, apesar de um pouco diferente na forma. Cristo utilizou muitas vezes esse tipo de ilustração e, em Mateus, essa é totalmente adequada ao contexto.

Bom tempo. Jesus Se referia ao tempo da Palestina. Geralmente, o vento e as nuvens provenientes do Mediterrâneo, a oeste, levavam chuva, enquanto o vento do deserto da Arábia, a sudeste, significava tempo quente e seco.

Mt.16:3 3. e, pela manhã: Hoje, haverá tempestade, porque o céu está de um vermelho sombrio. Sabeis, na verdade, discernir o aspecto do céu e não podeis discernir os sinais dos tempos?

Haverá tempestade. Literalmente, “hoje, uma tempestade”.

Sombrio. Do gr. stugnazo, “aparentar sombrio” ou “parecer triste” (Mc.10:22). Aqui, stugnazo significa “nublado” ou, talvez, “ameaçador”.

Hipócritas (ARC). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a omissão destas palavras. Evidentemente, não há dúvida de que esses fariseus e saduceus eram hipócritas (Mt.23:13-29; cf. DTN, 409).

Discernir. Do gr. diakrino, “discriminar”, “separar” ou “fazer distinção”.

Sinais dos tempos. Ver v. Mt.16:2; ver também p. 204. A própria atitude dos fariseus e dos saduceus era em si um “sinal dos tempos”, símbolo de “tempestade” no clima judaico da opinião a respeito do Messias.

Mt.16:4 4. Uma geração má e adúltera pede um sinal; e nenhum sinal lhe será dado, senão o de Jonas. E, deixando-os, retirou-se.

Má e adúltera. “Má” no sentido de que não tinha percepção moral e espiritual; “adúltera”, no sentido de que era desleal para com Deus (ver com. de Mt.12:39).

Nenhum sinal. Os críticos de Jesus necessitavam de regeneração espiritual interior, não de algum sinal exterior (DTN, 406). As palavras pronunciadas por Cristo eram em si mesmas um impressionante “sinal”, ao qual eles deviam dar atenção.

De Jonas. Aqui, Cristo aponta primeiro para o poder de conversão da pregação de Jonas como um “sinal” para o povo de Nínive, assim como Sua pregação era um sinal para as pessoas de Seu tempo (DTN, 406) e, segundo, o elemento de tempo – três dias e três noites – na experiência de Jonas (ver p. 246-248).

Retirou-Se. Ver com. de Mt.10:14; Mt.10:23; Mt.15:21. Jesus Se recusou a continuar discutindo com esses hipócritas. Era inútil fazê-lo, pois não haveria proveito nem para convencê-los nem para esclarecer os espectadores. Uma discussão mais aprofundada poderia servir apenas para confundir as pessoas e confirmar os fariseus e saduceus em seu curso de deliberada incredulidade e engano.

Mt.16:5 5. Ora, tendo os discípulos passado para o outro lado, esqueceram-se de levar pão.

Outro lado. Seu destino era Betsaida Julias (ver com. de Mt.11:21; Mc.6:31; Mc.8:22), a cerca de 13 km de Magdala. À primeira vista, o relato de Marcos (Mc.8:13-22) pode sugerir que a conversa entre Jesus e os discípulos ocorreu no barco, na travessia para o outro lado do lago. Porém, Mateus afirma claramente que foi depois de terem atingido “o outro lado” (DTN, 407).

Esqueceram-se. Isto é, na partida apressada de Magdala, ocasionada pela controvérsia com os fariseus e saduceus. Betsaida Julia, em si, era um território gentio e, normalmente, um judeu carregava provisões a fim de evitar a compra de alimentos dos não judeus (ver Nota Adicional a Mateus 15; Mt.15:39).

Mt.16:6 6. E Jesus lhes disse: Vede e acautelai-vos do fermento dos fariseus e dos saduceus.

Fermento dos fariseus. Ver com. de Mt.13:33. Aqui, “fermento” se refere especificamente à “doutrina” dos fariseus e saduceus (Mt.16:12), isto é, aos seus princípios e ensinamentos. Assim como o fermento permeia a massa, da mesma forma os princípios que um homem aceita permeiam sua vida. A comparação é aplicável, de fato, sejam os princípios bons ou maus. O espírito, os ensinamentos e o caráter dos líderes religiosos, revelados em sua hipocrisia, o orgulho, ostentação e formalismo afetavam inevitavelmente a vida daqueles que os estimavam e cumpriam suas instruções. Neste caso em particular, Jesus Se referiu ao espírito dos fariseus e dos saduceus (cf. Mc.8:15) que os levou a pedir um sinal. Mais tarde, Jesus comparou a hipocrisia deles ao fermento (Lc.12:1; Mt.23:2-3).

Mt.16:7 7. Eles, porém, discorriam entre si, dizendo: É porque não trouxemos pão.

Discorriam. Ou, “deliberavam” entre si.

Não trouxemos pão. Ver com. do v. Mt.16:6. Isto é, sem provisão adequada. Os discípulos tinham um pão pequeno, e não mais (Mc.8:14). Eles interpretaram mal a advertência de Jesus contra o “fermento” dos fariseus, entendendo que deviam evitar a compra de pão de um padeiro que pudesse ser um fariseu ou saduceu (DTN, 408). Os discípulos eram demorados em raciocinar da causa para o efeito e compreender as verdades espirituais que Cristo procurava lhes transmitir (veja Nota Adicional a Mateus 15; Mt.15:39).

Mt.16:8 8. Percebendo-o Jesus, disse: Por que discorreis entre vós, homens de pequena fé, sobre o não terdes pão?

Percebendo-o Jesus. Ele sabia o que os discípulos estavam pensando, mesmo sem ouvir o que falavam (ver com. de Mc.2:8).

Homens de pequena fé. Ver com. de Mt.8:26; Mt.6:30; Hb.11:6. A fé é necessária para a percepção da verdade espiritual. Parte da dificuldade dos discípulos era que eles não percebiam o verdadeiro caráter dos fariseus e saduceus (cf. DTN, 398, 408). Eles ainda consideravam esses líderes religiosos pelo que aparentavam ser, e não pelo que realmente eram – cegos para a hipocrisia que se escondia por trás de uma máscara de piedade.

Mt.16:9 9. Não compreendeis ainda, nem vos lembrais dos cinco pães para cinco mil homens e de quantos cestos tomastes?

Não compreendeis ainda [...]? Jesus estava decepcionado com a lentidão deles para perceber a verdade espiritual (ver com. de Mc.6:37). Apenas algumas horas antes, Ele havia provido alimento para 4 mil homens e, algumas semanas antes, para 5 mil. Por que eles pensavam que Ele estaria preocupado pela falta de pão literal?

Cinco mil. Ver com. de Mc.6:30-44.

Mt.16:10 10. Nem dos sete pães para os quatro mil e de quantos cestos tomastes?

Quatro mil. Ver com. de Mt.15:32-39.

Mt.16:11 11. Como não compreendeis que não vos falei a respeito de pães? E sim: acautelai-vos do fermento dos fariseus e dos saduceus.

Sem comentário para este versículo.

Mt.16:12 12. Então, entenderam que não lhes dissera que se acautelassem do fermento de pães, mas da doutrina dos fariseus e dos saduceus.

Sem comentário para este versículo.

Mt.16:13 13. Indo Jesus para os lados de Cesaréia de Filipe, perguntou a seus discípulos: Quem diz o povo ser o Filho do Homem?

Indo Jesus. [A confissão de Pedro, Mt 16:13-20 = Mc.8:27-30 = Lc.9:18-21. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 218; gráfico, p. 228]. A retirada de Cesareia de Filipe provavelmente tenha ocorrido no meio do verão de 30 d.C., durante o meio ano de retirada do ministério público que Jesus dedicou principalmente para instruir os discípulos. Essa fase do ministério de Cristo se estendeu desde Sua rejeição em Cafarnaum, perto da época da Páscoa (ver com. de Jo.6:66), na primavera, até a Festa dos Tabernáculos, no outono (ver com. de Jo.7:2). Para evitar conflitos com os líderes judeus e os espias encarregados de segui-Lo (ver com. de Mc.7:1), Jesus já tinha passado várias semanas além das fronteiras da Galileia, na Fenícia e em Decápolis (ver com. de Mt.15:21-22; Mc.7:31). Contudo, imediatamente após retornar à Galileia, os espias enviados pelo Sinédrio novamente O desafiaram (ver com. de Mt.16:1), então Ele deixou a Galileia para Betsaida Julia, no território de Herodes Filipe (ver p. 52; ver também com. de Mc.8:22; ver mapa, p. 327). Os espias não O seguiram então.

Lados. Ver com. de Mt.15:21.

Cesareia de Filipe. Deixando Betsaida Julia, Jesus e os discípulos viajaram outros 40 km em direção ao norte, até as proximidades de Cesareia de Filipe, a principal cidade da Itureia, que estava sob a administração de Filipe, irmão de Herodes Antipas, tetrarca da Galileia (ver p. 52; ver também mapa, p. 327). Cesareia de Filipe, originalmente conhecida como Paneias, foi identificada com o sítio arqueológico de Banias, na atual Síria. Paneias era chamada segundo o nome de Pan, o deus grego dos rebanhos, pastagens, florestas e animais selvagens e deus patrono dos pastores e caçadores. A partir de uma gruta, anteriormente dedicada a Pan, em um penhasco elevado nas proximidades de Paneias (Cesareia de Filipe), brota uma corrente perene, o rio Banias, um dos principais afluentes do rio Jordão. Filipe reconstruiu e embelezou a cidade de Paneias e lhe deu o nome de Cesareia de Filipe, em homenagem a si mesmo e a Tibério César (Josefo, Antiguidades, xviii.2.1; Guerra dos Judeus, ii.9.1 [168]).

Perguntou. Ou, “começou a perguntar”, o que sugere uma discussão prolongada. A retirada de Cristo para essa região gentílica foi, em parte, para escapar dos espias, que não Lhe davam trégua enquanto permanecia na Galileia, e também para ter a oportunidade de instruir os discípulos e prepará-los para a hora de crise que em breve levaria Seu ministério ao fim (DTN, 411). A discussão que se seguiu, evidentemente, teve lugar durante as viagens de Jesus e dos discípulos (Mc.8:27), no final de um de Seus períodos de oração (cf. Lc.9:18). Esses detalhes incidentais da narrativa sugerem que Jesus e os discípulos passaram a noite ao relento, em algum lugar no sopé do monte Hermom, e que Ele havia dedicado a noite à oração ou tinha Se levantado cedo e ido a algum lugar tranquilo e isolado, distante dos discípulos, para um período de oração. Ele estava prestes a começar a instrução quanto às cenas finais de Seu ministério terrestre. Assim, Ele buscou orientação sobre como lhes transmitir essas notícias negativas, e orou para que eles estivessem preparados para receber o que Ele tinha para lhes falar (DTN, 411).

Quem diz o povo [...]? Jesus abriu a discussão sobre Seu sofrimento direcionando os pensamentos dos discípulos para Si mesmo como o Messias, um assunto que, aparentemente, Ele nunca havia abordado diretamente. Era essencial que Cristo fosse reconhecido como o Messias antes que eles pudessem avaliar de alguma forma o significado de Seu sacrifício vicário no Calvário. Se Ele fosse reconhecido apenas como um “Mestre, vindo da parte de Deus” (ver com. de Jo.3:2), ou como um dos antigos profetas ressuscitado (ver com. de Mt.16:14), Sua morte não poderia ter mais significado do que a de qualquer outro grande e bom homem. Seria exemplar, mas não vicária. Não teria poder expiatório. Quem quiser encontrar a salvação na cruz do Calvário deve primeiro reconhecer que Aquele que foi pendurado na cruz não era outro senão o Filho de Deus, o Salvador do mundo, o Messias, o Cristo.

É somente na base da messianidade de Jesus de Nazaré que a cruz pode ser entendida e apreciada em sua verdadeira perspectiva. Evidentemente, Jesus sabia muito bem o que as pessoas pensavam dEle. Conhecia também o conceito equivocado sobre a natureza do reino que Ele viera estabelecer (ver com. de Lc.4:19). Sua razão para fazer aos discípulos essa pergunta era preparar a mente deles para a pergunta seguinte: o que eles mesmos haviam concluído sobre Ele (Mt.16:15). A fé dos discípulos se destacava em contraste com a incredulidade ou pouca fé do restante de seus compatriotas. Com certeza, eles haviam estado intimamente associados com o Mestre por algum tempo.

Filho do homem. Ver com. de Mc.2:10.

Mt.16:14 14. E eles responderam: Uns dizem: João Batista; outros: Elias; e outros: Jeremias ou algum dos profetas.

Uns dizem. Os discípulos mencionaram quatro pareceres que tinham ouvido a respeito de Jesus. Mas a dificuldade com todas essas opiniões era que, embora reconhecessem Jesus como um grande homem, todas elas não chegavam a reconhecê-Lo como Deus, como tinha acontecido com Nicodemos (ver com. de Jo.3:2; sobre uma declaração anterior acerca da reação do público à pessoa de Jesus, ver com. de Mc.6:14-16).

João Batista. Na verdade, uma homenagem a João e o reconhecimento do que seu breve ministério havia causado sobre o pensamento das pessoas, até mesmo, de fato, sobre a consciência cauterizada de Herodes Antipas (ver com. de Mt.3:1; Mc.6:14-16). As várias opiniões das pessoas sobre Jesus eram uma triste admissão de que, apesar de todas as evidências oferecidas, “os Seus” não conseguiam reconhecê-Lo pelo que Ele era, na verdade, o Messias da profecia do AT (Jo.1:11; Lc.24:25-27).

Elias. Ver com. de Jo.1:19-25.

Algum dos profetas. Ver com. de Dt.18:15.

Mt.16:15 15. Mas vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou?

Quem dizeis [...]? A ênfase da construção grega da frase é: “Mas vós, quem dizeis que Eu sou?” (para uma conversa semelhante entre Jesus e os discípulos, ver Jo.6:66-69). Companheiros constantes de Jesus havia mais de um ano e, alguns deles, por mais de dois anos, os discípulos haviam tido a oportunidade de observar as muitas evidências da divindade de Jesus (ver com. de Jo.1:1-3), muito superiores às de outras pessoas. Naquele momento, Jesus lhes dava a oportunidade de testemunhar de sua fé. Apesar da compreensão deles a respeito de Cristo ainda estar longe de ser perfeita, aparentemente, André, Filipe e Natanael tinham crido desde o início que Jesus era o Messias (Jo.1:40-49; DTN, 141). Depois da tempestade no lago, todos os discípulos O adoraram (ver com. de Mt.14:33) e, após a crise na Galileia, tinham professado fé nEle como o Filho de Deus (Jo.6:68-69).

Mt.16:16 16. Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.

Respondeu Simão Pedro. Ou seja, não apenas em seu próprio nome (DTN, 412, 415), mas como porta-voz dos doze, como em ocasiões anteriores (Jo.6:69; ver com. de Mt.14:28; Mc.3:16).

Tu és o Cristo. Sobre o significado do título Cristo, ver com. de Mt.1:1. Embora muitos já houvessem rejeitado a ideia de que Cristo poderia ser o Messias da profecia (ver com. de Mt.16:13-14), os discípulos eram leais a Ele como tal, mesmo compreendendo de maneira incompleta tudo o que estava envolvido. Mais tarde, entenderam (cf. Lc.24:25-34). A não ser que compreendessem essa verdade fundamental pela fé e se mantivessem firmemente apegados a ela, eles também não compreenderiam a verdade de que o Messias devia sofrer. Ainda assim, quando chegou Sua hora extrema, “os discípulos todos, deixando-O, fugiram” (Mt.26:56). Mesmo assim, Jesus estava fundamentando as esperanças futuras da igreja nesse pequeno grupo de testemunhas e, a menos que cressem ser Ele o Cristo, que esperança haveria de que outras pessoas creriam nessa verdade sublime? (ver com. de Jo.1:11-12). A ideia de que Jesus era apenas um grande e bom homem, talvez o melhor homem que já tinha existido, mas nada mais, é tão absurda quanto incrível. Ele afirmava ser o Filho de Deus e esperava que Seus seguidores compatilhassem essa crença. Ou Ele era, ou não era. E, se não fosse, Jesus teria cometido a maior farsa e fraude. Aquele que fizera essa afirmação e incentivara outras pessoas a considerá-Lo como Salvador do mundo, se não fosse, não podia ser digno de adoração, para não dizer de admiração. Ou Jesus de Nazaré era o Cristo, o Filho do Deus vivo, ou era um impostor.

Filho do Deus vivo. Ver com. de Lc.1:35. Embora Jesus aceitasse esse título, Ele parece tê-lo aplicado a Si mesmo com pouca frequência. Geralmente, Jesus Se referia a Si mesmo como o Filho do Homem (ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10), que foi o título que usou ao lhes dirigir a pergunta nessa ocasião (Mt.16:13). “Quem é o Filho do Homem?”, Jesus perguntou. “O Filho do Deus vivo”, responderam os discípulos (ver com. de Jo.1:1-3; Jo.1:14; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51).

Mt.16:17 17. Então, Jesus lhe afirmou: Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelaram, mas meu Pai, que está nos céus.

Bem-aventurado. Ver com. de Mt.5:3. Jesus aceitou solenemente a confissão de fé de Pedro. Na medida em que Pedro foi o porta-voz de todos os discípulos (ver com. do v. Mt.16:16), a bênção dirigida a ele também pertencia a eles, visto que sua fé se comparava à deles.

Simão Barjonas. Isto é, “Simão, filho de Jonas [ou João]” (ver com. de Jo.21:15; cf. Mc.3:16). Este era o nome completo de Pedro, segundo o costume judaico.

Carne e sangue. Isto é, os seres humanos. Esta era uma expressão judaica comum para designar a humanidade no todo ou em parte (cf. Gl.1:16-17).

Meu Pai. Ver Jo.6:45; 1Co.2:10 (sobre o uso que Jesus fazia do termo “Pai” para Se referir a Deus, ver com. de Mt.6:9).

Mt.16:18 18. Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.

Também Eu te digo. O Pai havia revelado uma verdade (v. Mt.16:17); Jesus, então, lhe acrescentava outra.

Tu és Pedro. Dirigindo-Se a Simão Barjonas (v. Mt.16:17) como Pedro, Jesus usou o nome que lhe tinha dado em Seu primeiro encontro com ele (Jo.1:40-42; ver com. de Mt.4:18).

Sobre esta pedra. Estas palavras têm sido interpretadas de diversas maneiras: (1) que Pedro é “esta pedra”; (2) que a fé de Pedro em Jesus como o Cristo é “esta pedra”; e (3) que o próprio Cristo é “esta pedra”. Têm sido apresentados motivos persuasivos em favor de cada uma das três explicações. A melhor maneira de determinar o que Cristo queria dizer com estas palavras é inquirir das próprias Escrituras o que essa figura de linguagem significava para os ouvintes judeus, especialmente para os que ouviram Jesus usá-la naquela ocasião (ver MDC, 1). O testemunho dos escritos dos próprios discípulos, obviamente, é superior ao que as pessoas têm entendido que Jesus queria dizer. Felizmente, alguns daqueles que foram testemunhas oculares nessa ocasião (ver 2Pe.1:16; 1Jo.1:1-3) deixaram um registro claro e inequívoco. A esse respeito, Pedro, a quem foram dirigidas as palavras, nega enfaticamente, por seus ensinamentos, que a “rocha” de que Jesus falou se referia a ele (ver At.4:8-12; 1Pe.2:4-8). Mateus registra que Jesus usou outra vez a mesma figura de linguagem em circunstâncias que exigem claramente que o termo se refira a Ele mesmo (ver com. de Mt.21:42; cf. Lc.20:17-18). Desde os primeiros tempos, a figura da pedra foi utilizada pelos hebreus como um termo específico para Deus (ver com. de Dt.32:4; Sl.18:2). O profeta Isaías fala de Cristo como uma “grande rocha em terra sedenta” (ver com. de Is.32:2) e como uma “pedra preciosa, angular, solidamente assentada” (ver com. de Is.28:16). Paulo afirma que Cristo era a “Pedra” que seguia com Seu povo nos tempos antigos (ver 1Co.10:4; Dt.32:4; 2Sm.22:32; Sl.18:31).

Em sentido secundário, as verdades que Jesus apresentou também são uma “rocha” sobre a qual as pessoas podem construir de forma segura (ver com. de Mt.7:24-25), pois Ele mesmo é a “Palavra” viva feita carne (Jo.1:1; Jo.1:14; Mc.8:38; Jo.3:34; Jo.6:63; Jo.6:68; Jo.17:8). Jesus Cristo é a “rocha da nossa salvação” (Sl.95:1 [ARC]); cf. Dt.32:4; Dt.32:15; Dt.32:18; DTN, 413). Ele é o único fundamento da igreja, pois “ninguém pode lançar outro fundamento, além do que foi posto, o qual é Jesus Cristo” (1Co.3:11), “não existe nenhum outro nome [...] pelo qual importa que sejamos salvos” (At.4:12). Intimamente associados com Jesus Cristo como “a pedra de esquina”, na fundação da igreja, estão os “apóstolos e profetas” (Ef.2:20, ARC). No mesmo sentido em que Cristo é a rocha, “a pedra que vive, rejeitada, sim, pelos homens, mas para com Deus eleita e preciosa, também vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados casa espiritual” (1Pe.2:4-5), como “bem ajustado [...] santuário dedicado ao Senhor” (Ef.2:21).

Mas Jesus é sempre, e apenas Ele, a “Rocha” sobre a qual repousa toda a estrutura, pois sem Ele não haveria igreja. A fé nEle como Filho de Deus também torna possível sermos feitos filhos de Deus (Jo.1:12; 1Jo.3:1-2). A percepção de que Jesus Cristo é verdadeiramente o Filho de Deus, como Pedro enfaticamente afirmou nessa ocasião (ver Mt.16:16) é a chave para a porta da salvação (DTN, 412, 413). Mas é incidental, não fundamental, que Pedro tenha sido o primeiro a reconhecer e declarar sua fé, o que, nessa ocasião, ele fez como porta-voz de todos os discípulos (ver com. do v. Mt.16:16). Agostinho (c. 400 d.C.), o maior teólogo católico dos primeiros séculos do cristianismo, deixa para seus leitores decidir se Cristo aqui designava a Si próprio ou a Pedro como “a rocha” (Retractiones, i.21.1). Crisóstomo, o pregador “de língua de ouro”, outro pai da igreja dos primeiros séculos, diz que Jesus prometeu lançar as bases da igreja sobre a confissão de Pedro [não em Pedro], mas, em outro lugar, chama Cristo de nosso verdadeiro fundamento (Comentário sobre Gálatas, cap. 1:1-3; Homilias sobre 1 Timóteo, n. xviii, 6:21). Eusébio, historiador da igreja primitiva, cita Clemente de Alexandria declarando que Pedro, Tiago e João não lutaram pela supremacia da igreja em Jerusalém, mas optaram por Tiago, o Justo, como líder (História Eclesiástica, ii.1).

Outros entre os primeiros pais da igreja, como Hilário de Aries, ensinaram a mesma coisa. Foi só quando o apoio bíblico foi procurado em favor das reivindicações do bispo de Roma à primazia da igreja (ver vol. 4, p. 920, 921) que as palavras ditas por Cristo nessa ocasião foram tiradas de seu contexto original e interpretadas para dizer que Pedro era “esta pedra”. Leão 1 foi o primeiro pontífice romano a alegar, em c. 445 d.C., que sua autoridade provinha de Cristo, por meio de Pedro. Dele, Kenneth Scott Latourette, um destacado historiador da igreja cristã, diz: “Ele insistiu que, por decreto de Cristo, Pedro era a rocha, o alicerce, o porteiro do reino dos céus, encarregado de ligar e desligar, cujas decisões mantinham sua validade no Céu, e que, por meio do Papa, como seu sucessor, Pedro continuava a executar a tarefa que lhe tinha sido confiada” (A History of Christianity, 1953, p. 186). É realmente estranho que, se fosse isso realmente o que Cristo quis dizer, nem Pedro, nem qualquer outro dos discípulos nem outros cristãos ao longo de quatro séculos descobriram essa verdade! É extraordinário que nenhum bispo romano tenha descoberto esse significado nas palavras de Cristo, até que um bispo do 5º século considerou necessário encontrar algum apoio bíblico para o primado papal.

O significado atribuído às palavras de Cristo, por meio do qual fazem conferir a primazia sobre os chamados sucessores de Pedro, os bispos de Roma, está em completo desacordo com todos os ensinamentos que Cristo transmitiu a Seus seguidores (ver Mt.23:8; Mt.23:10). Talvez a melhor evidência de que Cristo não nomeou Pedro como a “rocha” sobre a qual Ele edificaria Sua igreja seja o fato de que nenhum dos que ouviram Cristo nessa ocasião – nem mesmo Pedro – interpretou assim Suas palavras, nem durante o tempo em que Cristo esteve na Terra, nem depois. Se Cristo tivesse feito de Pedro o principal entre os discípulos, eles não estariam depois envolvidos em repetidas discussões sobre qual deles “parecia ser o maior” (Lc.22:24; ver Mt.18:1; Mc.9:33-35; DTN, 817; ver com. de Mt.16:19). O nome de Pedro é derivado do gr. petros, uma “pedra”, geralmente uma pequena laje de pedra. A palavra “rocha” é o gr. petra, a grande massa da própria rocha, um “rochedo” ou “saliência rochosa”, um “pico rochoso”. Petra é uma “rocha” grande, fixa, imutável, enquanto petros é uma pequena “pedra”. Até que ponto Cristo pode ter tido esta distinção em mente, no entanto, ou pode ter explicado enquanto falava, é uma questão que não pode ser determinada a partir dessas palavras em si, porque Cristo, certamente, falava aramaico, a língua comum da Palestina naquela época.

O gr. petros representa, sem dúvida, a palavra kefa (Cefas), em aramaico (ver com. de Mt.4:18). E, muito provavelmente, petra também representa a palavra aramaica kefa, embora haja uma possibilidade de que Cristo tenha usado algum outro sinônimo ou expressão em aramaico, o que estaria de acordo com a distinção entre petros e petra, feita pelos escritores do evangelho em grego. No entanto, parece provável que Cristo teve a intenção de fazer essa distinção, ou Mateus, que escreveu em grego e foi guiado pelo Espírito Santo, não teria feito assim. Obviamente uma petros, ou pequena pedra, jamais proveria fundação a qualquer edifício, e aqui Jesus afirma que nada menos que uma petra, ou “rocha”, seria suficiente. Esse fato ainda torna mais certas as palavras de Cristo em Mt.7:24: “Todo aquele [...] que ouve estas Minhas palavras e as pratica” é como “um homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha [gr. petra]”. Qualquer edifício construído sobre Pedro, petros, um ser humano fraco, errante, como deixa claro o registro do evangelho, tem uma base apenas um pouco melhor do que a da areia movediça (ver com. de Mt.7:27).

Igreja. Do gr. ekklesia. Ver com. de Mt.18:17.

Portas. Nas cidades antigas, o portão era o ponto de encontro dos líderes da cidade e o lugar-chave na defesa contra um exército ofensor (ver com. de Gn.19:01; Js.8:29). Assim, a tomada das portas possibilitava a conquista de toda a cidade. O triunfo de Cristo sobre a morte e a sepultura é a verdade central do cristianismo. Não foi possível a Satanás deter Cristo pelos laços da morte (ver At.2:24), nem lhe será possível deter qualquer daqueles que creem em Cristo (Jo.3:16; Rm.6:23). Falando figurativamente, Satanás detém as “portas do inferno”, mas Cristo, por Sua morte, entrou no reduto de Satanás e prendeu o adversário (ver com. de Mt.12:29). Sobre esse fato sublime repousa a esperança cristã de libertação das artimanhas de Satanás nesta vida, de seu poder sobre a sepultura e da sua presença na vida por vir. “O último inimigo a ser destruído é a morte” (1Co.15:26). A morte e o sepulcro acabarão por ser “lançados para dentro do lago de fogo” (Ap.20:14). Fazer com que as palavras de Cristo signifiquem que as “portas do inferno” não prevalecerão contra Pedro é negar a própria explicação de Cristo em Mt.16:21 (da qual os v. Mt.16:13-20 são uma introdução) e tornar sem sentido a reação de Pedro (v. Mt.16:22-23).

Inferno. Ver com. de Mt.11:23.

Não prevalecerão. Figurativamente, as “portas do inferno” prevaleceram contra Pedro quando, por três vezes, ele negou seu Senhor (DTN, 413) e, literalmente, quando ele morreu (Jo.21:18-19). O pleno significado do que Cristo quis dizer quando disse que “as portas do inferno não prevalecerão” pode ser melhor entendido pelo fato de que, imediatamente, Ele começou a mostrar que iria “ser morto e ressuscitado no terceiro dia” (ver com. de Mt.12:40; cf. DTN, 418). Cristo triunfou gloriosamente sobre todo o poder de Satanás e, por esse triunfo, deu a certeza de que Sua igreja na Terra também triunfaria sobre ele.

Mt.16:19 19. Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus.

As chaves. As palavras de Cristo são as “chaves” para o reino dos céus (cf. DTN, 413; cf. Jo.1:12; Jo.17:3). É importante notar que o próprio Cristo fala da “chave”, aqui mencionada como “a chave da ciência” de como entrar no reino (Lc.11:52). As palavras de Jesus são “espírito e vida” a todos os que as recebem (Jo.6:63). São as palavras de Cristo que trazem a vida eterna (Jo.6:68). A palavra de Deus é a chave para a experiência do novo nascimento (1Pe.1:23). Assim como as palavras ditas por Jesus convenceram os discípulos de Sua divindade, também a ação de Seus embaixadores ao repetir Suas palavras aos outros, deveria “reconciliá-los” com Deus (ver 2Co.5:18-20). O poder salvador do evangelho é a única coisa que permite a entrada de homens e mulheres no reino dos céus. Cristo simplesmente conferiu a Pedro e a todos os demais discípulos (ver com. de Mt.18:18; Jo.20:23) a autoridade e o poder de conduzir as pessoas ao reino.

Foi a percepção da verdade por parte de Pedro de que Jesus é verdadeiramente o Cristo que colocou as “chaves” do reino em sua posse e o admitiu no reino. O mesmo pode ser dito de todos os seguidores de Cristo até o fim dos tempos. O argumento de que Cristo conferiu a Pedro um grau de autoridade superior ou diferente da que deu aos outros discípulos não tem base bíblica (ver com. de Mt.16:18). De fato, entre os apóstolos, foi Tiago, e não Pedro, quem exerceu funções administrativas sobre a igreja primitiva em Jerusalém (ver At.15:13; At.15:19; At.1:13; At.12:17; At.21:18; 1Co.15:7; Gl.2:9; Gl.2:12). Em pelo menos uma ocasião; Paulo “resistiu” a Pedro “face a face”, por agir de maneira errada (ver Gl.2:11-14), o que ele certamente não teria feito se soubesse alguma coisa a respeito de Pedro desfrutar dos direitos e prerrogativas que alguns afirmam que ele tinha, tendo por base Mt.16:18-19.

Reino dos céus. Como Cristo usou frequentemente durante todo o Seu ministério, o “reino dos céus” aqui se refere ao reino da graça divina no coração daqueles que se tornam seus cidadãos, aqui e agora (ver com. de Mt.4:17; Mt.5:2). Ninguém pode ter a esperança de entrar no futuro reino da glória (ver com. de Mt.25:31; Mt.25:34), se não entrar primeiramente no presente reino da graça.

Ligares. A declaração inteira diz, literalmente: “Tudo o que ligardes na Terra terá sido ligado nos céus, e tudo o que desligardes na Terra terá sido desligado nos céus.” Evidentemente, o significado é que a igreja na Terra exigirá apenas o que o Céu exige e proibirá apenas o que o Céu proíbe. Esse é o claro ensino das Escrituras (ver com. de Mt.7:21-27; Mc.7:6-13). Quando os apóstolos saíram para proclamar o evangelho, de acordo com a comissão que lhes foi confiada (ver Mt.28:19-20), eles foram ensinar os conversos a “guardar todas as coisas que” Cristo havia ordenado; nem mais, nem menos. Estender o significado de “ligar” e “desligar” à autoridade de ditar o que os membros da igreja podem crer e o que podem fazer, em matéria de fé e prática, é ler nessas palavras de Cristo mais do que Ele queria dizer com elas, e mais do que os discípulos entenderam por elas. Deus não sanciona essa reivindicação. Os representantes de Cristo na Terra têm o direito e a responsabilidade de “ligar” o que foi “ligado no Céu” e “desligar” o que foi “desligado no Céu”, isto é, exigir ou proibir tudo aquilo que as Escrituras revelam claramente. Mas ir além disso é substituir a autoridade de Cristo pela do homem (ver com. de Mc.7:7-9), tendência que o Céu não tolera nos que foram designados para a supervisão dos cidadãos do reino dos céus na Terra.

Mt.16:20 20. Então, advertiu os discípulos de que a ninguém dissessem ser ele o Cristo.

A ninguém dissessem. Na verdade, até o fim de Seu ministério, durante a entrada triunfal em Jerusalém, Jesus evitou a discussão pública de Sua messianidade. Ele nunca afirmou publicamente ser o Messias. Aparentemente, para evitar a publicidade como o Messias (ver com. de Mc.1:24-25), Cristo ordenou várias vezes que os espíritos malignos não se dirigissem a Ele como “o Santo de Deus” (Mc.1:24-25; Mc.1:34; Mc.3:11-12; Lc.4:34-35; Lc.4:41). Os doze, em sua jornada pela Galileia, não deveriam discutir a questão de saber se Jesus era o Messias (DTN, 350), pois as concepções errôneas alimentadas pelo povo sobre o Messias (DTN, 30, 414, 415; ver com. de Lc.4:19) tendiam a impedir a proclamação e a recepção do evangelho. As pessoas teriam interpretado essa proclamação em sentido político, como fizeram no momento da entrada triunfal em Jerusalém (ver com. de Mt.21:1; Mt.21:5; Jo.6:15).

Mt.16:21 21. Desde esse tempo, começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos que lhe era necessário seguir para Jerusalém e sofrer muitas coisas dos anciãos, dos principais sacerdotes e dos escribas, ser morto e ressuscitado no terceiro dia.

Desde esse tempo. [Jesus prediz Sua morte e ressurreição, Mt 16:21-23 = Mc.8:31-33 = Lc.9:22]. A conversa dos v. Mt.16:13-20 foi uma introdução apropriada para o assunto que Jesus introduziria pela primeira vez: o sofrimento, a morte e a ressurreição iminentes (ver com. do v. Mt.16:13). Se a instrução e o diálogo dos v. 21 a 28 ocorreu imediatamente após a seção anterior, ou logo após, não se sabe. Outro breve intervalo pode ter ocorrido entre os v. Mt.16:23-24 (Mc.8:34; DTN, 416). Seja como for, é evidente que toda a conversa e discussão registrada nos v. Mt.16:14-28 ocorreu na região de Cesareia de Filipe (ver com. do v. Mt.16:13; cf. DTN, 411, 418). Esse tempo, provavelmente, foi a última parte do verão de 30 d.C. (ver com. do v. Mt.16:13). Antes dessa ocasião, Jesus não havia discutido Sua messianidade nem mesmo com os doze (ver com. dos v. Mt.16:13; Mt.16:16), nem tinha mencionado o fato de que, como Messias, Ele devia morrer pelos pecados do mundo. Houve, é verdade, uma referência a Sua morte em uma declaração enigmática na época da primeira purificação do templo, mais de dois anos antes (ver com. de Jo.2:19).

Ele revelou particularmente a Nicodemos, de modo claro, tanto o fato como a natureza de Sua morte (Jo.3:14). Desse momento em diante, no entanto, Jesus discutiu repetidamente o assunto com os discípulos, sem dúvida, no esforço de afastar da mente deles os falsos conceitos populares dos judeus a respeito do Messias e Seu reino (ver com. de Lc.4:19). Sua relutância nessa ocasião em aceitar e manter a ideia de que o Messias devia sofrer e morrer (cf. Mt.16:22) enfatiza a dificuldade que Cristo tinha em afastar deles esse equívoco. Vez após outra, Jesus discutiu o assunto com eles (Mt.17:22-23; Mt.20:17-19). Mas o desapontamento dos discípulos quando o tempo finalmente chegou revela que Jesus teve um sucesso parcial em fazê-los entender o que Ele quis dizer.

Que Lhe era necessário. Literalmente, “era necessário que Ele” (ver com. de Lc.2:49), isto é, no sentido de que era necessário que Ele fizesse a fim de cumprir o plano para Sua vida na Terra (cf. Mc.8:31; Mc.9:12). Não havia outra maneira pela qual Ele pudesse cumprir Sua missão, a não ser pelo caminho da cruz.

Jerusalém. Para onde, alguns meses mais tarde, talvez três ou quatro, Ele “manifestou, no semblante, a intrépida resolução de ir a Jerusalém” (ver com. de Lc.9:51).

Sofrer muitas coisas. Como havia sido profetizado (ver Sl.22:1; Sl.22:7-8; Sl.22:15-18; Is.53:3-10), os sofrimentos de Jesus têm um significado para nós no sentido de Ele ser o Filho de Deus, o Messias da profecia do AT e o Redentor da humanidade. Por ser o Messias, Ele devia sofrer.

Anciãos. O uso de um único artigo definido no grego indica que as três classes de líderes – anciãos, principais sacerdotes e escribas – são aqui tratados como um único grupo e não como três grupos distintos. Provavelmente, portanto, esse era o Sinédrio, que é conhecido por ter sido composto por esses três grupos (sobre os sacerdotes, ver com. de Mt.2:4; sobre os escribas, ver com. de Mc.1:22). O Sinédrio era o supremo corpo legislativo e judiciário de Israel, composto por 71 membros (ver p. 54).

Ser morto. Vez após outra, Jesus claramente expôs os fatos tanto da crucifixão como da ressurreição. No entanto, os discípulos não conseguiram compreender o que Cristo queria dizer (Mc.9:10; Mc.9:32), escolhendo cegamente acreditar no que queriam crer e passar por alto aquilo que achavam desagradável às suas opiniões preconcebidas (DTN, 30).

No terceiro dia. Ver p. 246-248.

Mt.16:22 22. E Pedro, chamando-o à parte, começou a reprová-lo, dizendo: Tem compaixão de ti, Senhor; isso de modo algum te acontecerá.

Pedro, chamando-O. Literalmente, “Pedro O tomou a si mesmo”, implicando que levou Jesus para um lado para falar com Ele.

Começou a reprová-Lo. Pedro “começou”, mas Jesus o deteve antes que ele pudesse terminar. Mais tarde, a ousadia de Pedro esteve novamente em evidência quando usou uma espada na tentativa de defender Jesus (Jo.18:10; Mt.26:33-35).

Longe de Ti (KJV). Expressão judaica comum traduzida para o grego e que significa “Deus tenha misericórdia de Ti”. Pedro não conseguia entender como o Messias estaria disposto a sofrer. A ideia de um “Messias” e um “Servo sofredor” parecia irrazoável em sua mente (cf. Is.52:13-53:1). Por esse protesto, Pedro revelou seu próprio egoísmo. Ele queria seguir Jesus, mas não gostava da ideia de estar associado a um plano destinado a levar ao sofrimento e à morte (DTN, 415, 416; ver com. de Mt.16:24-25).

De modo algum. No grego há uma negativa dupla, uma maneira enfática de dizer: “em nenhum caso isso acontecerá”.

Mt.16:23 23. Mas Jesus, voltando-se, disse a Pedro: Arreda, Satanás! Tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus, e sim das dos homens.

Voltando-Se. Parece que Cristo Se afastou de Pedro em direção aos outros discípulos (Mc.8:33), embora Suas palavras fossem dirigidas a Pedro enquanto fazia isso.

Para trás de Mim (ARC). O sentimento externado por Pedro era o do tentador e a resposta de Cristo foi direcionada ao inimigo invisível que havia feito isso. Estas tinham sido as palavras com que Cristo havia repelido o tentador no deserto (cf. Lc.4:8) e expressaram a repreensão mais severa pronunciada por Jesus. A ordem significa, literalmente: “Fique longe de mim!” Ou, mais livremente, “Vá embora!” Ou, “Saia da minha frente!” Pedro tinha permitido que “as portas do inferno”, por assim dizer, prevalecessem sobre ele para ser o porta-voz do príncipe do mal (ver com. de Mt.16:18). No entanto, as palavras de Cristo foram dirigidas, não tanto ao discípulo, como para aquele que havia incitado suas palavras.

Tropeço. Do gr. skandalon, apropriadamente, o gatilho da armadilha em que é colocada a isca e, metaforicamente, “um obstáculo”. O Senhor Se refere a Pedro como um obstáculo em Seu caminho para a cruz (ver com. do v. Mt.16:21).

Cogitas. Do gr. phroneo, “ter compreensão”, “sentir” ou “pensar”. Momentos antes, Pedro havia expressado a verdade divina a respeito de Jesus, que lhe havia sido revelada pelo Pai (v. Mt.16:17); neste momento, ele falava o que lhe tinha sido sugerido pelo inimigo de todo o bem. Quão depressa Pedro mudou de lado no grande conflito!

Mt.16:24 24. Então, disse Jesus a seus discípulos: Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me.

Se alguém. [O discípulo de Cristo deve levar a sua cruz, Mt 16:24-28 = Mc.8:34-9:1 = Lc.9:23-27], Jesus Se dirigiu a todos os discípulos (cf. Lc.9:23), e Marcos (Mc.8:34) acrescenta que havia outras pessoas presentes, além dos discípulos, talvez alguns judeus da região que passaram a crer nEle e que tinham ouvido falar de todas as Suas obras maravilhosas na Galileia (ver com. de Mt.10:38-39).

A si mesmo se negue. Ou seja, “renuncie a si mesmo”, submeta a vontade de Cristo e passe a viver para Cristo e não para si mesmo.

Tome a sua cruz. Ou seja, assuma as responsabilidades que acompanham o discipulado, embora, fazendo assim, seja chamado a pagar o preço supremo. A cruz não era um instrumento judaico, mas romano, para a execução de criminosos (ver com. de Mt.10:38). No entanto, durante essas décadas, a cruz era bem conhecida na Palestina. Um criminoso condenado à morte por crucifixão, literalmente, “tomava a sua cruz” ou, pelo menos, o patibulum (parte horizontal), e a levava para a cena da execução. Provavelmente, foi a isso que Cristo fez alusão neste versículo. No contexto em que Cristo menciona o ato de levar a cruz parece que Ele Se refere não tanto às pequenas dificuldades e obstáculos a serem enfrentados pelos discípulos, mas à necessidade de estar pronto para enfrentar a própria morte (ver Mt.16:21-22). Pedro apenas havia tentado persuadir Jesus a abandonar o plano divino que O chamara para tomar Sua cruz. Jesus respondeu que isso era impossível, pois essa não é a vontade do Pai, e que, além disso, se Pedro continuasse como discípulo, ele deveria estar disposto a pagar o mesmo preço, como, aliás, ele acabou fazendo (ver com. de Jo.21:18-19). Em outro texto, Cristo apresentou o pensamento de que os discípulos devem tomar sua cruz “cada dia” (Lc.9:23, ARC), em consagração à vida de serviço que são chamados. Se os homens odiaram Jesus, também se pode esperar que odiarão Seus representantes, os discípulos (cf. Jo.15:18; Jo.16:33; ver com. de Mt.10:22).

Siga-Me. O candidato a discípulo deve primeiramente renunciar a si mesmo, a seus planos e desejos. Somente após isso deve estar disposto a suportar qualquer cruz que o dever o chame a “tomar”. Por fim, deve “seguir” os passos de Jesus (ver 1Pe.2:21). “Seguir” a Jesus é modelar nossa vida conforme a Sua e servir a Deus e a nossos semelhantes como Ele o fez (ver 1Jo.2:6).

Mt.16:25 25. Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á.

Salvar a sua vida. Ver com. de Mt.10:39. Neste contexto, “salvar” a própria vida é buscar primeiramente as coisas da realidade atual, esquecendo o reino de Deus “e a Sua justiça” (Mt.6:33).

Perder a vida. Um homem “perde” a vida por amor a Jesus quando “nega”, ou “renuncia” a si mesmo e toma a cruz de Cristo (ver com. de Mt.5:11; Mt.16:24; 1Pe.4:12-13).

Achá-la-á. Outro aspecto desse grande paradoxo do evangelho. Para o cristão, não pode haver coroa sem cruz, apesar de Satanás ter oferecido a Cristo no deserto a coroa deste mundo, por outro caminho que não a cruz (ver com. de Mt.4:8-9; Mt.16:22).

Mt.16:26 26. Pois que aproveitará o homem se ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou que dará o homem em troca da sua alma?

Mundo. Do gr. kosmos, aqui designando o que o mundo tem para oferecer em termos de riqueza material, benefícios, etc. “Ganhar o mundo inteiro” sempre foi a ambição das forças do mal, visíveis e invisíveis, tanto no presente como no passado.

Alma. Do gr. psyche (ver com Mt.10:28).

Dar em troca. Cristo aqui usa uma ilustração poderosa para tornar vívida uma verdade eterna. Não há uma resposta adequada à questão proposta.

Mt.16:27 27. Porque o Filho do Homem há de vir na glória de seu Pai, com os seus anjos, e, então, retribuirá a cada um conforme as suas obras.

Filho do homem. Título habitual de Jesus para Si mesmo (ver com. de Mc.2:10).

Vir na glória. Quem perder a sua vida por amor de Cristo tem a certeza de encontrá-la quando o Senhor voltar em glória no fim dos tempos (1Co.15:51-55; 1Ts.4:16-17). Será nessa ocasião que todos receberão sua recompensa (ver 2Tm.4:8; Ap.22:12). Cristo tinha acabado de falar dos cristãos que perdem a vida (ver Mt.16:25) por causa dEle. Se sua “recompensa” pelo sacrifício fosse recebida na morte, como afirma a teologia popular, é estranho que Cristo aqui declare especificamente que essa recompensa não será dada até que Ele mesmo retorne em glória no fim dos tempos (ver com. de Mt.25:31).

Com os Seus anjos. Comparar com Mt.24:31; 1Co.15:52; 1Ts.4:16.

Conforme as suas obras. Ou seja, de acordo com o que ele fez em vida. Cristo ensinou a mesma verdade com mais ênfase nas parábolas sobre as ovelhas e os bodes (Mt.25:31-46), do rico e Lázaro (Lc.16:19-31), do joio (Mt.13:24-30), da rede lançada no mar (Mt.13:47-50) e das bodas (Mt.22:1-14). Nada nos ensinamentos de Cristo pode ser interpretado como se significasse que haverá um momento em que será dada aos seres humanos uma segunda chance, uma oportunidade para escapar da “recompensa” das más ações na vida presente. As Escrituras apresentam persistentemente esta vida como o “dia da salvação” (Is.49:8; 2Co.6:2), o momento em que a pessoa deve “desenvolver” sua “salvação com temor e tremor” (Fp.2:12), pela fé em Cristo e sob o poder capacitador do Espírito Santo.

Mt.16:28 28. Em verdade vos digo que alguns há, dos que aqui se encontram, que de maneira nenhuma passarão pela morte até que vejam vir o Filho do Homem no seu reino.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Até que vejam. É significativo que os três evangelhos sinóticos tenham registrado a narrativa da transfiguração imediatamente após essa previsão. Não há ruptura na narrativa; no original grego não havia divisão de capítulos ou versículos. Além disso, os três mencionam o fato de que a transfiguração ocorreu cerca de uma semana após esta declaração, o que implica que o evento foi o cumprimento da profecia. A ligação entre as duas seções da narrativa parece excluir a possibilidade de que Jesus aqui tenha Se referido a qualquer coisa, a não ser a transfiguração, que foi uma demonstração em miniatura do reino da glória. Sem dúvida, Pedro entendeu assim (ver 2Pe.1:16-18).

Filho do homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51.

Mt.17:1 1. Seis dias depois, tomou Jesus consigo a Pedro e aos irmãos Tiago e João e os levou, em particular, a um alto monte.

Seis dias depois. [A transfiguração, Mt 17:1-8 = Mc.9:2-8 = Lc.9:28-36. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 218; gráfico, p. 228]. Para eventos e circunstâncias que levaram à transfiguração, ver com. de Mt.16:13. A transfiguração ocorreu provavelmente no fim do verão de 30 d.C. À época da Páscoa de 30 d.C., a opinião pública na Galileia se voltou contra Jesus (ver com. de Mt.15:21). Além disso, o Sinédrio havia intensificado seu propósito de levar Seu ministério a um impasse (ver com. de Mt.16:1; Mc.7:1-2). Em Cesareia de Filipe, pela primeira vez, Jesus tinha falado claramente aos discípulos sobre Seus sofrimentos e morte (ver com. de Mt.16:21). Mas, como todos os outros judeus, eles pensavam no Messias como um rei conquistador. Por isso, era difícil, mesmo para eles, compreender a ideia de um Messias que fosse sofrer e morrer. Como em ocasiões anteriores, pensamentos sombrios encheram a mente deles, devido à falta de compreensão sobre a natureza e o propósito do ministério de Jesus. O período aqui mencionado, “seis dias depois”, refere-se ao tempo desde a profissão de fé de Pedro na filiação divina de Jesus (Mt.16:16). Lc.9:28 fala desse período como sendo “cerca de oito dias depois”, isto é, cerca de uma semana mais tarde. Pelos cálculos inclusivos, uma semana seria chamada de “oito dias” (ver p. 246-248). Não é incomum para Lucas (ver com. de Lc.3:23) dar um tempo aproximado, ou “cerca de”, em lugar de uma declaração exata.

Pedro, Tiago e João. Dentre os demais discípulos, estes três demonstraram melhor compreensão das verdades que Cristo procurava transmitir. Pelo menos em uma ocasião anterior, eles haviam sido escolhidos especialmente para testemunhar o poder divino no trabalho (ver Mc.5:37) e, por causa de sua visão espiritual mais profunda, eles ainda deviam testemunhar Sua hora de agonia no Getsêmani (Mc.14:33). Foi especialmente para prepará-los para essa hora de medo e desapontamento que Jesus os levou consigo a sós para as colinas (ver DTN, 420).

Um alto monte. O local da transfiguração não é conhecido. O monte Tabor (588m de altitude), 19 km a sudoeste do lago da Galileia e 8,8 km a leste de Nazaré, é considerado ser este local, segundo a tradição. Contudo, a descoberta de que, no tempo de Cristo, uma fortaleza e um pequeno povoado coroavam seu cume parece tornar impossível que Jesus tivesse encontrado ali a solidão descrita em Mateus e Marcos (cf. DTN, 419). Visto que o monte Tabor já não é considerado seriamente como o local da transfiguração, geralmente, este tem sido identificado com o monte Hermom (elevação de 2.794m, em cujas encostas mais baixas se situa a cidade de Cesareia de Filipe, e em cuja vizinhança se sabe que Cristo e os discípulos estiveram imediatamente antes da transfiguração (ver com. de Mt.16:13).

Mas também há dificuldades com essa identificação. Nas proximidades de Cesareia de Filipe e do monte Hermom, Jesus estava “fora do alcance de Herodes e Caifás” e longe dos fariseus (ver DTN, 418). Era uma região gentílica fora dos limites da Galileia. Foi esse fato que levou Cristo a Se retirar para lá por um tempo (ver com. de Mt.16:13). Ao pé do monte da transfiguração, os escribas e rabinos se misturaram com uma multidão, provavelmente de judeus, e tentaram humilhar Jesus e Seus discípulos. Isso parece indicar que a transfiguração ocorreu na Galileia, não no distrito gentio de Cesareia de Filipe. Além disso, após a visita a Cesareia de Filipe, antes da transfiguração, menciona-se que Jesus e os discípulos viajaram ao sul, ao longo das margens do lago da Galileia (ver DTN, 418), a pelo menos 48 km do monte Hermom. No intervalo da semana entre a grande confissão e a transfiguração, em seguida, Jesus voltou para a Galileia. Assim, parece que os montes Hermon e Tabor não foram o monte da transfiguração.

Em particular. Lucas acrescenta que Jesus foi lá para “orar” (Lc.9:28). Essa foi uma daquelas ocasiões especiais em que Jesus buscou ansiosamente a comunhão com o Pai celestial (ver com. de Mc.1:35) a fim de saber como cumprir Sua missão (ver com. de Mc.3:13). Nesse caso, o problema era a forma de ajudar os discípulos a compreender a verdadeira natureza de Sua missão e como prepará-los para Sua morte (ver com. de Mt.16:13). A noite inteira foi passada no monte (ver DTN, 426). Jesus e Seus companheiros, aparentemente, tinham feito uma escalada até que ficou escuro demais para ir mais longe. Parece que Jesus já tinha passado uma parte considerável da noite em oração no momento da transfiguração, pois, como as horas passavam lentamente, o orvalho da noite estava “pesado”. Ele orou pedindo força pessoal para enfrentar a grande prova que estava à frente, e também pelos discípulos, para que sua fé nEle como o Filho de Deus fosse reforçada, a fim de que compreendessem a necessidade de Sua morte, como parte do plano de salvação, e que fossem preparados para a hora do julgamento (ver DTN, 420). Assim, Ele orou para que os três contemplassem Sua glória divina que até então, com exceção de momentos fugazes, tinha sido escondida de seu olhar (ver com. de Lc.2:48).

Mt.17:2 2. E foi transfigurado diante deles; o seu rosto resplandecia como o sol, e as suas vestes tornaram-se brancas como a luz.

Transfigurado. Do gr. metamorfo, “ser transformado para outra forma” ou “transformar-se”. Esta foi uma das ocasiões em que a divindade brilhou através da humanidade de Jesus, para se comparar ao brilho do Céu (cf, DTN, 421; ver com. de Lc.2:49). Foi quando Jesus estava orando e os discípulos dormiam que a misteriosa transformação ocorreu. A descrição da experiência pelos três evangelhos sinóticos exclui qualquer sugestão de que foi uma experiência subjetiva por parte dos discípulos ou, talvez, apenas de Pedro. Foi mais que um sonho ou alucinação devido ao cansaço do dia de viagem e da preocupação com a previsão da morte de Cristo; foi uma experiência real. Muitos anos depois, Pedro declarou que ele e seus condiscípulos foram “testemunhas oculares” da “majestade”, “honra” e “glória” de Jesus, e que testemunharam ter ouvido a voz proclamando a filiação de Jesus ao Pai (ver 2Pe.1:16-18). João apresenta essa excelente experiência como uma das grandes confirmações da fé cristã (ver com. de Jo.1:14).

Sua face. A descrição de Cristo aqui registrada se assemelha à que foi dada por Daniel (ver Dn.10:5-6) e por João (Ap.1:13-15). A aparência da face de Jesus se tornou diferente (cf. Lc.9:29) sob a influência da radiante luz branca. Era uma glória luminosa que parecia vir de dentro. Esta era a glória que Jesus tinha no Céu, antes de assumir a forma humana (Jo.17:5) e é a glória com a qual Ele voltará novamente a este mundo (ver Mt.25:31; 1Ts.4:16-17; DTN, 422). Glória semelhante irradiava da face de Moisés quando ele desceu do monte Sinai (ver Ex.34:29; 2Co.3:7). Quando Jesus voltar e conceder o dom da imortalidade aos Seus fiéis, sem dúvida, também vai refletir essa glória (ver Dn.12:3; sobre outros momentos da vida de Cristo, quando Sua divindade brilhou, ver com. de Lc.2:48).

Brancas como a luz. Marcos compara as “vestes” de Jesus à neve (ver Mc.9:3). As “vestes brancas” dos santos (ver Ap.3:4-5; Ap.3:18) refletirão a glória das vestes de justiça de Cristo na terra renovada.

Mt.17:3 3. E eis que lhes apareceram Moisés e Elias, falando com ele.

Moisés e Elias. Evidentemente, os discípulos reconheceram os visitantes celestiais, seja pela conversa, seja mediante iluminação divina. Moisés foi o grande libertador, legislador e fundador da nação hebraica, e Elias, o que a salvou em um tempo de grande apostasia e crise. Aqui estavam representantes vivos para dar testemunho da divindade de Jesus, assim como “Moisés e todos os profetas”, por meio de seus registros escritos, testemunharam dEle (ver com de Lc.24:44). É importante notar que tanto em relação a Elias (ver com. de 2Rs.2:11-12) como a Moisés (ver com. de Jd.1:9), as Escrituras registram o fato de que um foi trasladado ao Céu sem ver a morte, e o outro foi ressuscitado. O fato de Moisés e Elias aparecerem com Cristo nesse momento, portanto, não deve ser tomado para provar que todos os justos mortos estão no Céu. Esses dois, um ressuscitado e o outro trasladado sem ver a morte, apareceram com Jesus como tipos do glorioso reino no qual os resgatados de todas as eras estarão com Ele na glória (cf. Mt.25:31; Cl.3:4; 1Ts.4:16-17).

Falando com Ele. Lucas acrescenta que eles estavam falando “da Sua partida, que Ele estava para cumprir em Jerusalém” (Lc.9:31; Mt.16:21).

Mt.17:4 4. Então, disse Pedro a Jesus: Senhor, bom é estarmos aqui; se queres, farei aqui três tendas; uma será tua, outra para Moisés, outra para Elias.

Então, disse Pedro. Como de costume, Pedro tomou a frente como porta-voz do grupo (ver com. de Mt.16:16; Mt.16:22). Lucas acrescenta que Pedro falou sem saber realmente o que estava dizendo (Lc.9:33). Marcos diz que Pedro e os demais estavam “aterrados” (Mc.9:6).

Senhor. Do gr. kurios. De acordo com Mc.9:5, Pedro se dirigiu a Jesus como “Mestre” (gr. Rhabbi) e, de acordo com Lc.9:33, também como “Mestre”, mas usando outra palavra (gr. epistates; sobre o significado dessas variações nas narrativas do evangelho, ver Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17).

Façamos (ARC). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a variante “farei” (ARA), embora em Marcos e em Lucas a tradução “façamos” seja incontestável.

Três tendas. Literalmente, “três cabanas”. Praticamente não chovia durante a última parte do verão (ver vol. 2, p. 94; ver com. de Mt.17:1), e a única proteção necessária seria contra o orvalho intenso da noite. Se Pedro pensou nas cabanas como proteção apenas contra os elementos, ou se a sugestão veio à sua mente por causa da Festa dos Tabernáculos, então prestes a ocorrer, não é certo. A expectativa de que Elias viria para anunciar o reino messiânico (ver com. do v. Mt.17:10) pode ter lembrado a Pedro de que estava prevista a celebração dessa festa em conexão com o reinado do Messias (ver Zc.14:16-19). Talvez ele tenha concluído que a aparição de Moisés e Elias às vésperas da Festa dos Tabernáculos dava a entender que eles tinham ido para participar da celebração.

Mt.17:5 5. Falava ele ainda, quando uma nuvem luminosa os envolveu; e eis, vindo da nuvem, uma voz que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo; a ele ouvi.

Uma nuvem luminosa. Reminiscência, talvez, da coluna de nuvem no deserto (ver com. de Ex.13:21-22), que era iluminada pela glória de Deus (cf. Nm.9:15-16; ver com. de Ex.40:34). Isso se compara com a experiência de Moisés com Deus no monte (ver com. de Ex.24:15-18), quando ele entrou “pelo meio da nuvem” que envolvia a glória de Deus. Essa cena pode ter marcado a mente dos discípulos como a experiência de Elias no monte Carmelo marcou a dele (ver com. de 1Rs.18:38; Lc.2:48; Jo.1:14).

Envolveu. Do gr. episkiazo, “lançar uma sombra sobre” (cf. Lc.1:35; Sl.91:1). Mateus e Marcos não deixam claro se a nuvem “envolveu” Cristo e os dois visitantes celestiais, os discípulos, ou a todos; no entanto, parece evidente, a partir de Lucas, que a principal referência seja aos discípulos (Lc.9:34).

Uma voz. A mesma voz ouvida no momento do batismo de Cristo (ver Mt.3:17) e, mais tarde, no fim de Seu ministério (cf. Jo.12:28). Após essas três ocasiões, o Pai atestou pessoalmente a filiação divina de Jesus.

O Meu Filho amado. A respeito de Cristo como Filho de Deus, ver com. de Lc.1:35; Jo.1:1-3; ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51.

Em quem Me comprazo. Deus Se agradava de Cristo, enquanto Ele vivia na Terra, pois Jesus cumpriu perfeitamente a tarefa que Lhe fora atribuída (ver Jo.17:4). Cristo apresentou aos homens um exemplo perfeito de obediência à vontade do Pai (cf. Jo.15:10). Se colocarmos a confiança em nosso Salvador, também teremos o privilégio de fazer “diante dEle o que Lhe é agradável” (1Jo.3:22).

A Ele ouvi. Esta ordem divina provavelmente foi dada especificamente com relação à instrução que Jesus dera sobre o sofrimento e a morte prestes a ocorrer (ver com. de Mt.16:21).

Mt.17:6 6. Ouvindo-a os discípulos, caíram de bruços, tomados de grande medo.

Caíram de bruços. Comparar com Ez.1:28; Dn.10:9. Homens como Ezequiel e Daniel receberam visões, mas Pedro, Tiago e João viram com a visão natural.

Mt.17:7 7. Aproximando-se deles, tocou-lhes Jesus, dizendo: Erguei-vos e não temais!

Tocou-lhes. O fato de que o toque de Jesus veio depois e não antes da experiência é um testemunho indireto de que essa não foi uma visão, mas sim uma experiência real. Além disso, não há nenhum exemplo bíblico em que três homens tenham recebido a mesma visão simultaneamente.

Mt.17:8 8. Então, eles, levantando os olhos, a ninguém viram, senão Jesus.

Levantando os olhos. Segundo Marcos, os três homens “de relance, [olharam] ao redor” (Mc.9:8).

Mt.17:9 9. E, descendo eles do monte, ordenou-lhes Jesus: A ninguém conteis a visão, até que o Filho do Homem ressuscite dentre os mortos.

Visão. [A vinda de Elias, Mt 17:9-13 = Mc.9:9-13]. Do gr. horama, “espetáculo”, literalmente, “aquilo que é visto”. Comparar as palavras heb. chazon e marah (ver com. de 1Sm.3:1).

A ninguém. Jesus levou consigo somente Pedro, Tiago e João porque, dos doze, estes estavam preparados para entender o que Ele tinha para lhes mostrar (ver com. do v. Mt.17:1). Se contassem o que tinham visto e ouvido, só teriam despertado admiração e curiosidade, e isso não seria proveitoso naquele momento. O fato de que eles deveriam permanecer em silêncio sobre o assunto até após a ressurreição sugere que, só então, os demais discípulos estariam prontos para compreender, e que a fé de todos seria reforçada pelo relato dos três que testemunharam o evento. Além disso, tendo visto com os próprios olhos os dois homens sobre quem a morte não tinha poder, esses três discípulos deveriam ter sido preparados para crer nas palavras de Cristo sobre Sua ressurreição (cf. Lc.9:31) e para transmitir fé e coragem aos seus condiscípulos. Além disso, o fato de Jesus levar consigo os mesmos três a sós ao jardim do Getsêmani para se unir a Ele em oração deveria novamente tê-los lembrado vividamente dessa lição.

Mt.17:10 10. Mas os discípulos o interrogaram: Por que dizem, pois, os escribas ser necessário que Elias venha primeiro?

Dizem os escribas. Como expositores oficiais das Escrituras, seria de esperar que os “escribas” esclarecessem os problemas teológicos, como o que estava em discussão nesta ocasião (quanto aos escribas, ver p. 43). A aparente ligação entre a transfiguração e a discussão sobre a vinda de Elias parece ser apenas por que Elias era um dos dois que apareceram com Cristo. No entanto, Malaquias havia predito a vinda de Elias como precursor do Messias (ver com. de Ml.4:5), e os discípulos pensavam que Elias tinha vindo para anunciar o Messias, para proteger Jesus e confirmar Sua autoridade como Rei Messias (ver DTN, 422; ver com. de Jo.1:21). Mas, se Jesus era de fato o Messias da profecia, como os discípulos esperavam e acreditavam que Ele fosse (ver com. de Mt.16:16), por que, então, Elias não tinha aparecido antes? Eles ainda não compreendiam a missão de João Batista, apesar do fato de Jesus já lhes ter dito claramente que a vida e a obra de João Batista haviam cumprido a profecia da vinda de Elias (ver com. de Mt.11:14).

Mt.17:11 11. Então, Jesus respondeu: De fato, Elias virá e restaurará todas as coisas.

Restaurará todas as coisas. Na dramática experiência do monte Carmelo, Elias foi bem-sucedido em conduzir de volta o coração de muitos em Israel ao Deus de seus pais (ver com. de 1Rs.18:37-40) e, consequentemente, em refrear os terríveis avanços da apostasia. Da mesma forma, João Batista proclamou o batismo de arrependimento do pecado e o retorno ao verdadeiro espírito de adoração (ver com. de Ml.3:1; Ml.3:7; Ml.4:6; Lc.1:17). Evidentemente, João não era Elias em pessoa (ver com. de Jo.1:21), mas ele foi adiante do Messias “no espírito e poder de Elias” (Lc.1:17).

Mt.17:12 12. Eu, porém, vos declaro que Elias já veio, e não o reconheceram; antes, fizeram com ele tudo quanto quiseram. Assim também o Filho do Homem há de padecer nas mãos deles.

Não o reconheceram. Ou seja, não o reconheceram como Elias (ver com. de Jo.1:10-11).

Tudo quanto quiseram. Isto é, tudo o que desejaram fazer. Em vez de aceitar João e crer em sua mensagem, os líderes judeus o haviam rejeitado bem como ao seu chamado ao arrependimento (ver Lc.7:30-33; ver com. de Mt.21:25; Mt.21:32). Herodes o aprisionara (ver com. de Lc.3:20) e o executara um ano depois (ver com. de Mc.6:14-29). Apenas alguns meses depois da transfiguração, os líderes de Israel, de modo semelhante, fariam a Jesus “tudo quanto” quisessem.

Mt.17:13 13. Então, os discípulos entenderam que lhes falara a respeito de João Batista.

Sem comentário para este versículo.

Mt.17:14 14. E, quando chegaram para junto da multidão, aproximou-se dele um homem, que se ajoelhou e disse:

Quando chegaram. [A cura de um jovem possesso, Mt 17:14-21 = Mc.9:14-29 = Lc.9:37-42. Comentário principal: Mc].

Mt.17:15 15. Senhor, compadece-te de meu filho, porque é lunático e sofre muito; pois muitas vezes cai no fogo e outras muitas, na água.

Lunático. Ver com. de Mt.4:24.

Mt.17:16 16. Apresentei-o a teus discípulos, mas eles não puderam curá-lo.

Sem comentário para este versículo.

Mt.17:17 17. Jesus exclamou: Ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei convosco? Até quando vos sofrerei? Trazei-me aqui o menino.

Perversa. Literalmente, “distorcida” ou “corrupta”.

Mt.17:18 18. E Jesus repreendeu o demônio, e este saiu do menino; e, desde aquela hora, ficou o menino curado.

Sem comentário para este versículo.

Mt.17:19 19. Então, os discípulos, aproximando-se de Jesus, perguntaram em particular: Por que motivo não pudemos nós expulsá-lo?

Sem comentário para este versículo.

Mt.17:20 20. E ele lhes respondeu: Por causa da pequenez da vossa fé. Pois em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele passará. Nada vos será impossível.

Pequena fé. As evidências textuais se dividem (cf. p. 136) entre esta variante e “incredulidade”. Os discípulos tinham muita fé em si mesmos e pouca fé em Deus (ver com. de Mt.8:26).

Grão de mostarda. Ver com. de Mt.13:31-32. Jesus fez ilustrações semelhantes em outras ocasiões (ver Mt.21:21; Mc.11:23; Lc.17:6). A semente de mostarda pode ser pequena no início, mas o princípio da vida se oculta dentro dela, fazendo que, sob circunstâncias favoráveis, ela cresça.

Direis a este monte. Cristo fala aqui figurativamente sobre os grandes obstáculos encontrados por Seus discípulos ao cumprirem a comissão evangélica. Na verdade, Jesus nunca teve a intenção de que Seus discípulos fossem pelo país movendo montanhas literais. No entanto, Ele prometeu que nenhuma dificuldade, por maior que fosse, poderia dificultar o cumprimento de Seu propósito divino de salvar os pecadores (ver Is.45:18; Is.55:8-11).

Nada é impossível. Comparar com Mt.19:26.

Mt.17:21 21. [Mas esta casta não se expele senão por meio de oração e jejum.]

Mas. As evidências textuais se dividem (cf. p. 146) quanto a possibilidade de o v. 21 estar ou não no texto original de Mateus (ver com. de Mc.9:29).

Mt.17:22 22. Reunidos eles na Galiléia, disse-lhes Jesus: O Filho do Homem está para ser entregue nas mãos dos homens

Reunidos eles. [De novo Jesus prediz Sua morte e ressurreição, Mt 17:22, 23 = Mc.9:30-32 = Lc.9:43-45. Comentário principal: Mc]. Ou, “enquanto voltaram”, isto é, a Cafarnaum. A evidência textual (cf. p. 136) se divide entre essa variante e a da ARA.

Entregue. Ou, “traído” (KJV; ver com. de Mc.3:19; Lc.6:16).

Mt.17:23 23. e estes o matarão; mas, ao terceiro dia, ressuscitará. Então, os discípulos se entristeceram grandemente.

Terceiro dia. Ver p. 246-248.

Os discípulos se entristeceram. Ou, “ficaram em grande aflição”. Embora tenham se dado conta de que o Mestre estava falando sobre Sua morte, eles esperavam e criam que algo surgiria para tornar a morte de Jesus desnecessária.

Mt.17:24 24. Tendo eles chegado a Cafarnaum, dirigiram-se a Pedro os que cobravam o imposto das duas dracmas e perguntaram: Não paga o vosso Mestre as duas dracmas?

Chegado a Cafarnaum. [Jesus paga imposto, Mt 17:24-27. Ver mapa, p. 218; gráfico, p. 228; sobre os milagres, ver p. 204- 210]. Evidentemente, Jesus e os discípulos acabavam de voltar de uma breve jornada pela Galileia (DTN, 432; cf. Mt.17:22-23; ver com. de Mc.9:30-32). Como de costume, Jesus provavelmente estava hospedado na casa de Pedro (ver com. de Mc.1:29; Mc.2:1), onde permaneceu durante as semanas restantes de Sua estada na Galileia.

Os que cobravam. Literalmente, “que recebiam a dupla dracma” [gr. didrachmon]. Estes não eram os publicanos, ou cobradores de impostos (ver com. de Lc.3:12), que cobravam pedágios e impostos para as autoridades civis, mas os homens designados em cada distrito para recolher o imposto do templo, o meio siclo exigido de todo homem judeu livre, com 20 anos de idade ou mais, para a manutenção do templo. Esse imposto não era obrigatório no mesmo sentido em que era o dízimo, mas seu pagamento era considerado um dever religioso (sobre a origem desse imposto e dos regulamentos relativos a ele, ver com. de Ex.30:12-16). De acordo com a Mishnah (Shekalim, 1.1, ed. Soncino, Talmude, p. 1), devia ser feito um anúncio público sobre o imposto no primeiro dia de adar, correspondente a nosso fevereiro ou março (ver vol. 2, p. 92). No dia 15 de adar, “eram postas mesas [de cambistas] nas províncias” e, 10 dias mais tarde, no templo (Shekalim, 1.3, Soncino ed. do Talmude, p. 2). Portanto, o imposto do templo para aquele ano estava com vários meses de atraso. O antigo siclo hebraico (ver vol. 1, p. 145- 147) não estava mais em uso geral, mas o costume rabínico exigia que o imposto do templo fosse pago na unidade do meio siclo. Aqueles que “recebiam o tributo” trocavam a moeda do reino pela moeda do templo, obtendo um lucro em cada transação. O gr. didrachama, traduzido por “tributo”, era a dupla dracma, quase equivalente ao meio siclo e cerca de duas vezes o valor de um denário romano, tido como o salário de um dia (ver com. de Mt.20:2).

Dirigiram-se a Pedro. Provavelmente porque Jesus estava hospedado na casa de Pedro.

Não paga o vosso Mestre [...]? Não se sabe se era mantido um registro de quem pagava o imposto, nem se aqueles que abordaram Pedro já sabiam que Jesus não havia pago o imposto. Além disso, essa não era a época do ano em que o imposto era recolhido. Parece que, muito antes disso, se soubessem que Jesus não havia pago o imposto, os escribas, que durante aqueles meses tinham incomodado Jesus várias vezes publicamente (ver com. de Mt.16:1; Mc.7:1-23), teriam-No confrontado pela suposta inadimplência. Aparentemente, a ideia de desafiar Jesus a esse respeito havia chegado havia pouco à mente deles; era parte de um plano bem elaborado. No grego, assim como em português, o pronome está no plural (“vosso”). Com essa abordagem, os cobradores de impostos criaram um motivo de preocupação a todos os discípulos, não apenas a Pedro.

Mt.17:25 25. Sim, respondeu ele. Ao entrar Pedro em casa, Jesus se lhe antecipou, dizendo: Simão, que te parece? De quem cobram os reis da terra impostos ou tributo: dos seus filhos ou dos estranhos?

Sim, respondeu ele. A pronta resposta de Pedro é considerada por alguns como significando que, habitualmente, Jesus havia pago o imposto e que Pedro sabia desse fato. Na verdade, Pedro poderia não estar ciente de que Jesus tinha realmente pago. Quando lhe foi perguntado se Jesus pagava o tributo, Pedro reconheceu imediatamente a natureza incomum e inesperada (ver com. do v. Mt.17:24) do questionamento e sentiu o desafio implícito à fidelidade de Jesus ao templo que a suposta inadimplência indicava. Aparentemente, Pedro e seus condiscípulos ainda eram totalmente fiéis em espírito aos líderes judeus (cf. DTN, 398), e a primeira reação de Pedro foi de evitar a todo custo qualquer coisa que tendesse a piorar as relações com eles. Porém, como em ocasiões posteriores (ver Mt.22:15-22), os escribas e fariseus procuravam confrontar Jesus com um dilema inescapável. Os levitas, sacerdotes e profetas estavam isentos (DTN, 433). Recusar-se a pagar o imposto significaria deslealdade ao templo, mas pagá-lo implicaria que Jesus não Se considerava um profeta, que estaria isento dele.

Ao entrar em casa. Provavelmente a própria casa de Pedro (ver com. do v. Mt.17:4).

Antecipou. Do gr. prophthano, “vir antes”, ou “antecipar”.

Tributo. Do gr. telos, um “pedágio”, geralmente, que incidia sobre mercadorias ou bens (ver com. Lc.3:12).

Estranhos. Ou seja, aqueles que não pertencem à família real. Em outras palavras, os súditos do rei.

Mt.17:26 26. Respondendo Pedro: Dos estranhos, Jesus lhe disse: Logo, estão isentos os filhos.

Isentos os filhos. Jesus poderia ter reivindicado a isenção como um mestre ou rabino. No entanto, Ele deixou de lado essa afirmação válida (ver com. do v. Mt.17:27).

Mt.17:27 27. Mas, para que não os escandalizemos, vai ao mar, lança o anzol, e o primeiro peixe que fisgar, tira-o; e, abrindo-lhe a boca, acharás um estáter. Toma-o e entrega-lhes por mim e por ti.

Mas. O coletor do tributo do templo não tinha o direito legal de exigir o meio siclo de Jesus. Ele pagou por conveniência, não por obrigação. Ele renunciou a Seu direito a fim de evitar controvérsia e fez o que não podia legitimamente ser obrigado a fazer, a fim de estar em paz com Seus inimigos. Evidentemente, Ele não queria que Sua lealdade ao templo fosse contestada, por mais que a acusação fosse injusta. O modo de ação de Cristo se destaca como lição para todos os cristãos. Devemos nos esforçar para viver em paz com todos e, quando necessário, fazer mais do que o exigido, a fim de evitar conflitos desnecessários com os adversários da verdade (cf. Rm.12:18; Hb.12:14; 1Pe.2:12-15; 1Pe.19-20). No entanto, sob nenhuma circunstância devemos comprometer o princípio cristão no esforço para agradar os outros (ver DTN, 356).

Escandalizemos. Do gr. skandalizo, literalmente, “fazer cair em armadilha” (ver com. de Mt.5:29; sobre o dever cristão de evitar o escândalo, ver 1Co.8:8-13).

Ao mar. Isto é, até o lago da Galileia, às margens do qual estava situada Cafarnaum (ver com. Mt.4:13).

Um anzol. Este é o único exemplo no NT em que se faz menção de apanhar peixes com um anzol.

Estáter. Do gr. stater, moeda de prata no valor de quatro dracmas e o equivalente aproximado de um siclo (ver p. 37; vol. 1, p. 146). Apesar de todos os esforços por parte de alguns para explicar o elemento sobrenatural desse incidente, não pode haver dúvida de que foi um milagre que Pedro apanhasse aquele peixe em especial no exato momento e que tivesse a quantia exata de dinheiro em sua boca.

Por Mim e por ti. O montante foi suficiente para cobrir o imposto de meio siclo para duas pessoas. A história termina, assim, abruptamente, admitindo que Pedro apanhou o peixe e pagou o tributo para os cobradores. O milagre foi planejado para impressionar Pedro, pescador de profissão, que sabia quão improvável era que um peixe tivesse dinheiro na boca, ainda mais, com a quantidade específica de dinheiro designado nessa ocasião. Também sabia quão improvável seria que ele fosse capaz de apanhar aquele peixe no momento exato em que tinha sido instruído para pegá-lo (ver com. de Lc.5:8-9). Não foi para Seu próprio benefício que Jesus operou esse milagre (ver com. de Mt.4:3), apesar de metade do valor pago ser para Ele. O milagre tinha a intenção de ensinar a Pedro uma lição e silenciar os cobradores de impostos críticos, que tinham procurado colocar Cristo na categoria de um israelita comum e, assim, desafiar Seu direito de ensinar.

Mt.18:1 1. Naquela hora, aproximaram-se de Jesus os discípulos, perguntando: Quem é, porventura, o maior no reino dos céus?

Naquela hora. [O maior no reino dos céus, Mt 18:1-5 = Mc.9:33-37 = Lc.9:46-48. Comentário principal: Mt e Mc. Ver mapa, p. 218]. Esta instrução foi dada no mesmo dia em que ocorreu o incidente sobre o tributo do templo (DTN, 434, 435; sobre as circunstâncias e os eventos imediatamente anteriores, ver com. de Mt.17:24). A discussão entre os discípulos, que levou à instrução dada nesta seção, havia ocorrido durante a então recente viagem pela Galileia (Mc.9:30; DTN, 432) e, aparentemente, atingiu o clímax no momento em que o grupo entrou em Cafarnaum. A referência de Jesus sobre ir novamente a Jerusalém (ver Mt.16:21), de onde Ele tinha estado ausente por quase um ano e meio (ver com. de Jo.7:2), tinha reavivado no coração dos discípulos esperanças equivocadas (ver com. de Mt.16:21; Lc.4:19) de que havia chegado o tempo de Jesus estabelecer Seu reino (ver com. de Mt.14:22). Aparentemente, todo o discurso de Mateus 18 foi ministrado de uma só vez. Como no caso do Sermão do Monte (ver com. de Mt.5:2), cada um dos escritores dos evangelhos inclui porções não mencionadas pelos outros. Com exceção de pequenas variações (Mc.9:38-41; Mc.9:49-50), o relato de Marcos é semelhante ao de Mateus.

Onde tanto Mateus como Marcos relatam o discurso, o relato de Marcos tende a ser um pouco mais completo do que o de Mateus. Mas, em Mateus, encontra-se uma seção mais longa (Mt.18:10-35), que Marcos e Lucas não têm. Lucas apresenta um breve relato do discurso, embora em outro ponto relate uma série de ensinamentos paralelos de Jesus, transmitidos em outros momentos. O relato de Mateus é, portanto, o mais completo. Todo o discurso pode muito bem ser intitulado: “Como lidar com as diferenças de opinião e conflitos que surgem na igreja”. O grande problema que tornou necessário o discurso foi um grave choque de personalidades entre os doze. Era necessário resolver isso para que a unidade do grupo fosse preservada (sobre a importância da unidade entre os crentes, ver com. de Jo.17:11; Jo.17:22-23).

Aproximaram-se [...] os discípulos. Na volta a Cafarnaum, os discípulos haviam tentado esconder de Jesus seu espírito de rivalidade (DTN, 432). Ele leu seus pensamentos, mas não lhes disse nada na ocasião. Pouco depois do retorno, surgiu a oportunidade para tratar do assunto com eles. À primeira vista, Mateus e Marcos parecem diferir quanto à forma como o assunto surgiu nesse momento. Mateus afirma que os discípulos iniciaram a discussão, enquanto Marcos relata que Jesus fez isso (Mc.9:33). No entanto, os dois relatos podem ser harmonizados assim: enquanto Pedro estava longe, pescando a moeda do tributo (ver com. de Mt.17:27), Jesus iniciou o assunto com os onze discípulos que permaneceram com Ele, provavelmente na casa de Pedro (ver com. de Mt.17:24), mas eles estavam relutantes em discutir o tema. Após a volta de Pedro, um dos doze se aventurou a fazer a Jesus a mesma pergunta que discutiam entre si em segredo (DTN, 434, 435).

Quem [...]? Literalmente, “então, quem?” Parece mais provável que a palavra “então” (gr. ara) conecte esta pergunta com a indagação anterior de Cristo, durante a ausência de Pedro. Cerca de seis meses depois, Tiago e João, por meio de sua mãe, apelaram a Jesus pela preeminência em Seu reino (ver com. de Mt.20:20). Após a entrada triunfal em Jerusalém e a afirmação da soberania de Jesus sobre o templo, a questão da preeminência no reino novamente se ergueu, na mesma noite da traição de Jesus (ver com. de Lc.22:24). Os discípulos se consideravam os mais altos oficiais do reino. No reino da própria imaginação, a posição ocupava o primeiro lugar, fazendo-os esquecer o que Jesus lhes dissera sobre o sofrimento e a morte. A opinião preconcebida efetivamente isolava a mente contra a verdade.

Reino dos céus. Em relação à verdadeira natureza do reino de Cristo, ver com. de Mt.4:17; Mt.5:2. Em relação às falsas ideias mantidas pelos judeus sobre esse assunto, ver com. de Lc.4:19.

Mt.18:2 2. E Jesus, chamando uma criança, colocou-a no meio deles.

Chamando uma criança. O Salvador tomou o menino “nos braços” (Mc.9:36; DTN, 437).

Mt.18:3 3. E disse: Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos tornardes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus.

Se não vos converterdes. Do gr. strepho, “virar” ou “dar a volta”, portanto, em referência à conduta deles; “mudar de ideia”. No texto bíblico, strepho é equivalente ao heb. shuv, comumente usado em todo o AT como “voltar-se” para o Senhor (ver Ez.33:11; ver com. de Je.3:12; Ez.14:6; Ez.18:30). A ignorância sobre a natureza do reino da graça divina foi a ocasião para a contenda entre os discípulos que os levou à pergunta: “Quem é o maior?” (ver Mt.18:1; DTN, 435). Mas havia outra, e ainda mais importante, porque não estavam verdadeiramente “convertidos” (DTN, 435). A não ser que se “voltassem” para seguir a Cristo pelo caminho no qual Ele tinha entrado quando veio a este mundo (ver Fp.2:6-8), seus desejos se tornariam cada vez mais identificados com os do maligno (cf. Jo.8:44). Assim, Jesus procurava incutir na mente deles a compreensão do princípio da verdadeira grandeza (ver com. de Mc.9:35). A menos que os discípulos aprendessem esse princípio, eles nunca entrariam no reino e jamais desfrutariam uma posição elevada nele.

Tornardes como crianças. O espírito de rivalidade abrigado pelos discípulos os tornara infantis, mas Jesus os chamou para se tornarem como uma criança (sobre a atitude de Jesus para com as crianças, ver com. de Mc.10:13-16).

De modo algum entrareis. No grego, há uma dupla negativa, que enfatiza impossibilidade absoluta. Os discípulos aprenderam imperfeitamente a lição que Cristo procurou transmitir. Isso fica evidente a partir de duas situações que se desenvolveram alguns meses mais tarde (ver Mt.20:20-28; Lc.22:24-30).

Mt.18:4 4. Portanto, aquele que se humilhar como esta criança, esse é o maior no reino dos céus.

Que se humilhar. Ver com. de Mt.11:29. Cristo deu outras instruções sobre o valor da humildade como um traço de caráter (ver Mt.23:8-12; Lc.14:11; Lc.18:14).

Esse é o maior. Ver com. de Mc.9:35.

Mt.18:5 5. E quem receber uma criança, tal como esta, em meu nome, a mim me recebe.

Criança. Jesus continua a comparação de determinadas características admiráveis que muitas vezes acompanham a infância e as características daqueles que são verdadeiramente “grandes” no reino dos céus – em que a única grandeza é a de caráter. Naturalmente, as crianças literais estão incluídas, mas, aqui, Jesus Se refere principalmente aos que ainda são “crianças” no reino dos céus, isto é, cristãos imaturos (ver 1Co.3:1-2; Ef.4:15; Hb.5:13; 2Pe.3:18; DTN, 440). Esses “pequenos” são aqueles que creem em Jesus (Mt.18:6).

Em Meu nome. Ver com. de Mt.10:40-42. Isto é, “por Minha causa”, ou “como Meu representante”.

A Mim Me recebe. A narrativa de Mateus omite aqui uma parte do discurso de Jesus. Esta seção foi pronunciada em resposta a uma pergunta de João sobre a atitude a tomar em relação aos que não estão diretamente associados aos seguidores imediatos de Cristo (ver com. de Mc.9:38-41).

Mt.18:6 6. Qualquer, porém, que fizer tropeçar a um destes pequeninos que crêem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma grande pedra de moinho, e fosse afogado na profundeza do mar.

Fizer tropeçar. [Os tropeços, Mt 18:6-9 = Mc.9:42-48 = Lc.17:1-2]. Do gr. skandalizo, literalmente, “aprisionar” (ver com. de Mt.5:29). Aqui, Jesus Se refere principalmente a qualquer coisa que possa causar desunião entre os irmãos. Paulo admoesta os cristãos maduros a não fazer nada que leve um cristão imaturo a tropeçar (1Co.8:9-13).

Destes pequeninos. Ver com. do v. Mt.18:5. Talvez Jesus estivesse pensando em alguns de Seus discípulos que ainda eram “filhinhos” e que seriam feridos pela atitude arrogante de alguns dos outros.

Pedra de moinho. Do gr. mulos onikos, literalmente, “uma pedra de moinho de jumento”, isto é, uma pedra tão grande que era necessário um jumento para movê-la (sobre uma mó menor, ou movida a mão, ver com. de Mt.24:41).

Mt.18:7 7. Ai do mundo, por causa dos escândalos; porque é inevitável que venham escândalos, mas ai do homem pelo qual vem o escândalo!

Escândalos. Isto é, “coisas que levam uma pessoa a tropeçar” (ver com. de Mt.5:29).

É inevitável. Escândalos não são necessários nos propósitos e planos de Deus, mas simplesmente impossíveis de ser evitados. As pessoas são o que são (DTN, 438; cf. Lc.17:1).

Ai do homem. Isto é, para aquele que, por preceito ou exemplo, leva os outros a errar ou os desencoraja de seguir os passos de Jesus.

Mt.18:8 8. Portanto, se a tua mão ou o teu pé te faz tropeçar, corta-o e lança-o fora de ti; melhor é entrares na vida manco ou aleijado do que, tendo duas mãos ou dois pés, seres lançado no fogo eterno.

O teu pé te faz tropeçar. Sobre a natureza figurativa desta declaração, ver com. de Mt.5:29-30. Depois de falar sobre os tropeços devidos às palavras ou exemplos dos outros (Mt.18:5-7), Jesus Se volta para os maus hábitos e tendências da vida. “Um pecado alimentado é suficiente para operar a degradação do caráter e desencaminhar a outros” (DTN, 439; ver com. de Jo.14:30).

Fogo eterno. Ver com. de Mt.5:22; Mt.25:41; Mc.9:43.

Mt.18:9 9. Se um dos teus olhos te faz tropeçar, arranca-o e lança-o fora de ti; melhor é entrares na vida com um só dos teus olhos do que, tendo dois, seres lançado no inferno de fogo.

Entrares na vida. Ou seja, a vida eterna.

Inferno de fogo. Ver com. de Mt.5:22. Aqui, a narrativa de Mateus omite uma parte do discurso de Jesus a partir de uma ilustração relacionada com “fogo” e “sal” (ver com. de Mc.9:49; Mt.5:13).

Mt.18:10 10. Vede, não desprezeis a qualquer destes pequeninos; porque eu vos afirmo que os seus anjos nos céus vêem incessantemente a face de meu Pai celeste.

Pequeninos. [A parábola da ovelha perdida, Mt 18:10-14 = Lc.15:3-7]. Ver com. do v. Mt.18:5.

Seus anjos. Comparar com Sl.103:20-21; Hb.1:14.

Veem [...] a face. No uso idiomático hebraico, ver o rosto de alguém significa ter acesso a essa pessoa (ver Gn.43:3; Gn.43:5; Gn.44:23). Que os anjos “sempre têm acesso à presença do Pai é a certeza para o mais fraco cristão acerca da atenção solícita que Deus manifesta pelo bem-estar até mesmo do menor de Seus filhos na Terra (ver com. de Is.57:15).

Mt.18:11 11. [Porque o Filho do Homem veio salvar o que estava perdido.]

Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10. As evidências textuais (cf. p. 136) se dividem entre manter ou omitir este versículo.

Salvar. Ver com. de Mt.1:21; Jo.3:16.

O que estava perdido. Ver com. de Lc.19:10.

Mt.18:12 12. Que vos parece? Se um homem tiver cem ovelhas, e uma delas se extraviar, não deixará ele nos montes as noventa e nove, indo procurar a que se extraviou?

Nos montes. A imagem é de um pastor acampando com suas ovelhas nos prados no alto das colinas, no verão.

Indo procurar. Ver com. de Lc.15:4-7. Deus tomou a iniciativa de realizar a salvação do homem. A salvação consiste não na busca do homem por Deus, mas na busca de Deus pelo homem. O raciocínio humano vê na religião nada mais do que tentativas humanas de encontrar paz e resolver o mistério da existência, encontrar uma solução para as dificuldades e incertezas da vida. É verdade que no fundo do coração humano há um desejo dessas coisas, mas o ser humano, por si só, nunca pode encontrar a Deus. A glória da religião cristã é que ela conhece um Deus que tanto Se preocupa com o ser humano que deixou tudo a fim de “buscar e salvar o perdido” (Lc.19:10).

A que se extraviou. Do gr. planao, “desviar-se”, “vagar” ou “levar ao erro”. Nossa palavra “planeta” vem da palavra grega relacionada planetes, que significa “errantes” (ver Jd.1:13). Os planetas do sistema solar receberam esse nome porque parecem vagar sem rumo, entre as estrelas aparentemente “fixas”.

Mt.18:13 13. E, se porventura a encontra, em verdade vos digo que maior prazer sentirá por causa desta do que pelas noventa e nove que não se extraviaram.

Se porventura. Existe a possibilidade de que os esforços de Deus em favor do ser humano sejam rejeitados.

Mt.18:14 14. Assim, pois, não é da vontade de vosso Pai celeste que pereça um só destes pequeninos.

Não é da vontade. Deus não quer que alguém “pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento” (2Pe.3:9). É Sua vontade que “todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade” (1Tm.2:4).

Pequeninos. Ver com. dos v. Mt.18:5-6.

Mt.18:15 15. Se teu irmão pecar [contra ti], vai argüi-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão.

Ora (ARC). [Como se deve tratar um irmão culpado, Mt 18:15-20]. Jesus começa aqui uma nova seção de instrução, intimamente relacionada com a que a precede, especialmente os v. Mt.18:12-14. Na parábola da ovelha perdida, Jesus salienta a profunda preocupação do Pai por “um só destes pequeninos” (v. Mt.18:14) que se extraviaram (ver com. do v. Mt.18:12). Ele passa então a discutir (v. 15-20) que atitude um cristão deve tomar em relação a um irmão que o ofendeu.

Pecar. Do gr. hamartano, literalmente, “errar o alvo”; portanto, “errar”, “praticar o mal” ou “pecar”. Evidentemente, o “irmão” que “erra” é o mesmo que a “ovelha” que “se extraviou” (ver com. do v. Mt.18:12).

Mostre-lhe o erro (NVI). Ver com. de Lv.19:17-18. Comparar com Gl.6:1. Esta é mais do que uma advertência sábia, é um mandamento. “Somos tão responsáveis pelos males que poderíamos haver reprimido, como se fôssemos nós mesmos culpados da ação” (DTN, 441).

Entre ti e ele só. Fazer circular relatos sobre o que “teu irmão” possa ter feito tornará mais difícil, talvez mesmo impossível, chegar até ele. Aqui, talvez mais do que em qualquer outro aspecto das relações pessoais, é nosso privilégio aplicar a regra de ouro (ver com. de Mt.7:12). Quanto menos publicidade for dada a um ato errôneo, melhor.

Ganhaste teu irmão. Alguém já disse que a melhor forma de nos desfazer de nossos inimigos é fazer deles nossos amigos. O talento da influência é um dever sagrado, do qual inevitavelmente seremos chamados a dar conta no dia do juízo. “Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus” (ver com. de Mt.5:9).

Mt.18:16 16. Se, porém, não te ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que, pelo depoimento de duas ou três testemunhas, toda palavra se estabeleça.

Não te ouvir. Ou seja, se ele não admitir o erro, não mudar seu modo de agir e endireitar, na medida do possível, os erros do passado.

Uma ou duas pessoas. Estas “mais uma ou duas pessoas”, não estão pessoalmente envolvidas, portanto, estão em posição melhor para expressar uma opinião imparcial e aconselhar o irmão ofensor. No caso de o irmão agressor deixar de atender à advertência delas, podem testemunhar dos esforços que foram feitos em seu favor e, também, sobre os fatos do caso.

Duas ou três testemunhas. Ver com. de Dt.17:6; Dt.19:15. De acordo com a lei hebraica, ninguém podia ser punido pelo depoimento de uma testemunha solitária. É bom lembrar, também que, para cada discordância, há dois lados, e os dois devem ter um julgamento justo antes que seja tomada uma decisão.

Mt.18:17 17. E, se ele não os atender, dize-o à igreja; e, se recusar ouvir também a igreja, considera-o como gentio e publicano.

Igreja. Do gr. ekklesia, de ek, “para fora”, e kaleo, “chamar”. Originalmente, ekklesia se referia a uma assembléia de cidadãos convocados para examinar as questões cívicas. Na LXX, as palavras gr. sunagoge, “sinagoga”, e ekklesia são usadas comumente com referência à “assembléia” ou “congregação” de Israel. Como sunagoge passou a se referir especialmente a uma assembléia religiosa judaica, era de se esperar que os cristãos preferissem usar ekklesia para denotar suas assembléias. No uso cristão, ekklesia significava tanto o local de culto como o corpo de fiéis, quer estivessem reunidos, quer não. Aqui, a “igreja” é o corpo local de crentes agindo na sua capacidade corporativa, não a igreja universal, como em Mt.16:18.

Como gentio e publicano. Ou, “como o gentio e o coletor de impostos”. Recusando o conselho da igreja, o membro errante se separou de sua comunhão (DTN, 441). Isso não significa que ele deve ser desprezado, rejeitado ou negligenciado. Mas, devem ser feitos esforços em favor do membro errante, da mesma forma que por qualquer pessoa que não seja membro. Trabalhando por uma pessoa, assim, que se separou da igreja, os membros devem evitar se associar a ele, fazendo, dessa forma, parecer que compartilham de seu ponto de vista ou que participam com ele em sua má conduta.

Mt.18:18 18. Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra terá sido ligado nos céus, e tudo o que desligardes na terra terá sido desligado nos céus.

Tudo o que ligardes. Ver com. de Mt.16:19. Aqui, o poder de “ligar” e “desligar” é entregue à “igreja” (ver com. de Mt.18:17). E, mesmo aqui, a ratificação do Céu sobre a decisão na Terra só ocorrerá se a decisão for feita em harmonia com os princípios do Céu. Todos os que lidam com os irmãos errantes devem sempre se lembrar de que estão lidando com o destino eterno das pessoas e que os resultados de seu trabalho podem ser eternos (DTN, 442).

Mt.18:19 19. Em verdade também vos digo que, se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai, que está nos céus.

Também vos digo. Os v. 19 e 20 afirmam o princípio geral do qual o v. Mt.18:18 é uma aplicação específica.

Se dois dentre vós. Ver com. do v. Mt.18:16.

Concordarem. Em Sua oração intercessória, na noite em que foi traído, Jesus salientou repetidamente a importância da ação conjunta por parte dos membros da igreja (Jo.17:11; Jo.17:21-23). Nesse caso, aquilo em que os “dois” “concordam” é, especificamente, o caminho a seguir em relação ao irmão que erra (ver Mt.18:16-18).

Coisa. Do gr. pragma, uma “ação”, um “assunto” ou um “negócio”, aqui significando que alguma coisa precisa ser feita sobre isso.

Mt.18:20 20. Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles.

Em Meu nome. Ver com. de Mt.10:18; Mt.10:42; 1Co.5:4. De acordo com a Mishnah: “Mas, [quando] dois se assentam juntos e há palavras da Torah [faladas] entre eles, a Shekinah habita entre eles” (ver com. de Gn.3:24). A declaração de Mt.18:20, é claro, é verdadeira em sentido geral, embora, no contexto do capítulo (v. Mt.18:16-19) se refira principalmente à igreja em sua capacidade oficial de lidar com um membro ofensor.

Mt.18:21 21. Então, Pedro, aproximando-se, lhe perguntou: Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes?

Então, Pedro. [Quantas vezes se deve perdoar a um irmão, Mt 18:21, 22 = Lc.17:3-4]. Em seu papel assumido como porta-voz dos discípulos (ver com. de Mt.16:16), Pedro muitas vezes tomou a iniciativa de responder a perguntas, fazê-las por si mesmo ou de propor alguma forma de ação (ver com. de Mt.14:28; Mt.16:16; Mt.16:22; Mt.17:4).

Até quantas vezes [...]? Direta ou indiretamente, grande parte do cap. 18 é dedicada à instrução sobre a atitude do cristão para com irmãos ofensores, especialmente, quando a ofensa é pessoal. Pedro aceita tacitamente a ideia de lidar pacientemente com seu “irmão”, mas gostaria de saber porquanto tempo deve fazê-Io antes de estar livre para tomar uma atitude mais severa e buscar reparação.

Até sete vezes? Tem sido sugerido por alguns que os rabinos limitavam as vezes que se devia perdoar a não mais de três, em uma incorreta interpretação de Am.1:3. Plenamente consciente do fato de que Cristo sempre interpretava a lei no sentido mais amplo do que os escribas (ver com. de Mt.5:17-18), Pedro aqui procura antecipar o grau de paciência que se poderia esperar que Cristo recomendasse: sete, o número geralmente considerado como representando a perfeição (PJ, 243). Mas, perdoar uma pessoa “sete vezes”, e não mais, seria uma espécie mecânica de perdão. O perdão, seja da parte de Deus, seja da parte do homem, é muito mais do que um ato judicial, é a restauração da paz onde havia conflito (cf. Rm.5:1). Mas o perdão vai além e envolve o esforço de restaurar o próprio irmão que erra.

Mt.18:22 22. Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete.

Até setenta vezes sete. O texto grego pode significar tanto “setenta vezes sete” quanto “setenta e sete vezes” (cf. Gn.4:24). Naturalmente, o número em si não é importante; é apenas simbólico. Qualquer dos números está em harmonia com a verdade aqui ensinada, de que o perdão não é uma questão de matemática legal ou regulamentar, mas uma atitude cristã. Aquele que abriga dentro de si a ideia de que, em algum momento no futuro, não perdoará, está longe de estender o verdadeiro perdão, mesmo que mostre a forma do perdão. Se o espírito de perdão age no coração, a pessoa está tão pronta a perdoar aquele que se arrepende pela oitava vez como na primeira vez, tão pronta a perdoar na 491º vez como na oitava. O verdadeiro perdão não se limita a números; além disso, não é o ato que importa, mas o espírito que precede o ato. “Nada pode justificar o espírito irreconciliável” (PJ, 251).

Mt.18:23 23. Por isso, o reino dos céus é semelhante a um rei que resolveu ajustar contas com os seus servos.

Por isso. [A parábola do credor incompassivo, Mt 18:23-35. Sobre as parábolas, ver p. 197-204]. O restante de Mateus 18 consiste em uma parábola dada para ilustrar o verdadeiro espírito do perdão.

Um rei. Na medida em que essa parábola representa o trato do Senhor conosco, e a forma pela qual devemos lidar com nossos semelhantes, o “rei” não representa outro senão Cristo.

Ajustar contas. Ou seja, auditar suas contas procurando fechá-las. Na parábola, os “servos” são funcionários do governo.

Mt.18:24 24. E, passando a fazê-lo, trouxeram-lhe um que lhe devia dez mil talentos.

Trouxeram-lhe um. Apenas um alto funcionário poderia ter uma dívida tão grande para com seu senhor, tendo em conta a imensa quantia devida por esse servo.

Dez mil talentos. Cerca de 215 toneladas de prata, o suficiente para contratar 10 mil trabalhadores por 18 anos (ver p. 37).

Mt.18:25 25. Não tendo ele, porém, com que pagar, ordenou o senhor que fosse vendido ele, a mulher, os filhos e tudo quanto possuía e que a dívida fosse paga.

Não tendo [...] com que pagar. Nos tempos antigos e, na verdade, até muito recentemente, mesmo nos países ocidentais, o devedor poderia ser enviado para a prisão. Em regiões orientais, ele e sua família poderiam ser vendidos como escravos por um credor. Neste caso, o devedor e sua família deveriam ser vendidos. De acordo com as disposições da lei de Moisés, um hebreu podia se vender ou ser vendido pelo credor, mas era “vendido” apenas por um período (ver com. de Ex.22:3; Lv.25:39; Lv.25:47). Além disso, as leis protegiam essa pessoa contra o tratamento severo (ver com. de Ex.21:2; Ex.21:20; Dt.15:12; Dt.15:15-16). Deve-se lembrar que uma parábola é designada para ensinar uma verdade central e que muitos dos detalhes da parábola são mais ou menos incidentais, acrescentados apenas com a finalidade de dar lógica à história (PJ, 244). A parte da parábola em que o servo está sendo vendido como escravo não implica que Deus venda alguém à escravidão (sobre as parábolas, ver p. 197-204).

Mt.18:26 26. Então, o servo, prostrando-se reverente, rogou: Sê paciente comigo, e tudo te pagarei.

Prostrando-se. Ver com. de Mt.2:11.

Rogou. Ver com. de Mt.8:2; Mt.15:25.

Mt.18:27 27. E o senhor daquele servo, compadecendo-se, mandou-o embora e perdoou-lhe a dívida.

Perdoou-lhe a dívida. Figurativamente, a “dívida” representa o registro dos pecados anotados contra nós. Como o devedor da parábola, somos absolutamente incapazes de pagá-la. Mas, quando nos arrependemos verdadeiramente. Deus nos liberta da dívida (comparar com a parábola dos dois devedores (ver com. de Lc.7:41-42)).

Mt.18:28 28. Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos que lhe devia cem denários; e, agarrando-o, o sufocava, dizendo: Paga-me o que me deves.

Encontrou um. Se ele foi em busca do homem ou se encontrou com ele acidentalmente, não está indicado e não tem relação com a lição da parábola.

Cem denários. Ver com. do v. Mt.18:24. Cem denários seriam uma grande dívida, pois um denário representava o salário de um trabalhador comum por um dia inteiro (ver com. de Mt.20:2). No entanto, em comparação com a primeira dívida, a segunda era insignificante.

Paga-me. Em grego, a palavra traduzida como “paga” está na forma enfática.

Mt.18:29 29. Então, o seu conservo, caindo-lhe aos pés, lhe implorava: Sê paciente comigo, e te pagarei.

Caindo. Ver v. Mt.18:26; ver também com. de Mt.2:11.

Mt.18:30 30. Ele, entretanto, não quis; antes, indo-se, o lançou na prisão, até que saldasse a dívida.

Não quis. O credor implacável foi inflexível na exigência do pagamento. Essa crueldade é dificilmente concebível. Seu egoísmo, que o cegou para a grandeza da sua própria dívida e o impediu de apreciar a grandeza da misericórdia estendida a ele por seu próprio credor, o rei, o levou a tratar seu conservo impiedosamente.

Na prisão. Ver com. do v. Mt.18:25.

Mt.18:31 31. Vendo os seus companheiros o que se havia passado, entristeceram-se muito e foram relatar ao seu senhor tudo que acontecera.

Entristeceram-se muito. Os “conservos”, possivelmente acostumados a proteger um dos seus colegas da detenção em casos insignificantes de proveito à custa do seu senhor, o rei, evidentemente acharam a ação do primeiro servo mais grave do que podiam suportar.

Relatar. Ou seja, explicaram totalmente e em detalhes as circunstâncias do caso.

Mt.18:32 32. Então, o seu senhor, chamando-o, lhe disse: Servo malvado, perdoei-te aquela dívida toda porque me suplicaste

Sem comentário para este versículo.

Mt.18:33 33. não devias tu, igualmente, compadecer-te do teu conservo, como também eu me compadeci de ti?

Sem comentário para este versículo.

Mt.18:34 34. E, indignando-se, o seu senhor o entregou aos verdugos, até que lhe pagasse toda a dívida.

Indignando-se, o seu senhor. Observe o contraste com a compaixão manifesta quando a ofensa foi contra ele mesmo. O rei poderia pacientemente suportar a maior perda – para ele, essa era uma questão menor, mas a injustiça a um dos seus súditos despertou sua indignação.

Verdugos. A partir de um verbo que significa “torturar” (ver com. de Mc.5:7).

Até que ele pagasse. Ver com. do v. Mt.18:25.

Mt.18:35 35. Assim também meu Pai celeste vos fará, se do íntimo não perdoardes cada um a seu irmão.

Assim também. Aquele que se recusa a perdoar os outros joga fora sua própria esperança de perdão. Aqui está a grande lição da parábola: o infinito contraste entre a crueldade e a maldade do homem para com seus semelhantes e a longanimidade e a misericórdia de Deus para conosco. Antes de partirmos para acusar os outros, ou exigir deles nossas “dívidas”, faríamos bem em considerar primeiramente como Deus nos tratou em circunstâncias semelhantes e como gostaríamos que os outros nos tratassem, se as condições fossem revertidas (ver com. de Mt.6:12; Mt.6:14-15). Em vista da infinita misericórdia de Deus para conosco, devemos também mostrar misericórdia para com os outros.

Do íntimo. O problema na pergunta de Pedro (ver com. dos v. Mt.18:21-22) foi que o tipo de perdão a que ele se referia não era do coração, mas, sim, um tipo mecânico e legalista de “perdão”, com base no conceito de obtenção de justiça pelas obras. Como foi difícil para Pedro entender o novo conceito de obediência do coração, motivada pelo amor a Deus e aos seus semelhantes! Isso completa a resposta de Jesus à pergunta de Pedro (v. Mt.18:21), resposta que também trata indiretamente da pergunta: “Quem é o maior no reino dos céus?” (v. Mt.18:1). O “maior” é simplesmente aquele que, “de coração”, reflete sobre a misericórdia do Pai celestial e que faz “o mesmo” em relação a seus semelhantes. Essa é a verdadeira medida do caráter em nossas relações com os semelhantes. Como Jesus declarou enfaticamente no Sermão do Monte, o que determina o caráter de uma ação é o motivo que a provoca. Assim, aparentemente, boas ações, quando realizadas com o propósito de adquirir a estima dos homens, não têm valor aos olhos do Céu (Mt.6:1-7).

As palavras de perdão, por mais importantes que sejam, não são de primordial importância aos olhos de Deus. Pelo contrário, é a atitude do coração que dá às palavras a plenitude de sentido que, de outra forma, lhes faltaria. A aparência de perdão, motivada por circunstâncias ou por objetivos escusos, pode enganar aquele a quem é atribuída, mas não Aquele que vê o coração (1Sm.16:7). O perdão sincero é um aspecto importante da perfeição cristã (ver com. de Mt.5:48).

Mt.19:1 1. E aconteceu que, concluindo Jesus estas palavras, deixou a Galiléia e foi para o território da Judéia, além do Jordão.

Concluindo Jesus estas palavras. [Partida final da Galileia. Início do ministério em Samaria e na Pereia: Jesus atravessa o Jordão, Mt 19:1, 2 = Mc.10:1. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 219; gráficos, p. 226, 228]. Esta é a fórmula frequentemente usada por Mateus para assinalar o encerramento dos discursos de Jesus Mt.7:28; Mt.11:1; Mt.13:53; Mt.26:1).

Deixou a Galileia. Aparentemente, uma continuação da afirmação de que Jesus “partiu para a Galileia” (ver com. de Mt.4:12). Os evangelhos sinóticos silenciam sobre a visita de Jesus a Jerusalém na época da Festa dos Tabernáculos, no ano 30 d.C. (ver com. de Jo.7:10; quanto a essa festa, ver com. de Ex.23:16; Lv.23:2; Dt.16:13). João fornece um relato mais ou menos extenso das experiências de Jesus em Jerusalém, durante e imediatamente após a Festa dos Tabernáculos (Mt.7:2-10:21). Uma tentativa de prendê-Lo no último dia da festa havia falhado (Jo.7:32; Jo.7:37; Jo.7:44-53; DTN, 459). Na manhã seguinte, a infeliz mulher apanhada em adultério Lhe foi apresentada enquanto Ele ensinava no templo, “de madrugada” (Jo.8:2; DTN, 460). Parece também que o discurso sobre “a luz do mundo” ocorreu logo após esse fato (Jo.8:2; Jo.8:12; cf. DTN, 463), como também a primeira tentativa de apedrejamento de Jesus (v. Jo.8:59). Houve uma segunda tentativa para apedrejá-Lo, “alguns meses depois”, na Festa da Dedicação (DTN, 470; cf. Jo.10:22; Jo.10:31; Jo.10:33), e foi feita uma tentativa de prendê-Lo e encerrar Seu ministério (Jo.10:39-40). Jesus curou o cego de nascença (Jo.9:1; Jo.9:7; Jo.9:14) e fez o discurso sobre o Bom Pastor (Jo.10:1-18; DTN, 477) após o encerramento da Festa dos Tabernáculos, provavelmente, no sábado seguinte, talvez pouco antes da Festa da Dedicação.

Sendo que: (1) após a Festa dos Tabernáculos, Jesus voltou para a Galileia por algum tempo (DTN, 485); (2) depois da Festa da Dedicação, Ele Se retirou para a Pereia (Jo.10:39-40); e (3) a cura do cego parece ter acontecido logo após o discurso sobre “a luz do mundo” (Jo.8:12-58), é possível que essa cura do cego tenha sido realizada no sábado seguinte (Jo.8:12; Jo.8:59; Jo.9:1; Jo.9:5; Jo.9:14). Um ano e meio antes disso, Jesus havia curado o enfermo no tanque de Betesda, tinha sido levado perante o Sinédrio e havia Se retirado da Judeia para a Galileia (ver com. de Mt.4:12). Então, Ele novamente deixou Jerusalém e foi para a Galileia, onde permaneceu por um tempo por causa da animosidade dos sacerdotes e rabinos (DTN, 485). No final do outono, Jesus deixou novamente a Galileia pela última vez, e fez lentamente Seu caminho em direção a Jerusalém. Sua viagem da Galileia para participar da Festa dos Tabernáculos tinha sido feita de forma rápida e secreta, mas, desta vez, Ele viajou lentamente e por um caminho tortuoso (Jo.7:10). Durante esse tempo, Ele enviou os setenta (ver com. de Lc.10:1-24) e, após o encerramento de Sua missão, participou da Festa da Dedicação.

Após essa festa, Ele novamente deixou a cidade, retirando-Se para a Pereia e deu sequência a Seu ministério ali (Jo.10:40; DTN, 485, 488). Dependendo se o ano 30/31 d.C. tinha 12 ou 13 meses (ver p. 252, 254, 255), passou-se um período de cerca de 16 ou 20 semanas (4 ou 5 meses) entre a Festa da Dedicação e a Páscoa. Essa foi a duração aproximada do ministério na Pereia (cf. DTN, 488; para os eventos do ministério em Samaria e Pereia, ver com. de Lc.9:51-18:34). O grande problema cronológico do ministério na Pereia (ver p. 178) é o sequenciamento dos eventos na Festa da Dedicação (Jo.10:22-42) e os relacionados com a ressurreição de Lázaro (Jo.11:1-57), em relação ao relato de Lucas desse período do ministério de Jesus (Lc.9:51-18:34). Os motivos para situar a Festa da Dedicação entre os cap. Lc.10-11 de Lucas são apresentados no comentário sobre Lc.11:1. Os motivos para situar a ressurreição de Lázaro e os incidentes relacionados entre os v. Lc.17:10-11 são dados no comentário sobre Lc.17:1-11 (ver p. 192; cf. com. de Jo.10:40).

Território. Ver com. de Mt.15:22.

Além do Jordão. Esta expressão é comumente usada para se referir às regiões a leste do Jordão, embora, às vezes, se refira às regiões do lado ocidental (ver com. de Mt.4:15). Aqui, ela se refere à região da Pereia, além do Jordão, tendo em vista a Judeia. Nesse momento, tanto a Pereia como a Galileia estavam sob a jurisdição de Herodes Antipas (ver com. de Lc.3:1).

Mt.19:2 2. Seguiram-no muitas multidões, e curou-as ali.

Muitas multidões. Como no auge do ministério na Galileia (Lc.12:1; Lc.12:14; Lc.14:25). Até então, Jesus não tinha trabalhado na Pereia. A região continha uma proporção relativamente grande de judeus e, naquele tempo, era densamente povoada. Era bom que atendesse às necessidades das pessoas de lá, assim como na Judeia e na Galileia.

Mt.19:3 3. Vieram a ele alguns fariseus e o experimentavam, perguntando: É lícito ao marido repudiar a sua mulher por qualquer motivo?

Alguns fariseus. [A questão do divórcio, Mt 19:3-12 = Mc.10:2-12 = Lc.16:18. Comentário principal: Mt. Ver com. de Mt.5:27-32]. O texto de Lc.9:51-18:14, que, às vezes, é chamado de “grande inserção” (ver com. de Lc.9:51), logicamente se insere entre os v. Mt.19:2-3. Lucas é o único evangelista a cobrir os incidentes e ensinamentos, registrados em Lc.9-18, que tratam, em grande parte, do ministério na Pereia. Na época em que ocorreu o incidente aqui registrado, aparentemente, faltavam apenas algumas semanas para a Páscoa de 31 d.C (em relação às crenças e práticas dos fariseus, ver p. 39, 40).

Experimentavam. Ou, “testavam” (ver com. de Mt.4:1), isto é, com o objetivo de prendê-Lo. Por quase dois anos, os espias enviados pelo Sinédrio de Jerusalém tinham seguido Jesus com o duplo objetivo de encontrar alguma falha para acusá-Lo e tentar desacreditá-Lo aos olhos do povo (DTN, 213). Após duas ocasiões anteriores, desde a Festa dos Tabernáculos (ver com. de Mt.19:1) foram feitas tentativas em Jerusalém para apedrejar Jesus (Jo.8:59; Jo.10:31-33). Sabia-se que Sua vida estava em perigo, caso Ele Se aventurasse novamente na Judeia (Jo.11:8), pois os líderes judeus estavam buscando Sua prisão (Jo.11:57). Repetidamente, desde a cura do homem no tanque de Betesda (Jo.5:1-9), os escribas e fariseus tinham procurado enredar Jesus com perguntas destinadas a obter declarações que, mais tarde, pudessem se tornar o fundamento de acusações contra Ele (Mc.7:2; Mc.7:5; Mc.8:11; Jo.8:6; ver com. de Mt.16:1).

Repudiar a sua mulher. Ver com. de Mt.5:31. Ou seja, “divorciar-se” dela.

Por qualquer motivo. Ver com. de Mt.5:31-32.

Mt.19:4 4. Então, respondeu ele: Não tendes lido que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher

Não tendes lido [...]? Ver com. de Mc.2:25. Mais uma vez, Jesus dirige Seus ouvintes às Escrituras, à “Lei”, para uma declaração oficial de doutrina (ver com. de Mc.7:7-13).

O Criador [...] os fez. Ou seja, homem e mulher, com referência particular ao primeiro homem e à primeira mulher (ver com. de Gn.1:27). O grego aqui é idêntico ao da LXX em Gn.1:27.

Desde o princípio. Ou seja, na criação (Mc.10:6). Jesus encaminhou Seus inquisidores para antes da lei de Moisés, que estava na mente deles naquele momento, aos princípios fundamentais do casamento conforme instituído na criação.

Mt.19:5 5. e que disse: Por esta causa deixará o homem pai e mãe e se unirá a sua mulher, tornando-se os dois uma só carne?

Por esta causa. Esta citação de Gn.2:24 é quase idêntica ao texto da LXX. Em Gênesis, as palavras aqui citadas parecem ser a afirmação de Adão naquele momento em que Eva se tornou sua mulher, mas Jesus as atribuiu especificamente a Deus, na declaração aqui citada.

Deixará [...] pai e mãe. Durante a infância e juventude, a responsabilidade primária de uma pessoa é com o pai e a mãe. Essa responsabilidade continua ao longo da vida (ver com. de Mc.7:11). No entanto, apesar de sua importância, essa obrigação está subordinada à lei do casamento e, quando as duas entram em conflito, como resultado das fraquezas e dos erros humanos, a primeira responsabilidade de um homem é para com sua esposa.

Uma só carne. Quanto mais o homem e a mulher tiverem em comum, mesmo antes do casamento, maior será a probabilidade de que eles encontrarão no casamento o companheirismo que tornará a união um sucesso completo. Por outro lado, onde há grandes diferenças de formação, educação, atitudes, princípios, gostos e desgostos, muito mais difícil será que sejam “um” em mente e espírito e que, assim, encontrem sucesso no relacionamento conjugal.

Mt.19:6 6. De modo que já não são mais dois, porém uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.

De modo. Jesus aqui passa a indicar a conclusão a ser tirada a partir do princípio fundamental da relação do casamento, citada com base em Gn.2:24.

Mais dois. Aos olhos de Deus, marido e mulher são uma só entidade e, portanto, não devem ser mais divisíveis do que é um corpo humano.

O que. Ou seja, a nova união formada pelo casamento (v. Mt.19:5).

Deus ajuntou. A relação de casamento foi instituída por Deus, santificada por Ele. Foi um Criador sábio que proveu a relação matrimonial; foi Ele quem a tornou possível e desejável. Todos os que entram na relação matrimonial são, portanto, unidos, de acordo com o plano original de Deus, para toda a vida.

Não o separe o homem. Com a única exceção para a qual Jesus fez provisão (ver com. do v. Mt.19:9), o divórcio não pode ser honrado e reconhecido pelo Céu. Aos olhos de Deus, qualquer aliança em que qualquer deles entre com outra mulher ou outro homem, conforme o caso, é considerada por Cristo como adultério.

Mt.19:7 7. Replicaram-lhe: Por que mandou, então, Moisés dar carta de divórcio e repudiar?

Por que [...] Moisés? Ver Dt.24:1-4.

Divórcio. Ver com. de Dt.24:4; Mt.5:31.

Repudiar. Ver com. de Mt.5:31.

Mt.19:8 8. Respondeu-lhes Jesus: Por causa da dureza do vosso coração é que Moisés vos permitiu repudiar vossa mulher; entretanto, não foi assim desde o princípio.

Dureza do vosso coração. Ver com. de Dt.14:26.

Permitiu. De acordo com a declaração de Cristo, a lei do AT que fez provisão para o divórcio foi uma concessão designada para atender a circunstâncias que estavam longe do ideal (ver com. de Dt.24:4). No entanto, o ensino de Cristo aqui deixa claro que as disposições da lei de Moisés com relação ao divórcio são inválidas para os cristãos (ver com. de Mt.19:9).

Desde o princípio. A lei de Gn.1:27 e Gn.2:24 antecede o direito de Dt.24:1-4 e é superior a ele, pois, no período edênico de Gênesis, o ideal de Deus para Seus filhos humanos já estava estabelecido. Deus nunca revogou a lei do casamento que Ele enunciou no princípio. Não era plano de Deus que o divórcio fosse necessário. Portanto, os cristãos de hoje que desejam em seu coração seguir o plano de Deus não irão, sem fundamento bíblico, recorrer ao divórcio como solução para as dificuldades conjugais (ver com. de Mt.19:9).

Mt.19:9 9. Eu, porém, vos digo: quem repudiar sua mulher, não sendo por causa de relações sexuais ilícitas, e casar com outra comete adultério [e o que casar com a repudiada comete adultério].

Eu, porém, vos digo. Ver com. de Mt.5:22. A única mudança feita para acomodar a lei do casamento original a um mundo caído é que a violação do contrato de casamento por falta de castidade pode constituir uma base legal para a dissolução da união. Caso contrário, a união não pode ser legalmente quebrada.

Quem. O princípio que Cristo estava prestes a enunciar é de aplicação universal. Ninguém que professa ser cristão deve se considerar uma exceção a ele.

Relações sexuais ilícitas. Do gr. porneia, “fornicação” (ver com. de Mt.5:32). Deve-se notar que, no NT, o termo “fornicação” abrange todas as relações sexuais ilícitas, tanto antes como depois da união. Para o leitor moderno, a expressão “falta de castidade” transmite mais exatamente o significado de porneia como é usada no NT. Sob a lei mosaica, a pena pela infidelidade era a morte (ver com. de Lv.20:10), não o divórcio. Além disso, segundo a lei de Moisés, a pena de morte era obrigatória, ao passo que, sob a lei cristã, aqui estabelecida por Cristo, o divórcio não é obrigatório, mas permitido. Dos ensinamentos de Jesus aqui, pode-se inferir que a parte inocente está livre para escolher se o relacionamento conjugal deve continuar ou não. A reconciliação é sempre o ideal, especialmente se envolve filhos. Aqui e na discussão paralela de Jesus (Mt.5:32) parece estar implícito, embora não declarado especificamente, que a parte inocente em um divórcio tem a liberdade de se casar novamente. Esse tem sido o entendimento da grande maioria dos comentaristas ao longo dos anos.

Casar com a repudiada. Qualquer aliança que ela assuma com outro homem viola seu voto de casamento original, violação que constitui adultério. Por analogia de raciocínio, o homem que se casar com ela também se torna adúltero.

Mt.19:10 10. Disseram-lhe os discípulos: Se essa é a condição do homem relativamente à sua mulher, não convém casar.

Os discípulos. Aparentemente, foi depois que Jesus e Seus discípulos haviam deixado os fariseus e entrado em uma casa que os discípulos se manifestaram quanto ao assunto em discussão (Mc.10:10).

Se essa é a condição. Ou seja, se o casamento une as pessoas tão estritamente como Jesus acabava de dizer. Parece que os discípulos não haviam entendido claramente as declarações anteriores de Jesus com respeito ao casamento (ver Mt.5:31-32; Lc.16:18) e que, portanto, estavam perplexos com a interpretação que Jesus tinha acabado de dar.

Não convém casar. Evidentemente, os discípulos argumentaram que, sendo a natureza humana o que é e havendo tantas circunstâncias em que marido e mulher se mostram incompatíveis, não seria melhor renunciar à vida de casado por completo? Sem dúvida, à primeira vista, o padrão que Jesus proclamou parecia muito elevado até mesmo para os discípulos, como, por vezes, fazem os cristãos de hoje. O que os discípulos esqueciam, e o que os cristãos de hoje são propensos a esquecer, é que Cristo oferece outra solução para a infelicidade conjugal. De acordo com a fórmula de Cristo, onde as disposições e personalidades não são adequadas, a solução é mudar as disposições, o coração e a vida (ver com. de Rm.12:2), não o cônjuge.

Os princípios sobre os quais essa transformação pode ser realizada estão claramente estabelecidos no Sermão do Monte (ver com. de Mt.5:38-48; Mt.6:14-15). Se esses princípios forem aplicados a situações matrimoniais difíceis, eles podem operar os mesmos milagres que operam quando aplicados a outras relações sociais. Não há problema conjugal que não possa ser resolvido para a satisfação de ambos, marido e mulher, em que os dois estejam dispostos a seguir os princípios estabelecidos por Cristo no Sermão do Monte. E, quando um dos cônjuges está disposto a fazê-lo, mesmo que o outro não esteja, é possível atingir um grau verdadeiramente notável de paz conjugal, resultando na conquista daquele que não está disposto. Essa recompensa vale mais do que a paciência e o sacrifício necessários.

Mt.19:11 11. Jesus, porém, lhes respondeu: Nem todos são aptos para receber este conceito, mas apenas aqueles a quem é dado.

Nem todos. O comentário dos discípulos (v. Mt.19:10) revelou sua perplexidade e levou Cristo a fazer uma nova declaração (v. Mt.19:12).

Este conceito. Literalmente, “esta palavra”, isto é, o que os discípulos acabavam de dizer (v. Mt.19:10) com relação à afirmação anterior de Jesus sobre as relações sexuais ilícitas e o divórcio (v. Mt.19:9).

Mas apenas. Cada pessoa deve ter a liberdade de determinar se o conceito se aplica ao seu caso. O próprio Deus havia proclamado: “Não é bom que o homem esteja só” (Gn.2:18), mas, sob o reinado do pecado, Jesus, neste caso, aparentemente admite que pode haver certas circunstâncias em que seja melhor a pessoa estar sozinha.

Mt.19:12 12. Porque há eunucos de nascença; há outros a quem os homens fizeram tais; e há outros que a si mesmos se fizeram eunucos, por causa do reino dos céus. Quem é apto para o admitir admita.

Eunucos. Evidentemente, Cristo estava aqui descrevendo certas pessoas que sofriam de um defeito congênito e, portanto, pelo qual elas não deveriam ser consideradas responsáveis.

Fizeram tais. No antigo Oriente, os mordomos eram invariavelmente eunucos literais. Aparentemente, os eunucos se casavam (ver com. de Gn.37:36). Os eunucos eram objeto de piedade pelos judeus (ver Is.56:3-5). Os sacerdotes assim mutilados fisicamente não poderiam servir no ofício sacerdotal (ver Lv.21:20). Na história mais recente de Judá, são mencionados eunucos em conexão com a corte (Je.29:2, ARC), mas não se sabe se esses eram judeus ou estrangeiros (ver com. de Et.1:10; Et.2:3). Pelo menos um deles, Ebede-Meleque, era etíope (ver Je.38:7).

Que [...] Se fizeram eunucos. O casamento é desejável. A formação do caráter pode ser muito mais eficaz e completa em estreita associação com outro ser humano do que quando a pessoa está solteira. Nas relações íntimas da vida doméstica cotidiana, mais pode ser alcançado como forma de suavizar e subjugar os traços desagradáveis de caráter e fortalecer as melhores qualidades do que seria possível de outra forma. Aqueles que, por um motivo ou outro, estão sem o privilégio de um lar próprio perdem, assim, uma das melhores escolas para a formação do caráter e não podem conhecer as profundezas das alegrias, tristezas e oportunidades da vida. O celibato não é um estado comum, normal, e é um engano do diabo dizer que, por si só, ele pode levar a um estado superior de santidade do que seria possível de outra forma. Entre os judeus, o celibato era desaprovado ou digno de pena, e era praticado somente por grupos ascéticos extremos, como os essênios (ver p. 41).

O registro das Escrituras afirma especificamente que Pedro era casado e, provavelmente, os outros discípulos também o eram (ver com. de Mc.1:30). Jesus nunca recomendou o celibato, nem para os cristãos como um todo nem para os líderes cristãos. Não é natural e não contribui para o desenvolvimento de um caráter simétrico, como pode fazer a vida normal de casado. As palavras do Senhor, se tomadas literalmente, seriam contrárias a todo o teor das Escrituras. A ideia da mutilação corporal é abominável. Parece apropriado considerar essa declaração como sendo análoga à declaração de Cristo em Mt.5:30. Alguns comentaristas encontram um paralelo nas palavras de Paulo em 1Co.7:29 (ver também os v. 1Co.7:1-2). Sem dúvida, a afirmação de Cristo deve ser entendida em sentido figurado.

Apto para o admitir. Ver com. do v. Mt.19:11.

Mt.19:13 13. Trouxeram-lhe, então, algumas crianças, para que lhes impusesse as mãos e orasse; mas os discípulos os repreendiam.

Depois (NVI). [Jesus abençoa as crianças, Mt 19:13-15 = Mc.10:13-16 = Lc.18:15-17. Comentário principal: Mc]. Aqui a sequência de pensamento tem precedência sobre a sequência temporal imediata.

Trouxeram-Lhe. Os judeus costumam levar seus filhos, especialmente, com a idade de um ano, para ser abençoados por um rabino (DTN, 511).

Repreendiam. Os discípulos não compreendiam bem a Jesus. Eles consideraram esse pedido um desperdício de tempo do Mestre e uma interrupção desnecessária na tarefa que era, para eles, a mais importante de pregar o evangelho aos adultos. Eles pensavam que estavam protegendo Jesus de aborrecimentos. De acordo com Marcos, Jesus “indignou-Se” com a ação imperativa dos discípulos (Mc.10:14).

Mt.19:14 14. Jesus, porém, disse: Deixai os pequeninos, não os embaraceis de vir a mim, porque dos tais é o reino dos céus.

Deixai os pequeninos. Ou seja, permitam ou deixem que as crianças venham. É evidente que Jesus amava as crianças e que elas O amavam. Ele apreciava seu amor e devoção sinceros. Ele estava interessado nelas e gostava delas. Em mais de uma ocasião, Ele Se referiu às características e aos interesses da infância para ilustrar verdades espirituais (ver Mt.11:16-17; Mt.18:2-4).

Não os embaraceis. Literalmente, “não continuem a impedi-los”. Qualquer pessoa que tornar difícil que as crianças encontrem o Mestre hoje, com certeza, há de enfrentar Seu maior desgosto e receber Sua severa reprovação. Há espaço para as crianças no reino da graça divina. Em casa, na igreja, na escola, as necessidades e os interesses das crianças devem sempre receber um lugar de grande importância. Todos os que têm qualquer contato com as crianças, ou que tenham voz nas decisões que afetam seus interesses, devem evitar fazer qualquer coisa que lhes torne mais difícil encontrar Jesus.

Dos tais. Ver com. de Mt.18:3.

Mt.19:15 15. E, tendo-lhes imposto as mãos, retirou-se dali.

Imposto as mãos. Ver com. de Mc.10:16. O toque de Jesus, que tantas vezes levou cura aos enfermos, transmite bênção às crianças. É digno de nota que Jesus não as batizou, mas simplesmente as entregou ao amor e cuidado do Pai.

Mt.19:16 16. E eis que alguém, aproximando-se, lhe perguntou: Mestre, que farei eu de bom, para alcançar a vida eterna?

Eis. [O jovem rico, Mt 19:16-22 = Mc.10:17-22 = Lc.18:18-23. Comentário principal: Mt]. Este incidente parece ter ocorrido logo após a bênção das crianças (ver v. Mt.19:13-15). O jovem havia presenciado a bênção das crianças, e essa expressão comovente de amor motivou sua pergunta (DTN, 518).

Alguém. Ele é geralmente chamado de “jovem rico”, um nome composto com base nos três relatos sinóticos do incidente. De acordo com Mateus, é dito ter sido um “jovem” (Mt.19:20); Lucas o descreve como um “homem de posição”, “certo príncipe”, que era “riquíssimo” (Lc.18:18, ARA e ARC; Mt.19:23). De acordo com seu ponto de vista, ele era consciencioso e tinha vivido de modo exemplar (ver com. de Mt.19:19). Como um “príncipe”, ele ocupava uma posição de responsabilidade e era membro do “honrado conselho dos judeus” (DTN, 518, 520). Se este era o Sinédrio local ou o conselho da cidade em que ele vivia ou o Grande Sinédrio de Jerusalém, não é certo (ver p. 54). O jovem rico parece ter abordado Jesus quando Ele estava saindo da cidade (Mc.10:17). O fato de o jovem ir “correndo” reflete entusiasmo juvenil, e que ele “se ajoelhou” indica sinceridade (Mc.10:17). Sua atitude estava em destacado contraste com a dos fariseus, que haviam chegado havia pouco e “experimentavam” Jesus (ver Mt.19:3). Esse incidente e a instrução dada posteriormente aos discípulos (v. Mt.19:23-30) ensinam, primeiramente, a importância da renúncia própria como requisito para a entrada no reino dos céus (ver com. de Lc.9:61-62; Lc.14:26-28; Lc.14:33) e, depois, o perigo do amor ao dinheiro (ver com. de Mt.6:19-12; Lc.12:13-21; Lc.16:1-15).

Bom Mestre (ARC). Literalmente, “bom professor” (ver com. do v. Mt.19:17).

Que farei eu de bom [...]? Esta questão reflete o típico conceito farisaico de justiça pelas obras como passaporte para a “vida eterna” (ver com. do v. Mt.19:17). O jovem rico tinha cumprido conscienciosamente todos os requisitos da lei (PJ, 391), pelo menos de maneira formal, e também todos aqueles impostos pelos rabinos, mas estava consciente de que algo faltava em sua vida. Ele admirava Jesus e pensava seriamente em se tornar um de Seus discípulos (DTN, 518; sobre a mesma pergunta feita por um intérprete da lei, ver com. de Lc.10:25).

Mt.19:17 17. Respondeu-lhe Jesus: Por que me perguntas acerca do que é bom? Bom só existe um. Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos.

Por que perguntas [...]? Evidentemente, a maneira pela qual o jovem se dirigiu a Jesus era bastante incomum (cf. Jo.3:2). Não parece haver nenhum registro na literatura rabínica em que os rabinos tenham sido tratados como “bons”. Em contraste, na Mishnah, o próprio Deus é mencionado como “o que é bom e concede o bem”. A situação do jovem na vida e seu ofício de confiança do público (ver com. de Mt.19:16) indicam que ele não chamou Jesus de “bom Mestre” por ignorância ou descuido. Era óbvio que ele tinha um motivo para fazê-lo, e Jesus tentou extrair dele uma declaração pública desse motivo. A explicação de Jesus: “Bom só existe um” procurava ajudar o jovem a perceber claramente a importância de sua saudação. Jesus reconheceu a sinceridade e o discernimento do rapaz e pensou em fortalecer sua fé, recebendo dele uma declaração ainda mais clara.

Bom só existe um. A suprema bondade é uma característica de Deus, unicamente (Ex.34:6; Sl.23:6; Sl.27:13; Sl.31:19; Sl.52:1; Rm.2:4). Jesus não repudiou Sua divindade, como poderia parecer à primeira vista, mas, sim, esclareceu e enfatizou o significado completo da declaração do moço.

Entrar na vida. Equivalente à expressão “entrar no reino dos céus” (Mt.5:20). Tendo em vista o fato de que Jesus inclui tanto esta vida como a vida por vir em suas observações sobre as recompensas do discipulado (cf. Mt.19:29; Mc.10:30; Lc.18:30), pode ser apropriado concluir que tanto o reino da graça como o reino da glória estão incluídos aqui.

Mandamentos. Do gr. entolai, “preceitos”, “ordens”, “incumbências” ou “mandamentos” (cf. com. de Sl.19:8). Os entolai são os requisitos específicos, individuais ou mandamentos, impostos aos homens, pela “lei”, gr. nomos (cf. com. de Sl.19:7; Pv.3:1). É da vontade de Deus que as pessoas reflitam Seu caráter, o que pode ser resumido em uma palavra: “amor” (1Jo.4:7-12). Para refletir o caráter, ou o “amor” de Deus, devemos amá-Lo supremamente e ao nosso próximo como a nós mesmos (ver com. de Mt.22:37; Mt.22:39). Se perguntarmos como devemos expressar nosso amor para com Deus e os semelhantes, Deus nos dá a resposta nos dez mandamentos (ver Ex.20:3-17), que Cristo explicou e exaltou (ver com. de Is.42:21) no Sermão do Monte (cf. Mt.5:17-48). Todas as leis civis de Moisés no AT, e as instruções de Cristo e dos apóstolos no NT esclarecem as exigências divinas estabelecidas nos dez mandamentos e as aplicam aos problemas práticos da vida diária. O jovem professava amar a Deus, mas o verdadeiro teste desse amor, disse Jesus, deveria ser encontrado em seu trato com os semelhantes (ver 1Jo.4:20). “Se Me amais”, diz Jesus, “guardareis os Meus mandamentos” (Jo.14:15).

Mt.19:18 18. E ele lhe perguntou: Quais? Respondeu Jesus: Não matarás, não adulterarás, não furtarás, não dirás falso testemunho

Quais? Em resposta a essa pergunta, Jesus citou especificamente vários dos dez mandamentos, tratando dos relacionamentos com o semelhante. Sem dúvida, aos olhos dos homens, o jovem rico era honesto, mas, aos olhos de Deus, que lê o coração, ele não tinha de fato em mente os interesses de seus semelhantes (ver com. dos v. Mt.19:19-20).

Mt.19:19 19. honra a teu pai e a tua mãe e amarás o teu próximo como a ti mesmo.

Amarás o teu próximo. Isto resume todos os “mandamentos” a que Jesus Se referia aqui (ver com. de Mt.22:39-40). Embora o jovem ainda não percebesse, esses preceitos de conduta iam ao cerne de seu problema. Ele não amava tanto os outros quanto a si mesmo. No entanto, ele sentia que tinha praticado “tudo isso”. Ele tinha observado a letra da lei, mas não seu espírito, e considerava que vivia em harmonia com seus princípios. Jesus tentou abrir os olhos do rapaz para o fato de que os princípios da lei devem ser aplicados conscienciosamente a todas as relações práticas da vida.

Mt.19:20 20. Replicou-lhe o jovem: Tudo isso tenho observado; que me falta ainda?

Desde a minha mocidade (ARC). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a omissão desta frase. O jovem sentia sinceramente que tinha “observado” os mandamentos, todos eles, e não estava consciente de qualquer imperfeição (DTN, 519).

Que me falta ainda? Aparentemente, o rapaz estava confiante de que havia apenas um passo entre ele e a perfeição. Mas, embora tivesse obedecido diligentemente à letra da lei, ele ainda sentia que isso não era o suficiente. Ele sentia que faltava algo, mas ele sinceramente não sabia o que era. Sua vida tinha sido de pureza, honestidade e veracidade. Mas sua atitude para com os semelhantes tinha sido essencialmente negativa: ele não havia roubado seus bens, não tinha dado falso testemunho contra eles, não tinha tirado sua esposa ou sua vida. É verdade que a letra da lei é negativa na forma, mas seu espírito pede ação positiva. Não é suficiente evitar nutrir ódio ou ferir nossos semelhantes: o evangelho nos convida a amá-los e ajudá-los como amamos a nós mesmos. Esse jovem não tinha o amor de Deus no coração (ver DTN, 519), sem o qual a observância de todas essas coisas não tinha nenhum valor real aos olhos de Deus.

Mt.19:21 21. Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu; depois, vem e segue-me.

Perfeito. Ver com. de Mt.5:48. Jesus reconheceu que o jovem realmente era sincero e sabia o que estava envolvido na pergunta: “Que me falta ainda?”. A perfeição tinha sido o ideal do moço. Mas, como Paulo salienta, a perfeição não pode ser alcançada pelas obras (ver Gl.2:21; Hb.7:11). Se, portanto, o jovem queria atingir a perfeição, ele não devia esperar obtê-la pela realização de obras meritórias. Ele devia passar por uma completa mudança de coração e vida. Sua mente devia ser transformada, seus objetivos, mudados.

Vai, vende. Em um caráter que de outra forma parecia amável (Mc.10:21), um grave defeito permanecia: o egoísmo. A menos que a influência maligna do egoísmo fosse removida, o jovem rico não poderia alcançar nenhum progresso rumo à perfeição. A doença pode variar de pessoa para pessoa, e o remédio pode, portanto, variar também. Quando Pedro, André, Tiago e João foram chamados para seguir o Mestre, Ele não lhes pediu que vendessem seus barcos e equipamentos de pesca, pelo motivo de que essas coisas não eram um obstáculo para que eles O seguissem. No entanto, quando chamados, “deixaram tudo” a fim de poderem seguir o Mestre (ver com. de Lc.5:11). Aquilo que a pessoa ama mais do que a Cristo torna-a indigna de Cristo (ver com. de Mt.10:37-38). Até mesmo as mais importantes responsabilidades terrenas estão em segundo lugar na tarefa de seguir a Cristo no caminho do discipulado (ver com. de Lc.9:61-62). Paulo considerou tudo como “perda”, a fim de “ganhar a Cristo” (Fp.3:7-10). Para garantir a posse do tesouro celestial ou para comprar a pérola de grande valor (ver com. de Mt.13:44-46), a pessoa deve estar pronta para vender “tudo o que tem”. Mas isso, o jovem rico não estava disposto a fazer. Diante dele estava sua cruz, mas ele se recusou a levá-la.

Os teus bens. Literalmente, “teus pertences”.

Tesouro nos céus. Ver com. de Mt.6:19-21. Jesus apresentou ao rapaz a escolha entre o tesouro terrestre e o celestial. Mas o jovem queria os dois e, quando descobriu que não poderia ter os dois, “retirou-se triste” (Mt.19:22). A dolorosa descoberta de que não poderia servir a Deus e a Mamom (ver com. de Mt.6:24) foi demais para ele.

Vem e segue-Me. Ver com. de Lc.5:11.

Mt.19:22 22. Tendo, porém, o jovem ouvido esta palavra, retirou-se triste, por ser dono de muitas propriedades.

Triste. Literalmente, “pesaroso” ou “ofendido”. Seu desapontamento foi grande quando percebeu o sacrifício exigido. A ansiosa alegria com a qual ele havia corrido até Jesus (ver com. do v. Mt.19:16) se transformou em tristeza e escuridão. O preço da “vida eterna” (v. Mt.19:16) que o jovem tinha ido buscar, era maior do que ele estava disposto a pagar.

Muitas propriedades. Suas posses constituíam a coisa mais importante de sua vida. Eram seu ídolo e, nesse relicário, ele escolheu depositar a adoração e a devoção de seu coração. Foi para libertá-lo das garras do deus da riqueza que Jesus propôs que ele vendesse tudo o que tinha. Essa era sua única esperança de alcançar o Céu (DTN, 520). Ele tinha grandes posses, mas, sem sabedoria celestial para administrá-las corretamente, ele descobriria que eram mais uma maldição do que uma bênção. Posteriormente, ele perderia até mesmo o que tinha (ver com. de Mt.25:28-30).

Mt.19:23 23. Então, disse Jesus a seus discípulos: Em verdade vos digo que um rico dificilmente entrará no reino dos céus.

Disse a Seus discípulos. [O perigo das riquezas, Mt 19:23-30 = Mc.10:23-41 = Lc.18:24-30]. O jovem se afastou, enquanto Jesus e os discípulos continuaram em seu caminho.

Um rico. Ver com. de Mt.13:7. É difícil um rico entrar no reino dos céus, não porque é rico, mas por causa de sua atitude para com as riquezas (ver com. de Lc.12:15; Lc.12:21). Abraão era “muito rico” (Gn.13:2) e, ao mesmo tempo, “amigo de Deus” (Tg.2:23). Para o jovem rico, a porta que Jesus apontou pela qual ele poderia “entrar na vida” (Mt.19:17) era muito “estreita”, e o “caminho” pelo qual deveria passar a caminhar, muito “apertado” (ver com. de Mt.7:13-14). Os discípulos tiveram a oportunidade de testemunhar um exemplo de como é difícil para alguém cujo coração está nas riquezas entrar no reino dos céus. Quantas pessoas corretas Satanás prende com sucesso a este mundo pela teia das riquezas!

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:2; Lc.4:19.

Mt.19:24 24. E ainda vos digo que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus.

Camelo. Jesus trata de uma impossibilidade humana, como afirma claramente (v. Mt.19:26). A verdade declarada foi precisamente o oposto do que as pessoas, mesmo os discípulos, criam (ver com. do v. Mt.19:25). Os fariseus pensavam e ensinavam que a riqueza constituía uma prova do favor divino (ver com. de Lc.16:14). Quando Jesus discutiu as riquezas nessa ocasião, Ele podia ter tido em mente particularmente Judas Iscariotes, que, por amor ao dinheiro, estava prestes a vendê-Lo (Jo.12:6; Jo.13:29). O problema de Judas era fundamentalmente o mesmo que o do jovem rico (ver com. de Mc.3:19).

Fundo de uma agulha. Há uma explicação de que o “fundo de uma agulha” se refere a um portão menor aberto em um grande portão da cidade, pelo qual as pessoas poderiam passar quando a grande porta fosse fechada para o tráfego principal. Contudo, essa explicação se originou séculos depois da época de Cristo. Não existe, portanto, base válida para essa explicação, por mais plausível que pareça. Jesus estava lidando com impossibilidades (v. Mt.19:26), e não há nenhum proveito em maquinar uma explicação pela qual tornar possível o que Jesus apontou especificamente como impossível.

Do que entrar um rico. Ver com. de Lc.12:15; Lc.12:21. Em contraste com o possuidor habitual das riquezas, Mateus abandonou as riquezas a fim de seguir o Mestre (ver com. de Mc.2:13-14) e Zaqueu, outro rico coletor de impostos, transferiu suas afeições das riquezas para Jesus (ver com. de Lc.19:2; Lc.19:8).

Mt.19:25 25. Ouvindo isto, os discípulos ficaram grandemente maravilhados e disseram: Sendo assim, quem pode ser salvo?

Maravilhados. Os falsos conceitos dos discípulos a respeito da natureza do reino dos céus (ver com. de Lc.4:19) e sobre as riquezas como sinais do favor divino (ver com. de Lc.16:14) os deixou muito intrigados com essa declaração categórica.

Quem pode ser salvo? Se prestígio, influência e riquezas não são evidências do favor divino, os discípulos arrazoavam, aqueles que não têm esses recursos têm ainda menores chances.

Mt.19:26 26. Jesus, fitando neles o olhar, disse-lhes: Isto é impossível aos homens, mas para Deus tudo é possível.

Fitando neles o olhar. Ou seja, Jesus provavelmente observou a expressão de espanto no rosto dos discípulos.

Isto é impossível. É impossível a um rico entrar no Céu mediante esforço humano, porque ele não tem os meios de se libertar das garras do amor às riquezas em seu coração. Para esse assunto, a salvação é impossível a qualquer pessoa, com base em seus próprios esforços. Só o milagre da graça divina será suficiente para salvar um rico do amor supremo das riquezas ou qualquer outra pessoa do pecado em particular que a assedia (cf. Hb.12:1).

Tudo é possível. Isto é, para aquele que está disposto a permitir que Deus controle sua vida (ver Fp.4:13). Só o poder de Deus operando na vida pode realizar essa transformação de caráter necessária para a entrada no reino dos céus.

Mt.19:27 27. Então, lhe falou Pedro: Eis que nós tudo deixamos e te seguimos; que será, pois, de nós?

Então [...] Pedro. Como ocorria frequentemente, Pedro se adiantou como porta-voz dos discípulos (ver com. de Mt.16:16; Mt.17:4).

Nós tudo deixamos. Pedro não exagerou o caso (ver com. de Lc.5:11). Os discípulos haviam cumprido a exigência que acabava de ser apresentada ao jovem rico (ver com. de Mt.19:21). Eles haviam feito o que ele não estava disposto a fazer. Estavam bem no caminho da perfeição de que Jesus falava? Estavam qualificados para “entrar na vida” (v. Mt.19:17)?

Que será [...] de nós? Os pensamentos de Pedro estavam na recompensa do discipulado. A abnegação praticada com um olho voltado na direção da esperada recompensa nunca merecerá o “bem está” que o Céu espera conferir ao servo fiel (Mt.25:21; Mt.25:23).

Mt.19:28 28. Jesus lhes respondeu: Em verdade vos digo que vós, os que me seguistes, quando, na regeneração, o Filho do Homem se assentar no trono da sua glória, também vos assentareis em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Regeneração. Ou, “renovação”. Aqui, Jesus Se refere à “regeneração”, ou “renovação”, deste mundo, isto é, a Terra em seu estado recriado (ver Is.5:17; 2Pe.3:13; Ap.21:1).

Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Trono da Sua glória. Ou, “Seu trono glorioso” (ver com. de Mt.16:27; Mt.25:31).

Doze tronos. Eles reinariam com Jesus (ver 2Tm.2:12; Ap.3:21; Ap.20:6).

Mt.19:29 29. E todo aquele que tiver deixado casas, ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe [ou mulher], ou filhos, ou campos, por causa do meu nome, receberá muitas vezes mais e herdará a vida eterna.

Deixado casas. Os discípulos tinham abandonado a casa e a família a fim de seguir Jesus (ver com. de Lc.5:11), não no sentido de deixar a família em indigência, mas, sim, no sentido de tornar o serviço de Cristo seu objetivo primordial. Pouco antes, Jesus havia afirmado essa exigência do discipulado em termos ainda mais fortes (ver com. de Lc.14:26).

Por causa do Meu nome. Ver com. de Mt.5:11.

Muitas vezes. Ou, “cem vezes” (ARC, comparar com Jó.42:10; Lc.18:30). Obviamente, Jesus estava falando em linguagem figurada. Cerca de um ano e meio antes, Jesus havia observado que aqueles que fazem a vontade do Pai que está nos céus são Sua “mãe”, “irmã” e “irmão” (cf. Mt.12:46-50, ARC). Os “cem” que os cristãos recebem nesta vida são a alegria da comunhão cristã e a satisfação mais real e intensa que vem com o serviço a Deus. Paulo fala de “nada tendo, mas possuindo tudo” (2Co.6:10).

A vida eterna. Ver com. de Jo.3:16; Jo.6:27. Quando alguém abandona tudo para seguir a Cristo, recebe em troca “eterno peso de glória, acima de toda comparação” (2Co.4:17). Da mesma forma, foi isso que Jesus fez a fim de possibilitar o plano de salvação (Fp.2:6-8).

Mt.19:30 30. Porém muitos primeiros serão últimos; e os últimos, primeiros.

Primeiros serão últimos. Ver com. de Lc.13:30. Muitos dos que, como o jovem rico, tinham toda a aparência de ser os primeiros a entrar no Céu, seriam realmente os últimos. A declaração de Mt.19:30 forma um elo entre o incidente, a discussão posterior registrada nos v. Mt.19:23-29 e a parábola dos trabalhadores na vinha (Mt.20:1-16). Note-se que a mesma declaração sumária é repetida ao fim dessa parábola (v. Mt.20:16), que foi contada especificamente para ilustrar esse grande paradoxo da fé cristã. Algumas semanas depois disso, durante Seu último dia de ensino no templo, Jesus declarou aos principais dos sacerdotes e anciãos que os publicanos e as meretrizes entrariam no reino dos céus à frente deles (Mt.21:31-32). Na verdade, de todas as partes do mundo viria uma multidão de crentes humildes e fiéis, dignos de tomar “lugares à mesa no reino de Deus” (Lc.13:29), enquanto os mesmos líderes religiosos de Israel seriam “lançados fora” (v. Mt.19:28). Sucesso terreno e popularidade são baseados em padrões completamente diferentes daqueles pelos quais Deus avalia o valor de uma pessoa (sobre a inversão das condições da vida futura, ver a parábola do rico e Lázaro, no com. de Lc.16:19-31).

Mt.20:1 1. Porque o reino dos céus é semelhante a um dono de casa que saiu de madrugada para assalariar trabalhadores para a sua vinha.

Porque. [A parábola dos trabalhadores na vinha, Mt 20:1-16. Sobre as parábolas, ver p. 197-204]. A divisão entre o fim do cap. Mt.19 e o início do 20 obscurece a íntima relação cronológica e temática entre ambos. Foi a conversa de Jesus com o jovem rico (Mt.19:16-22) e Sua subsequente discussão com os discípulos que levou à narração da parábola dos trabalhadores na vinha. De fato, a parábola ilustra especificamente a verdade declarada em Mt.19:30, que é repetida no final como recurso de ênfase (Mt.20:16). Essa repetição imediatamente precedendo e seguindo a narração da parábola enfatiza a lição que a parábola pretende ensinar (ver PJ, 390). Esta parábola foi dirigida aos discípulos em resposta à pergunta: “Que será, pois, de nós?” (Mt.19:27). Sendo que tinham “abandonado tudo” para seguir Jesus, imaginavam que receberiam uma recompensa por esse sacrifício. Jesus lhes deu uma garantia de recompensa (v. Mt.19:28-29), mas também lhes avisou que, por terem sido os primeiros a segui-Lo, não deveriam esperar maiores recompensas e honras do que outros súditos do reino. Na parábola dos trabalhadores na vinha, Jesus estabelece a maneira pela qual Deus lida com aqueles que dedicam seu serviço a Ele e sobre qual é o critério para a recompensa (ver PJ, 396). A parábola ensina que eles não receberão nem mais nem menos que os outros, pois, sendo cidadãos do reino dos Céus, são todos iguais.

Reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:2; Lc.4:19.

É semelhante. Esta era uma fórmula comum de introduzir uma parábola (sobre os princípios de interpretação das parábolas, ver p. 199, 200).

Um dono de casa. Do gr. oikodespotes, ou, o “senhor da casa” (ver Lc.2:29). Neste exemplo, o “dono da casa” é o proprietário (ver Mt.20:15).

De madrugada. Do gr. hama proi (ver Mc.1:35), na aurora. Para assalariar trabalhadores. Nas regiões orientais, os diaristas ainda se reúnem nas praças, onde aguardam emprego.

Sua vinha. O profeta Isaías já havia falado de Israel como a vinha do Senhor (ver Is.5:1-7).

Mt.20:2 2. E, tendo ajustado com os trabalhadores a um denário por dia, mandou-os para a vinha.

Tendo ajustado. Nas regiões orientais, a negociação é uma parte essencial e esperada de qualquer transação envolvendo bens ou serviços (ver com. de Jo.9:4).

A um dinheiro por dia (ARC). Do gr. denarion. O denário romano era uma moeda de prata com o peso aproximado de 3,9 g (ver p. 37), mas valia muito mais do que as moedas atuais. Na época, o denário representava o salário diário normal para o trabalhador comum. A jornada de trabalho naqueles tempos era do amanhecer ao anoitecer.

Mt.20:3 3. Saindo pela terceira hora, viu, na praça, outros que estavam desocupados

Terceira hora. Por volta das 9 horas da manhã (ver p. 38).

Estavam desocupados. Ver v. Mt.20:6-7.

Na praça. Ver com. de Mt.11:16; Mc.7:4. O mercado podia estar localizado em qualquer rua de fácil acesso no povoado, na cidade, ou à porta da cidade.

Mt.20:4 4. e disse-lhes: Ide vós também para a vinha, e vos darei o que for justo. Eles foram.

O que for justo. Isto é, correto. Seria um pagamento proporcional às horas trabalhadas. Nesse exemplo, não houve negociação com nenhum dos últimos homens contratados. Não fizeram perguntas, mas aceitaram a oferta do empregador, confiando em sua promessa e em seu senso de justiça.

Mt.20:5 5. Tendo saído outra vez, perto da hora sexta e da nona, procedeu da mesma forma,

Perto da hora sexta e da nona. Ou, ao meio-dia e outra vez às 15 horas.

Mt.20:6 6. e, saindo por volta da hora undécima, encontrou outros que estavam desocupados e perguntou-lhes: Por que estivestes aqui desocupados o dia todo?

Hora undécima. Ou, por volta das 17 horas. Os homens que foram trabalhar às 17 horas deveriam trabalhar durante um período curto até que escurecesse (ver v. Mt.20:12; ver também com. do v. Mt.20:2), ou seja, na parte mais agradável do dia.

Por que estivestes aqui [...]? O contexto da parábola indica que esses homens não estiveram na praça mais cedo naquele dia com o grupo de trabalhadores contratados e, portanto, não haviam recusado o convite prévio do dono (ver PJ, 399).

Mt.20:7 7. Responderam-lhe: Porque ninguém nos contratou. Então, lhes disse ele: Ide também vós para a vinha.

Ninguém. Talvez nas últimas horas do dia, ou, possivelmente, por todo o dia.

Ide também. Ver com. do v. Mt.20:4.

Mt.20:8 8. Ao cair da tarde, disse o senhor da vinha ao seu administrador: Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando pelos últimos, indo até aos primeiros.

Ao cair da tarde. Provavelmente, ao pôr do sol ou no início da noite (ver com. do v. Mt.20:12).

O Senhor da vinha. Ou, o “proprietário” (ver com. do v. Mt.20:1).

Chama os trabalhadores. Parece que continuaram trabalhando até serem chamados pelo administrador, o homem a quem o proprietário tinha confiado a supervisão do trabalho.

Paga-lhes o salário. De acordo com o AT (ver Lv.19:13), um empregador era obrigado a acertar as contas com os trabalhadores no final de cada dia. Esta sábia disposição foi designada para ajudar a evitar que os empregadores sem escrúpulos adiassem ou evitassem o pagamento de salários.

Começando pelos últimos. Parece muito difícil crer que era costume começar o pagamento pelos últimos trabalhadores, mas esse procedimento é necessário para a Lição da parábola. Se os trabalhadores fossem pagos fora da ordem em que eles foram contratados, a insatisfação dos primeiros homens contratados provavelmente não seria tão evidente. A lição da parábola descarta a explicação sugerida por alguns de que os homens que “suportaram a fadiga e o calor do dia” não tinham trabalhado tão diligentemente quanto deveriam, e que o “senhor da vinha” procurou lhes ensinar uma lição.

Mt.20:9 9. Vindo os da hora undécima, recebeu cada um deles um denário.

Um denário. Ver com. do v. Mt.20:2.

Mt.20:10 10. Ao chegarem os primeiros, pensaram que receberiam mais; porém também estes receberam um denário cada um.

Os primeiros. Estes representam aqueles que esperam e reivindicam um tratamento preferencial, pois julgavam ter se sacrificado mais e trabalhado mais diligentemente do que seus colegas. Também representam os judeus, que haviam sido os primeiros a aceitar o chamado do Senhor para trabalhar na Sua vinha (ver PJ, 400; vol. 4, p. 13-19).

Mt.20:11 11. Mas, tendo-o recebido, murmuravam contra o dono da casa,

Murmuravam. Ou, “resmungavam”. Os discípulos, que se julgavam “os primeiros” (ver com. de Mt.18:1), sem dúvida, reconheceram que Jesus aqui Se referia a eles de certa forma como murmuradores (ver Mt.19:27; Mt.19:30). Pelo menos, eles não aceitaram o serviço na “vinha do Senhor” no espírito de confiança dos trabalhadores chamados no final do dia (ver com. de Mt.20:4).

O dono da casa. Ver com. do v. Mt.20:1.

Mt.20:12 12. dizendo: Estes últimos trabalharam apenas uma hora; contudo, os igualaste a nós, que suportamos a fadiga e o calor do dia.

Contudo, os igualaste a nós. Tendo testemunhado a generosidade do proprietário para com todos os outros trabalhadores, os homens contratados inicialmente julgavam que mereciam mais. Poderiam ter argumentado que se um homem que trabalhou “não mais do que uma hora” merecia um denário, eles mereciam 12. Eles esperavam mais porque não entendiam a base sobre a qual o pagamento para o dia de trabalho estava sendo feito (ver com. do v. Mt.20:15).

Calor. Do gr. kauson, “calor abrasador [do sol]”, ou “calor insuportável” [do vento]. O termo é usado em um sentido posterior na LXX para se referir ao forte vento oriental que sopra do deserto (ver com. de Je.18:17).

Mt.20:13 13. Mas o proprietário, respondendo, disse a um deles: Amigo, não te faço injustiça; não combinaste comigo um denário?

A um deles. Aparentemente, o porta-voz do grupo (cf. com. de Mt.19:27).

Amigo. O proprietário responde de maneira amável. Os primeiros trabalhadores o acusaram de tratá-los injustamente, mas ele explica suas ações como sendo inteiramente uma questão de generosidade, e não apenas de acertos justos (ver v. Mt.20:14-15).

Não combinaste comigo [...]? Os primeiros trabalhadores tinham entrado no acordo voluntariamente, e não havia nenhuma base válida para a reclamação. O proprietário lhe pagou o que havia sido combinado.

Mt.20:14 14. Toma o que é teu e vai-te; pois quero dar a este último tanto quanto a ti.

Toma. Literalmente, “levantem-se”.

Quero dar. Ou, “é minha vontade dar”. Aqui a palavra implica uma decisão consciente e não apenas uma intenção.

Mt.20:15 15. Porventura, não me é lícito fazer o que quero do que é meu? Ou são maus os teus olhos porque eu sou bom?

Não me é lícito [...]? O proprietário não se refere a qualquer estatuto legal, mas simplesmente pergunta: “Não é admissível que eu faça meu desejo?”

O que quero. Ou, “o que eu desejo” (ver com. do v. Mt.20:14). Evidentemente, o proprietário havia apreciado muito poder garantir a ajuda de mais ceifeiros para a colheita. A vontade do último grupo de operários de trabalhar, quando a ajuda era tão necessária, parece ter atingido um ponto sensível em seu coração. Ele considerou sua disposição de trabalhar como um favor, e então estava expressando o seu apreço por isso.

Ou são maus os teus olhos [...]? Esses homens não tinham feito mais do que concordaram em fazer e não tinham, portanto, o direito de esperar qualquer compensação especial (ver com. de Lc.17:10; sobre a expressão “olho mau”, ver com. de Mt.6:22-24).

Porque eu sou bom? Eles haviam acusado o proprietário de parcialidade e, por implicação, de injustiça. O proprietário explica que não é uma questão de justiça ou de injustiça, mas de generosidade. Tratou todos os diaristas com justiça e, caso quisesse, não poderia fazer melhor do que isso? Jesus deixa claro que não se ganha o favor divino, como os rabinos ensinavam. Os obreiros cristãos não negociam com Deus. Se Deus lidasse com os seres humanos com base na estrita justiça, ninguém se qualificaria para a infinita generosidade do Céu e da eternidade. Não é a cultura, a posição, o talento, a quantidade de tempo ou de trabalho, com resultados visíveis, que contam à vista de Deus, mas o espírito de disposição com que desempenhamos as tarefas que nos foram designadas (ver PJ, 397) e a fidelidade com que as realizamos (ver PJ, 402).

Mt.20:16 16. Assim, os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos [porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos].

Os últimos serão os primeiros. Ver com. de Mt.19:30; Mt.20:1.

Muitos são chamados. Ver com. de Mt.22:14. A evidência textual favorece (cf. p. 136) a omissão destas palavras e do restante do versículo.

Mt.20:17 17. Estando Jesus para subir a Jerusalém, chamou à parte os doze e, em caminho, lhes disse:

Para subir a Jerusalém. [Jesus ainda outra vez prediz Sua morte e ressurreição, Mt 20:17-19 = Mc.10:32-34 = Lc.18:31-34. Comentário principal: Mt]. Repetidas vezes os evangelhos falam de Jesus ao subir a Jerusalém em sua partida final da Galileia (ver com. de Mt.19:1-2; Lc.9:51). Durante esses últimos meses de Sua estada na Terra, Jesus esteve várias vezes em Jerusalém e na Judeia, mas dedicou a maior parte do Seu ministério às regiões de Samaria e da Pereia. Desta vez foi, provavelmente, no final de março ou no começo de abril do ano 31 d.C. em que Ele chegou a Betânia, na sexta-feira, antes da Páscoa (ver Jo.12:1; DTN, 557). Sem dúvida, ao longo do caminho, antes de chegar a Jericó, é que ocorreram os incidentes de Mt.20:17-28. Do vale do Jordão que, naquele ponto, ficava aproximadamente a mil e 300 metros abaixo do nível do mar Mediterrâneo, ir a Jerusalém era literalmente “subir” mais de 750 metros acima do nível do mar (ver com. de Mc.10:46; Lc.10:30). Porém, não era apenas no sentido geográfico que os judeus falavam em “subir a Jerusalém”. A expressão também indica Jerusalém como o centro da vida nacional judaica, o lugar em que procuravam liderança política e espiritual. Como era um curto período antes do início da Páscoa, todas as estradas que “subiam a Jerusalém”, sem dúvida, estavam lotadas de peregrinos convergindo para a cidade, a fim de participar das cerimônias ligadas àquela ocasião importante.

Chamou. Jesus caminhou adiante dos discípulos, sozinho, e Sua conduta os encheu de espanto e temor (ver DTN, 547; ver com. de Mc.10:32). O relato em Marcos é mais detalhado e visual do que o de Mateus.

À parte. Ou, à parte de outros viajantes que faziam sua peregrinação a Jerusalém e, provavelmente, à parte também dos outros discípulos, além dos doze, que, sem dúvida, acompanhavam Jesus a Jerusalém. A instrução dada naquele momento era somente para o círculo íntimo dos discípulos. Mas até os doze, depois de repetida a instrução (ver com. de Lc.18:31), falharam em compreender que o Messias deveria morrer pelos pecados.

Mt.20:18 18. Eis que subimos para Jerusalém, e o Filho do Homem será entregue aos principais sacerdotes e aos escribas. Eles o condenarão à morte.

Eis que subimos para Jerusalém. Ver com. do v. Mt.20:17.

O Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Será entregue. Nos registros de Mateus, esta foi a terceira tentativa feita por Jesus de informar os doze sobre Seu sofrimento e morte (ver Mt.16:21; Mt.17:22-23; Mc.8:31; Mc.9:31; Mc.10:32-34). Lucas relata as mesmas três ocasiões (ver Lc.9:22; Lc.9:44; Lc.18:31-33), mas também menciona três outros exemplos não registrados por Mateus ou Marcos (Lc.12:50; Lc.13:33; Lc.17:25). Os últimos três são referências incidentais ao sofrimento e morte de Cristo do que ocasiões, principalmente dedicadas primariamente a esse assunto, e ocorreram no tempo do ministério na Pereia, registrado apenas por Lucas (ver com. de Mt.18:31).

Principais sacerdotes. Ver com. de Mt.2:4.

Escribas. Ver p. 39, 43.

Eles O condenarão à morte. Os líderes judaicos estavam planejando assassinar Jesus, desde a cura do paralítico no tanque de Betesda, dois anos antes, e haviam designado espiões para segui-Lo aonde fosse (ver com. de Jo.5:18; DTN, 213). O sucesso da missão de Cristo na Galileia os levou a intensificar esses esforços (ver com. de Lc.5:17). Depois disso, eles se tornaram mais agressivos em seus frequentes ataques públicos (ver com. de Mt.15:21; Mt.16:1; Mc.7:1-2). Nos últimos meses, durante o ministério na Pereia, eles haviam feito várias tentativas de prendê-Lo e matá-Lo (ver com. de Mt.19:3). Seus planos, por fim, tomavam uma forma mais definida, particularmente depois da ressurreição de Lázaro, poucas semanas antes.

Mt.20:19 19. E o entregarão aos gentios para ser escarnecido, açoitado e crucificado; mas, ao terceiro dia, ressurgirá.

E O entregarão. Pela primeira vez, Jesus menciona o fato de que os gentios, as autoridades romanas, serviriam de instrumento em Sua morte.

Crucificado. Três anos antes, Jesus dissera a Nicodemos que Ele devia ser “levantado”, implicando, assim, a crucifixão (ver com. de Jo.3:14). Então, pela primeira vez, Ele anunciou como morreria.

Terceiro dia. Ver p. 246-248.

Mt.20:20 20. Então, se chegou a ele a mulher de Zebedeu, com seus filhos, e, adorando-o, pediu-lhe um favor.

Então, se chegou a Ele. [O pedido da mãe de Tiago e João, Mt 20:20-28 = Mc.10:35-45. Comentário principal: Mt]. Este incidente inoportuno está intimamente ligado aos versículos precedentes (v. Mt.20:17-19). A mãe dos irmãos se dirigiu a Jesus com seu pedido para que seus filhos fossem os primeiros no reino, logo após Jesus descrever as circunstâncias de Sua morte próxima! Aqui, o egoísmo que move o coração humano se revela em perfeito contraste com o amor generoso de Deus. Talvez fosse a reflexão sobre o anúncio de que os doze se sentariam nos doze tronos “quando o Filho do Homem Se assentar no trono de Sua glória” (Mt.19:28), que impeliu a mãe de Tiago e João a pedir para os filhos os tronos próximos ao de Jesus.

Com seus filhos. Ou seja, os irmãos Tiago e João (ver Lc.5:10). A mãe de ambos, provavelmente, Salomé (ver Mt.27:56; Mc.15:40; Mc.16:1), que pode ter sido a irmã de Maria, a mãe de Jesus (ver com. de Jo.19:25). Ela fazia parte do grupo de mulheres que acompanhavam Jesus e os discípulos em suas viagens e cuidava de suas necessidades (ver Lc.8:1-3; cf. DTN, 548). Marcos especificamente menciona que Tiago e João apresentaram seu pedido a Jesus pessoalmente (Mc.10:35), enquanto Mateus omite seus nomes, mas declara que a mãe deles fez o pedido. Essa mãe incentivou os filhos em sua ambição e os acompanhou quando foram a Jesus (ver DTN, 548). Aparentemente, ela iniciou o assunto (ver Mt.20:20) e os irmãos falaram em seu próprio favor (Mc.10:35; ver com. de Mt.20:22).

Adorando-O. Ver Mt.8:2; Mt.15:25.

Mt.20:21 21. Perguntou-lhe ele: Que queres? Ela respondeu: Manda que, no teu reino, estes meus dois filhos se assentem, um à tua direita, e o outro à tua esquerda.

Que queres? Ou, “o que desejas?” Aqui Jesus Se dirige à mãe, talvez por respeito, embora os dois discípulos também estivessem com ela.

À Tua direita. O pedido se referia às duas maiores posições de honra e privilégio.

No Teu reino. Em Marcos se encontra, “na Tua glória” (Mc.10:37), em paralelo com a expressão “no trono da Sua glória” (Mt.19:28; sobre a natureza do reino de Cristo, ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:2; Lc.4:19).

Mt.20:22 22. Mas Jesus respondeu: Não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cálice que eu estou para beber? Responderam-lhe: Podemos.

O que pedis. Literalmente, “o que pedis para vós mesmos”. O uso do plural “vós” torna evidente que Tiago e João também haviam falado em favor próprio (ver com. do v. Mt.20:20).

O cálice. Uma expressão figurativa para o cálice de sofrimento que Jesus devia beber no jardim no Getsêmani, em Seu sofrimento e na cruz (ver Mt.26:39; Mc.14:36; Lc.22:42; Jo.18:11). O “cálice” é um símbolo bíblico comum para sofrimento e castigo (ver Is.51:17; Je.49:12; Lm.4:21; ver com. do Sl.11:6; Sl.16:5).

Ser batizados (ARC). Do gr. baptizo. Ver com. de Mt.3:6. Aqui, é óbvio que a palavra é usada figurativamente. Assim como o cálice representa os sofrimentos de Jesus, o “batismo” representa Sua morte (ver Rm.6:3-4; ver com. de Lc.12:50).

Podemos. Tiago foi o primeiro dos doze a ser martirizado (ver At.12:2), mas seu irmão João viveu além de todos os discípulos (ver AA, 542, 569).

Mt.20:23 23. Então, lhes disse: Bebereis o meu cálice; mas o assentar-se à minha direita e à minha esquerda não me compete concedê-lo; é, porém, para aqueles a quem está preparado por meu Pai.

Não Me compete. Em vez de reprovar abertamente a audácia da mãe dos dois irmãos, Jesus lida com eles de modo indireto. É provável que os três tenham falado com Jesus em particular.

A quem está preparado. No reino dos céus não se ganha ou se obtém posição por influência. Ela é concedida somente com base na idoneidade, que é avaliada pelo espírito de serviço em favor dos outros (ver com. de Mt.20:15). São os vencedores que serão convidados a se assentarem com Cristo em Seu trono (ver Nota Adicional a Apocalipse 3; Ap.3:22).

Meu Pai. Como homem dentre os homens, Jesus não exercitou Suas prerrogativas reais (ver com. de Jo.1).

Mt.20:24 24. Ora, ouvindo isto os dez, indignaram-se contra os dois irmãos.

Indignaram-se. Os dez discípulos sentiram que Tiago e João estavam procurando obter vantagem sobre eles, talvez devido ao relacionamento que tinham com Jesus (ver com. do v. Mt.20:20).

Mt.20:25 25. Então, Jesus, chamando-os, disse: Sabeis que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles.

Governadores. Esta não foi a primeira vez que Jesus instruiu Seus discípulos sobre a humildade e o serviço (ver com. de Mt.18:1; Mt.18:3; Mc.9:35).

Exercem autoridade. Literalmente, “governar”, ou “exercer domínio”. A autoridade terrena funciona com base na força e, de fato, não poderia ser de outro modo.

Mt.20:26 26. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva

Não é assim. Na Terra, homens em posições de autoridade tendem a “exercer domínio” sobre aqueles que estão abaixo deles. Porém, entre os cidadãos do reino celestial, poder, posição, talento e educação devem ser devotados exclusivamente a serviço dos outros e jamais devem ser usados como alavancas para dominar.

Quem quiser tornar-se grande. Ver com. de Mc.9:35. Aquele que quiser ser o maior deverá servir aos outros do modo mais desprendido possível. A aprovação de Jesus talvez repouse sobre o desejo de “ser grande” em termos de servir ao invés de dominar.

Sirva. Do gr. diáconos, “mordomo”, “servo”, ou “diácono” (ver com. de Mc.9:35).

Mt.20:27 27. e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo

Servo. Do gr. doulos, “criado” ou “escravo”.

Mt.20:28 28. tal como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos.

Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10. A vida de Jesus, sem dúvida, foi de serviço. Durante Seu ministério, Ele não tirou vantagem de nenhum de Seus privilégios comumente reivindicados pelos rabinos. Ele não tinha propriedades e jamais exerceu poder divino em vantagem própria.

Vida. Do gr. psyche (ver com. de Mt.10:28).

Em resgate. Do gr. lutron, “resgate”, “expiação”, ou “recompensa”. O termo lutron era usado nos papiros que continham o preço pago por um escravo para libertá-lo. Também é usado para o dinheiro pago pela remissão de um voto. O verbo relacionado, lutroo é traduzido por “redimir” ou “redimido” (ver Lc.24:21; Tt.2:14; 1Pe.1:18). Pela primeira vez, Jesus fez uma declaração inequívoca sobre a natureza vicária de Sua morte. Esse aspecto de Seu supremo sacrifício foi expresso claramente pelo profeta Isaías mais de sete séculos antes (ver com. de ls.53:4-6). É verdade que houve um aspecto exemplar em relação à morte de Cristo, mas foi muito mais do que isso. Foi primeiramente e acima de tudo mais uma morte substitutiva. Se fosse de outro modo, Jesus não teria poder para salvar a humanidade de seus pecados (ver com. de Mt.1:21; ver Fp.2:6-8). Não há base nenhuma, portanto, para a sugestão de alguns de que Jesus pagou um “resgate” a Deus ou ao diabo,

Mt.20:29 29. Saindo eles de Jericó, uma grande multidão o acompanhava.

Saindo eles. [A cura de dois cegos de Jericó, Mt 20:29-34 = Mc.10:46-52 = Lc.18:35-43. Comentário principal: Mc. Ver mapa, p. 220; gráfico, p. 228].

Mt.20:30 30. E eis que dois cegos, assentados à beira do caminho, tendo ouvido que Jesus passava, clamaram: Senhor, Filho de Davi, tem compaixão de nós!

Sem comentário para este versículo.

Mt.20:31 31. Mas a multidão os repreendia para que se calassem; eles, porém, gritavam cada vez mais: Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de nós!

Sem comentário para este versículo.

Mt.20:32 32. Então, parando Jesus, chamou-os e perguntou: Que quereis que eu vos faça?

Sem comentário para este versículo.

Mt.20:33 33. Responderam: Senhor, que se nos abram os olhos.

Sem comentário para este versículo.

Mt.20:34 34. Condoído, Jesus tocou-lhes os olhos, e imediatamente recuperaram a vista e o foram seguindo.

Sem comentário para este versículo.

Mt.21:1 1. Quando se aproximaram de Jerusalém e chegaram a Betfagé, ao monte das Oliveiras, enviou Jesus dois discípulos, dizendo-lhes:

Quando se aproximaram de Jerusalém. [A entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, Mt 21:1-11 = Mc.11:1-11 = Lc.19:28-40 = Jo.12:12-15. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 221; gráfico, p. 230]. Era o domingo (ver DTN, 569) antes da Páscoa, que caiu na sexta-feira em 31 d.C. (ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75). Jesus havia chegado a Betânia, a cerca de três quilômetros de Jerusalém, na sexta-feira precedente e havia descansado no sábado. Foi durante essa visita que Simão recebeu Jesus e Lázaro (ver DTN, 557, 558; ver com. de Mt.26:6). O relato de João apresenta essa sequência de eventos (ver Jo.12:1-19). Os quatro evangelhos registram a entrada triunfal, sendo este o primeiro incidente mencionado pelos quatro desde a multiplicação que alimentou as cinco mil pessoas. O relato da entrada triunfal é dado de forma bem simples por João e é descrito de modo mais extenso por Lucas. Os detalhes fornecidos pelos quatro evangelistas variam de escritor para escritor, indicando narrativas separadas, porém complementares. Os preparativos para a entrada triunfal começaram aparentemente à tarde, pois foi aproximadamente por volta das 15h que Jesus chegou ao monte das Oliveiras e contemplou Jerusalém. Ali, os eventos alcançaram seu ponto culminante (ver DTN, 571). Ele chegou ao templo muito mais tarde.

Betfagé. Especificamente nada se sabe sobre a localização desta aldeia. Sem dúvida, ficava na encosta leste do monte das Oliveiras e, provavelmente, não muito longe de Betânia (ver Mc.11:1; Lc.19:29). O nome é aramaico e significa “casa dos figos verdes”.

Monte das Oliveiras. Uma elevação montanhosa baixa situada a leste de Jerusalém, separada pelo vale de Cedrom. O monte se eleva cerca de 820 m acima do nível do mar, em média, 76 m mais alto do que Jerusalém e 90 m mais alto do que o platô do templo. Algumas vezes, essa elevação é chamada de Olivete (ver 2Sm.15:30; At.1:12), cujo nome deriva do latim da Vulgata. O Getsêmani ficava ao pé ou próximo ao lado oeste do monte das Oliveiras, oposto a Jerusalém (ver Mt.26:30; Mt.26:36). Esta é a primeira menção ao monte das Oliveiras em conexão com a vida de Jesus, embora, sem dúvida, Ele tenha passado a noite ali em visitas anteriores a Jerusalém (ver ilustração, p. 550).

Enviou Jesus. Embora no passado Jesus tivesse tomado todas as precauções para evitar qualquer demonstração popular que O identificasse como o Messias (ver com. de Mt.14:22; Mc.1:25; Jo.6:15), por fim, Ele não somente encoraja isso, mas toma a iniciativa de Se revelar como tal. Com certeza, os discípulos e muitos dentre o povo esperavam que Jesus estabelecesse o Seu reino na Páscoa (ver Mt.20:20-21). Os discípulos poderiam ter ficado surpresos, de certo modo, por Jesus ter modificado a Sua atitude anterior em relação a Sua publicidade. Esse comportamento diferente deve ter enchido os discípulos de grande entusiasmo e esperança. Eles não compreenderam o verdadeiro significado do evento até depois da ressurreição (ver Jo.12:16).

Dois discípulos. Nenhum dos evangelhos identifica quem são esses dois.

Mt.21:2 2. Ide à aldeia que aí está diante de vós e logo achareis presa uma jumenta e, com ela, um jumentinho. Desprendei-a e trazei-mos.

A aldeia diante de vós. Jesus e os discípulos haviam descansado durante o sábado em Betânia. Provavelmente isto tenha ocorrido no final da manhã de domingo (ver com. do v. Mt.21:1). Possivelmente, a “aldeia diante de vós” se refira a Betfagé, aparentemente não muito longe de Betânia.

Que aí está. As instruções que Jesus dá aqui são explícitas, e Marcos as registra com mais detalhes do que os outros três evangelistas.

Achareis presa uma jumenta. Marcos acrescenta que eles, de fato, encontraram o animal “amarrado junto ao portão do lado de fora na rua” no encontro de dois caminhos (ver com. de Mc.11:4).

Um jumentinho. Como parte das instruções de Jesus, Marcos acrescenta em relação ao jumentinho a informação “o qual ainda ninguém montou” (Mc.11:2), um detalhe observado também por Lc.19:30.

Trazei-Mos. Os dois animais não deviam se separar. Não é explicado nem fica claro o motivo pelo qual ambos os animais deviam ser levados, já que Jesus iria montar somente o jumentinho (ver Mc.11:7; ver com. de Mt.21:5). O propósito pode ter sido tornar a profecia de Zc.9:9 mais vívida para aqueles que contemplariam seu cumprimento.

Mt.21:3 3. E, se alguém vos disser alguma coisa, respondei-lhe que o Senhor precisa deles. E logo os enviará.

Se alguém vos disser. Lucas observa que “os donos” perguntaram sobre o motivo por que os discípulos estavam soltando os animais para levá-los (ver Lc.19:33).

Senhor. Do gr. kurios (ver com. de Lc.2:29). Esta é a primeira vez que Jesus Se refere a Si mesmo como kurios, “Senhor”. Até aquele momento, Sua designação usual era “Filho do Homem” (ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10).

Precisa deles. Pode parecer estranho que Jesus não tenha instruído os dois discípulos a pedir para usar os animais, e sim se apossar deles. No entanto, deve-se lembrar de que, nesta ocasião, Jesus assumiu o papel de Rei de Israel (ver com. do v. Mt.21:1). Ele Se referiu a Si próprio como Senhor, inferindo que tinha poder e autoridade de convocar os súditos do Seu reino em qualquer propriedade ou serviço que julgasse necessário. Um rei não pedia propriedades e serviços, pois isso implicaria que o súdito pudesse negar o pedido. Assim, Suas orientações para obter os dois animais estavam em pleno acordo com o papel que Jesus então assumia e seria compreendido tanto pelos discípulos como pelos donos dos animais. O sentimento popular em favor de proclamar Cristo como rei (ver com. do v. Mt.21:1), em conjunto com a explicação dos dois discípulos, confirmaram as intenções de Cristo nesta ocasião e asseguraram o consentimento para o uso dos animais.

Mt.21:4 4. Ora, isto aconteceu para se cumprir o que foi dito por intermédio do profeta:

Para se cumprir. Ver com. de Mt.1:22.

Profeta. A citação é de Zc.9:9, embora a primeira frase pareça mais semelhante a Is.62:11 (cf. com. de Mc.1:2; comparar a citação como é feita em Jo.12:14-15).

Mt.21:5 5. Dizei à filha de Sião: Eis aí te vem o teu Rei, humilde, montado em jumento, num jumentinho, cria de animal de carga.

Dizei. Observe que as orientações de Jesus aos dois discípulos se encerram no v. Mt.21:3. Nos v. Mt.21:4-5, Mateus se refere à entrada triunfal como o cumprimento de certas profecias específicas do AT.

Filha de Sião. Um hebraísmo para os habitantes da cidade de Jerusalém (ver com. do Sl.9:14; Is.1:8).

Aí te vem o teu Rei. Jesus estava seguindo o costume de uma entrada real na cidade, como se fazia no passado (ver DTN, 570). Sua hora havia chegado e, pela primeira vez, Jesus Se apresentou a Israel como o seu Rei legítimo, Aquele que deveria Se assentar no trono de Davi (ver com. de 2Sm.7:12-13; Mt.1:1; At.2:30). Jesus, mais tarde, ficou conhecido pelo título de “Rei dos Judeus” (Lc.23:3; Jo.18:33-34; Jo.18:37), mas Se apressou em acrescentar, “Meu reino não é deste mundo” (Jo.18:36). No entanto, os líderes se recusaram a aceitá-Lo como Rei (ver com. de Jo.19:14-15). Jesus não estava, naquela circunstância, assumindo Seu papel como Rei do reino da glória (ver Mt.25:31), mas como Rei do reino espiritual da graça (ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:2). Jesus sabia que esse episódio em Sua missão de vida inevitavelmente O levaria à cruz, embora passasse por isso com firmeza e propósito. Era necessário que os olhos de todos se voltassem para Ele nos últimos dias de Sua vida, para que todos pudessem compreender, se possível, o significado de Sua missão na Terra.

As memórias sagradas e as visões da glória futura devem ter impressionado Sua mente quando Cristo passou pelo caminho que levou ao cume do monte das Oliveiras e ao descer a encosta oriental em direção a Jerusalém. O shekinah sagrado, momentos antes de deixar o primeiro templo, pouco antes da destruição por Nabucodonosor, havia pousado brevemente no alto do monte (ver DTN, 829; ver com. de Ez.11:23). A entrada triunfal foi um “pálido prenuncio” do retorno de Jesus nas nuvens do céu (ver DTN, 580). Seria na encosta leste da montanha que o próprio Jesus, cerca de dois meses depois, devia subir ao Céu (ver DTN, 829, 830). Quando, no final do milênio, Jesus voltar à Terra, acompanhado pelos salvos e a Cidade Santa, Ele descerá no monte das Oliveiras (ver CC, 662, 663; ver com. de Zc.14:4). A cidade santa então se estabelecerá no lugar da antiga Jerusalém, e Cristo, os salvos e os anjos entrarão na cidade (ver Ap.21:2; Ap.21:10; GC, 663).

Mt.21:6 6. Indo os discípulos e tendo feito como Jesus lhes ordenara,

Indo os discípulos. Que emoções devem ter agitado o coração desses dois discípulos ao cumprirem a incumbência recebida! Para todos os amigos de Jesus entre as multidões (ver com. do v. Mt.21:8) que eles conheceram, os dois discípulos transmitiram sua interpretação do que estava prestes a ocorrer (ver DTN, 570). Com emoção que não conseguiam esconder, eles se apressaram em seu caminho, pensando que estavam prestes a realizar o desejo há muito acalentado (cf. DTN, 570, 571). Mateus omite o relato da experiência dos dois discípulos em encontrar a jumenta e sua cria e assegurar a permissão do proprietário para levá-los a Jesus (ver Mc.11:4-6; Lc.19:32-34).

Mt.21:7 7. trouxeram a jumenta e o jumentinho. Então, puseram em cima deles as suas vestes, e sobre elas Jesus montou.

Suas vestes. Do gr. himatia, significando as vestes externas, ou “manto” (ver com. de Mt.5:40).

Mt.21:8 8. E a maior parte da multidão estendeu as suas vestes pelo caminho, e outros cortavam ramos de árvores, espalhando-os pela estrada.

A maior parte da multidão. Ver com. do v. Mt.21:9.

Estendeu. Sobre este costume como expressão de homenagem à realeza, ver com. de 2Rs.9:13.

As suas vestes. Literalmente, “suas próprias vestes”, em contraste com as vestes dos discípulos (ver v. Mt.21:7).

Ramos. Além dos ramos das oliveiras (dos quais o monte das Oliveiras recebeu o nome), havia ramos de palmeiras, que eram usados em conexão com uma entrada triunfal, como símbolo de vitória (comparar com as experiências de Simão e Judas Macabeu, em 1 Macabeus 13:51; 2 Macabeus 10:7). Em triunfo, Jesus caminhou antecipando-Se à cruz, onde, em aparente derrota, usando uma coroa de espinhos como “rei dos judeus” (Jo.19:19), Ele morreu como um poderoso conquistador.

Mt.21:9 9. E as multidões, tanto as que o precediam como as que o seguiam, clamavam: Hosana ao Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor! Hosana nas maiores alturas!

Multidões. Refere-se à multidão que se reunia à medida que Jesus caminhava em direção ao cume do monte das Oliveiras. Entre estes que constituíam a multidão, sem dúvida, estavam muitos dos que tinham ido a Betânia para ver Jesus e Lázaro, a quem Jesus tinha ressuscitado dentre os mortos poucas semanas antes (ver Jo.12:17-18). Até os sacerdotes e governantes saíram para se juntar à vasta multidão. Nessa procissão triunfal, havia muitos que tinham sido cativos de Satanás e a quem Jesus tinha livrado de demônios, de cegueira e mudez, de doença e claudicação, de lepra e morte.

Clamavam. De acordo com o texto grego, eles continuaram gritando e repetindo as palavras de louvor (sobre a aclamação de júbilo expressa pela primeira vez ao se receber a arca em Jerusalém, ver com. do Sl.24:7-10).

Hosana. Do gr. hosanna, uma transliteração do aramaico hosha na, que significa “salva, agora” ou “salva, peço-Te” (ver com. do Sl.118:25). Aqui, a expressão pode ser considerada uma oração a Deus para que a salvação pudesse vir a Israel através do Rei-Messias.

Filho de Davi. Ver com. de Mt.1:1.

Bendito o que vem. A citação é baseada no Sl.118:26. A passagem paralela em Marcos diz, em vez disso, “bendito o reino que vem, o reino de Davi, nosso pai!” (Mc.11:10).

Hosana nas maiores alturas. Ver com. de Lc.2:14. Só Lucas relata o clímax da entrada triunfal, quando os sacerdotes e os governantes de Jerusalém encontraram Jesus, e só ele registra a exclamação de pesar de Jesus sobre a condenada cidade de Jerusalém (ver com. de Lc.19:39-44).

Mt.21:10 10. E, entrando ele em Jerusalém, toda a cidade se alvoroçou, e perguntavam: Quem é este?

Toda a cidade se alvoroçou. Literalmente, “se comoveu” ou “se abalou”. A extrema agitação da cidade inteira é aqui retratada graficamente. O relato de Marcos ao contar o que Jesus fez no fim da tarde e à noite deste dia memorável é mais completo do que o dos outros evangelistas (ver com. de Mt.11:11).

Mt.21:11 11. E as multidões clamavam: Este é o profeta Jesus, de Nazaré da Galiléia!

Multidões. Ver com. do v. Mt.21:9.

O profeta Jesus. Ver Mt.21:46; ver com. de Jo.7:40; cf. v. Jo.7:52. As pessoas não estavam totalmente convencidas de que Jesus era o Messias, mas perceberam que o poder de Deus estava sobre Ele.

Mt.21:12 12. Tendo Jesus entrado no templo, expulsou todos os que ali vendiam e compravam; também derribou as mesas dos cambistas e as cadeiras dos que vendiam pombas.

Tendo Jesus entrado no templo. [A purificação do templo; Jesus efetua curas no templo, Mt 21:12-17 = Mc.11:15-19 = Lc.19:45-46. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 221; gráficos 5, 9, p. 226-230]. A primeira purificação do templo é registrada apenas em João (ver Jo.2:13-25), que, por sua vez, não relata a segunda purificação. A primeira purificação ocorreu na primavera de 28 a.C., bem no início do ministério na Judeia (ver com. de Jo.2:13-17). Pelo fato de Jesus ter entrado nos átrios do templo, no domingo à tarde, após a Sua entrada triunfal em Jerusalém (ver com. de Mt.21:1), e porque o registro do evangelho deixa mais ou menos obscura a transição desta visita ao templo para a do dia seguinte, alguns concluíram que a purificação do templo ocorreu no domingo, logo após o cortejo triunfal na cidade. O desvio da estrita ordem cronológica feito por Mateus ao relatar a maldição e a extinção da figueira (ver com. do v. Mt.21:18) também tende a deixar a ordem dos acontecimentos menos evidente do que poderia ser. A narrativa de Marcos está numa ordem cronológica mais estrita, daí a segunda purificação do templo ter ocorrido na segunda-feira (cf. DTN, 581, 582).

Expulsou. Sem dúvida, a multidão que acompanhava Jesus tinha a intenção de coroá-Lo rei de Israel. Embora Jesus nunca tivesse encorajado as ideias errôneas dos judeus sobre o Seu reino, nessa ocasião, Ele passou a desempenhar o papel de Rei-Messias, a fim de que todos pudessem ter plena oportunidade para compreender o significado da crucifixão (ver com. dos v. Mt.21:1; Mt.21:5). Ele declarou o templo como “Minha casa” (v. Mt.21:13) e, como seu legítimo proprietário, exerceu autoridade para determinar como os recintos sagrados deviam ser usados (ver com. do v. Mt.21:23).

Os que ali vendiam e compravam. O átrio exterior, ou pátio dos gentios, era o cenário desse negócio profano. No mercado do templo eram vendidos vários tipos de animais e pássaros necessários para o sacrifício, juntamente com cereais, sal, incenso e óleo (ver vol. 1, p. 752-760). Esse mercado era considerado uma comodidade necessária para os peregrinos que percorriam grandes distâncias e que, desse modo, não tinham condições de carregar os seus próprios sacrifícios. O barulho, o tumulto e a negociação disputada devem ter ofendido a consciência religiosa dos que adoravam a Deus “em espírito e em verdade” (Jo.4:24). Esse comércio era permitido pelas autoridades do templo, que obtinham um lucro farto com isso. Mas aqueles que o praticavam revelavam um equívoco grosseiro sobre o caráter de Deus e acerca dos requisitos dEle sobre aqueles que O amam e servem (ver p. 57, 58; ver com. de Mq.6:8; Mt.9:13; Ez.44:23).

Mesas. Do gr. trapeza (ver com. de Lc.19:23).

Cambistas. Os que trocavam outras moedas pelo meio siclo do templo, obtendo lucro (ver com. de Mt.17:24).

Pombas. Ou, “pombos”. As pombas eram a oferta dos pobres (ver Lv.12:8; ver com. de Lv.1:14; Lc.2:24).

Mt.21:13 13. E disse-lhes: Está escrito: A minha casa será chamada casa de oração; vós, porém, a transformais em covil de salteadores.

Está escrito. A citação é de Is.56:7, que, tomada em seu contexto, refere-se especificamente ao fato de que os gentios deviam ser convertidos ao verdadeiro Deus (ver com. de Is.56:6-8; sobre o plano divino de realizar um grande ajuntamento das nações, a fim de adorá-Lo no templo de Jerusalém, ver vol. 4, p. 14-17).

Covil de salteadores. Ou, “antro de ladrões”. Jesus emprega a linguagem das Escrituras (ver com. de Je.7:11) ao fazer Seu próprio comentário da cena diante dEle. Ao fazerem dos símbolos sagrados do Cordeiro de Deus uma fonte de lucro pessoal, os líderes estavam tornando comuns as coisas sagradas e roubando de Deus Sua honra e glória. Também roubavam de todos os adoradores o conhecimento do caráter e dos requisitos de Deus e, aos adoradores gentios, roubavam a oportunidade de conhecer a Deus como Ele é. Em seu espírito de ganância, os dignitários do templo não eram melhores que os ladrões.

Mt.21:14 14. Vieram a ele, no templo, cegos e coxos, e ele os curou.

Cegos e coxos. No cortejo triunfal, no dia anterior, os troféus que o poder de cura de Jesus tinha resgatado da opressão de Satanás marchavam gritando louvores ao Salvador (ver com. do v. Mt.21:9). Quando Jesus começou a curar aqueles que se reuniam a Ele nos átrios do templo, Ele deu uma demonstração prática da verdade de que o templo tinha sido ordenado por Deus para atender às necessidades do pecador, e não à sua ganância. Parece que, por um breve momento, Jesus manteve completo controle do templo (ver Mc.11:16) e, durante esse tempo, demonstrou, em parte, como esses recintos sagrados deviam ser usados. Ele tinha vindo à Terra para que as pessoas tivessem “vida [...] em abundância” (Jo.10:10), e não para que sacrificassem e lucrassem mais abundantemente.

Mt.21:15 15. Mas, vendo os principais sacerdotes e os escribas as maravilhas que Jesus fazia e os meninos clamando: Hosana ao Filho de Davi!, indignaram-se e perguntaram-lhe:

Principais sacerdotes e escribas. Ver p. 43. Estes eram os homens que haviam permitido o comércio ilegal no templo e que obtinham bom lucro das transações de compra e venda que ocorriam ali.

Hosana. Ver com. do v. Mt.21:9.

Filho de Davi. Ver com. de Mt.1:1.

Mt.21:16 16. Ouves o que estes estão dizendo? Respondeu-lhes Jesus: Sim; nunca lestes: Da boca de pequeninos e crianças de peito tiraste perfeito louvor?

Ouves [...]? A situação estava totalmente fora do controle dos “principais sacerdotes e escribas”. As multidões que se reuniram na área do templo para ver Jesus, aclamavam a Ele como o Messias, e isso despertou nos líderes judeus o mesmo misto de medo e raiva que haviam sentido no final da tarde do dia anterior (ver com. de Lc.19:39). Então, fizeram um apelo frenético a Jesus, como no dia anterior, para silenciar as aclamações de louvor.

Nunca lestes [...]? Esta citação se harmoniza exatamente com o Sl.8:2 da LXX, que difere levemente do hebraico. A pergunta, implicando uma reprovação severa, sugere que os líderes deveriam ter reconhecido os eventos que ocorriam em harmonia com as profecias da Escritura (ver com. de Mt.19:4).

Mt.21:17 17. E, deixando-os, saiu da cidade para Betânia, onde pernoitou.

Betânia. Evidentemente, este era o lugar em que Jesus estava hospedado desde sexta-feira (ver com. de Mt.21:1-2; Mc.11:11).

Mt.21:18 18. Cedo de manhã, ao voltar para a cidade, teve fome

Cedo de manhã. [A figueira sem fruto, Mt 21:18-22 = Mc.11:12-14; Mc.11:20-24. Comentário principal: Mc]. Seguindo um arranjo tópico dos fatos, Mateus une as duas partes da história da figueira sem fruto (para uma sequência cronológica dos eventos, ver com. de Mc.11:12).

Mt.21:19 19. e, vendo uma figueira à beira do caminho, aproximou-se dela; e, não tendo achado senão folhas, disse-lhe: Nunca mais nasça fruto de ti! E a figueira secou imediatamente.

Sem comentário para este versículo.

Mt.21:20 20. Vendo isto os discípulos, admiraram-se e exclamaram: Como secou depressa a figueira!

Sem comentário para este versículo.

Mt.21:21 21. Jesus, porém, lhes respondeu: Em verdade vos digo que, se tiverdes fé e não duvidardes, não somente fareis o que foi feito à figueira, mas até mesmo, se a este monte disserdes: Ergue-te e lança-te no mar, tal sucederá

Sem comentário para este versículo.

Mt.21:22 22. e tudo quanto pedirdes em oração, crendo, recebereis.

Sem comentário para este versículo.

Mt.21:23 23. Tendo Jesus chegado ao templo, estando já ensinando, acercaram-se dele os principais sacerdotes e os anciãos do povo, perguntando: Com que autoridade fazes estas coisas? E quem te deu essa autoridade?

Tendo Jesus chegado ao templo. [A autoridade de Jesus e o batismo de João, Mt 21:23-27 = Mc.11:27-33 = Lc.20:1-8. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 221; gráfico 9, p. 230]. Esta ocasião, a terça-feira antes da Páscoa, em 31 d.C., foi a última vez que Jesus ensinou no templo. Ele já falava ao povo quando os líderes O abordaram (ver Lc.20:1).

Os principais sacerdotes. Ver com. de Mt.2:4. Muitos dos “principais dos sacerdotes” eram saduceus, assim como a maioria dos escribas eram fariseus. Tanto Mc.11:27 quanto Lc.20:1 incluem os escribas em seus relatos sobre esse evento.

Os anciãos. O Sinédrio já havia se reunido no início da manhã e tinha decidido exigir de Jesus Suas credenciais (ver DTN, 593). Possivelmente, alguns dos mesmos homens que O confrontavam podiam ter estado entre os que foram enviados a João Batista com uma questão semelhante três anos e meio antes (ver com. de Jo.1:19). Se assim era, eles já tinham ouvido João declarar que Jesus era o Messias (Jo.1:26-27; Jo.1:29).

Com que autoridade [...]? Na primeira purificação do templo, os líderes judeus pediram um “sinal” como prova da autoridade de Jesus para ensinar (ver Jo.2:18). Desde então, os líderes de Israel haviam testemunhado evidências repetidas do poder e da autoridade de Cristo (ver com. de Mt.16:1). Os judeus reconheciam que os profetas poderiam ensinar às pessoas sem a aprovação rabínica, mas esperavam que eles dessem prova de sua missão divina. Nesse caso, por meio de suas perguntas, os líderes judeus procuravam provas contra Jesus.

Estas coisas. Com isso, se referiam à entrada triunfal de Jesus, à purificação do templo e, por fim, aos ensinos nos átrios do templo.

Mt.21:24 24. E Jesus lhes respondeu: Eu também vos farei uma pergunta; se me responderdes, também eu vos direi com que autoridade faço estas coisas.

Eu também vos farei uma pergunta. Responder a uma pergunta propondo outra era um procedimento aprovado nos debates rabínicos. A segunda pergunta era supostamente designada para apontar o caminho para responder à questão original. Jesus adotou dali em diante essa maneira de responder.

Estas coisas. Na realidade, Jesus não estava Se evadindo da questão, pois a resposta deles à Sua pergunta proveria, em princípio, parte da resposta. A sabedoria e a habilidade com a qual Jesus enfrentava os desafios era uma evidência adicional de Sua divindade.

Mt.21:25 25. Donde era o batismo de João, do céu ou dos homens? E discorriam entre si: Se dissermos: do céu, ele nos dirá: Então, por que não acreditastes nele?

O batismo de João. Ver com. de Mt.3:6; Mc.1:4; Lc.7:29. O batismo era o traço característico do ministério de João e se tornou uma designação popular.

Donde era [...]? Nem João nem Jesus haviam recebido endosso das autoridades de Jerusalém. A autoridade deles vinha diretamente de Deus e não dos homens; portanto, a pergunta feita pelos líderes e a pergunta de Cristo em resposta, girava em torno da questão das credenciais divinas.

E discorriam. Os líderes judeus estavam em conluio e rapidamente consultaram uns aos outros.

Por que não acreditastes nele? Os líderes judeus sabiam bem que uma admissão honesta omitiria essa resposta de Jesus; porém, havia mais coisas envolvidas. Se eles reconhecessem as credenciais divinas de João deviam necessariamente aceitar sua mensagem, e o clímax de sua mensagem era a identificação de Jesus de Nazaré como o Messias (ver Jo.1:26-27; Jo.1:29). Desse modo, reconhecer a autoridade de João era equivalente a reconhecer a de Jesus.

Mt.21:26 26. E, se dissermos: dos homens, é para temer o povo, porque todos consideram João como profeta.

Temer o povo. O temor da violência física parece ter controlado a mente dos líderes (ver Lc.20:6). Se a opinião popular se voltasse contra eles, sua influência sobre o povo se perderia. Para eles, posição e influência significavam mais do que a verdade. O sentimento público era fortemente favorável a João Batista e, naquele momento, de modo semelhante, era favorável a Jesus (ver Mc.12:37; DTN, 594).

Mt.21:27 27. Então, responderam a Jesus: Não sabemos. E ele, por sua vez: Nem eu vos digo com que autoridade faço estas coisas.

Não sabemos. Os líderes judeus deviam saber, com certeza, que João era um profeta; mas, para escapar ao dilema, refugiaram-se em uma pretensa ignorância. Mesmo assim, não escaparam ilesos. A resposta que deram a Jesus automaticamente cancelou o direito de pressioná-Lo a responder, e por isso não insistiram no questionamento. Além disso, perderam o respeito do povo. Haviam se emaranhado na própria rede que habilmente lançaram sobre Jesus. O Mestre havia testado sua professa habilidade de reconhecer as credenciais divinas, e eles fracassaram completamente. Por questões práticas, haviam abdicado de sua pretensão como líderes espirituais da nação.

Mt.21:28 28. E que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Chegando-se ao primeiro, disse: Filho, vai hoje trabalhar na vinha.

E que vos parece? (A parábola dos dois filhos, Mt 21:28-32. Sobre as parábolas, ver p. 197-204]. O propósito de Jesus nesta parábola era mostrar a verdadeira natureza da escolha que os líderes judeus estavam fazendo com respeito ao evangelho do reino, conforme havia sido proclamado por João Batista. Com muito tato e propósito, Jesus os conduziu, como sempre o fez, a condenar a si mesmos (v. Mt.21:41), para que pudessem avaliar sua conduta em sua verdadeira luz.

Um homem. Nesta parábola, Deus.

Dois filhos. Desde a entrada do pecado, as duas classes aqui representadas estão presentes no mundo: os que obedecem e os que desobedecem. Assim será até o fim dos tempos.

Ao primeiro. Este filho é representante de todos os que professam servir a Deus, mas vivem em transgressão aberta aos Seus mandamentos.

Vai hoje trabalhar. Deus dá essa ordem a todos os “filhos”. Ninguém é isento do serviço.

Mt.21:29 29. Ele respondeu: Sim, senhor; porém não foi.

Porém não foi. Esse filho escarneceu abertamente da autoridade paterna. Ele não tinha intenção de obedecer ao pai. Estava disposto a usufruir dos privilégios da filiação; aparentemente ainda vivia na casa do pai, mas não estava disposto a assumir suas responsabilidades como filho.

Mt.21:30 30. Dirigindo-se ao segundo, disse-lhe a mesma coisa. Mas este respondeu: Não quero; depois, arrependido, foi.

Segundo. Este filho representa todos os que professam ser filhos de Deus, mas falham em fazer Sua vontade.

Mt.21:31 31. Qual dos dois fez a vontade do pai? Disseram: O segundo. Declarou-lhes Jesus: Em verdade vos digo que publicanos e meretrizes vos precedem no reino de Deus.

Qual dos dois [...]? Qual dos dois filhos agradou mais ao pai? Obviamente nenhum deles foi perfeito. Ambos erraram, um, na atitude inicial, o outro, na realização.

A vontade do pai. Professar sem agir não tem valor algum (ver com. de Mt.7:21).

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Publicanos e meretrizes. Ver com. de Mc.2:14; Lc.3:12. Esta é uma frase generalizadora que designa todos os párias da sociedade e da religião que, geralmente, evitavam o templo e a sinagoga porque não eram bem recebidos quando compareciam (comparar com a expressão “publicanos e pecadores”, em Mt.9:11; ver também com. de Lc.5:30).

Precedem. No que dizia respeito ao batismo de João, isso era literalmente verdade (ver Lc.7:29-30). Muitos dos que não eram religiosos estavam dolorosamente conscientes de sua grande necessidade espiritual e se alegravam de que Jesus e João abrissem espaço para eles no reino dos céus. Por outro lado, escribas e fariseus se sentiam satisfeitos consigo mesmos e, portanto, estavam fechados ao evangelho (ver com. de Lc.15:2).

Mt.21:32 32. Porque João veio a vós outros no caminho da justiça, e não acreditastes nele; ao passo que publicanos e meretrizes creram. Vós, porém, mesmo vendo isto, não vos arrependestes, afinal, para acreditardes nele.

Caminho da justiça. É o caminho cristão, ou uma filosofia de vida (ver com. de Mt.7:13-14).

E não acreditastes. Ver Lc.7:29-30. Como o primeiro filho na parábola, os líderes judeus se recusaram a entrar na vinha do Senhor e trabalhar nela depois de terem professado que assim o fariam.

Não vos arrependestes. Eles não alteraram sua decisão original. Quando surgiu Aquele de quem João havia dado testemunho, que durante três anos e meio dera evidência de Sua natureza divina, os líderes judeus perseveraram em sua impenitência. Seu coração endurecido permaneceu sem mudança (ver com. de Ex.4:21). O fato de que coletores de impostos e prostitutas respondiam tão prontamente à pregação de João e de Jesus ofendia os líderes judeus (ver com. de Mt.11:19). Estes não estavam dispostos a trabalhar na mesma vinha em que coletores de impostos convertidos como Zaqueu (ver Lc.19:1-10) e prostitutas restauradas como Maria (ver com. de Lc.7:36-37) eram aceitos como trabalhadores.

Mt.21:33 33. Atentai noutra parábola. Havia um homem, dono de casa, que plantou uma vinha. Cercou-a de uma sebe, construiu nela um lagar, edificou-lhe uma torre e arrendou-a a uns lavradores. Depois, se ausentou do país.

Atentai noutra parábola. [A parábola dos lavradores maus, Mt 21:33-46 = Mc.12:1-12 = Lc.20:9-19. Comentário principal: Mt. Sobre as parábolas, ver p. 197-204]. Esta segunda parábola foi dirigida àqueles que ouviam atentamente os ensinos de Jesus (ver Lc.20:9), mas era endereçada aos seus líderes. Como na parábola dos dois filhos (ver Mt.21:31), esses líderes foram levados a confessar sua culpa e a pronunciar sentença contra si mesmos (ver v. Mt.21:41).

Dono de casa. Do gr. oikodespotes, ou, “o senhor da casa” (ver com. de Lc.2:29).

Uma vinha. A vinha era um dos símbolos nacionais de Israel. Bem perto do lugar onde Cristo estava, naquela ocasião, na entrada do templo, havia uma grande e magnífica videira esculpida em ouro e prata que representava Israel (Josefo, Antiguidades, xv.11.3; ver DTN, 575; ver com. de Jo.15:1). A maior parte das palavras de Mt.21:33 é um empréstimo da alegoria da vinha do Senhor, de Is.5:1-7. Esta parábola enfatiza as ricas bênçãos que Deus concedeu a Israel para que pudessem suprir o mundo com o fruto do caráter divino (ver com. de Mt.21:34). Israel havia se tornado a maior dentre as nações da Terra em saúde, intelecto, habilidades, prosperidade e no caráter, revelando a todos os homens a glória do propósito de Deus (ver vol. 4, p. 13-17).

Cercou-a. Do gr. phragmos, “cerca”, ou “sebe”. A cerca representa os preceitos da lei divina e obediência àqueles princípios da verdade que protegem contra a prática do erro.

Um lagar. Geralmente um cocho ou um tanque cavado em rocha sólida. Esses lagares ainda podem ser vistos na Palestina.

Arrendou-a. Ou, “alugou-a”. Nos tempos antigos, o aluguel de um campo era pago à vista ou em acordo. No último caso, uma quantidade especificada da colheita ou uma quantia proporcional era estipulada na negociação. Os lavradores nesta parábola eram arrendatários. Esse fato não implica que as dificuldades dos arrendatários de hoje sejam necessariamente as mesmas dos tempos antigos.

Lavradores. Ou, arrendatários.

Mt.21:34 34. Ao tempo da colheita, enviou os seus servos aos lavradores, para receber os frutos que lhe tocavam.

Seus servos. Em Mt.23:34, Jesus fala em enviar “profetas, sábios e escribas” (cf. v. Mt.21:37). Os sacerdotes, em sentido especial, eram os depositários designados da vinha do Senhor, e os profetas, os representantes ou servos escolhidos por Deus.

Os frutos que lhe tocavam. Ou, “seus frutos”. O dono pediu sua parte da colheita (ver com. do v. Mt.21:33). Israel devia mostrar o fruto do caráter e revelar ao mundo os princípios do reino dos céus. O fruto do caráter devia se manifestar primeiramente em sua vida e, então, na vida dos povos ao redor. Do mesmo modo, Deus espera que Sua igreja hoje partilhe as grandes bênçãos que Ele tem derramado sobre ela (ver PJ, 296).

Mt.21:35 35. E os lavradores, agarrando os servos, espancaram a um, mataram a outro e a outro apedrejaram.

Agarrando os servos. Mateus fala de vários grupos de servos. Alguns do primeiro grupo foram mortos (ver v. Mt.21:35-36). Marcos apresenta os servos enviados em cada ocasião, sendo que alguns deles foram espancados, e outros, mortos (ver Mc.12:3-5). Lucas também menciona os servos enviados em cada ocasião, mas nenhum deles foi morto (ver Lc.20:10-12). O número de servos e o destino que cada um teve, em particular, não são essenciais na parábola (ver p. 199, 200). Um pouco mais tarde, nesse mesmo dia, Jesus falou em linguagem literal sobre o tratamento que os judeus davam aos mensageiros de Deus (ver Mt.23:29-37; sobre uma ilustração específica do destino de vários profetas, ver 1Rs.18:13; 1Rs.22:24-27; 2Rs.6:31; 2Cr.24:19-22; 2Cr.36:15-16; Ne.9:26; Je.37:15; ver também At.7:52). Os arrendatários da vinha não apenas se recusaram a pagar o aluguel, mas insultaram o dono ao maltratar os seus representantes e ao agir como se fossem os proprietários legítimos.

Mt.21:36 36. Enviou ainda outros servos em maior número; e trataram-nos da mesma sorte.

Sem comentário para este versículo.

Mt.21:37 37. E, por último, enviou-lhes o seu próprio filho, dizendo: A meu filho respeitarão.

E, por último. Ver Mc.12:6. Quando os judeus rejeitaram Jesus como o Messias, desprezaram a última oferta de misericórdia a eles como nação. Aqui, Jesus não prevê tempo algum no futuro em que os judeus deviam recuperar o favor divino, como nação (ver vol. 4, p. 19, 20).

Respeitarão. Ou, “acatarão”.

Mt.21:38 38. Mas os lavradores, vendo o filho, disseram entre si: Este é o herdeiro; ora, vamos, matemo-lo e apoderemo-nos da sua herança.

Este é o herdeiro. Paulo fala de Jesus como aquele a quem Deus “constituiu herdeiro de todas as coisas” (Hb.1:2), e daqueles que O aceitam como coerdeiros com Ele (Rm.8:17).

Matemo-lo. Naquele momento, o Sinédrio procurava um meio de se livrar de Jesus (ver Lc.19:47; ver com. de Mt.21:23). Repetidamente, durante aqueles últimos meses, os líderes haviam se reunido para encontrar um meio de por um ponto final ao ministério de Jesus (ver com. de Mt.19:3; Mt.20:18). As últimas tentativas de aprisionar Jesus ocorreram no sábado precedente (ver DTN, 563, 564) e na manhã daquele mesmo dia (Mt.21:23).

Mt.21:39 39. E, agarrando-o, lançaram-no fora da vinha e o mataram.

Sem comentário para este versículo.

Mt.21:40 40. Quando, pois, vier o senhor da vinha, que fará àqueles lavradores?

Vier o Senhor. Os arrendatários não respeitaram ninguém exceto o dono (cf. Jo.8:41), que retornara para fazer uma investigação pessoal da situação. Ele voltara para julgá-los.

Mt.21:41 41. Responderam-lhe: Fará perecer horrivelmente a estes malvados e arrendará a vinha a outros lavradores que lhe remetam os frutos nos seus devidos tempos.

Responderam-Lhe. Não poderia haver uma resposta diferente da que deram. A ordem das palavras no original grego é impactante e pode ser traduzida como “ímpios, ele os destruirá impiedosamente”.

A vinha. Ver com. dos v. Mt.21:33; Mt.21:43.

Mt.21:42 42. Perguntou-lhes Jesus: Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os construtores rejeitaram, essa veio a ser a principal pedra, angular; isto procede do Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos?

Nunca lestes [...]? Ver com. do v. Mt.21:16. Entre os que compunham a delegação, estavam os escribas, cujo dever era estudar e ensinar as Escrituras (ver com. dos v. Mt.21:16; Mt.21:23).

A pedra. A citação é do Sl.118:22-23, e é idêntica ao texto da LXX. Os próprios rabis reconheceram essa passagem como messiânica (ver DTN, 597, 598; ver com. de Mt.16:18).

Principal pedra. A pedra angular era a parte mais importante da estrutura, já que unia as duas paredes que se encontravam no canto (ver At.4:11; Ef.2:20; 1Pe.2:7; ver com. de Sl.118:22; Is.28:16).

Mt.21:43 43. Portanto, vos digo que o reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que lhe produza os respectivos frutos.

Reino de Deus. Ou, neste exemplo, o privilégio de ser o povo escolhido de Deus. No futuro, o plano de Deus para salvar o mundo não dependeria mais da nação judaica, como um edifício dependia da pedra principal (ver vol. 4, p. 13-20).

Entregue a um povo. Ou, à igreja cristã (ver 1Pe.2:9-10).

Frutos. Ver com. do v. Mt.21:34.

Mt.21:44 44. Todo o que cair sobre esta pedra ficará em pedaços; e aquele sobre quem ela cair ficará reduzido a pó.

Cair sobre esta pedra. Ou, submeter-se a Cristo. Esta era a coisa mais importante que os judeus se recusavam a fazer (ver com. dos v. Mt.21:25; Mt.21:27).

Sobre quem ela cair. Ou, em juízo. Esse juízo logo recairia sobre a nação judaica e seus líderes impenitentes.

Ficará reduzido a pó. Do gr. likmao “joeirar” (a limpadura dos grãos), “espalhar”, ou “esmagar”. Estas palavras refletem vividamente o pensamento de Dn.2:44-45, em que likmao é encontrado na LXX (v. Dn.2:44). Um objeto pesado pulveriza tudo o que atinge, e os fragmentos se espalham ao redor. A mesma palavra é usada na LXX em Rt.3:2. A expressão “reduzir a pó” poderia também ser traduzida como “espalhar como a palha”. Evidências textuais (cf. p. 136) apoiam a omissão de Mateus 21:44.

Mt.21:45 45. Os principais sacerdotes e os fariseus, ouvindo estas parábolas, entenderam que era a respeito deles que Jesus falava

Sacerdotes e os fariseus. Ver com. do v. Mt.21:23.

Entenderam. A aplicação era tão clara que nenhuma explicação era necessária. Sem dúvida, os líderes judeus conheciam o pleno significado das passagens sobre a alegoria da vinha em Is.5:1-7 e as várias passagens que se referiam ao Messias como uma “pedra” (Sl.118:22-23; Is.28:16).

Mt.21:46 46. e, conquanto buscassem prendê-lo, temeram as multidões, porque estas o consideravam como profeta.

Conquanto buscassem prendê-Lo. Ou, detê-Lo. Conforme viram, Jesus estava desafiando a autoridade dos líderes que mal podiam impedir a si mesmos de realizar os seus desígnios imediatamente. Temeram as multidões. O sentimento público era, naquela circunstância, fortemente favorável a Jesus. A cada encontro com os líderes judeus, o respeito que o povo tinha por esses perversos clérigos diminuía.

Como profeta. Ver com. de Mt.21:11; Jo.7:40.

Mt.22:1 1. De novo, entrou Jesus a falar por parábolas, dizendo-lhes:

A falar. [A parábola das bodas, Mt.22:1-14. Sobre as parábolas, ver p. 197-204]. Ver com. de Lc.14:16-24; sobre as circunstâncias que levaram Jesus a contar a parábola, ver com. de Mt.21:12; Mt.21:23; Mt.21:28; Mt.21:33. Sem dúvida, o cap. 22 é uma continuação do anterior, portanto, representa os eventos que ocorreram na terça-feira antes da crucifixão. A parábola das bodas tem muito em comum com a da grande ceia (Lc.14:16-24). Alguns estudiosos críticos concluíram que as semelhanças apontam para uma identidade básica entre as duas parábolas. A conclusão a que os críticos chegaram nega a Cristo o privilégio de relatar a mesma história em ocasiões diferentes, com variação de detalhes para se adequar às necessidades da verdade que Ele pretendia ensinar em cada ocasião. As seguintes diferenças parecem indicar claramente a distinção das duas histórias: (1) A parábola da grande ceia foi contada na casa de um fariseu; a das bodas, no pátio do templo. (2) O primeiro banquete foi oferecido por um homem comum; o segundo, por um rei. (3) O primeiro foi simplesmente uma ocasião social; o segundo, uma festa de casamento em homenagem ao filho do rei. (4) Na primeira, a ênfase é colocada em desculpas vazias por aqueles que declinaram do convite; na segunda, na preparação necessária da parte dos convidados. (5) Na primeira, desculpas são dadas; na segunda, os convidados não se desculpam. (6) Na primeira, os mensageiros são recebidos com indiferença; na segunda, alguns são agredidos e mortos. (7) Na primeira, a única penalidade imposta sobre os que declinaram do convite foi a exclusão do banquete; na segunda, aqueles que declinaram do convite foram mortos.

De novo. Esta expressão implica que a parábola foi contada na mesma ocasião que as registradas no cap. Mt.21, conforme sua posição no evangelho de Mateus. Essa palavra pareceria inadequada se a parábola, de fato, pertencesse ao cenário dado na parábola da grande ceia, em Lucas, como alguns críticos afirmam.

Mt.22:2 2. O reino dos céus é semelhante a um rei que celebrou as bodas de seu filho.

O reino dos céus. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:2; Lc.4:19.

Semelhante a um rei. Aqui, Deus, o Pai.

As bodas. Do gr. gamoi, literalmente, “festa nupcial”. Os prazeres de uma festa eram um símbolo judaico comum dos privilégios e das alegrias do reino messiânico (ver com. de Mt.8:11; Lc.14:15). Nas terras orientais, um banquete desse tipo poderia durar vários dias (ver Jz.14:17; ver com. de Et.1:4-5; Jo.2:1).

De seu filho. Ou, de Cristo (ver com. de Mt.25:1; sobre Cristo como Filho de Deus, ver com. de Lc.1:35; como Filho do Homem, ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10. Ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51).

Mt.22:3 3. Então, enviou os seus servos a chamar os convidados para as bodas; mas estes não quiseram vir.

Enviou os seus servos. Observe que os convidados já haviam sido chamados para a festa. Até hoje é costume nos países orientais honrar os convidados enviando mensageiros pessoalmente para lembrá-los do convite que já fora aceito (ver com. de Lc.14:17).

A chamar. Os profetas dos tempos do AT já haviam feito o convite original aos judeus (ver com. de Mt.21:34; Lc.14:16). João Batista, Jesus e Seus discípulos fizeram o primeiro chamado da parábola e o segundo convite aos judeus (ver com. de Lc.14:17).

Os convidados. Nesta parábola, os judeus. A aliteração na frase grega pode ser traduzida como “chamar os que foram chamados”.

Para as bodas. Ver com. do v. Mt.22:2.

Não quiseram vir. A recusa reflete a rejeição do evangelho pelos judeus, particularmente, por seus líderes (ver com. de Mt.21:38; PJ, 307). Mais tarde, Jesus expressou o mesmo pensamento: “vós não o quisestes” (ver Mt.23:37). Os líderes de Israel não apenas se recusavam a entrar, mas procuravam também impedir os outros de fazê-lo (ver com. de Mt.23:13).

Mt.22:4 4. Enviou ainda outros servos, com esta ordem: Dizei aos convidados: Eis que já preparei o meu banquete; os meus bois e cevados já foram abatidos, e tudo está pronto; vinde para as bodas.

Enviou ainda. O segundo chamado da parábola foi o terceiro convite à nação judaica. Embora o rei estivesse amargamente desapontado e grandemente humilhado, estava disposto a perdoar a grosseria e esquecer os insultos. O fato de que, mais tarde, tenha enviado suas tropas e “exterminado aqueles assassinos” (v. Mt.22:7) indica que, se quisesse, poderia tê-los obrigado a ir à festa. Deus poderia compelir as pessoas a aceitar o convite do evangelho, mas não faz isso. Cada um tem a liberdade de aceitar ou rejeitar o convite.

Outros servos. Este segundo chamado da parábola, foi dado aos judeus pelos discípulos, depois da crucifixão, ressurreição e ascensão de Cristo ao Céu. Os discípulos deviam primeiramente trabalhar em Jerusalém e em toda a Judeia antes de ir “aos confins da Terra” (At.1:8).

Banquete. Do gr. Ariston, “desjejum” ou “almoço” (ver com. de Lc.14:12). Aqui, evidentemente, refere-se à refeição do meio-dia. De acordo com Josefo (Vida de Flávio Josefo, 54), era costume dos judeus “almoçar” (ou, Ariston), pelo menos aos sábados, na sexta hora do dia, ou ao meio-dia.

Tudo está pronto. Ou, “o reino dos céus está próximo” (ver com. de Mt.3:2). Aqui Jesus Se refere ao reino da graça divina estabelecido no tempo do Seu primeiro advento (ver com. de Mt.4:17; Mt.5:2).

Mt.22:5 5. Eles, porém, não se importaram e se foram, um para o seu campo, outro para o seu negócio

Não se importaram. Eles nem se deram ao trabalho de pedir desculpas (ver com. de Lc.14:18).

Negócio. Do gr. emporia, “comércio”, “negócio” ou “mercanciar”; de emporos, “negociar”.

Mt.22:6 6. e os outros, agarrando os servos, os maltrataram e mataram.

E os outros. Ou, “o restante”, aqueles que não se contentaram simplesmente em ignorar o convite.

Agarrando os servos. Isto se refere primariamente à perseguição dos judeus aos primeiros cristãos (ver At.8:1-4).

E mataram. Nas perseguições que os judeus promoveram contra a igreja cristã primitiva, Estêvão foi o primeiro a morrer (ver At.6:9-15; At.7:54-60). Tiago, o primeiro dos doze a ser martirizado, também foi vítima da inimizade dos líderes judeus (ver At.12:1-3).

Mt.22:7 7. O rei ficou irado e, enviando as suas tropas, exterminou aqueles assassinos e lhes incendiou a cidade.

Enviando. O estilo da narrativa hebraica sempre segue a ordem temática em vez da ordem estritamente cronológica (ver p. 276; ver com. de Gn.25:19; Ex.16:33).

Tropas. Literalmente, “grupos de soldados” e não um grande “exército”.

Incendiou a cidade. Sem dúvida, uma alusão à queda de Jerusalém pelas legiões de Roma, em 70 d.C. (ver Mt.24:15; Lc.21:20; p. 64).

Mt.22:8 8. Então, disse aos seus servos: Está pronta a festa, mas os convidados não eram dignos.

Está pronta a festa. Alguns parecem ter certa dificuldade com a declaração de que o casamento já estava “pronto” depois de o rei ter tido tempo de se dispor com seus inimigos (ver v. Mt.22:7). Porém, os banquetes orientais duravam muitos dias (ver com. do v. Mt.22:2), e como os convidados não tinham comparecido, a festa ainda estaria “pronta”, mesmo que o tempo designado para ela tivesse passado.

Os convidados. Ver com. do v. Mt.22:3.

Não eram dignos. Ou, não eram aceitáveis aos olhos de Deus (ver Mt.10:11; Mt.10:13).

Mt.22:9 9. Ide, pois, para as encruzilhadas dos caminhos e convidai para as bodas a quantos encontrardes.

Ide, pois. Este é o terceiro chamado da parábola; de modo bem evidente representa o convite de misericórdia aos gentios.

Caminhos. Ou, as vias públicas principais.

Mt.22:10 10. E, saindo aqueles servos pelas estradas, reuniram todos os que encontraram, maus e bons; e a sala do banquete ficou repleta de convidados.

Maus e bons. Obviamente, o salão festivo representa a igreja ainda neste mundo, pois não haverá “maus” no Céu.

Mt.22:11 11. Entrando, porém, o rei para ver os que estavam à mesa, notou ali um homem que não trazia veste nupcial

Entrando, porém, o rei. Em Lc.14:16-24, na parábola da grande ceia, faltam alguns trechos semelhantes aos que se encontram aqui em Mateus 22:11 a 14 (ver com. do v. Mt.22:1).

Para ver os que estavam à mesa. Ele entrou para ver se tudo estava correndo bem e, particularmente, para verificar que tipo de convidados seus servos haviam encontrado ao sair pelos caminhos. A inspeção dos convidados representa um processo de julgamento para determinar quem podia ou não ficar. Em sentido especial, representa a obra do juízo investigativo (ver PJ, 310; ver com. de Ap.14:6-7).

Veste nupcial. As vestes nupciais especiais eram fornecidas pelo próprio rei. Um salão de festa com os convidados vestidos apropriadamente seria uma honra ao rei e à ocasião. Uma pessoa que não estivesse adequadamente vestida traria desonra ao anfitrião e introduzida uma nota discordante às festividades. A veste nupcial representa “a justiça de Cristo” (PJ, 310). Portanto, a rejeição da veste representa a rejeição daqueles traços de caráter que qualificam as pessoas a se tornarem filhos e filhas de Deus. Como os convidados da parábola, não temos nada adequado para usar. Somos aceitáveis na presença do grande Deus somente se nos vestirmos da perfeita justiça de Jesus Cristo, pela virtude de Seus méritos. Estas são as vestes brancas que os cristãos são aconselhados a “comprar” (ver Ap.3:18; Mt.19:8). O homem sem a veste nupcial representa os professos cristãos que não sentem necessidade de uma transformação no caráter. Esse convidado estava aparentemente interessado apenas no privilégio de comer à mesa do rei. De fato, ele não apreciava o privilégio do convite. A honra do rei e a importância da ocasião nada significavam para ele. Esqueceu-se de que a festa estava sendo dada em honra ao filho do rei e, consequentemente, ao próprio rei. Não importava quão bem vestido ele poderia estar, pois havia declinado da única coisa que lhe permitia sentar à mesa real e desfrutar as festividades e as fartas provisões que acompanhavam a celebração das bodas.

Mt.22:12 12. e perguntou-lhe: Amigo, como entraste aqui sem veste nupcial? E ele emudeceu.

Amigo. O rei abordou o convidado ofensor com tato e lhe deu a oportunidade de defesa. É possível que o rei estivesse disposto a perdoar se não fosse culpa do homem, ou por displicência de seus servos.

Ele emudeceu. Do gr. phimoo, “amordaçar”; aqui, portanto, em sentido figurativo, “ficar sem palavras”. Com certeza, a culpa era do próprio convidado, pois, se fosse inocente, teria se apressado a falar em defesa própria. Seu erro havia sido intencional; ele havia rejeitado a veste que era para ele, possivelmente por considerar-se superior para vesti-la. Talvez estivesse usando um novo traje caro e estivesse ansioso para exibi-lo diante dos convidados para ser admirado.

Mt.22:13 13. Então, ordenou o rei aos serventes: Amarrai-o de pés e mãos e lançai-o para fora, nas trevas; ali haverá choro e ranger de dentes.

Lançai-o para fora. Os homens são excluídos do reino dos céus como resultado de suas más escolhas. Assim foi com as cinco virgens néscias (ver com. de Mt.25:11-12). O homem, na parábola, estava apto a entrar no salão do banquete apenas pelo convite do rei, mas só ele era responsável por permanecer ali. Nenhum homem pode se salvar, mas pode atrair condenação. Inversamente, Deus pode “salvar totalmente” (Hb.7:25), mas não condena arbitrariamente alguém ou o impede de entrar no reino.

Nas trevas. Ver Mt.8:12; Mt.25:30. Esta é a escuridão do esquecimento, da separação eterna de Deus, do aniquilamento. Na parábola, as trevas eram o que havia de mais palpável em contraste com a luz brilhante da câmara festiva.

Ali. Ou, naquele lugar, lá fora, nas trevas exteriores.

Ranger de dentes. Ver com. de Mt.8:12.

Mt.22:14 14. Porque muitos são chamados, mas poucos, escolhidos.

Muitos são chamados. Jesus expressou a verdade dita aqui em várias ocasiões (ver Mt.20:16; Lc.13:23-24). O convite do evangelho é para todos os que o aceitam. “Quem quiser” poderá receber “de graça a água da vida” (Ap.22:17). Qualquer que tiver sede da água da salvação tem o privilégio de aceitar o convite: “Se alguém tem sede, venha a Mim e beba” (Jo.7:37). No Sermão do Monte, Jesus prometeu a todos que têm “fome e sede de justiça [que eles] serão fartos” (Mt.5:6).

Mas poucos, escolhidos. Esta verdade não está baseada em um ponto específico da parábola, mas é uma conclusão geral relacionada a ela. Na parábola não apenas está implícito que os convidados que recusaram ir à festa eram “muitos”, Jesus aqui, simplesmente afirma um fato fundamental: comparativamente, poucos estão dispostos a aceitar o gracioso convite do rei e entrar na câmara festiva. De modo semelhante, no Sermão do Monte, Jesus declarou, com clareza, que apenas “poucos” encontram o caminho da salvação, enquanto são muitos os que entram pela porta larga, o caminho da destruição (ver Mt.7:13-14).

Mt.22:15 15. Então, retirando-se os fariseus, consultaram entre si como o surpreenderiam em alguma palavra.

Fariseus. [A questão do tributo, Mt 22:15-22 = Mc.12:13-17 = Lc.20:19-26. Comentário principal: Mt].

Consultaram entre si. Pela segunda vez, naquele dia (ver com. de Mt.21:23), que era terça-feira antes da crucifixão.

Como O surpreenderiam. Do gr. pagideuo, “armar cilada”, “emboscar” ou “embaraçar”. Uma metáfora para descrever a intenção dos judeus.

Mt.22:16 16. E enviaram-lhe discípulos, juntamente com os herodianos, para dizer-lhe: Mestre, sabemos que és verdadeiro e que ensinas o caminho de Deus, de acordo com a verdade, sem te importares com quem quer que seja, porque não olhas a aparência dos homens.

Discípulos. Os “discípulos” dos fariseus eram homens mais jovens, aos quais os líderes esperavam que Cristo não reconhecesse. Os fariseus temiam que se eles mesmos fossem a Jesus com alguma pergunta, Ele imediatamente suspeitaria de uma cilada, pois, sem dúvida, conhecia a maioria deles, se não todos. Porém, esses estranhos tinham toda a aparência de pessoas honestas e sinceras, buscando uma resposta para o que, entre todos os judeus daquele tempo, era um problema que os deixava perplexos (ver com. do v. Mt.22:17). Lucas fala desses discípulos como “espias” dos fariseus (ver com. de Lc.20:20). Durante três anos, os membros do Sinédrio enviaram espias para seguir Jesus em quase todos os lugares aonde Ele ia (ver com. de Mt.19:3; Lc.11:54).

Herodianos. Os herodianos eram um partido político judaico que favorecia a casa de Herodes Antipas (ver p. 42). Os fariseus eram nacionalistas que se opunham à Herodes e a César, enquanto os partidários de Herodes eram colaboracionistas. Inimigos ferrenhos na política, eles se uniram contra Jesus, assim como se opuseram a João Batista (ver com. de Mc.6:14). Nesta ocasião, os herodianos deviam testemunhar a resposta de Jesus, prontos para acusá-Lo se Ele demonstrasse a mais leve insinuação de deslealdade ao governo.

Sabemos. Sua falsa honestidade era, de fato, uma tentativa de engano. Por meio da lisonja, esperavam distraí-Lo de Sua vigilância.

Sem Te importares. Cf. At.10:34.

Mt.22:17 17. Dize-nos, pois: que te parece? É lícito pagar tributo a César ou não?

Que Te parece? Os espias queriam que Jesus definitivamente Se entregasse de um jeito ou de outro. Caso Ele aprovasse o pagamento do tributo a Roma, considerariam isso como uma evidência contra a lei de Deus, já que os fariseus defendiam a proibição de pagamento de impostos a um poder estrangeiro. Desse modo, Jesus comprometeria Sua reputação diante do povo como Messias. Se Ele proibisse o pagamento de impostos, seria representado como traidor e revolucionário diante das autoridades romanas. De um jeito ou de outro, os fariseus esperavam vencê-Lo. Porém, Jesus os desapontou ao Se recusar seguir a qualquer ponto do dilema. Ele respondeu a ambos.

É lícito [...]? Ou, em harmonia com os princípios da lei judaica. Os fariseus defendiam que não era possível enquanto os herodianos pensavam o contrário. A questão, de fato, era se um homem poderia ser um bom judeu, mesmo se submetendo à autoridade romana.

Tributo. Do gr. kensos (ver com. de Mt.17:25). Provavelmente era o imposto per capita romano, cobrado em todos os territórios sob a jurisdição de Roma. O pagamento do tributo era particularmente irritante para os judeus, não por ser um fardo excessivo, mas porque era símbolo de submissão a um poder estrangeiro e um lembrete amargo de sua liberdade perdida. A questão politicamente explosiva que confrontou Jesus envolvia o problema: “Devemos nos submeter a Roma ou lutar por nossa independência?”

Mt.22:18 18. Jesus, porém, conhecendo-lhes a malícia, respondeu: Por que me experimentais, hipócritas?

Malícia. Marcos fala da “hipocrisia” deles (Mc.12:15), e Lucas, de “sua astúcia” (Lc.20:23, ARC). Todas as três palavras descrevem bem os motivos que os levaram a essa pergunta.

Por que Me experimentais [...]? Ou, “por que Me testais?” (ver com. de Mt.6:13). Jesus informou Seus pretensos impostores que estava ciente da armadilha que eles haviam tão engenhosamente preparado para Ele.

Hipócritas. Ver com. de Mt.6:2.

Mt.22:19 19. Mostrai-me a moeda do tributo. Trouxeram-lhe um denário.

Moeda do tributo. Do gr. nomisma, literalmente, “qualquer coisa sancionada pela lei ou pela alfândega”; portanto, “dinheiro”. De modo semelhante, hoje, falamos de dinheiro como “moeda oficial”. Os impostos romanos deviam ser pagos em moeda romana. Os governantes locais tinham permissão para emitir suas próprias moedas de cobre, mas somente Roma podia cunhar moedas de prata.

Um denário. Ver com. de Mt.20:2.

Mt.22:20 20. E ele lhes perguntou: De quem é esta efígie e inscrição?

Efígie. Do gr. eikon, “imagem”, “figura” ou “semelhança”; que deriva de palavras como “ícone” e “iconoclasta”. Em contraste com as moedas romanas, que portavam a figura do imperador, as moedas judaicas traziam imagens de oliveiras, palmeiras e coisas semelhantes, o que parecia aos judeus estar mais em harmonia com a ordem do segundo mandamento.

Inscrição. Do gr. epigraphe, “inscrição”, “título”.

Mt.22:21 21. Responderam: De César. Então, lhes disse: Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.

Dai. Ou, “devolva”. O dinheiro do imposto (ver o v. Mt.22:19) então em circulação normal portava a imagem de César; e, portanto, devia ter sido emitido por ele e pertencia a ele. O fato de os judeus terem a posse do dinheiro e de usá-lo como moeda oficial era, em si, uma evidência de que reconheciam, embora de má vontade, a autoridade e a jurisdição de César; portanto, César tinha o direito de exigir o que era seu.

O que é de César. Aqui Jesus estabelece o princípio fundamental que determina o relacionamento do cristão com o Estado. Ele não deve ignorar as exigências justas que o Estado coloca sobre ele, porque certas coisas “são de César”.

O que é de Deus. A autoridade de Deus é suprema; portanto, a lealdade suprema do cristão pertence a Deus. O cristão coopera com as autoridades temporais porque elas foram “instituídas” por Deus (Rm.13:1). Assim, pagar o tributo a César não era contrário à lei de Deus, como os fariseus afirmavam (ver com. de Mt.22:17). Porém, havia certas “coisas” em que César não tinha o direito de interferir (ver com. de Mt.5:29). O governo de Deus é absoluto e universal, o de César era subordinado e limitado.

Mt.22:22 22. Ouvindo isto, se admiraram e, deixando-o, foram-se.

Ouvindo isto, se admiraram. Os fariseus tinham antecipado uma resposta do tipo “sim” ou “não”, e não haviam considerado a possibilidade de uma alternativa ao dilema que propuseram. Foram forçados a perceber que não podiam competir com Jesus, a despeito do cuidadoso plano que haviam traçado.

Mt.22:23 23. Naquele dia, aproximaram-se dele alguns saduceus, que dizem não haver ressurreição, e lhe perguntaram:

Naquele dia. [Os saduceus e a ressurreição, Mt 22:23-33 = Mc.12:18-27 = Lc.20:27-40. Comentário principal: Mt]. Ou, terça-feira antes da crucifixão, o mesmo dia em que ocorreram os eventos registrados previamente neste capítulo (ver com. de Mt.21:23; Mt.22:1; Mt.22:15).

Saduceus. Ver p. 40. Embora professassem crer nas Escrituras, os saduceus eram, para propósitos práticos, materialistas e céticos em sua filosofia de vida. Criam em Deus como criador, mas negavam que Ele Se preocupasse com os problemas da humanidade. Negavam a existência dos anjos, não criam na ressurreição, ou na vida além desta, nem na operação do Espírito Santo na vida das pessoas (ver At.23:8). Os saduceus se consideravam intelectualmente superiores aos demais e passavam por alto o legalismo rígido dos fariseus. Ao virem a Jesus, naquela ocasião, os saduceus pretendiam embaraçá-Lo com uma de suas questões mais difíceis, que sempre deixava os fariseus confusos, pois acreditavam na ressurreição. Anteciparam que Jesus não seria capaz de lhes dar uma resposta melhor do que os fariseus.

Não haver ressurreição. Ver At.23:8.

Mt.22:24 24. Mestre, Moisés disse: Se alguém morrer, não tendo filhos, seu irmão casará com a viúva e suscitará descendência ao falecido.

Mestre. Literalmente, “professor”.

Moisés disse. Os saduceus citaram a lei do levirato (ver com. de Dt.25:5-6). De acordo com essa lei, se uma mulher enviuvasse sem filhos, o irmão de seu falecido marido deveria desposá-la. O primogênito dessa nova união seria considerado filho do primeiro marido, para perpetuar seu nome e herdar sua propriedade.

Mt.22:25 25. Ora, havia entre nós sete irmãos. O primeiro, tendo casado, morreu e, não tendo descendência, deixou sua mulher a seu irmão

Sete. Um número que comumente significa plenitude.

Mt.22:26 26. o mesmo sucedeu com o segundo, com o terceiro, até ao sétimo

Sem comentário para este versículo.

Mt.22:27 27. depois de todos eles, morreu também a mulher.

Sem comentário para este versículo.

Mt.22:28 28. Portanto, na ressurreição, de qual dos sete será ela esposa? Porque todos a desposaram.

De qual dos sete [...]? Esta pergunta não trazia em si uma carga política explosiva como a questão sobre o pagamento do imposto a César (ver com. do v. Mt.22:17). Era simplesmente de natureza teológica especulativa. No entanto, se Cristo falhasse em lhes dar uma resposta satisfatória, seria um grande golpe na popularidade dEle como mestre (ver Mt.21:46).

Mt.22:29 29. Respondeu-lhes Jesus: Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus.

Errais. Do gr. planao (ver com. de Mt.18:12). Os saduceus provaram que as pessoas cultas podem ser tão ignorantes e aprisionadas ao erro como as incultas. Sábios e confiantes em sua própria filosofia como eram, não percebiam que o conhecimento sobre esse assunto era incompleto, e havia, pelo menos, um fator vital que não haviam considerado: “o poder de Deus”. Jesus seguiu mostrando que, embora a doutrina da ressurreição pudesse não ser explicitamente ensinada no AT, como alguns poderiam desejar, ela está implícita em todo o AT.

Não conhecendo as Escrituras. Os saduceus se orgulhavam de estudar as Escrituras com mais critério do que os fariseus, mas Jesus afirma aqui que, a despeito de se jactarem de todo o seu conhecimento da Palavra de Deus, eles eram profundamente ignorantes. Conceitos teológicos baseados em especulações que partem de informações incompletas podem, com certeza, levar à deriva aqueles que se apoiam nesse método fantasioso de buscar a verdade. Hoje, os cristãos precisam ter cuidado, senão também “errarão não conhecendo as Escrituras”.

Poder de Deus. Literalmente, o “dynamis de Deus” (ver com. de Lc.1:35). Os saduceus haviam se esquecido de que o Deus poderoso o bastante para ressuscitar os mortos também tinha sabedoria e poder para estabelecer uma nova ordem social na Terra renovada e perfeita. Além disso, todos os salvos se sentirão contentes e felizes com a gloriosa nova ordem das coisas, mesmo que, nesta vida, eles não compreendam totalmente o que o futuro lhes reserva (ver 1Co.2:9).

Mt.22:30 30. Porque, na ressurreição, nem casam, nem se dão em casamento; são, porém, como os anjos no céu.

Nem casam. Não haverá necessidade de casamento, porque uma ordem diferente de vida prevalecerá.

Como os anjos. Os anjos são seres criados e não seres procriadores. “A doutrina de que crianças nascerão na nova terra não faz parte da segura palavra da profecia” (MS, 99).

Mt.22:31 31. E, quanto à ressurreição dos mortos, não tendes lido o que Deus vos declarou:

Não tendes lido? Há uma reprovação implícita nestas palavras (ver com. de Mt.21:42).

Mt.22:32 32. Eu sou o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó? Ele não é Deus de mortos, e sim de vivos.

O Deus de Abraão. Não há honra em Deus reinar sobre os mortos. Abraão, Isaque e Jacó já haviam morrido quando Deus apareceu a Moisés na sarça ardente. Por que o Senhor Se identificaria como o Deus dos patriarcas, em antecipação à ressurreição? Nessa mesma antecipação, pela fé, Abraão “aguardava a cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e edificador” (Hb.11:10). Há sugestão de que Jesus citou o Pentateuco (Ex.3:6; Ex.3:16) porque os saduceus acreditavam somente na inspiração dos livros de Moisés.

Mt.22:33 33. Ouvindo isto, as multidões se maravilhavam da sua doutrina.

As multidões se maravilhavam. Ver com. de Mt.7:28.

Sua doutrina. Literalmente, “seus ensinos”.

Mt.22:34 34. Entretanto, os fariseus, sabendo que ele fizera calar os saduceus, reuniram-se em conselho.

Os fariseus, sabendo. [O grande mandamento, Mt 22:34-40 = Mc.12:28-31. Comentário principal: Mc]. Ver com. de Mt.21:23; Mt.21:28; Mt.21:33; Mt.22:1; Mt.22:15; Mt.22:23; Mc.12:28.

Fizera calar os saduceus. Literalmente, “tapou a boca dos saduceus” (ver com. do v. Mt.22:12). Embora os fariseus tenham se agradado de que seus inveterados adversários teológicos tivessem sido calados, eles reconheceram de má vontade a vitória de Jesus, tendo ainda esperança de pegar Jesus em uma cilada, reuniram-se para uma tentativa final de levar o Salvador a dizer algo contrário à Lei (ver com. de Mt.5:17).

Reuniram-se. Ver com. do v. Mt.22:15.

Mt.22:35 35. E um deles, intérprete da Lei, experimentando-o, lhe perguntou:

Intérprete da lei. Alguém versado nas leis civis e religiosas do judaísmo (ver p. 43). Este intérprete, em particular, era um fariseu (v. Mt.22:34), como era a maior parte dos escribas.

Experimentando-O. Ou, “testando-O”. Os fariseus que propuseram a pergunta estavam “tentando” Jesus, enquanto o homem que, de fato, expôs a questão estava simplesmente “testando-O”. Qualquer que tivesse sido o real motivo da pergunta, o próprio advogado parecia ser honesto e sincero (ver com. de Mc.12:28; Mc.12:32-34). Evidentemente, ele não tinha nenhuma questão pessoal contra Jesus.

Mt.22:36 36. Mestre, qual é o grande mandamento na Lei?

Mestre. Literalmente, “professor” (ver com. de Lc.10:25).

O grande e primeiro mandamento. Embora esta questão lidasse com princípios fundamentais, ela provavelmente foi exposta em uma tentativa dos rabinos de ordenar todos os mandamentos da lei numa hierarquia de importância. Onde as exigências de dois mandamentos pareciam estar em conflito, aquele que fosse “maior” deveria ter precedência e liberar o homem da responsabilidade de violar o “menor” ou menos importante dos dois (ver com. de Mt.5:19). Aqui, “grande”, significa, “o principal”. Os fariseus exaltavam os quatro primeiros preceitos do decálogo como sendo mais importantes do que os últimos seis e, como resultado, falhavam quando se tratava de assuntos que envolviam a religião prática.

Mt.22:37 37. Respondeu-lhe Jesus: Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento.

Amarás o Senhor. Jesus cita Dt.6:5 (ver com. de Lc.10:27). Primeiramente deve haver amor no coração antes que uma pessoa possa, na força e na graça de Cristo, começar a observar os preceitos da lei de Deus (cf. Rm.8:3-4). Obediência sem amor é tão impossível quanto inútil. Porém, onde o amor estiver presente, a pessoa ordenará sua vida naturalmente em harmonia com a vontade de Deus expressa em Seus mandamentos (ver com. de Jo.14:15; Jo.15:10).

De todo o teu coração. O propósito de Cristo aqui, ao enumerar as diferentes características de uma pessoa, é simplesmente outro modo de dizer que o amor a Deus, se estiver verdadeiramente presente, permeará cada aspecto do ser.

Mt.22:38 38. Este é o grande e primeiro mandamento.

Sem comentário para este versículo.

Mt.22:39 39. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.

Semelhante. Os dois mandamentos se baseiam no grande princípio do amor e exigem a atenção harmoniosa e cooperativa de todas as partes do ser humano.

Amarás o teu próximo. Ver com. de Mt.5:43; Mt.19:19; Lc.10:27-29. Jesus cita Lv.19:18, em que “próximo” se refere a um semelhante israelita. No entanto, Jesus ampliou o conceito de “próximo”, incluindo todos os que estavam em necessidade e precisavam de ajuda (ver Lc.10:29-37). A lei do amor em relação a Deus e ao homem não era, absolutamente, algo novo. No entanto, Jesus foi o primeiro a unir os dois conceitos apresentados em Dt.6:4-5 e Lv.19:18 como uma junção “do dever de todo homem”, embora Miqueias chegue bem perto dessa ideia (ver com. de Mq.6:8).

Como a ti mesmo. A tendência natural do homem é de se voltar, primeiramente, para si mesmo, sem levar em consideração suas obrigações no relacionamento com Deus e com os semelhantes. Para ser totalmente livre do egoísmo ao lidar com o próximo, o homem deve, primeiramente, amar a Deus de todo o coração. Este é o fundamento de toda conduta correta.

Mt.22:40 40. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas.

A Lei e os Profetas. Uma expressão idiomática comum no hebraico para designar todo o AT (ver com. de Lc.24:44). Em outras palavras, Jesus afirma que o AT não é nada mais do que uma exposição dos dois grandes princípios enunciados aqui: amor a Deus e amor ao próximo (para a resposta do intérprete à declaração de Jesus, ver Mc.12:32).

Mt.22:41 41. Reunidos os fariseus, interrogou-os Jesus:

Reunidos os fariseus. [O Cristo, Filho de Davi, Mt 22:41-46 = Mc.12:35-37 = Lc.20:41-44. Comentário principal: Mt]. Nesta ocasião, uma grande delegação de sacerdotes havia se reunido para ouvir o que Jesus poderia dizer (ver com. de Mt.21:23; Mt.21:28; Mt.21:33; Mt.22:1; Mt.22:15; Mt.22:23; Mt.22:34). Marcos observa que Jesus ainda estava ensinando no templo (Mc.12:35).

Interrogou-os Jesus. Todas as três tentativas (ver dos v. Mt.22:15; Mt.22:23; Mt.22:34) para fazer Jesus Se incriminar falharam. Então Jesus troca de lugar com Seus supostos acusadores.

Mt.22:42 42. Que pensais vós do Cristo? De quem é filho? Responderam-lhe eles: De Davi.

Cristo. Ou, “Ungido”, “Messias” (ver com. de Mt.1:1). Aqui Jesus usa o termo “Cristo”, não como nome pessoal, mas como título. Os judeus conheciam o Messias (Cristo) da profecia, mas negavam que Jesus fosse o Messias.

De Davi. Ver com. de Mt.1:1.

Mt.22:43 43. Replicou-lhes Jesus: Como, pois, Davi, pelo Espírito, chama-lhe Senhor, dizendo:

Como, pois [...]? Jesus apresenta a seus críticos um evidente paradoxo que eles não puderam resolver, um dilema para o qual não tinham uma resposta melhor do que a obtida quando, em uma ocasião anterior, Jesus lhes havia formulado uma pergunta difícil (ver Mt.21:25; Mt.21:27).

Pelo Espírito. Ou, “pela inspiração”. Marcos diz, “pelo Espírito Santo” (Mc.12:36).

Mt.22:44 44. Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés?

Ao meu Senhor. Jesus cita aqui o livro dos Salmos (ver Lc.20:42; ver com. de Sl.110:1; At.2:34; Hb.1:13).

Mt.22:45 45. Se Davi, pois, lhe chama Senhor, como é ele seu filho?

Como é Ele seu filho? Em outras palavras, se Davi chama o Messias de “Senhor”, implicando que o Messias é mais velho que o próprio Davi, como poderia o Messias ser também Filho de Davi e ser mais novo do que Davi? A única resposta possível à pergunta de Jesus é que Aquele que devia vir como o Messias já deveria existir antes de Sua encarnação para vir ao mundo. Como o “Senhor” de Davi, o Messias era ninguém menos que o Filho de Deus; como “Filho” de Davi, o Messias era o Filho do Homem (ver com. de Mt.1:1). Obviamente os líderes judeus não estavam preparados para responder a essa pergunta por causa de seus conceitos errôneos sobre o Messias (ver com. de Lc.4:19). Eles não podiam responder à pergunta sem admitir que Jesus de Nazaré era o Messias, o Filho de Deus. Portanto, ao fazer esta pergunta, Jesus confrontou escribas e fariseus com a ideia central de Sua missão na Terra, pois essa questão, sem dúvida, se fosse encarada de modo sincero e inteligente os levaria ao reconhecimento de Sua Messianidade.

Mt.22:46 46. E ninguém lhe podia responder palavra, nem ousou alguém, a partir daquele dia, fazer-lhe perguntas.

Ninguém Lhe podia responder. Os líderes judeus descobriram que era inútil continuar a interrogar Jesus, pois, em cada dilema, Ele Se voltava aos líderes, provando-lhes sua ignorância sobre as Escrituras e sua incapacidade como líderes espirituais do povo. Em pelo menos mais um exemplo, Jesus os confrontou com uma pergunta que os deixou desconcertados (cf. Mt.21:23-27). Em cada tentativa de desacreditar Jesus, ocorria o contrário.

Mt.23:1 1. Então, falou Jesus às multidões e aos seus discípulos:

Então, falou Jesus. [Jesus censura os escribas e os fariseus, Mt 23:1-12 = Mc.12:38-40 = Lc.11:37-52; Lc.20:45-47. Comentário principal: Mt]. Ver com. de Mt.21:23; Mt.21:28; Mt.21:33; Mt.22:1; Mt.22:15; Mt.22:23; Mt.22:34; Mt.22:41; Lc.11:37-52. Isto ocorreu, provavelmente, na terça-feira, no fim do dia. Foi a última vez em que Jesus ensinou no templo, a última em que falou ao povo. Evidentemente, Ele procurou, através de denúncias contundentes contra os escribas e fariseus, quebrar as correntes que prendiam as pessoas à tradição e àqueles que a perpetuavam. O discurso dos v. 1 a 12 foi dirigido aos discípulos e ao povo em geral; e os v. Mt.23:13-33, aos escribas e fariseus presentes. Na última seção, há sete “ais”, ou oito, se o do v. Mt.23:14 for incluído.

Às multidões. O público, aqueles que estavam reunidos nos átrios do templo.

Mt.23:2 2. Na cadeira de Moisés, se assentaram os escribas e os fariseus.

Os escribas e os fariseus. Ver p. 39, 43, 45.

Na cadeira de Moisés, se assentaram. Ou, como intérpretes oficiais da lei de Moisés. Anteriormente, a “cadeira de Moisés” foi planejada como uma expressão figurativa comparável “à cadeira de história” em uma universidade hoje. Agora, no entanto, os arqueólogos descobriram que as antigas sinagogas judaicas tinham cadeiras literais em que o intérprete da lei, sem dúvida, se assentava. A sinagoga escavada em Hamate tinha uma cadeira de pedra perto da parede sul da sinagoga, com o encosto voltado para a “arca”, onde os pergaminhos eram guardados (ver p. 45). É provável que Jesus tenha Se referido a ela.

Mt.23:3 3. Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não os imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem.

Tudo quanto eles vos disserem. Jesus não contesta os ensinamentos dos escribas e fariseus, como tinha feito em outras ocasiões (ver com. de Mc.7:1-13), mas ressalta que a vida deles era incompatível com sua exaltada profissão de justiça.

Não os imiteis. Nos v. Mt.23:13-33, Jesus condena atitudes como a pretensa santidade superior, devoções ostensivas, amor à preeminência religiosa e política bem como a ganância. Fazemos bem em examinar nossa vida em busca de traços dos mesmos males que fizeram “fariseu” sinônimo de “hipócrita” (ver com. de Lc.18:9-14).

Dizem e não fazem. Ver com. de Mt.7:21-23. Dizer sem fazer é o que faz de um homem um hipócrita (ver com. de Mt.6:2; Mt.7:5). Escribas e fariseus professavam lealdade absoluta às Escrituras, mas falhavam na prática dos princípios ali estabelecidos. Suas boas ações consistiam de uma meticulosa atenção aos requisitos de cerimônia e ritual, em detrimento dos “assuntos mais importantes da lei” (ver com. de Mt.9:13; Mt.22:36; Mt.23:23; comparar com a lição da maldição da figueira, no com. de Mc.11:12-14; Mc.11:20-22; e com o exemplo do filho que disse: “eu vou, senhor, e não foi”, Mt.21:30, ARC).

Mt.23:4 4. Atam fardos pesados [e difíceis de carregar] e os põem sobre os ombros dos homens; entretanto, eles mesmos nem com o dedo querem movê-los.

Atam fardos pesados. Os escribas e fariseus eram feitores rigorosos, mas não levavam a carga. Esses “fardos pesados” eram uma parte da tradição rabínica e não das leis de Moisés (ver com. de Mc.7:1-13).

Difíceis de carregar. As exigências rabínicas nada trouxeram além de problemas e desânimo para aqueles que tentavam cumpri-las. Não havia nada nas leis de Deus que trouxesse dor ou cansaço. Isso era verdade apenas em relação às exigências de leis feitas pelo homem (comparar com Mt.11:28-30).

Mt.23:5 5. Praticam, porém, todas as suas obras com o fim de serem vistos dos homens; pois alargam os seus filactérios e alongam as suas franjas.

Serem vistos dos homens. Eles pareciam se esquecer de que Deus olha o coração e que se Ele examinasse o coração deles, nada poderia encontrar lá que os recomendasse como filhos leais. A obediência deles era usada como uma capa (ver com. dos v. Mt.23:25-26). Sua conduta era regulamentada pelo que imaginavam que os outros pensariam dela, mais do que por amor a Deus (cf. 2Co.5:14; sobre este tipo de religião, ver com. de Mt.6:1-8).

Filactérios. Do gr. phulakteria, de um verbo que significa “observar”, “manter”, portanto, “salvaguardar”. A ideia de usar filactérios foi baseada em uma interpretação literal de Dt.6:8 (ver com. de Ex.13:9). Para muitos, o filactério se tornou um talismã, assim como os antigos hebreus chegaram a considerar a arca da aliança (ver com. de 1Sm.4:3). Judeus piedosos da época de Cristo normalmente usavam filactérios em suas devoções diárias, mas os rabinos recomendavam que fossem usados todos os dias, exceto aos sábados e dias de festa. O Talmude de Jerusalém fala de “fariseus que levavam a guarda dos mandamentos sobre os seus ombros”.

Franjas. Do gr. kraspeda, sobre as “borlas” ou “franjas” aqui referidas, ver com. de Mc.5:27. Alongá-las era um meio de torná-las mais visíveis; e, como as roupas adornadas com essas franjas ou borlas eram usadas para fins religiosos, a pessoa que as usava procurava chamar a atenção dos outros como sendo piedoso além das exigências da lei e além das pessoas comuns. A lei judaica especificava apenas as medidas mínimas. A utilização da borla se baseava em Nm.15:38-40 e Dt.22:12 (cf. com. de Mc.12:38).

Mt.23:6 6. Amam o primeiro lugar nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas,

O primeiro lugar. Ou, “posições de honra” (ver DTN, 613; cf. Tg.2:2-4; sobre a prática de buscar os lugares de honra nos banquetes, ver com. de Lc.14:7-11). Dois dias depois, na última Ceia, os doze discutiram sobre uma situação semelhante (Lc.22:24; DTN, 644, 645).

As primeiras cadeiras. Nos tempos antigos, os “hipócritas” escolhiam sentar à frente, onde podiam ser vistos. As sinagogas antigas, de modo geral, não tinham “assentos” para a congregação, que, em geral, assentava-se no chão ou ficava em pé. As vezes, os bancos eram colocados junto às paredes. Os “assentos” reservados para os mais velhos eram geralmente os primeiros, de frente para a congregação. A pessoa que pregava o sermão ocupava um desses bancos (ver p. 45; ver com. de Mt.23:2). Os lugares de honra nas sinagogas eram geralmente atribuídos a pessoas em funções de destaque na comunidade.

Mt.23:7 7. as saudações nas praças e o serem chamados mestres pelos homens.

Nas praças. Ver com. de Mt.11:16; Mc.7:4.

Mestres. Literalmente, “meu maioral”, “meu professor” ou “meu senhor”. Mais tarde, o pronome pessoal perdeu sua força. Este título honorífico para os estudiosos da lei provavelmente não era usado havia muito tempo. O termo “rabino” para professor foi encontrado já em 110 a.C. na fala de Josué b. Perahah. O título “rabino” distinguia um homem como sendo instruído na Lei de Moisés e, portanto, dá a entender que sua interpretação dos deveres religiosos prescritos na Lei era vinculativa ou infalível. Isso tende a criar autoridade humana em lugar da palavra expressa de Deus. Jesus aconselhou Seus seguidores a não olhar para os homens, mas para Deus e Sua vontade, conforme as Escrituras estabelecem. Essa advertência não tem qualquer influência sobre o uso de títulos como “doutor” ou “professor” nas instituições de ensino hoje, embora fosse aplicável a títulos honoríficos como “reverendo”, “sua santidade”, etc., o que implica o mesmo que o título de “rabino” nos dias de Cristo.

Mt.23:8 8. Vós, porém, não sereis chamados mestres, porque um só é vosso Mestre, e vós todos sois irmãos.

Não sereis chamados. O pronome “vós” é enfático no grego. Provavelmente, era uma advertência aos discípulos. Eles não deviam assumir um papel autoritário em matéria de teologia.

Mestres. Literalmente, “professores”.

A saber, o Cristo (ARC). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a omissão destas palavras, como na ARA.

Vós todos sois irmãos. Os cristãos devem se considerar iguais. Nenhum deve exercer autoridade sobre o outro, muito menos em questões de consciência.

Mt.23:9 9. A ninguém sobre a terra chameis vosso pai; porque só um é vosso Pai, aquele que está nos céus.

Pai. Título frequentemente aplicado aos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó (ver Jo.7:22; Jo.8:53) e, em geral, aos homens dignos das gerações passadas. Elias e Eliseu foram chamados de “pai” (2Rs.2:12; 2Rs.6:21). Um tratado da Mishnah (ver p. 86) é chamado Aboth, “Os pais”. A palavra aramaica abba, “pai”, ocorre sem tradução no NT (Mc.14:36; Rm.8:15; Gl.4:6). Aqui, Jesus parece referir-Se a um uso técnico do termo, comparável em suas implicações a “rabino” (ver com. de Mt.23:7-8).

Mt.23:10 10. Nem sereis chamados guias, porque um só é vosso Guia, o Cristo.

Guias. Do gr. kathegetai, “professores”, palavra do grego atual para “professores”.

O Cristo. Ver com. de Mt.1:1.

Mt.23:11 11. Mas o maior dentre vós será vosso servo.

Mas o maior. Ver com. de Mt.20:26; Mc.9:35; Lc.9:48; ver DTN, 613.

Mt.23:12 12. Quem a si mesmo se exaltar será humilhado; e quem a si mesmo se humilhar será exaltado.

Quem a si mesmo se exaltar. Ver com. de Mt.11:29; Mt.20:26; Lc.14:11; Lc.18:14. Este parece ter sido um dos ditados favoritos de Jesus, que Ele repetiu mais vezes, talvez, do que qualquer outro. Na declaração paralela no Talmude de Jerusalém lê-se: “Deus exalta quem se humilha, Deus humilhará aquele que se exalta” (ver Nota Adicional a Mateus 7; Mt.7:29).

Mt.23:13 13. Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque fechais o reino dos céus diante dos homens; pois vós não entrais, nem deixais entrar os que estão entrando!

Ai de vós. [Várias advertências de Jesus, Mt 23:13-36]. Do gr. ouai, uma exclamação de pesar ou denúncia (ver com. de Mt.11:21). Os sete ais (oito, se o de Mt.23:14 for incluído; ver com. do v. Mt.23:14) ilustram as observações feitas nos v. Mt.23:3-5 sobre os escribas e os fariseus (sobre o propósito de Jesus em proferir essas denúncias mordazes contra os líderes religiosos da nação, ver com. do v. Mt.23:1).

Hipócritas. Ver com. de Mt.6:2; Mt.7:5. O epíteto ocorre sete vezes em Mt.23:13-29.

Fechais o reino dos céus. Em primeiro lugar, o reino da graça divina; porém, eventualmente, também o reino da glória (ver com. de Mt.4:17; Mt.5:2). Os escribas e fariseus tornaram quase impossível, aos sinceros de coração, encontrar o caminho da salvação, em primeiro lugar, fazendo da religião um fardo insuportável (Mt.23:4) e, em segundo, pelo seu próprio exemplo hipócrita (v. Mt.23:3). Em vez de iluminar o caminho da salvação, a tradição rabínica o tornava tão obscurecido que até as melhores pessoas só podiam tatear ao longo do caminho, como em uma névoa densa (ver com. de Mc.7:5-13).

Não entrais. Sua maneira hipócrita de vida impedia os outros de entrar.

Nem deixais entrar. Ou, “não permitem entrada”. Era como se os escribas e fariseus estivessem fora da porta de entrada (ver com. de Mt.7:13-14) para impedir os outros de entrar e, depois de trancar a porta e colocar barricadas em frente dela, jogassem fora a chave para que, com certeza, ninguém entrasse. Eram tão exclusivistas, a ponto de pensar que o reino dos céus era uma espécie de clube privado em que apenas as pessoas que atingissem todos os padrões e requisitos poderia assegurar sua entrada.

Mt.23:14 14. [Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque devorais as casas das viúvas e, para o justificar, fazeis longas orações; por isso, sofrereis juízo muito mais severo!]

Devorais as casas das viúvas. As evidências textuais favorecem (cf. p. 136) a omissão do v. 14. Mas a afirmação é incontestável em Mc.12:40. Os fariseus convenciam as viúvas ricas a doar seus bens para o templo e, em seguida, usavam esses recursos para sua própria vantagem pessoal (DTN, 614). As viúvas eram protegidas pela lei (Ex.22:22), mas esse fato não impedia os fariseus gananciosos de agir em causa própria (cf. Is.10:2; sobre outro dispositivo destinado a legalizar a fraude sobre pessoas idosas, ver com. de Mc.7:11-13).

Para o justificar. Ver com. do v. Mt.23:5.

Longas orações. Ver com. de Mt.6:7.

Juízo muito mais severo. Por serem líderes, suas más ações eram mais condenáveis do que os mesmos atos cometidos por pessoas comuns. Como mestres da lei, seu comportamento era ainda mais condenável do que o dos pecadores comuns. Em primeiro lugar, eles conheciam a lei muito mais a fundo e, em segundo, seu mau exemplo seria observado pelos outros como uma justificativa para os seus erros.

Mt.23:15 15. Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque rodeais o mar e a terra para fazer um prosélito; e, uma vez feito, o tornais filho do inferno duas vezes mais do que vós!

Ai de vós. Ver com. do v. Mt.23:13.

Para fazer um prosélito. Os judeus e sua religião tinham ampla influência no império romano na época de Cristo (ver p. 48-50). Registros antigos revelam que havia muitos milhares de convertidos à fé judaica. Alguns se tornaram judeus e ordenavam sua vida em harmonia com todas as exigências cerimoniais judaicas. Primeiramente, eram instruídos e, então, batizados e obrigados a oferecer sacrifícios no templo em Jerusalém. Todos os homens foram circuncidados como sinal de aceitação da aliança abraâmica (ver com. de Gn.17:10-12). Um número muito maior acreditava no Deus verdadeiro e O adorava, mas sem participar dos ritos do judaísmo; esses eram conhecidos como “prosélitos de portão” ou “tementes a Deus”.

Duas vezes mais. Um convertido empolgado acabava se tornando, se possível, ainda mais intolerante do que os fariseus. Ser um “filho do inferno” significava se adequar ao “inferno” (do gr. geenna, ver com. de Mt.5:22) e destinado, portanto, para ele. Em contraste, ser “filho do reino” significava ter um caráter adequado ao reino e, consequentemente, ser destinado a ele.

Mt.23:16 16. Ai de vós, guias cegos, que dizeis: Quem jurar pelo santuário, isso é nada; mas, se alguém jurar pelo ouro do santuário, fica obrigado pelo que jurou!

Guias cegos. Jesus Se refere, naturalmente, à cegueira espiritual (ver com. de Jo.9:39-41). Os judeus se orgulhavam de ser guias para os gentios cegos (Rm.2:19); na verdade, eles se esforçavam muito para ganhar prosélitos (Mt.23:15). Mas um homem cego conduzir outros como ele seria o cúmulo da loucura. Jesus prossegue ilustrando o que Ele entende por cegueira espiritual (v. 16-24). Esta seção do indiciamento dos líderes judeus em Mateus 23 é maior do que qualquer outra registrada. O único remédio para a cegueira espiritual é o “colírio” divino (Ap.3:18), mas eles recusaram comprá-lo do único que podia vendê-lo. Aqui está um sóbrio aviso para a igreja hoje.

Quem jurar. Ver com. de Mt.5:33-37.

Isso é nada. Esta é a primeira ilustração da cegueira espiritual dos escribas e fariseus. Talvez o raciocínio por trás da distinção aqui mencionada é que um juramento para ser obrigatório devia ser específico. Por exemplo, de acordo com o Talmude: “Se alguém jurar pela Torah, suas palavras não têm nenhum efeito; mas se for por aquilo que está escrito nela, seu voto é obrigatório.” A expressão “não tem nenhum efeito” é semelhante à de Jesus, “é nada”.

Fica obrigado. O que jura deve cumprir o que prometeu, ou aceitar a responsabilidade por aquilo que jurou.

Mt.23:17 17. Insensatos e cegos! Pois qual é maior: o ouro ou o santuário que santifica o ouro?

Insensatos [...]! Do gr. moroi, “tolos”. Comparar com a advertência de Cristo em Mt.5:22 (ver com. ali) contra o uso precipitado desta palavra. Evidentemente, em Mt.5, Jesus condenou os motivos que, às vezes, levavam ao uso impulsivo da palavra, em vez do uso da palavra em si. No Sermão do Monte, do mesmo modo, o Mestre lidou com motivos, mais do que com atos externos. Ele não estava se dirigindo aos escribas e fariseus com raiva, mas simplesmente afirmando fatos.

Que santifica. Ou seja, torna sagrado. O ouro era sagrado somente em virtude do fato de que era do templo.

Mt.23:18 18. E dizeis: Quem jurar pelo altar, isso é nada; quem, porém, jurar pela oferta que está sobre o altar fica obrigado pelo que jurou.

Jurar pelo altar. Ver com. dos v. Mt.23:16-17, em que o mesmo princípio é aplicado.

Mt.23:19 19. Cegos! Pois qual é maior: a oferta ou o altar que santifica a oferta?

Insensatos (ARC). As evidências textuais (cf. p. 136) se dividem entre a inclusão e a omissão desta palavra.

Mt.23:20 20. Portanto, quem jurar pelo altar jura por ele e por tudo o que sobre ele está.

Sem comentário para este versículo.

Mt.23:21 21. Quem jurar pelo santuário jura por ele e por aquele que nele habita

Sem comentário para este versículo.

Mt.23:22 22. e quem jurar pelo céu jura pelo trono de Deus e por aquele que no trono está sentado.

Jurar pelo céu. Ver com. dos v. Mt.23:16-17, em que se aplica o mesmo princípio. O próprio Céu e o trono de Deus são sagrados somente em virtude da presença dEle.

Mt.23:23 23. Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e tendes negligenciado os preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé; devíeis, porém, fazer estas coisas, sem omitir aquelas!

Dais o dízimo. O dízimo era parte da Lei (ver com. de Lv.27:30; Dt.14:22). O escrupuloso cuidado com que os judeus devotos pagavam o dízimo se reflete na Mishnah: “Tudo o que for [considerado] alimento e for guardado e crescer para fora do solo, está sujeito aos dízimos.” E eles ainda estabeleceram outra regra (no que diz respeito ao dízimo): “Tudo o que for considerado alimento tanto no início quanto no final [do crescimento], embora seja retido para uso de modo a aumentar a quantidade de alimentos, é suscetível [de dízimo], quer [seja colhido] em sua fase inicial ou final [de maturação] [...]. Quando é que os frutos se tornam suscetíveis de dízimo? Figos, a partir do momento em que eles são chamados bohal; uvas e uvas silvestres, nos primeiros estágios de maturação; frutas vermelhas e amoras, depois que se tornam vermelhas, etc.”.

Hortelã. Na Mishnah, esta erva não é mencionada como suscetível ao dízimo. Era dizimada por judeus escrupulosos, sem dúvida, como prova de seu profundo respeito pela lei do dízimo.

Endro. É mencionado na Mishnah como sujeito ao dízimo. Todas as partes da planta deviam ser dizimadas: sementes, folhas e vagens; na verdade, tudo, exceto a raiz.

Cominho. Uma planta cultivada cujas sementes aromáticas são utilizadas como tempero ou para dar sabor aos alimentos (ver Is.28:25; Is.28:27). As sementes do cominho são semelhantes às da alcaravia, mas menos agradáveis ao paladar e menos nutritivas. Todas as três ervas aqui mencionadas eram usadas na culinária e as duas últimas eram valorizadas por suas propriedades medicinais (ver com. de Is.28:25).

Sem omitir. Ou, “negligenciar”. Isso era semelhante à acusação que os líderes judeus fizeram a Cristo (ver com. de Mt.5:17-20).

Os preceitos mais importantes. Os próprios escribas tinham feito um arranjo artificial das leis do judaísmo, alistando-as como sendo mais ou menos importantes (ver com. de Mt.22:36; ver também com. de Mt.5:17-20). Os escribas e fariseus davam grande valor às ordenanças humanas e às formas externas de observância da lei (ver com. de Mc.7:3-13), mas se esqueciam quase completamente do verdadeiro espírito da lei em si, do amor a Deus e ao próximo (ver com. de Mt.22:37; Mt.22:39). No Sermão do Monte, Jesus tinha procurado restaurar o espírito da observância externa da lei (ver com. de Mt.5:17-22).

Juízo (ARC). Do gr. krisis, aqui, provavelmente usado com o sentido de “direito”, ou “justiça” (ARA; sobre a misericórdia nas relações humanas, ver com. de Mt.9:13; sobre a fé, ver com. de Hb.2:4).

Estas. Ou seja, as coisas menos pesadas que, muitas vezes, consistiam principalmente na forma externa. Jesus aqui aprova o dízimo. Nem Ele, nem qualquer outro escritor do NT eliminam essa obrigação. Jesus deixa claro que não é contra o dízimo como ordenança, mas contra o espírito hipócrita do escriba e do fariseu, cuja religião consistia na escrupulosa observância das formas da lei.

Aquelas. Ou, os “assuntos mais importantes da lei”, que o escriba e o fariseu tinham negligenciado.

Mt.23:24 24. Guias cegos, que coais o mosquito e engolis o camelo!

Guias cegos. Ver com. do v. Mt.23:16.

Coais. Do gr. diulizo, “filtrar”, como passar através de uma peneira. A cláusula deveria dizer, literalmente, “coar todos os insetos” da água potável (cf. DTN, 617). Aqui Jesus novamente censura os escribas e os fariseus pelas precauções elaboradas em questões menores e por negligência quando se trata de coisas que são realmente importantes. O mosquito e o camelo são imundos de acordo com a lei levítica (ver com. de Lv.11:4; Lv.11:22-23). As precauções elaboradas tomadas contra engolir as mais diminutas (e impuras) formas de vida animal, enquanto engoliam um dos maiores dentre os animais imundos, o camelo, são colocadas lado a lado em uma das figuras hiperbólicas impressionantes que tornavam os ensinos de Cristo notáveis (cf. com. de Mt.19:24).

Mt.23:25 25. Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque limpais o exterior do copo e do prato, mas estes, por dentro, estão cheios de rapina e intemperança!

O exterior do copo. Jesus Se refere não aos hábitos dos fariseus sobre utensílios domésticos literais, no uso dos quais os judeus exerciam escrupuloso cuidado, mas aos próprios fariseus. Com copos literais, os fariseus tomariam tão grande cuidado do interior como do lado exterior. A dificuldade é que eles não conseguiam aplicar o mesmo princípio à vida diária. Viviam para serem “vistos dos homens” (ver com. do v. Mt.23:5), parecendo completamente alheios ao fato de que Deus podia ver o coração e sabia muito bem os motivos hipócritas que moviam sua piedade exteriormente escrupulosa (comparar com Mc.7:18-23).

Prato. Do gr. paropsis, um prato no qual se serviam guloseimas.

Rapina e intemperança. As palavras aqui traduzidas indicam “rapina” e “roubo” por um lado, e “intemperança” e “falta de autocontrole” por outro. Cristo ilustra como os escribas e fariseus falhavam nos assuntos “mais importantes da lei” (v. Mt.23:23).

Mt.23:26 26. Fariseu cego, limpa primeiro o interior do copo, para que também o seu exterior fique limpo!

Limpa primeiro. Uma limpeza eficaz deve começar por dentro (ver com. de Mc.7:3-18; Lc.11:41).

Mt.23:27 27. Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia!

Ai de vós. Ver com. do v. Mt.23:13.

Sepulcros caiados. De acordo com a lei ritual, uma forma extrema de contaminação era o contato com a morte. Os sacerdotes, por exemplo, não deviam se “contaminar” pelo contato com os mortos, salvo em caso de parentes próximos (Lv.21:1-4), mas até essa exceção era negada ao sumo sacerdote (v. Lv.21:10-11). De acordo com a Mishnah, era costume caiar as sepulturas em 15 de adar, um mês antes da Páscoa, a fim de que os sacerdotes e nazireus pudessem evitar a contaminação através do contato involuntário com as sepulturas (ver Nm.19:11-22; comparar com At.23:3; ver com. de Lc.11:44).

Mt.23:28 28. Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas, por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniqüidade.

Pareceis justos. Ver com. dos v. Mt.23:3 e 50.

Dentro. Sobre a importância da retidão interior, ver com. de Mt.5:22; Mt.5:28.

Mt.23:29 29. Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque edificais os sepulcros dos profetas, adornais os túmulos dos justos

Edificais os sepulcros. Os mártires de uma geração, muitas vezes, se tornam os heróis da seguinte. Enquanto os profetas estavam vivos, era comum apedrejá-los. Algum tempo após a sua morte, era costume edificar monumentos elaborados em pedra para homenageá-los. Os judeus não poderiam honrar os profetas vivos sem aceitar as suas mensagens, mas era simples honrar os mortos sem acatar suas exortações.

Mt.23:30 30. e dizeis: Se tivéssemos vivido nos dias de nossos pais, não teríamos sido seus cúmplices no sangue dos profetas!

Se tivéssemos vivido. Cada geração tende a se orgulhar de ser mais sábia e tolerante do que as anteriores. Hoje também podemos encontrar satisfação em pensar que não somos como os escribas e os fariseus, alheios ao fato de que, ao pensar desse modo, nos tornamos como eles (ver com. de Lc.18:11). A luz aumenta as responsabilidades. Os profetas dos tempos antigos sofreram porque desafiaram as crenças, normas e ações de seus contemporâneos. Se esses profetas vivessem hoje, teriam comunicado as mesmas mensagens em denúncia ao pecado, e essas mensagens provavelmente teriam encontrado a mesma resistência insensível e provocado as mesmas tentativas de silenciar seus portadores.

Mt.23:31 31. Assim, contra vós mesmos, testificais que sois filhos dos que mataram os profetas.

Contra vós mesmos. Eles se fizeram responsáveis pela luz da verdade que brilhou das mensagens dos profetas, que, embora mortos, ainda falavam.

Mt.23:32 32. Enchei vós, pois, a medida de vossos pais.

Enchei-vos. O pronome “vós” é enfático no grego. A taça de culpa da nação judaica estava quase cheia, e as obras das pessoas da geração de Cristo, especialmente a rejeição dEle como o Messias (ver com. de Jo.19:15), encheriam essa taça a ponto de fazê-la transbordar (ver vol. 4, p. 19, 20). Do mesmo modo que a culpa de Babilônia atingiu os limites da tolerância divina na noite da festa de Belsazar, Israel como nação ultrapassou os limites da graça divina ao rejeitar e crucificar Jesus.

Mt.23:33 33. Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da condenação do inferno?

Raça de víboras. Ver com. de Mt.3:7; Mt.12:34.

Como escapareis [...]? Ver com. de Hb.2:3.

Da condenação. Ou, “da sentença”.

Inferno. Do gr. geenna (ver com. de Mt.5:22). Eles eram testemunhas contra si mesmos (Mt.23:31). Se admitissem a culpa, como poderiam esperar se livrar?

Mt.23:34 34. Por isso, eis que eu vos envio profetas, sábios e escribas. A uns matareis e crucificareis; a outros açoitareis nas vossas sinagogas e perseguireis de cidade em cidade

Eu vos envio. Comparar com Lc.11:49.

Sábios. Assim Cristo classificou os homens que entenderam as mensagens dos profetas e procuraram aplicar à vida da nação os princípios nelas estabelecidos. Eram homens que tinham a “ciência dos tempos” e sabiam “o que Israel devia fazer” (1Cr.12:32, ARC), à luz da verdade revelada. Os sábios “eram conselheiros seguros”, homens prudentes, cuja liderança podia ser confiável. Não eram líderes “cegos”, como os escribas e fariseus (ver com. de Mt.23:16-17; sobre o significado de “sabedoria” em contraposição a “compreensão” e “conhecimento”, ver com. de Pv.1:2).

Matareis e crucificareis. Estêvão morreu por causa do desejo dos escribas e dos fariseus de derramar o sangue daqueles que falavam por Deus (At.7:59). Foi o despeito dos judeus que levou Paulo à prisão mais de uma vez e à sua execução (ver 2Tm.4:6-8; AA, 489, 597). Deve-se notar que a crucifixão era um modo romano e não judaico de execução.

Açoitareis. Sobre o costume de açoitar pessoas na sinagoga, ver com. de Mt.10:17. Paulo foi açoitado cinco vezes (2Co.11:24).

Perseguireis. Ver com. de Mt.5:10-12; Mt.10:17-18; Mt.10:23 (quanto a exemplos de perseguição, ver At.13:50; At.14:5-6; At.14:19-20; At.26:11).

Mt.23:35 35. para que sobre vós recaia todo o sangue justo derramado sobre a terra, desde o sangue do justo Abel até ao sangue de Zacarias, filho de Baraquias, a quem matastes entre o santuário e o altar.

Sobre vós. Isso não quer dizer que as pessoas da geração de Cristo deveriam ser punidas pelos erros de seus antecessores, pois as Escrituras ensinam especificamente que ninguém é punido pelos pecados dos outros (ver Ez.18:2-30; Ex.32:33). Mas a rejeição a Jesus e a Seus ensinamentos tornou a sua culpa maior do que a de qualquer geração anterior.

O sangue justo. Ou, o sangue de inocentes.

Abel. Ver com. de Gn.4:8-10.

Zacarias. Sem dúvida, refere-se ao Zacarias, filho de Joiada, o sumo sacerdote, que foi apedrejado até a morte no pátio do templo, sob a ordem do rei Joás, que reinou de 835 a 796 a.C. (2Cr.24:20-22; ver vol. 2, p. 68). Inúmeras referências a esse assassinato na literatura judaica posterior não deixam dúvida de que ele causou uma profunda impressão na memória da nação. Nas Bíblias hebraicas, os livros de Crônicas aparecem como os últimos das Escrituras, na mesma posição ocupada por Malaquias em nossa Bíblia (ver vol. 1, p. 13). Partindo do pressuposto plausível de que Jesus mencionou Abel e Zacarias porque, de acordo com a ordem dos livros na Bíblia hebraica, eles representam o primeiro e o último mártir registrados, a maioria dos estudiosos conclui que a ordem judaica de livros que colocava Crônicas por último já existia na época de Jesus.

Filho de Baraquias. Zacarias, filho de Joiada (2Cr.24:20-22) é a única pessoa com esse nome mencionada na Bíblia como tendo sido morta desse modo (ver DTN, 619). Não há informações a respeito de Zacarias, filho de Baraquias (Zc.1:1), como alguém que sofreu morte violenta. O mesmo pode ser dito de “Zacarias, filho de Jeberequias”, mencionado em Is.8:2. Tem sido sugerido que Jesus não identificou Zacarias como o “filho de Baraquias”, mas que essas palavras foram acrescentadas mais tarde por um escriba que, ao escrever, tinha em mente tanto o profeta Zacarias quanto o Zacarias de Is.8:2. É digno de nota que, na declaração paralela de Lc.11:51, Zacarias não é identificado como “filho de Baraquias”.

O santuário. Do gr. nãos, o templo propriamente dito, diferentemente de hieron, ou o complexo do templo como um todo (ver Mt.21:23), que incluía o pátio e outros edifícios adjacentes. Normalmente, apenas um sacerdote tinha acesso ao pátio interno do templo, onde ficava o altar do holocausto, e o fato de Zacarias estar “entre o templo e o altar” sugere que ele estava em serviço como sacerdote no momento de seu martírio. Se o pátio do templo de Salomão era igual ao do templo de Herodes, os assassinos de Zacarias, a menos que fossem sacerdotes ou levitas, provavelmente, não tinham o direito de entrar ali.

Mt.23:36 36. Em verdade vos digo que todas estas coisas hão de vir sobre a presente geração.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Todas estas coisas. Ou, o clímax das más ações resumidas nos v. Mt.23:34-35. A taça da iniquidade dos judeus como nação estava se enchendo rapidamente (ver com. do v. Mt.23:32).

Presente geração. Jesus aqui Se refere claramente à “geração” de pessoas vivas, Seus contemporâneos judeus. No capítulo seguinte, Ele deixa claro o destino a que Se refere aqui, a destruição de Jerusalém e do templo pelos exércitos de Roma, em 70 d.C. (ver Mt.24:15-20; Lc.21:20-24; comparar também com Mt.24:34; Lc.11:50).

Mt.23:37 37. Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes!

Jerusalém, Jerusalém [...]! [O lamento sobre Jerusalém, Mt 23:37-39 = Lc.13:34-35]. Todas as esperanças de Israel como nação centravam-se em Jerusalém. A cidade era o símbolo de força e orgulho nacional (sobre o papel de Jerusalém no plano de Deus, ver vol. 4, p. 13-17).

Que matas os profetas. Ver com. do v. Mt.23:34.

Quis Eu reunir. Literalmente, “como desejei reuni-los!” Esta é uma das expressões mais pungentes e solícitas dos lábios de Jesus. Com o mesmo terno anelo, Deus contempla todos os perdidos (ver com. de Lc.15:7). O tempo em que Deus devia rejeitar os judeus como povo escolhido estava prestes a chegar (ver Mt.23:38). Mas com que relutância Ele os abandonou à sua própria perversidade e a seu trágico destino! (comparar com outras afirmações das Escrituras que expressam a misericórdia e a longanimidade de Deus exercida para com os pecadores impenitentes, em Ez.18:23; Ez.18:31-32; Ez.33:11; 1Tm.2:4; 2Pe.3:9).

Como a galinha. Ou, “seus filhotes”.

Vós não o quisestes! Foi a escolha deles que determinou seu destino (ver com. de Dn.4:17; ver vol. 4, p. 19, 20; T5, 120). Nenhum pecador se perderá por causa de provisão inadequada por parte do Céu (comparar com Js.24:15; Is.55:1; Ap.22:17).

Mt.23:38 38. Eis que a vossa casa vos ficará deserta.

Vossa casa. Apenas um dia antes, Jesus tinha Se referido ao templo como “Minha casa” (Mt.21:13). Então, passou a ser “vossa casa”. As palavras de Jesus devem ter despertado terror no coração dos sacerdotes e príncipes. Pode ser que, durante o julgamento de Cristo, eles tenham se lembrado dessa declaração (Mt.26:61-64). O véu rasgado, três dias depois, foi um sinal visível, de que Deus não aceitava mais as formas e as cerimônias destituídas de significado. Por cerca de 40 anos mais, elas continuaram a ser praticadas (ver Mt.27:51). A semana profética de Dn.9:27 estava no meio e, tanto quanto dizia respeito ao Céu, o valor do sacrifício e da oblação estava prestes a cessar para sempre (ver com. de Mt.24:3; Mt.24:15; Lc.21:20; ver vol. 4, p. 22).

Mt.23:39 39. Declaro-vos, pois, que, desde agora, já não me vereis, até que venhais a dizer: Bendito o que vem em nome do Senhor!

Já não Me vereis. Esta declaração deve ser entendida nos mesmos termos de outras feitas por Jesus durante essa mesma semana, particularmente a de Mt.26:64. Por “desde agora” Jesus não Se refere à Sua saída do templo, na tarde de terça-feira, mas a todas as circunstâncias ligadas à rejeição, ao julgamento e crucifixão.

Bendito. Jesus Se referiu ao tempo em que os homens, incluindo os “que O traspassaram” (Ap.1:7), O veriam “vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória” (Mt.24:30). No último grande dia, mesmo os escarnecedores seriam obrigados a reconhecer a bem-aventurança dAquele a quem eles amaldiçoaram tão livremente (ver Fp.2:9-11). Os escribas e fariseus, a quem Jesus falou, estariam nessa multidão. Jesus quis dizer: “Vocês não mais Me verão até que Eu retorne em glória.” Logo depois de dizer essas palavras, Jesus partiu para sempre do recinto do templo (quanto a outros eventos anteriores a essa partida do pátio do templo, ver com. de Mc.12:41-44; Jo.12:20-50).

Mt.24:1 1. Tendo Jesus saído do templo, ia-se retirando, quando se aproximaram dele os seus discípulos para lhe mostrar as construções do templo.

Tendo Jesus saído. [O sermão profético: A destruição do templo, Mt 24:1-51 = Mc.13:1-37 = Lc.21:5-36; Lc.12:42-46. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 221; gráfico, p. 230]. Provavelmente, na terça-feira à tarde, Jesus passou o dia ensinando no pátio do templo e foi assediado várias vezes por grupo após grupo de líderes judeus. Finalmente, em Seu último discurso público (Mt.23), Ele delineou em termos inequívocos o caráter hipócrita dos “guias cegos” (v. Mt.23:16) e, em seguida, partiu do templo para sempre. O relato de Mateus sobre os acontecimentos desse dia estão registrados em Mt.21:23-23:39. O discurso proferido, em particular, com alguns dos discípulos na encosta do monte das Oliveiras ocupa os cap. 24 e 25. Marcos e Lucas seguem o relato de Mateus 24 até o v. Mt.24:42. Deixando o templo, Jesus e pelo menos quatro de Seus discípulos fizeram uma descida íngreme ao vale de Cedrom e subiram a encosta do monte das Oliveiras, que se eleva cerca de 120m acima do vale de Cedrom. Sendo cerca de 90m mais alto do que o templo, a elevação proporcionava uma vista do templo e da cidade (ver com. de Mt.21:1; ver ilustração, p. 550).

Seus discípulos. Mc.13:3 identifica esses discípulos como Pedro, André, Tiago e João, os quatro que tinham sido chamados quando trabalhavam com suas redes na praia do mar da Galileia, menos de dois anos antes (ver com. de Lc.5:1-11).

Para Lhe mostrar. Só Marcos relata as palavras dos discípulos: “Mestre! que pedras, que construções!” (Mc.13:1). O templo era o orgulho e a alegria de cada coração judeu. Josefo compara as paredes de pedra branca do templo à beleza de uma montanha coberta de neve (Guerra dos judeus, v.5.6 [223]) e dá a dimensão fabulosa de algumas das suas pedras: 45 x 5 x 6 côvados (cerca de 20 x 2 x 2,7 m). O templo, naquela ocasião, estava em processo de construção havia quase 50 anos (ver Jo.2:20) e a obra de construção de todo o complexo de pátios e edifícios não foi concluída até cerca de 63 d.C., sete anos antes de ser totalmente destruído pelo exército de Tito.

Mt.24:2 2. Ele, porém, lhes disse: Não vedes tudo isto? Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra que não seja derribada.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Pedra sobre pedra. Para o tamanho fabuloso de algumas das pedras usadas na construção do templo, ver com. do v. Mt.24:1. Esta predição foi literalmente cumprida quando Jerusalém caiu, em 70 d.C. (ver com. do v. Mt.24:1).

Derribada. Josefo descreve vividamente a destruição do templo e os esforços feitos por Tito para salvá-lo (Guerra dos judeus, vi.4.5-8 [249-270]). A excelente construção do edifício assegurava que ele resistiria a ataques indefinidamente. A própria cidade de Jerusalém era considerada, para todos os efeitos práticos, inexpugnável, mas Jesus previu que seria destruída pela força.

Mt.24:3 3. No monte das Oliveiras, achava-se Jesus assentado, quando se aproximaram dele os discípulos, em particular, e lhe pediram: Dize-nos quando sucederão estas coisas e que sinal haverá da tua vinda e da consumação do século.

Assentado. Jesus provavelmente tinha subido ao monte para passar a noite, ao invés de voltar a Betânia como fizera nos dois dias anteriores (ver com. do Mt.21:17).

Os discípulos. Ver com. do v. Mt.24:1.

Em particular. Era-lhes difícil compreender a declaração de Jesus a respeito da destruição do templo, particularmente em vista dos acontecimentos então recentes, como a entrada triunfal e a segunda purificação do templo, o que lhes parecia pressagiar o estabelecimento iminente do reino messiânico. Sem dúvida, O procuraram em particular, pois seria considerado traição falar sobre essas coisas publicamente.

Dize-nos quando. Eles criam que Jesus Se proclamaria Rei a qualquer momento e seria aclamado como Messias pelo povo. Quando, então, a desolação do templo ocorreria?

Estas coisas. Isto é, a desolação à qual Jesus Se referia, registrada em Mt.23:38 e que fora mais claramente afirmada em Mt.24:2.

Que sinal. Ver com. do v. Mt.24:30.

Vinda. Do gr. parousia, “presença” ou “chegada”. A palavra parousia ocorre comumente nos papiros por ocasião da visita de um imperador ou um rei. O termo também ocorre nos v. Mt.24:27; Mt.24:37; Mt.24:39, mas em nenhum outro lugar no evangelho, embora seja abundante nas epístolas. Por vezes, é utilizada para denotar a presença, em oposição à ausência assim como em Fp.2:12 mas é mais comumente usada para denotar a vinda de Cristo (2Ts.2:1), ou de homens (1Co.16:17). No NT, é empregada como um termo técnico para o segundo advento de Cristo. Não há nada no termo parousia que signifique uma vinda secreta. Os discípulos, aparentemente, entenderam que Jesus devia partir por um tempo, para depois retornar em poder e glória para estabelecer Seu reino. Evidentemente, Ele já devia ter dado instruções mais explícitas sobre o assunto do que os evangelhos registram (cf. GC, 25). A crença popular era que, quando o Messias viesse, Ele desapareceria por um tempo e, quando reaparecesse, ninguém saberia de onde viria. No entanto, esta é a primeira discussão ampliada da segunda “vinda”, no que diz respeito ao registro do evangelho, embora esteja implícita nas parábolas dos talentos (Lc.19:12-15) e dos lavradores maus (Mt.21:33-41; Mt.16:27; ver vol. 4, p. 13-17; ver também DTN, 30).

Na mente dos discípulos, “estas coisas” (a “destruição do templo” e a segunda vinda de Jesus no “fim do mundo”) estavam estreitamente unidas. Eles concebiam um desses eventos como ocorrendo simultaneamente ou em rápida sucessão. Quando, no dia da ascensão, os discípulos perguntaram: “Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel?”, Jesus respondeu: “Não vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reservou para Sua exclusiva autoridade” (At.1:6-7). Eles ainda não haviam entendido que a nação judaica rejeitaria Jesus e, por sua vez, seria rejeitada como nação escolhida de Deus (ver vol. 4, p. 19, 20). O conhecimento dos eventos futuros, na época, teria sido insuportável para eles. Os discípulos tinham, na verdade, demonstrado incapacidade de compreender a instrução que Cristo repetia a eles por quase um ano em relação ao sofrimento e morte iminentes (ver com. de Mt.16:21; Mt.20:17-19). Os eventos preditos provaram ser quase mais do que eles podiam suportar (ver Lc.24:11; Lc.24:17-25; DTN, 631, 772).

Consumação do século. Ou, “fim do mundo” (ARC). Sobre o significado do gr. aion, “mundo”, ver com. de Mt.13:39. Expressões similares ocorrem com frequência na literatura apocalíptica judaica para descrever o fim da atual ordem das coisas e o início da era messiânica (ver vol. 4, p. 13-17). Os discípulos relacionavam as perguntas deles com as mensagens messiânicas dos profetas do AT. Mas, como os outros judeus, não compreendiam perfeitamente que as promessas de Deus poderiam se cumprir para Israel somente após o cumprimento das condições necessárias (ver vol. 4, p. 17-21; ver com. de Je.18:6-10). Jesus misturou em Sua resposta à pergunta dos discípulos, eventos que levavam ao “fim” da nação judaica como povo escolhido de Deus e ao “fim” do mundo. As linhas não podem ser sempre nitidamente traçadas entre os dois. Uma parte considerável do que Jesus delineou para o futuro se aplicava aos eventos que logo ocorreriam à nação judaica, à cidade de Jerusalém e ao templo. No entanto, o discurso também foi dado em benefício daqueles que viveriam em meio às últimas cenas da história da Terra. Ellen G. White aplica os sinais enumerados nos v. Mt.24:4-14 principalmente à queda de Jerusalém e, alguns deles, secundariamente, ao nosso tempo, ao passo que os sinais dos v. Mt.24:21-30 são quase exclusivamente associados aos eventos que antecedem a segunda vinda do Salvador (ver DTN, 628 a 633; ver também com. de Mt.10:1).

Mt.24:4 4. E ele lhes respondeu: Vede que ninguém vos engane.

Ninguém vos engane. A principal razão para a cautela é evitar ser enganado ou desviado. De uma forma ou de outra, Jesus repetiu esse aviso muitas vezes (ver v. Mt.24:4-6; Mt.24:11; Mt.24:23-26; Mt.24:36; Mt.24:42-46).

Mt.24:5 5. Porque virão muitos em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo, e enganarão a muitos.

Em Meu nome. Ou, fingindo ser o Messias. O aviso do v. 5 se aplica especificamente à queda de Jerusalém e da nação judaica, que era particularmente suscetível a esse tipo de fraude. Nos dias dos apóstolos, havia muitos falsos messias (ver Josefo, Guerra dos Judeus, vi.5.4 [312-315]). Depois (v. Mt.24:27), “em linguagem inequívoca, o Senhor falou de Sua segunda vinda” (DTN, 631).

Mt.24:6 6. E, certamente, ouvireis falar de guerras e rumores de guerras; vede, não vos assusteis, porque é necessário assim acontecer, mas ainda não é o fim.

Rumores. Do gr. akoai, “relatos”. Os discípulos não deviam se surpreender ou se alarmar quando, antes do ano 70 d.C., guerras eclodissem. Haveria guerras antes da queda de Jerusalém, mas elas não anunciariam o breve retorno de Jesus (ver DTN, 628, 629).

O fim. Neste discurso, o Senhor prevê tanto o fim da nação judaica como do mundo. Os rabinos declarariam que os sinais dos v. 6 a 8 seriam “o sinal da vinda do Messias” e “de sua libertação [como povo] da servidão”, mas Jesus os apontou como “sinais de sua destruição [como nação]” (DTN, 628, 629; cf. MDC, 120). E, assim como as guerras e os rumores de guerras dos tempos apostólicos prenunciavam o fim da nação judaica, do mesmo modo, a turbulência internacional e os conflitos dos nossos dias pressagiam o fim do mundo (ver PR, 536; T5, 753).

Mt.24:7 7. Porquanto se levantará nação contra nação, reino contra reino, e haverá fomes e terremotos em vários lugares

Nação contra nação. Escritores judeus e romanos descrevem o período de 31-70 d.C. como um tempo de grandes calamidades. Estas palavras de Cristo foram literalmente cumpridas em eventos antes da queda de Jerusalém, em 70 d.C. (ver DTN, 628, 629). As previsões sobre “fomes, e pestes, e terremotos”, do v. 7 (ARC), sem dúvida também se referem principalmente ao mesmo período. Jesus advertiu os primeiros cristãos a não considerar a luta política, fomes, pestes e terremotos daquele tempo como sinais do “fim” imediato do mundo (ver com. do v. Mt.24:3).

Fomes. Uma grave fome na Judeia, ocorrida por volta do ano 44 d.C., é mencionada em At.11:28. Houve, ao todo, quatro grandes períodos de fome durante o reinado de Cláudio, em 41 a 54 d.C.

Pestes (ARC). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a omissão desta palavra.

Terremotos. Houve uma série de grandes terremotos entre 31 d.C. e 70 d.C. Os piores deles foram em Creta (46 ou 47), Roma (51), Frigia (60) e Campânia (63). Tácito também fala de furacões particularmente severos e tempestades no ano 65 d.C. (Anais, xvi. 10-13).

Vários lugares. Ou, “em muitas regiões”.

Mt.24:8 8. porém tudo isto é o princípio das dores.

O princípio. Ver com. dos v. Mt.24:6-7.

Dores. Do gr. odines, “dores de parto”, “contrações do parto”, “trabalho de parto”, “parto”. A mesma palavra é traduzida como “dores de parto” em 1Ts.5:3, a forma verbal ocorre em Gl.4:19, Gl.4:27; e Ap.12:2. Metaforicamente, a palavra denota dores em um sentido mais amplo (ver At.2:24). Os judeus usavam uma expressão (do heb. cheblo shel mashiach; aramaico chebleh dimeshiach, literalmente, “a dor do Messias”, uma vez na passagem em questão na forma plural, “as dores do Messias”) pela qual designavam não os sofrimentos do próprio Messias, mas as calamidades das quais a era messiânica nasceria. A expressão já é encontrada por volta de 90 d.C. em uma frase do rabi Eliézer e, possivelmente, já era usada no tempo de Jesus. Se assim for, o uso que Jesus tez do termo chamaria a atenção para essas calamidades previstas (sobre as expectativas do fim do mundo por parte dos escritores apocalípticos não canônicos, ver 2 Esdras 5:1-12; 6:18-25; 15:16; Apocalipse de Baruque 27; 48:31-37; 70:2-10; Livro dos Jubileus 23:16-25; Livro de Enoque 99:4-7; 100:1-6).

Mt.24:9 9. Então, sereis atribulados, e vos matarão. Sereis odiados de todas as nações, por causa do meu nome.

Atribulados. Ver com. de Mt.5:10-12; Mt.10:17-24. Estêvão (At.7:59-60), Pedro e João (At.4:3-7; At.4:21), Pedro e Tiago (At.12:1-4) estiveram entre os primeiros cristãos a sofrer nas mãos das autoridades. Paulo compareceu diante de Félix, Festo, Agripa e César (At.24-28; comparar com Mc.13:9-12). Cristo falou da perseguição que viria depois da queda de Jerusalém, em 70 d.C. (ver Mt.24:21-22).

Por causa do Meu nome. Ou, “por causa de Mim”, equivale a dizer, “porque vocês são cristãos” (ver com. Mt.5:11).

Mt.24:10 10. Nesse tempo, muitos hão de se escandalizar, trair e odiar uns aos outros

Escandalizar. Literalmente, “fazer tropeçar” (ver com. de Mt.5:29). Eles cairiam ou apostatariam e, como consequência, os crentes perderiam seu “primeiro amor” (Ap.2:4; sobre a apostasia nos primeiros séculos, ver com. de 2Ts.2:3-4).

Odiar uns aos outros. Ver com. de Mt.10:21-22.

Mt.24:11 11. levantar-se-ão muitos falsos profetas e enganarão a muitos.

Muitos falsos profetas. Comparar com o v. Mt.24:4. A história registra que muitos falsos profetas apareceram nos anos imediatamente anteriores à queda de Jerusalém nas mãos dos romanos (sobre os falsos profetas dos últimos dias, ver com. dos v. Mt.24:24-27; cf. DTN, 628, 631; sobre uma advertência anterior contra os falsos profetas, ver com. de Mt.7:15-20). Em Mt.24:24-26, Cristo fala especificamente do trabalho dos falsos profetas antes de Sua segunda vinda.

Mt.24:12 12. E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor se esfriará de quase todos.

Por se multiplicar a iniquidade. A previsão de Cristo teve o primeiro cumprimento nas décadas anteriores à queda de Jerusalém, em 70 d.C. (DTN, 633; cf. 36, 37). A profecia se cumprirá outra vez nos últimos dias (2Tm.3:1-5; cf. T5, 136, 741).

O amor. Sobre uma descrição dessa graça cristã, ver 1Co.13; ver com. de Mt.5:43-44; quanto ao cumprimento dessa previsão, na medida em que se aplica à igreja cristã, ver com. de Ap.2:4. Muitos acham mais fácil seguir o mundo do que permanecer fiéis e firmes.

Mt.24:13 13. Aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será salvo.

Aquele, porém, que perseverar. Ou, suportar as várias tentações à apostasia, como os enganos dos falsos profetas (v. Mt.24:11) e a atração pelo pecado (v. Mt.24:12).

Até o fim. Do gr. telos. Nos v. Mt.24:6; Mt.24:14, “fim” é uma palavra originada de telos, mas, no v. Mt.24:3, vem de sunteleia. Não está claro se Cristo quis dizer “até o limite da resistência” (ver 1Co.10:13; Hb.12:4), ou “até o fim do mundo” (ver com. de Mt.24:3; Mt.24:6).

Mt.24:14 14. E será pregado este evangelho do reino por todo o mundo, para testemunho a todas as nações. Então, virá o fim.

Este evangelho. Do gr. euaggelion (ver com. de Mc.1:1).

Do reino. Ver com. de Mt.3:2; Mt.4:17; Mt.5:3.

O mundo. Do gr. oikoumene, “o mundo não habitado” (ver com. de Lc.2:1 em contraste com aion, “mundo”, considerado do ponto de vista temporal (ver com. de Mt.24:3). Trinta anos depois de Cristo pronunciar estas palavras, Paulo afirmou que o evangelho tinha sido pregado a todo o mundo (Cl.1:23; Rm.1:8; Rm.10:18; Cl.1:5-6; T8, 26), confirmando o cumprimento literal desta predição em seu tempo (ver AA, 633). No entanto, a declaração de Paulo era verdade apenas em um sentido limitado. O pleno cumprimento desta profecia do Senhor ainda está para ser realizado (ver AA, 111). O glorioso progresso do evangelho em todo o mundo, durante o século 19 e na primeira metade do século 20, alegra o coração de todo cristão sincero e consciente, levando-o a crer que o completo cumprimento da promessa de Mateus 24:14 está prestes a se realizar.

De modo geral, acredita-se que a era das missões cristãs teve início com o trabalho de William Carey, em 1793. Desde sua missão histórica na Índia, tem sido testemunhada uma das maiores conquistas da fé cristã desde os dias dos apóstolos. De mãos dadas com as missões estrangeiras, a Bíblia passou a ser traduzida e a circular em vários lugares. Considerando que, nos primeiros 18 séculos da era cristã, a Bíblia foi traduzida em apenas 71 idiomas, no século 19 esse número subiu para 567. Em meados do século 20, a Bíblia estava disponível em mais de mil línguas. Em 2011, foram registradas publicações do texto bíblico em 2.539 línguas. Poucos povos não têm acesso a pelo menos uma porção das Escrituras em sua língua materna.

O fim. Ver com. dos v. Mt.24:3; Mt.24:6; Mt.24:13.

Mt.24:15 15. Quando, pois, virdes o abominável da desolação de que falou o profeta Daniel, no lugar santo (quem lê entenda),

O abominável da desolação. Ver com. de Dn.9:27; Dn.11:31; Dn.12:11. Na LXX, esses versos de Daniel contêm palavras gregas semelhantes ou idênticas (cf. 1 Macabeus 1:54). Entre os judeus, um ídolo ou outro símbolo pagão era, geralmente, chamado de “abominação” (1Rs.11:5; 1Rs.11:7; 2Rs.23:13) ou algo ofensivo a partir de um ponto de vista religioso (Ex.8:26; Gn.43:32; Gn.46:34). A passagem paralela em Lucas diz: “Quando, porém, virdes Jerusalém sitiada de exércitos, sabei que está próxima a sua devastação” (Lc.21:20). O evento predito é, obviamente, a destruição de Jerusalém pelos romanos, em 70 d.C., momento em que os símbolos de Roma pagã foram colocados dentro da área do templo. Quando a rebelião judaica de Bar Cocheba foi reprimida, em 135 d.C., os romanos construíram um templo a Júpiter Capitolino no local do antigo templo judeu, e os judeus foram banidos da cidade de Jerusalém sob pena de morte.

O profeta Daniel. Esta referência ao livro de Daniel é uma evidência de que Jesus acreditava que Daniel era uma pessoa histórica, que era um profeta e que escreveu o livro que leva seu nome. Pelo fato de a profecia de Daniel apontar claramente para o tempo em que o Messias havia de aparecer, os rabinos, em séculos posteriores, amaldiçoavam aqueles que tentavam fazer algum cálculo desse tempo (GC, 378).

No lugar santo. Ou seja, os recintos sagrados do templo, incluindo os pátios internos, dos quais eram excluídos os gentios sob pena de morte (ver At.6:13; At.21:28).

Entenda. Aqueles que afirmam que Daniel é um “livro selado”, e não é passível de ser compreendido, fariam bem em ponderar a clara afirmação contrária de Cristo. Como os eventos previstos se aproximavam, era essencial que o povo de Deus soubesse de que profeta se falava. Esses eventos estavam menos de 40 anos no futuro, dentro do tempo de vida de muitos, que viviam então. Da mesma forma, quando os eventos relacionados com o fim do mundo (ver com. do v. Mt.24:3) se aproximarem, os cristãos devem ser diligentes em seu esforço para compreender o que foi escrito para sua admoestação (ver Am.3:7; Rm.15:4; 1Co.10:11).

Mt.24:16 16. então, os que estiverem na Judéia fujam para os montes

Fujam para os montes. Como o povo hebreu havia feito em tempo de invasão estrangeira ao longo dos séculos (ver Jz.6:2; 1Sm.13:6; Hb.11:38). Josefo diz (Guerra dos Judeus, vi.9.3 [420]) que mais de um milhão de pessoas morreram durante e, após o cerco da cidade, mais 97 mil foram levadas em cativeiro. No entanto, durante uma trégua temporária, quando os romanos inesperadamente levantaram o cerco de Jerusalém, todos os cristãos fugiram e é dito que nenhum deles perdeu a vida. Seu local de retiro foi Pela, uma cidade no sopé a leste do rio Jordão, cerca de 30 km ao sul do mar da Galileia. De acordo com Josefo, Tito, comandante dos exércitos romanos, confessou que nem os seus exércitos nem as máquinas do cerco poderiam ter sucesso em romper os muros de Jerusalém, a menos que o próprio Deus assim o quisesse. A defesa obstinada da cidade enfureceu tanto os soldados romanos que, quando finalmente entraram, seu desejo de vingança não conhecia limites.

Mt.24:17 17. quem estiver sobre o eirado não desça a tirar de casa alguma coisa

Sobre o eirado. As casas eram geralmente construídas com telhados planos, que eram utilizados para a secagem de frutas. Essas coberturas também proporcionavam um lugar para descanso, meditação e oração (ver At.10:9; comparar com Js.2:6; 1Sm.9:25-26; 2Rs.23:12). Alguns pensam que a expressão “o que estiver sobre o eirado” se refere principalmente aos moradores da cidade.

Não desça. O tempo era essencial, e adiar a fuga implicaria um grande perigo. Como os eventos comprovaram, esse conselho era apropriado, pois os exércitos romanos logo retornariam. O alívio temporário (ver com. do v. Mt.24:16) seria a última oportunidade que os cristãos teriam de escapar (ver p. 61, 62).

Mt.24:18 18. e quem estiver no campo não volte atrás para buscar a sua capa.

No campo. Provavelmente, uma referência àqueles que viviam em aldeias no país. O “campo” é um termo bíblico comum que significa “país”, distinto de cidades e vilas (Dt.28:16; Gn.37:15; Ex.9:25).

Mt.24:19 19. Ai das que estiverem grávidas e das que amamentarem naqueles dias!

Ai. Os rigores e privações da fuga seriam praticamente insuportáveis para as mulheres com filhos pequenos.

Mt.24:20 20. Orai para que a vossa fuga não se dê no inverno, nem no sábado

Orai. Os cristãos em Jerusalém e na Judeia não podiam determinar o tempo da retirada dos exércitos romanos, mas podiam orar a Deus para mitigar o sofrimento e os perigos que enfrentariam durante a fuga para as montanhas.

No inverno. Na umidade e baixas temperaturas das chuvas de inverno, a viagem seria extremamente difícil, a hospedagem e as provisões seriam incertas, e a saúde, difícil de ser preservada. Além disso, durante o período chuvoso, seria difícil atravessar o rio Jordão.

No sábado. Quarenta anos depois da ressurreição, o sábado seria tão sagrado quanto era quando Jesus pronunciou estas palavras, na encosta do monte das Oliveiras. Ele não sugere nenhuma alteração na sacralidade do dia, como muitos cristãos hoje supõem ter ocorrido quando Ele saiu do túmulo. A agitação, excitação, o medo e os incidentes de viagem durante a Fuga de Jerusalém seriam inapropriados para o dia de sábado. Os cristãos deviam orar para que pudessem ser capazes de guardar o sábado como dia de descanso, como Deus pretendia que fosse. Ao ser pregado na cruz, Cristo não aboliu o sábado. Esse dia não perdeu nada do caráter sagrado que lhe havia sido originalmente transmitido por Deus (ver com. de Gn.2:1-3).

Mt.24:21 21. porque nesse tempo haverá grande tribulação, como desde o princípio do mundo até agora não tem havido e nem haverá jamais.

Então (ARC). Ou, após a destruição de Jerusalém e a queda da nação judaica. Entre o fim da nação judaica e o fim do mundo deveria haver “longos séculos de trevas, séculos assinalados por sangue, lágrimas e agonia para Sua igreja” (DTN, 630, 631). Começando com o v. Mt.24:21, os sinais preditos apontam para o futuro, exclusivamente, para o fim do mundo (ver DTN, 630, 631).

Grande tribulação. A primeira perseguição da igreja veio dos líderes judeus (At.4:1-3; At.7:59-60; At.8:1-4). Um pouco mais tarde, os gentios também perseguiram os cristãos (At.16:19-24; At.19:29; 1Co.15:32) e, por quase três séculos, a igreja sofreu intermitentemente nas mãos da Roma pagã. Em 538, começou o período dos 1.260 anos de supremacia papal e perseguição (ver Nota Adicional a Daniel 7; Dn.7:28).

Mt.24:22 22. Não tivessem aqueles dias sido abreviados, ninguém seria salvo; mas, por causa dos escolhidos, tais dias serão abreviados.

Por causa. Não fosse pela intervenção divina, a perseguição acabaria por destruir todos os “eleitos”.

Carne (ARC). Uma linguagem hebraica comum para “seres humanos”.

Seria salvo. Ou, se livraria da morte.

Mt.24:23 23. Então, se alguém vos disser: Eis aqui o Cristo! Ou: Ei-lo ali! Não acrediteis

Então. Após a “grande tribulação” dos v. Mt.24:21-22. O aviso dos v. 23 a 28 se aplica especificamente aos últimos dias da história da Terra e foi “dado como um sinal da segunda vinda” (cf. DTN, 631). Um aviso semelhante já havia sido dado nos v. Mt.24:4-5, mas foi estabelecido principalmente “como um dos sinais da destruição de Jerusalém” (DTN, 631) e foi cumprido antes da queda daquela cidade, em 70 d.C. Mas o mesmo aviso, repetido nos v. 23 a 28, foi dado para “aqueles que vivem nesta época do mundo”, pois agora, “em linguagem inequívoca, o Senhor fala de Sua segunda vinda, e Ele dá aviso de perigos que hão de preceder Seu advento ao mundo” (DTN, 628, 631).

Vos. Jesus Se dirige aos discípulos a respeito dos eventos no fim dos tempos, como representantes dos crentes que vivem no tempo do fim.

Cristo. Ver com. de Mt.1:1.

Não acrediteis. Ver com. dos v. Mt.24:4-5.

Mt.24:24 24. porque surgirão falsos cristos e falsos profetas operando grandes sinais e prodígios para enganar, se possível, os próprios eleitos.

Falsos cristos. Ver com. do v. Mt.24:5.

Falsos profetas. Aqui, os falsos profetas, antes da queda de Jerusalém, são mencionados. Neste contexto, um falso profeta é um representante de um falso messias (ver com. de Mt.7:15-23).

Grandes sinais. Ver p. 204; ver com. de Lc.2:12. Falsos profetas realizam “sinais” como prova de sua autoridade, e esses sinais são vistos pelas pessoas como “maravilhas” (ver p. 204; ver com. de Mt.12:38-39; quanto a uma referência mais específica a “sinais” realizados por esses profetas dos últimos dias, ver Ap.13:13-14; Ap.16:13-14; Ap.19:20). No entanto, esses falsos milagres não são operados através do poder de Deus. As duas palavras “sinais” e “maravilhas” ocorrem, com frequência, juntas no NT (Jo.4:48; At.2:22; At.4:30; 2Co.12:12; Hb.2:4).

Se possível. A implicação é que esses “sinais” poderiam quase, mas não completamente, convencer “até os escolhidos” (ARC). Os fiéis obedeceram ao conselho da “Testemunha Verdadeira” a Laodiceia para “ungir” seus “olhos com colírio” (ver com. de Ap.3:18) e, portanto, são capazes de distinguir entre o verdadeiro e o falso. A forma da frase no grego significa que é realmente impossível Satanás enganar aqueles que amam e servem a Deus com sinceridade (sobre a “obra-mestra de engano” de Satanás, ver GC, 561, 623, 624). Verdadeiro amor à verdade e diligência em obedecer a todas as instruções que Deus deu para estes últimos dias serão a única proteção contra os enganos do inimigo, os espíritos enganadores e as doutrinas de demônios (ver T6, 401; T8, 298; TM, 475; ver com. de 2Ts.2:9-12).

Eleitos. Do gr. eklektos, “escolhidos”.

Mt.24:25 25. Vede que vo-lo tenho predito.

Predito. O alerta contra os enganos dos últimos dias foi dado para que os cristãos possam ter uma compreensão inteligente dos perigos que enfrentarão, para que estejam atentos a esses perigos, reconheçam os falsos cristos e os falsos profetas; e, portanto, não sejam enganados (ver Jo.13:19; Jo.14:29; Jo.16:4). O fato de que todas essas coisas foram claramente estabelecidas por Deus constitui a melhor razão possível pela qual “o eleito” deve ser diligente em seu estudo de tudo o que Deus revelou sobre os enganos dos últimos dias.

Mt.24:26 26. Portanto, se vos disserem: Eis que ele está no deserto!, não saiais. Ou: Ei-lo no interior da casa!, não acrediteis.

No deserto. Talvez uma referência a regiões pouco povoadas, em contraste com as “câmaras secretas” da cidade (cf. DTN, 631; ver com. do v. Mt.24:18).

Não saias. Ou seja, “nem sequer tenha curiosidade para ouvir o que eles têm a dizer, não dê a impressão de concordar com eles, estando presente para ouvi-los falar”. “Sair”, aqui, significa colocar-se em terreno encantado e, assim, estar em perigo de cair no engano.

No interior da casa. Ou, nas “câmaras secretas” (comparar com Jo.7:27). Os cristãos não precisam fazer longas peregrinações para encontrar Cristo nos desertos, ou em outro lugar, nem haveria nada de misterioso sobre o evento que tornaria necessário entrar em “câmaras secretas”, a fim de investigar rumores da presença de Cristo em lugares assim. Em virtude das instruções claras dadas por Jesus, eles saberiam que todos esses rumores seriam falsos.

Mt.24:27 27. Porque, assim como o relâmpago sai do oriente e se mostra até no ocidente, assim há de ser a vinda do Filho do Homem.

Como o relâmpago. Não haveria nada de secreto ou misterioso sobre o retorno de Jesus. Todos saberiam do Seu retorno à Terra, pois todos O veriam (Ap.1:7). As palavras de Cristo não deixam margem para um arrebatamento secreto, para uma vinda mística ou para qualquer outra falsa teoria inventada por piedosos e excessivamente zelosos pretensos “profetas”. A humanidade iria “ver” Jesus “vindo sobre as nuvens do céu” (Mt.24:30; Mt.16:27; Mt.26:64; Mc.8:38; Mc.14:62; At.1:11; Ap.1:7). Não haveria nenhuma dúvida quanto ao evento. Quando Jesus retornar, todos saberão disso sem que nada tenha que ser dito.

Sai do oriente. Quando Cristo Se aproximar da Terra, vai parecer que Ele vem do oriente (GC, 640).

Filho do homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Mt.24:28 28. Onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão os abutres.

O cadáver. A declaração enigmática do v. 28 era, provavelmente, um provérbio popular. Ao ver um bando de abutres (provavelmente não “águias”; ver com. de Lc.17:37) circulando no ar ou pousados no chão, uma pessoa certamente concluiria que devia haver carniça por perto; caso contrário, os abutres buscariam alimento isoladamente. Em outras palavras, essas aves se reúnem somente quando há um motivo. A aplicação do ditado, de acordo com vários comentaristas, é que a multiplicação dos sinais é uma evidência de que algo decisivo está ao alcance. Outros sugerem que, no cenário de Mateus 24, o ditado pode ser um alerta para os cristãos contra reuniões para ver os falsos cristos ou para ouvir os falsos profetas (v. Mt.24:25-26). Eles vão acreditar que Cristo está realmente voltando somente quando O contemplarem vindo sobre as nuvens do céu (ver com do v. Mt.24:27; comparar com Jó.39:30; Pv.30:17).

Mt.24:29 29. Logo em seguida à tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão do firmamento, e os poderes dos céus serão abalados.

Logo em seguida. Ou, “naqueles dias, após a referida tribulação” (Mc.13:24). Mateus e Marcos se referem aqui aos 1.260 dias (anos) de perseguição papal, terminando em 1798 (ver com. de Mt.24:21). Próximo ao fim desse período, o sol escureceu. Os sinais do v. 29 estão, portanto, intimamente relacionados no ponto de tempo da “tribulação daqueles dias” (ver GC, 306; ver também com. de Dn.7:25).

A tribulação. Ver com. do v. Mt.24:21.

O sol. O escurecimento do sol aqui predito ocorreu em 19 de maio de 1780, conhecido como o grande dia escuro. Este foi o primeiro dos sinais no sol, na lua e nas estrelas ordenados para anunciar o retorno do Senhor.

A lua. Na noite do dia 19 de maio de 1780, a luz da lua foi velada, assim como havia ocorrido com o sol durante as horas do dia.

As estrelas. Sem dúvida, a maior chuva de meteoros que a história testemunhou se cumpriu em 13 de novembro de 1833. Esses dois fenômenos, de 1780 e 1833, cumpriram exatamente as previsões de Jesus, pois ocorreram no tempo especificado. Eles não foram os únicos eventos dessa natureza, mas os que melhor atenderam às especificações da profecia.

Os poderes do céu. Ou seja, o sol, a lua e as estrelas. O abalo das “potestades do céu” não se refere aos fenômenos descritos na primeira parte do versículo, mas a um tempo ainda futuro, quando os corpos celestes “serão movidos de seus lugares, abalados pela voz de Deus”. Isso acontecerá quando Sua voz abalar também a Terra (ver PE, 41), na abertura da sétima praga (Ap.16:17-20; GC, 636, 637; PE, 34, 285; cf. Is.34:4; Ap.6:14).

Mt.24:30 30. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; todos os povos da terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória.

O sinal. Do gr. semeion, “sinal”, “marca”, “símbolo” (ver p. 204; ver com. de Lc.2:12). O “sinal” que vai distinguir o retorno de Cristo dos enganos dos falsos cristos é a nuvem de glória com a qual Ele retornará à Terra (ver PE, 1.5, 35; GC, 640).

Filho do homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10; e Nota Adicional a João 1; Jo.1:51.

Povos. As várias nações da Terra (cf. Ap.14:6; Ap.17:15). O motivo desse lamento é declarado em Ap.6:15-17 (cf. Is.2:19-21; Os.10:8; Lc.23:30).

Filho do Homem. Ver com. de Dn.7:13. A expressão também é encontrada na literatura apocalíptica judaica. O Livro de Enoque (62:5), por exemplo, fala do tempo “em que verão o Filho do Homem sentado no trono da Sua glória” (cf. Mt.16:27; Mt.25:31).

Sobre as nuvens do céu. Comparar com At.1:9-11; 1Ts.4:16-17; Ap.1:7.

Poder e grande glória. Comparar com Mt.16:27; Mt.25:31; ver com. de Mt.24:27.

Mt.24:31 31. E ele enviará os seus anjos, com grande clangor de trombeta, os quais reunirão os seus escolhidos, dos quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus.

Enviará os Seus anjos. É conveniente que os anjos, que ministraram às necessidades daqueles que se tornaram “herdeiros da salvação” (cf. Hb.1:14), participem dos eventos daquela manhã gloriosa. Agora, pela primeira vez, o povo de Deus terá o privilégio de ver face a face esses seres sagrados que os guardaram ao longo dessa peregrinação terrena.

Trombeta. Quando Jesus vier, a “trombeta de Deus” chamará de seus túmulos todos os que dormiram em Cristo (1Ts.4:16; 1Co.15:52).

Seus escolhidos. Ver com. do v. Mt.24:24. Estes são aqueles a quem Deus escolheu para constituir Seu reino porque eles O escolheram. “Eles serão para Mim particular tesouro, naquele dia que prepararei, diz o Senhor dos Exércitos” (Ml.3:17). Os mortos em Cristo ressuscitarão para se juntar aos santos vivos, e juntos, encontrarão seu Senhor nos ares (1Ts.4:16-17; Jo.11:24-26).

Dos quatro ventos. Ou, de todas as direções (cf. Dn.7:2; Dn.8:8; Dn.11:4; Ap.7). Em uma das Dezoito Bênçãos do culto na sinagoga (ver Mt.6:9) encontra-se a petição: “Soe a grande trombeta para a nossa liberdade; levante a bandeira para reunir nossos exilados e congrega-nos dos quatro cantos da Terra.”

Extremidade dos céus. O “céu” aqui referido não é a morada de Deus e dos anjos, mas sim o invólucro atmosférico que circunda a Terra (ver com. de Gn.1:8). Esta expressão designa, portanto, toda a Terra, no sentido de que o planeta está “sob” os céus atmosféricos (ver Dt.4:19; Dt.4:32; Dt.30:4; Ne.1:9; Je.49:36; Cl.1:23).

Mt.24:32 32. Aprendei, pois, a parábola da figueira: quando já os seus ramos se renovam e as folhas brotam, sabeis que está próximo o verão.

A parábola. Ver as p. 197-200. Esta breve “parábola” é baseada em uma ilustração da natureza. Ela tinha um significado especial para o povo da Palestina, onde figueiras eram comuns.

Figueira. Seus brotos eram um sinal claro da aproximação da estação mais quente (comparar com a parábola da figueira estéril, ver com. de Lc.13:6-9; e com a maldição da figueira infrutífera, Mc.11:12-14; Mc.11:20-26).

Mt.24:33 33. Assim também vós: quando virdes todas estas coisas, sabei que está próximo, às portas.

Quando virdes. A ênfase está no reconhecimento pessoal dos sinais e na compreensão de sua importância. Os cristãos devem distinguir entre os “grandes sinais e prodígios” dos falsos profetas (ver com. do v. Mt.24:24) e os sinais verdadeiros mencionados por Jesus. Os sinais devem diferenciar os eventos que marcam “o princípio das dores” preditos por Jesus (v. Mt.24:8) no momento em que “ainda não é o fim” (v. Mt.24:6), e os sinais que indicam que Seu retorno “está próximo, às portas” (v. Mt.24:33).

Todas essas coisas. Isto não inclui o “sinal” do Filho do Homem, no v. Mt.24:30, pois, quando ele for visível, Jesus já estará vindo nas nuvens e não apenas “às portas”. A expressão “estas coisas” remonta aos sinais do v. Mt.24:29, em particular, mas também inclui outros eventos e sinais que Jesus menciona como tendo lugar antes do fim (ver lista completa desses sinais, em Mc.13; Lc.21).

Está próximo. O grego também pode ser traduzido como: “Ele está próximo”. O pronome “ele” se refere ao advento de Jesus. Em ambos os casos, o significado é o mesmo (a variante “Ele” é preferida, em DTN, 632).

As portas. Ou seja, seu próximo passo será através da porta.

Mt.24:34 34. Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que tudo isto aconteça.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Esta geração. Em geral, os comentaristas têm observado que a expressão “esta geração” de Mt.23:36 (ARC), se refere à dos apóstolos (ver com. ali). Jesus usou várias vezes a expressão “esta geração” nesse sentido (Mt.11:16; Mt.12:39; Mt.12:41-42; Mt.12:45; Mt.16:4; Mt.17:17; ver com. de Mt.11:16). Obviamente, as previsões de Cristo sobre a queda de Jerusalém, no ano 70 d.C., se cumpriram antes que muitos de Seus contemporâneos morressem. No entanto, as palavras “esta geração”, no v. 34, estão no contexto dos v. Mt.24:27-51, que lidam exclusivamente com a vinda do Filho do Homem no fim do mundo (ver DTN, 633). Os sinais referidos nestes versos e em Lucas, “sinais” nos céus e “sobre a Terra” (Lc.21:25), teriam lugar tão perto do dia de Sua vinda que Cristo declarou que a “geração” que vê o último dos sinais não passará antes que se cumpram “todas essas coisas” [a vinda de Cristo e o fim do mundo]. Cristo não tinha a intenção de que Seus seguidores soubessem com exatidão quando Ele voltaria. Os sinais preditos iriam testemunhar da proximidade de Sua vinda, mas Ele declarou enfaticamente, que o “dia e hora” daquele evento “ninguém sabe” (Mt.24:36). Fazer da expressão “esta geração” a base para a contagem de um período de tempo que termina supostamente em Seu retorno viola a letra e o espírito de Suas instruções (ver com. dos v. Mt.24:36; Mt.24:42).

Mt.24:35 35. Passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão.

Passará. Isto não significa que a Terra como planeta deixará de existir, mas sim que os céus atmosféricos e a superfície da Terra passarão por mudanças fundamentais (para descrição do processo pelo qual ocorrerá essa mudança, ver Is.34:4; 2Pe.3:7-13).

O céu e a terra. Uma expressão bíblica comum, que denota os céus atmosféricos e a Terra (ver com. de Gn.1:8; 2Pe.3:5; 2Pe.3:7; 2Pe.3:10; 2Pe.3:12-13).

Minhas palavras. Ver com. de Mt.5:18. A política até mesmo dos maiores homens da Terra muda, mas os princípios de Deus permanecem para sempre, pois Deus não muda (Ml.3:6). Aqui, Jesus dá ênfase na certeza do que Ele revelou sobre o futuro, especialmente no que diz respeito à Sua vinda e ao fim do mundo (ver com. de Mt.24:3).

Mt.24:36 36. Mas a respeito daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos dos céus, nem o Filho, senão o Pai.

Aquele dia e hora. Aqueles que são tentados a calcular com precisão quantos anos restam antes da vinda de Cristo fariam bem em ponderar o conselho dado aqui e também o de At.1:7. É privilégio e dever dos cristãos permanecer alerta, para observar os sinais de Sua vinda e saber o quanto está próxima (ver com. do v. Mt.24:33).

Nem os anjos. Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem o acréscimo das palavras “nem o Filho” (como na ARA). Em Mc.13:32, as evidências textuais apoiam unanimemente esta variante. Os comentaristas geralmente entendem que isso significa que, como um homem na Terra, Cristo limitou voluntariamente Seu conhecimento e poder na medida da capacidade dos seres humanos, a fim de que a Sua própria vida perfeita pudesse ser um exemplo de como devemos viver e que Seu ministério fosse um padrão que pudéssemos seguir, auxiliados pela mesma orientação divina e ajuda que Ele recebeu (ver com. de Lc.2:52).

Senão o Pai. Ver com. de At.1:7.

Mt.24:37 37. Pois assim como foi nos dias de Noé, também será a vinda do Filho do Homem.

Nos dias de Noé. Apesar da advertência anunciada por Noé e testemunhada por sua construção da arca, os homens iam para seu círculo habitual de trabalho e prazer, completamente indiferentes aos eventos que em breve ocorreriam. Jesus disse que a mesma indiferença caracterizaria a humanidade, próximo de Sua segunda vinda. Suas atividades também, como as dos antediluvianos, seriam em grande parte más (ver DTN, 633; para uma descrição das condições do mundo antes do dilúvio, ver Gn.6:5-13; 2Pe.2:5-6).

Mt.24:38 38. Porquanto, assim como nos dias anteriores ao dilúvio comiam e bebiam, casavam e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca,

Casavam. Ver com. do v. Mt.24:37. As Escrituras são explícitas sobre a iniquidade prevalecente nos dias de Noé (ver Gn.6:5; Gn.6:11-13). As mesmas condições são preditas para os últimos dias (2Tm.3:1-5). No entanto, em Mateus 24, o Senhor enfatiza o fato adicional de que o dilúvio surpreendeu os antediluvianos, enquanto eles estavam ocupados em sua rotina e os tomou de surpresa (v. Mt.24:36-43). O mesmo ocorrerá em relação ao segundo advento (ver GC, 338, 339, 491).

Mt.24:39 39. e não o perceberam, senão quando veio o dilúvio e os levou a todos, assim será também a vinda do Filho do Homem.

Não o perceberam. Isto é, literalmente, “não chegaram a saber”, ou “não reconheceram”. Por 120 anos, Noé tinha avisado os antediluvianos sobre o dilúvio. As pessoas tiveram ampla oportunidade de saber, mas não quiseram acreditar. Trancaram-se na escuridão da incredulidade (ver com. de Os.4:6).

E os levou. Ver Gn.7:11-12; Gn.7:17-22.

Mt.24:40 40. Então, dois estarão no campo, um será tomado, e deixado o outro

No campo. Ou seja, na área rural. A ilustração provavelmente se refere a imagens de agricultores (ver com. do v. Mt.24:18).

Um será tomado. Do gr. paralambano, cujo significado literal é “tomar para si” ou “levar consigo”, usado nos papiros com o sentido de receber ou tomar para si artigos que lhe pertencem. Paralambano é usado em Mt.17:1, quando Jesus levou consigo Pedro, Tiago e João, e com eles subiu ao monte da transfiguração. Em Cl.4:17, o verbo é usado em relação a um ministro cristão que recebe a comissão evangélica. Em Jo.14:3, paralambano é empregado ao Jesus receber para Si os discípulos que O esperam. Em contraste, “levou”, em Mt.24:39, vem de airo “levar consigo”, “remover”. Os salvos serão levados (v. 40) pelos anjos, que reunirão os “eleitos” (ver em v. Mt.24:31). É antibíblica a doutrina conhecida como “arrebatamento secreto”, segundo a qual os santos serão arrebatados secretamente da Terra antes do retorno visível de Cristo. Seus defensores apelam para as declarações de Cristo nos v. Mt.24:39-41, como prova.

Mas esses versículos não ensinam tal coisa. A “vinda” de Mateus 24 é sempre, sem exceção, a aparição literal e visível de Cristo (v. Mt.24:3; Mt.24:27; Mt.24:30; Mt.24:39; Mt.24:42; Mt.24:44; Mt.24:46; Mt.24:48; Mt.24:50). Nessa vinda, “todos os povos da Terra [...] verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu” (v. Mt.24:30). Jesus adverte sobre a natureza de uma vinda secreta de Cristo atribuída aos falsos profetas (v. Mt.24:24-26; ver com. do v. Mt.24:27). O que Jesus quis dizer com ser “levado” e ser “deixado” é esclarecido pelo contexto. Aqueles que são deixados são os servos maus, que, em vez de continuar em suas atividades normais, após um suposto arrebatamento secreto, serão castigados e receberão sua parte com os hipócritas (v. Mt.24:48-51).

Deixado. Do gr. aphiemi, “mandar embora”, “dispensar”. O grego se opõe à ideia de que os justos serão deixados. Os justos são, literalmente, “recebidos” e os ímpios, “dispensados”.

Mt.24:41 41. duas estarão trabalhando num moinho, uma será tomada, e deixada a outra.

Moinho. As evidências textuais (cf. p. 136) se dividem entre mulos, “mó”, e mulon, “moinho”, isto se refere, provavelmente, a um pequeno moinho manual movido por duas mulheres. Esse tipo de moinho tinha um cabo próximo da borda superior da pedra superior, que era agarrado alternadamente por duas mulheres sentadas, uma em frente à outra.

Mt.24:42 42. Portanto, vigiai, porque não sabeis em que dia vem o vosso Senhor.

Vigiai. As advertências para “tomar cuidado” e “vigiar” constituem o tema recorrente do capítulo. Para ilustrar a importância de permanecer alerta, Jesus contou seis parábolas: do porteiro (Mc.13:34-37), que está aqui condensada em um só versículo (Mt 24:42); do pai de família (v. Mt.24:43-44); do servo bom e do mau (v. Mt.24:45-51); das dez virgens (Mt.25:1-13); dos talentos (v. Mt.25:14-30); e a do grande julgamento (v. Mt.25:31-46). Os cristãos não devem aguardar o retorno do Senhor em expectativa ociosa. Enquanto esperam e observam, devem estar vigilantes para purificar a vida pela obediência à verdade e na dedicação com que trabalham pelos outros. É seu privilégio não “apenas aguardar, mas apressar o dia de Deus” (DTN, 633, 634; 2Pe.3:12).

A que hora (ARC). Ver com. do v. Mt.24:36. A evidência textual favorece a variante “dia” (ARA) em vez de “hora” (cf. p. 136).

Mt.24:43 43. Mas considerai isto: se o pai de família soubesse a que hora viria o ladrão, vigiaria e não deixaria que fosse arrombada a sua casa.

O pai de família. Do gr. oikodespotes, “o dono da casa” (ver com. de Mt.21:33).

A que hora. Os romanos dividiam a noite em quatro “vigílias”, um sistema de contagem do tempo também adotado pelos judeus (ver p. 38; ver com. de Mt.14:25).

O ladrão. Paulo (1Ts.5:2) e João (Ap.3:3) também usam a metáfora do ladrão em conexão com a segunda vinda de Jesus.

Mt.24:44 44. Por isso, ficai também vós apercebidos; porque, à hora em que não cuidais, o Filho do Homem virá.

Ficai também vós apercebidos. Este é o terceiro do grande trio de admoestações do discurso: “ninguém vos engane” (v. Mt.24:4), “vigiai” (v. Mt.24:42) e “ficai [...] apercebidos” (v. 44). “A crise se aproxima gradualmente sobre nós” (DTN, 636), à medida que nos envolvemos em nossa rotina diária de atividades. Aqueles que sinceramente desejam a vinda de Jesus estarão prontos, não importa quando seu Senhor aparecerá.

Não cuidais. É tolice tentar determinar a hora, o dia ou o ano da vinda de Cristo (ver com. do v. Mt.24:36). Se fosse necessário ou desejável para o cristão saber o tempo, Deus o revelaria. Mas o suficiente foi revelado para que se possa saber quando o evento estiver próximo. Sabendo que está próximo, o crente é chamado a vigiar e a estar pronto.

Mt.24:45 45. Quem é, pois, o servo fiel e prudente, a quem o senhor confiou os seus conservos para dar-lhes o sustento a seu tempo?

Servo fiel e prudente. Esta é a segunda das seis ilustrações dadas para mostrar a importância de vigiar e estar pronto.

A quem o senhor confiou. Esta parábola se aplica especialmente aos líderes religiosos e espirituais da “família da fé” (Gl.6:10; Ef.2:19), cujo dever é suprir as necessidades de seus membros e que, por preceito e exemplo, devem testemunhar de sua crença na proximidade da vinda de Cristo.

A seu tempo. Ou, “o sustento a seu tempo”. É dever do pastor alimentar e pastorear “o rebanho de Deus” (1Pe.5:2) dando-lhe exemplo (v. 1Pe.5:3) de vigilância e preparação. Deus vai exigir uma prestação de contas do seu rebanho, e cabe a cada pastor cumprir fielmente a responsabilidade que lhe foi confiada (ver Ez.34:2-10).

Mt.24:46 46. Bem-aventurado aquele servo a quem seu senhor, quando vier, achar fazendo assim.

Bem-aventurado. Ou, “feliz” (ver com. de Mt.5:3).

Mt.24:47 47. Em verdade vos digo que lhe confiará todos os seus bens.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Todos os seus bens. Ou, a ele se confiará maiores responsabilidades (ver com. de Mt.25:21; comparar com a experiência de José na casa de Potifar, ver Gn.39:3-6).

Mt.24:48 48. Mas, se aquele servo, sendo mau, disser consigo mesmo: Meu senhor demora-se,

Disser consigo mesmo. O “servo mau” pode não admitir abertamente que seu senhor demora a voltar, mas suas atitudes o traem. Ele age como se cresse na volta iminente.

Meu senhor demora-se. Ele não é um dos escarnecedores que negam a realidade do retorno de Cristo (2Pe.3:4). Ele finge acreditar; na verdade, aceitou a responsabilidade de dar aos membros da “família da fé” o alimento espiritual que irá ajudá-los a se preparar para o retorno de seu Senhor (ver com. de Mt.24:45). Suas palavras, porém, não têm convicção. Sua vida e labores proclamam que ele realmente não acredita que o Senhor está chegando. Em um momento de crise, ele não fica em pé “entre os mortos e os vivos” (Nm.16:48). Ele não ministra “a tempo e fora de tempo” (ARC), nem “corrige, repreende, exorta” (2Tm.4:2). Ao contrário, ele adapta a sua mensagem ao “comichão nos ouvidos” de seus fiéis (v. 2Tm.4:3). Ele se esquece de que “a mensagem da próxima vinda de Cristo visa a despertar os homens de seu enlevo nas coisas temporais” (PJ, 228).

Mt.24:49 49. e passar a espancar os seus companheiros e a comer e beber com ébrios,

Espancar os seus companheiros. Comparar com a denúncia amarga de Ezequiel de pastores que fizeram do seu negócio principal alimentar a si mesmos, que foram cruéis com suas ovelhas e espalharam o rebanho (Ez.34:2-10).

Mt.24:50 50. virá o senhor daquele servo em dia em que não o espera e em hora que não sabe

Não o espera. Ver com. do v. Mt.24:44.

Mt.24:51 51. e castigá-lo-á, lançando-lhe a sorte com os hipócritas; ali haverá choro e ranger de dentes.

Castigá-lo-á. A forma dolorosa e vergonhosa da pena capital, na qual o corpo era cortado em pedaços com uma espada, em vez de ser decapitado.

Com os hipócritas. Ver com. de Mt.6:2. Ele tem parte com os hipócritas porque vive e age como um deles.

Ranger de dentes. Ver com. de Mt.8:12.

Mt.25:1 1. Então, o reino dos céus será semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram a encontrar-se com o noivo.

O reino dos céus. [A parábola das dez virgens, Mt 25:1-13. Sobre as parábolas, ver p. 197-204]. Ver com. de Mt.4:17; Mt.5:2; cf. com. de Lc.4:19; sobre as circunstâncias desta parábola, ver com. de Mt.24:1-3; Mt.24:42. Jesus e pelo menos quatro dos discípulos estavam na encosta ocidental do monte das Oliveiras. O sol se pôs, e as sombras do crepúsculo foram se aprofundando (PJ, 405). Como era comum nas parábolas contadas por Jesus, a cena se desenrolava aos olhos daqueles que ouviam a história (ver PJ, 405).

Semelhante. Ou, “comparável” (ver p. 197-199). Esta parábola enfatiza a preparação para a vinda de Cristo (ver com. de Mt.24:44).

Virgens. Ou, “donzelas”. Aparentemente, nenhum significado deve ser atribuído ao número dez, um número redondo que Jesus usou em outras ocasiões (ver com. de Lc.15:8). Nesta parábola, as dez virgens representam aqueles que professam a fé pura de Jesus (ver PJ, 406) e acreditam em Sua breve volta (comparar com Ap.14:4).

Lâmpadas. Do gr. lampades, designa tanto tochas como lâmpadas, aqui, a última. As lâmpadas provavelmente consistiam de pequenas tigelas de barro montadas em varais. As tigelas continham óleo e um pavio que flutuava no óleo; a extremidade superior do pavio mantinha-se ereta, apoiada no lado da vasilha. O cortejo nupcial seguia “à luz de tochas” (PJ, 405). “As lâmpadas representam a Palavra de Deus” (PJ, 406, 407; ver Sl.119:105).

Saíram. As dez jovens esperavam, perto da casa da noiva, a chegada do noivo e seu cortejo; dali, elas pretendiam acompanhar o cortejo até a casa do noivo e participar ali das festividades do casamento (ver PJ, 405). O fato de as jovens terem visto o cortejo em movimento, após se despertarem (PJ, 406), sugere que não eram amigas íntimas da noiva. Provavelmente, eram conhecidas que, de acordo com o costume oriental, mesmo assim seriam bem-vindas à festa.

A encontrar-se com o noivo. Quando ele saiu de sua casa para a da noiva, a fim de recebê-la e acompanhá-la até a casa dele.

Mt.25:2 2. Cinco dentre elas eram néscias, e cinco, prudentes.

Cinco. Aparentemente, nenhum significado é atribuído ao número cinco, mais do que ao número dez (ver com. do v. Mt.25:1). Havia apenas duas classes de virgens no grupo. A diferença entre elas se torna evidente à medida que a narrativa prossegue e, de fato, constitui o ponto distintivo da parábola.

Néscias. As cinco “virgens néscias” não são hipócritas (PJ, 411), são “tolas”, por não terem se rendido ao trabalho do Espírito Santo. Nesse aspecto, elas se assemelham aos ouvintes, do “solo pedregoso” (PJ, 411; ver com. de Mt.13:5) e ao homem sem a veste nupcial (ver com. de Mt.22:11-14). Representam pessoas atraídas pelo evangelho, mas cujo egoísmo evita que a verdade desenvolva raízes profundas em sua vida e dê os frutos de um caráter semelhante ao de Cristo (ver com. de Ez.33:32; Mt.7:21-27). Elas estarão entre aqueles que respondem ao grito de “paz e segurança” (ver PE, 282; PP, 104; ver com. de 1Ts.5:3; Je.6:14; Je.8:11; Je.28:9; Ez.13:10; Ez.13:16).

Mt.25:3 3. As néscias, ao tomarem as suas lâmpadas, não levaram azeite consigo

Azeite. Simboliza o Espírito Santo (PJ, 408; ver Zc.4:1-14), do qual os membros da igreja aqui representados são destituídos. Eles estão familiarizados com a teoria da verdade, mas o evangelho não efetuou nenhuma mudança em sua vida.

Mt.25:4 4. no entanto, as prudentes, além das lâmpadas, levaram azeite nas vasilhas.

As prudentes. As virgens prudentes da parábola representam os cristãos que entendem, apreciam e se valem do ministério do Espírito Santo. São “sábios” de fato os cristãos que hoje acolhem o Espírito Santo em suas vidas e cooperam com Ele na Sua tarefa designada (ver Jo.14:16-17; Jo.16:7-15).

Vasilhas. Ou, “recipientes”, neste caso, pequenos vasos ou frascos de óleo. Esses recipientes eram para o fornecimento de reserva.

Mt.25:5 5. E, tardando o noivo, foram todas tomadas de sono e adormeceram.

E, tardando. Do gr. chronizo, “demorar”, “atrasar-se”. A parábola é uma advertência para aqueles que pensavam que “o reino de Deus havia de se manifestar imediatamente” (Lc.19:11; Mt.24:3; At.1:6). Jesus não voltaria tão brevemente quanto esperavam, mas se isso fosse dito aos discípulos de forma, clara e específica, eles teriam se desanimado (ver com. de Mt.24:3). Os cristãos de hoje fariam bem em se lembrar que o atraso do Esposo celestial não se deve a qualquer falta de preparação da parte dEle. Ele poderia ter vindo há muito tempo se Seu povo estivesse pronto para recebê-Lo e se tivesse sido fiel em completar a tarefa que lhe fora designada de preparar o mundo para a Sua vinda (ver DTN, 633, 634).

Mt.25:6 6. Mas, à meia-noite, ouviu-se um grito: Eis o noivo! Saí ao seu encontro!

À meia-noite. O momento em que as donzelas cansadas de esperar estariam mais sonolentas. “Meia-noite” representa a escuridão espiritual, a hora mais tenebrosa. Grandes trevas espirituais cobrirão a Terra nos últimos dias (ver PJ, 414).

Mt.25:7 7. Então, se levantaram todas aquelas virgens e prepararam as suas lâmpadas.

Então, se levantaram. Todas as dez virgens responderam à convocação para participar do cortejo nupcial.

Prepararam. As lâmpadas ficaram apagadas talvez por muito tempo e, por isso, precisavam ser “aparadas”, para que pudessem queimar e iluminar outra vez.

Mt.25:8 8. E as néscias disseram às prudentes: Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas lâmpadas estão-se apagando.

Disseram às prudentes. As virgens néscias não tinham aprendido a importante lição de tomar para si a responsabilidade. Tinham o hábito de confiar em outras pessoas para compensar sua falta de preparação.

Do vosso azeite. Ou, “um pouco do vosso óleo”. A preparação das virgens néscias não tinha sido completa nem séria, mas superficial.

Estão-se apagando. Literalmente, “estão se extinguindo”. O tempo de prova havia chegado, mas sua preparação se provou superficial e inadequada. Elas não tinham reservas para atender a uma situação de emergência. Haviam começado muito bem, mas não estavam preparadas para perseverar até o fim (ver com. de Mt.24:13).

Mt.25:9 9. Mas as prudentes responderam: Não, para que não nos falte a nós e a vós outras! Ide, antes, aos que o vendem e comprai-o.

Comprai-o. Ter dado às virgens néscias óleo suficiente para a ocasião, teria deixado as virgens prudentes sem nada. As prudentes não eram egoístas. O caráter não é transferível. Um cristão não pode fazer por outro o que ele deve fazer por si mesmo, em relação à sua preparação, ou em preparação à crise que se avizinha.

Mt.25:10 10. E, saindo elas para comprar, chegou o noivo, e as que estavam apercebidas entraram com ele para as bodas; e fechou-se a porta.

E, saindo elas para comprar. Após o fechamento da porta da graça, será tarde demais para adquirir os traços de caráter necessários para acompanhar o Esposo celestial à casa de Seu Pai. Isso não se dará por causa de qualquer falta de vontade da parte de Deus, mas porque o caráter não foi corrigido.

E fechou-se a porta. Comparar com os sentimentos de Esaú ao descobrir que tinha perdido o direito da primogenitura (ver com. de Hb.12:17). A exclusão da festa de casamento foi o resultado da própria escolha das virgens néscias (ver GC, 542, 543).

Mt.25:11 11. Mais tarde, chegaram as virgens néscias, clamando: Senhor, senhor, abre-nos a porta!

Abre-nos. As cinco virgens néscias procuraram as recompensas de um serviço fiel sem ter prestado esse tipo de serviço (ver com. do v. Mt.25:10).

Mt.25:12 12. Mas ele respondeu: Em verdade vos digo que não vos conheço.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Não vos conheço. Aparentemente, as cinco virgens não eram amigas especiais da noiva e do noivo nem tinham qualquer obrigação para com eles (ver com. do v. Mt.25:1). Parece que elas estavam tentando entrar, quando não tinham o direito de fazê-lo, e este era realmente o caso. Se estivessem prontas para entrar quando a porta estava aberta, teriam sido bem recebidas, mas àquela hora, a porta já tinha sido fechada. A falta de previsão foi imperdoável, e sua perda, irrecuperável (sobre a tremenda decepção daqueles que pretendem estar entre os salvos, mas não conseguem fazer a necessária preparação, ver com. de Mt.7:23; Mt.22:1-14). “De todas as palavras tristes escritas ou faladas, as mais tristes são: poderia ter sido!” (John Greenleaf Whittier, poeta e advogado norte-americano).

Mt.25:13 13. Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora.

Vigiai, pois. Esta é a lição da parábola (ver com. de Mt.24:42; Mt.24:44).

Mt.25:14 14. Pois será como um homem que, ausentando-se do país, chamou os seus servos e lhes confiou os seus bens.

Pois será. [A parábola dos talentos, Mt 25:14-30]. Ver com. de Lc.19:11-28; sobre as parábolas, ver p. 197-204. Sobre as circunstâncias desta parábola, ver com. de Mt.24:1-3; Mt.25:1; acerca do significado da ilustração, ver com. de Mt.24:45-51. Enquanto a parábola das dez virgens (Mt.25:1-13) enfatiza a preparação pessoal para o retorno de Cristo, a dos talentos sublinha a responsabilidade do trabalho para a salvação dos outros. Assim, “vigiar” (Mt.24:42) inclui tanto a preparação pessoal quanto o trabalho missionário individual. Em muitos aspectos, esta parábola e a dos talentos são semelhantes, mas há também grandes diferenças.

Ausentando-se. Ver com. de Lc.19:12. Jesus Se refere a Si mesmo.

Do país. Jesus voltou para o Céu. O nobre, na parábola dos talentos, foi “tomar posse de um reino” (ver com. de Lc.19:12).

Seus servos. Jesus designa, portanto, os discípulos, a quem Ele confiou a condução de Seus negócios na Terra (ver com. de Mt.28:19-20). Pertencemos a Deus, em virtude de Seu poder criativo e de Sua graça redentora. Nós e tudo o que temos pertencemos a Ele.

E lhes confiou os seus bens. O mestre tinha dois objetivos: (1) aumentar suas participações nos negócios e (2) testar seus servos, antes de lhes confiar maiores responsabilidades. Da mesma forma, Cristo confiou o trabalho de pregação do evangelho aos homens, a fim de promover os interesses do Seu reino no mundo e treinar Seus servos para maiores responsabilidades (ver com. de Mt.25:21; Lc.19:13).

Mt.25:15 15. A um deu cinco talentos, a outro, dois e a outro, um, a cada um segundo a sua própria capacidade; e, então, partiu.

Talentos. Um talento de prata pesava cerca de 21 kg (ver p. 37) e isso correspondia a mais de 18 anos de salário comum (ver também com. de Lc.19:13). Os talentos representam dons especiais do Espírito Santo, juntamente com todos os dotes naturais.

A cada um. Cada um de nós tem um trabalho a fazer para Deus. Embora existam vários graus de responsabilidade, ninguém é completamente isento dela.

Sua própria capacidade. A quantia confiada a cada um não era mais do que, na avaliação do mestre, o servo poderia lidar com sabedoria e, ao mesmo tempo, era suficiente para desafiar seu engenho e habilidade pessoal, dando-lhe, assim, uma oportunidade de ganhar experiência. O mestre exerceu discernimento no montante confiado a cada servo e, em seguida, exigiu fidelidade no cumprimento da responsabilidade envolvida ao lidarem com o valor recebido.

Mt.25:16 16. O que recebera cinco talentos saiu imediatamente a negociar com eles e ganhou outros cinco.

Saiu imediatamente a negociar. As evidências textuais se dividem (cf. p. 136) entre se a palavra “imediatamente” pertence ao v. Mt.25:15: “partiu imediatamente”, ou ao v. 16: “saiu imediatamente a negociar”. De acordo com a última leitura, o servo não perdeu tempo para desempenhar sua tareia. Ele provou ser diligente.

Mt.25:17 17. Do mesmo modo, o que recebera dois ganhou outros dois.

Sem comentário para este versículo.

Mt.25:18 18. Mas o que recebera um, saindo, abriu uma cova e escondeu o dinheiro do seu senhor.

Abriu uma cova. Nos tempos antigos, este era considerado o meio mais seguro de preservar um tesouro (cf. Mt.13:44). Muitas das moedas antigas expostas em museus hoje foram encontradas em covas.

Mt.25:19 19. Depois de muito tempo, voltou o senhor daqueles servos e ajustou contas com eles.

Ajustou contas. Ver com. de Mt.18:23.

Mt.25:20 20. Então, aproximando-se o que recebera cinco talentos, entregou outros cinco, dizendo: Senhor, confiaste-me cinco talentos; eis aqui outros cinco talentos que ganhei.

Outros cinco. Ver com. de Lc.19:16, em que o lucro foi muito maior.

Mt.25:21 21. Disse-lhe o senhor: Muito bem, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor.

Muito bem. A aprovação do mestre não foi proporcional à quantidade de lucro em cada caso, mas sim à fidelidade demonstrada (ver com. de Mt.20:8-16).

Sobre o muito. Este servo tinha manifestado bom senso em seguir os princípios corretos no pouco que recebeu, e havia razão para crer que faria o mesmo se lhe fosse confiado muito. A recompensa pelo serviço fiel devia aumentar a oportunidade de servir. A utilização da menor oportunidade foi a medida da capacidade de aproveitar oportunidades maiores. Em parte, a recompensa pelo serviço fiel vem nesta vida, mas Jesus aqui Se refere principalmente às recompensas do mundo por vir (PJ, 361).

No gozo do teu senhor. Esta constitui a segunda e não menos real parte da recompensa pelo serviço fiel.

Mt.25:22 22. E, aproximando-se também o que recebera dois talentos, disse: Senhor, dois talentos me confiaste; aqui tens outros dois que ganhei.

Sem comentário para este versículo.

Mt.25:23 23. Disse-lhe o senhor: Muito bem, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor.

Sem comentário para este versículo.

Mt.25:24 24. Chegando, por fim, o que recebera um talento, disse: Senhor, sabendo que és homem severo, que ceifas onde não semeaste e ajuntas onde não espalhaste,

Senhor, sabendo que és. Ver com. de Lc.19:21. O servo admite francamente que seu procedimento não foi devido à ignorância ou à falta de capacidade. Foi deliberado.

Severo. Do gr. skleros, “duro”, “rígido”. O servo negligente, na parábola das minas, acusou seu mestre de ser austeros, “austero”, “rigoroso”, “hostil” (ver Lc.19:21). A acusação era totalmente injusta.

Onde não semeaste. O servo negligente só pensou no lucro material e se esqueceu das recompensas menos tangíveis, mas não menos reais que caberiam a ele, como resultado de um serviço fiel (ver com. do v. Mt.25:21; ver com. de Lc.19:21).

Espalhaste. Do gr. diaskorpizo, “dispersar”.

Mt.25:25 25. receoso, escondi na terra o teu talento; aqui tens o que é teu.

Receoso. O servo negligente aceitou o talento; e, assim, tacitamente prometeu fazer algo com esse valor. Ele temia que um empreendimento mal-sucedido não só resultasse em nenhum lucro como poderia resultar na perda do capital investido nele. Ele supôs que todo o lucro iria para o seu mestre, e ele seria responsabilizado por qualquer perda. Ele não estava disposto a aceitar a responsabilidade envolvida, e faria o mesmo se oportunidades maiores lhe fossem oferecidas.

Escondi [...] o teu talento. Ver com. de Lc.19:20.

Mt.25:26 26. Respondeu-lhe, porém, o senhor: Servo mau e negligente, sabias que ceifo onde não semeei e ajunto onde não espalhei?

Mau e negligente. Muitos homens com grande capacidade realizam pouco porque empreendem pouco (ver PJ, 331).

Sabias. A desculpa do servo negligente foi sua condenação. Seus próprios lábios admitiram sua culpa.

Mt.25:27 27. Cumpria, portanto, que entregasses o meu dinheiro aos banqueiros, e eu, ao voltar, receberia com juros o que é meu.

Cumpria. O conhecimento do servo lhe impôs uma responsabilidade da qual não havia escapatória. Ele poderia ter feito algo a respeito da situação que tinha escolhido. Não havia desculpa. Ele tinha capacidade para dobrar o único talento. Deus aceita uma pessoa de acordo com o que ela pode fazer e nunca espera mais dela do que isso (2Co.8:12). Ele não requer mais nem nada menos do que o melhor de cada pessoa.

Aos banqueiros. Ou seja, os banqueiros do dia (ver com. de Lc.19:23). O servo poderia ter investido o dinheiro se ele temesse se envolver em um negócio mais complexo (ver com. de Mt.25:25). A quantidade de lucro poderia ter sido menor, mas mesmo isso seria melhor do que nada.

Com juros. “Usura”, “interesse” (ver com. de Ex.22:25).

Mt.25:28 28. Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem dez.

Tirai-lhe. A recompensa pelo serviço fiel era uma oportunidade de prestar um serviço maior (ver com. do v. Mt.25:21). A pena pelo fracasso em servir foi a perda de mais uma oportunidade de servir. Oportunidades negligenciadas são logo perdidas (ver com. de Lc.19:24; cf. PJ, 364).

Dai-o. As oportunidades e as tarefas recusadas por uma pessoa são dadas a outra que as aproveita e faz o melhor com elas (ver com. de Lc.19:24-25).

Mt.25:29 29. Porque a todo o que tem se lhe dará, e terá em abundância; mas ao que não tem, até o que tem lhe será tirado.

O que tem. Jesus afirmou essa grande verdade em várias ocasiões (cf. com. de Mt.13:12).

Tirado. Os talentos são concedidos para que possam ser usados e, se não forem usados, é natural que sejam removidos. Por outro lado, aproveitar, ao máximo as oportunidades, limitadas muitas vezes, resulta em oportunidades cada vez maiores.

Mt.25:30 30. E o servo inútil, lançai-o para fora, nas trevas. Ali haverá choro e ranger de dentes.

Lançai (ARC). O “servo inútil” havia sido negligente em seu dever, um fato que admitiu abertamente. Sua falha foi deliberada e premeditada e, por isso, devia assumir a responsabilidade pelo fracasso. No grande dia do juízo final, aqueles que vagaram ao acaso, esquivando-se das oportunidades e fugindo das responsabilidades, serão postos pelo grande Juiz junto aos que praticaram o mal (PJ, 365).

Inútil. Ou, “sem valor”, “sem serventia”.

Nas trevas. Ver com. de Mt.8:12; Mt.22:13.

Choro e ranger de dentes. Comparar com Mt.8:12; Mt.22:13; Mt.24:51. Jesus repetiu esse provérbio em numerosas ocasiões, como uma descrição gráfica do remorso dos perdidos.

Mt.25:31 31. Quando vier o Filho do Homem na sua majestade e todos os anjos com ele, então, se assentará no trono da sua glória

Filho do Homem. [O grande julgamento, Mt 25:31-46. Sobre as parábolas, ver p. 203-210]. Sobre as circunstâncias desta parábola, ver com. de Mt.24:1-3; cf. com. de Mt.25:1; Mt.25:14. Como as parábolas das dez virgens (v. Mt.25:1-13) e dos talentos (v. Mt.25:14-30), a parábola das ovelhas e dos cabritos foi dada para ilustrar as verdades estabelecidas em Mt.24, em relação ao retorno de Jesus (ver com. de Mt.25:14). Esta, a última das parábolas de Jesus, apresenta apropriadamente o grande veredito e reduz aos termos mais simples e práticos a base sobre a qual o julgamento será feito (sobre a expressão “Filho do Homem” ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10).

Na Sua majestade. Em Sua primeira vinda, Jesus velou Sua glória divina e viveu como um homem entre os homens (ver com. de Lc.2:48). Ele, então, estabeleceu o reino da graça (ver com. de Mt.5:3). No entanto, Ele virá de novo “em Sua glória” para inaugurar Seu reino eterno (Dn.7:14; Dn.7:27; Ap.11:15; ver com. de Mt.4:17; Mt.5:2). A segunda vinda de Jesus é o tema de Mt.24-25.

Os santos anjos (ARC). Embora haja pouca evidência textual (cf. p. 136) para a inclusão da palavra “santos”, não pode haver dúvida de que o termo se refira aos anjos (sobre os anjos na obra do juízo, ver com. de Dn.7:10; Ap.5:11; quanto ao ministério deles em favor dos seres humanos, ver Hb.1:14; sobre a presença dos anjos na segunda vinda de Cristo, ver com. de Mt.24:30-31; At.1:9-11; 1Ts.4:15-17).

Então se assentará. Ou seja, como Rei (v. Mt.25:34) e Juiz (v. Mt.25:32; Mt.25:34; Mt.25:41).

No trono da Sua glória. Ou, “Seu trono glorioso”. Cristo Se assentava no trono do universo antes da encarnação (DTN, 22, 23). Após a ascensão, Ele foi mais uma vez entronizado (AA, 38) como sacerdote e rei (Zc.6:13; AA, 39) e compartilhou o trono do Pai (DTN, 832; Ap.3:21). Após a conclusão da obra do juízo investigativo, iniciado em 1844 (ver com. de Ap.14:6-7), Jesus vai receber “Seu reino” (GC, 426, 613, 614; PE, 55, 280). A coroação final e a entronização de Cristo como rei do universo ocorrerá no fim do milênio, diante de todos os seres humanos: os súditos de Seu glorioso reino e aqueles que recusaram lealdade a Ele.

Mt.25:32 32. e todas as nações serão reunidas em sua presença, e ele separará uns dos outros, como o pastor separa dos cabritos as ovelhas

Todas as nações. Ver Ap.20:11-15; GC, 665, 666.

Separará uns dos outros. Ver com. de Mt.13:24-30; Mt.13:47-50.

Como o pastor. Direta ou indiretamente, Jesus muitas vezes Se comparou a um pastor, e Seu povo, a ovelhas (ver Ez.34:11-17; Zc.13:7; Mt.15:24; Mt.18:11-14; Lc.15:1-7; Jo.10:1-16).

Ovelhas. Na Palestina, as ovelhas eram geralmente brancas e os bodes, pretos (Sl.147:16; Is.1:18; Ez.27:18; Ct.4:1-2). Comumente faziam parte do mesmo rebanho apascentado pelo mesmo pastor (Gn.30:32-33).

Mt.25:33 33. e porá as ovelhas à sua direita, mas os cabritos, à esquerda

A Sua direita. Simbolizando honras e bênçãos (ver Gn.48:13-14; Mc.14:62; Mc.16:19; Cl.3:1).

A esquerda. O lado esquerdo pode representar um favor ou honra menor, ou um verdadeiro desfavor. Aqui, o último significado prevalece (ver v. Mt.25:41).

Mt.25:34 34. então, dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo.

O Rei. Referência ao “Filho do Homem”, do v. Mt.25:31 (ver com. ali).

Benditos. Ser “bendito” é ser “feliz” (ver com. de Mt.5:3). Aqueles a quem Deus faz “felizes” são felizes de fato! “A Sua mão direita há delícias perpetuamente” (Sl.16:11, ARC).

Meu Pai. Ver com. de Mt.6:9.

Possuí por herança (ARC). Herdar é tomar posse de uma propriedade. O homem foi originalmente nomeado rei deste mundo (Gn.1:28), mas perdeu seu domínio, como resultado do pecado. Daniel olhou para o futuro, para um tempo em que os santos mais uma vez herdariam o reino eterno originalmente planejado para eles (Dn.7:27).

Reino. Ou, o reino de glória (ver com. do v. Mt.25:31).

Que vos está preparado. O plano original de Deus para este mundo, interrompido pela entrada do pecado, será bem-sucedido, e Sua vontade será suprema tanto na Terra como no Céu (ver com. de Mt.6:10; comparar com Lc.12:32).

Mt.25:35 35. Porque tive fome, e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era forasteiro, e me hospedastes

E me destes de comer. Ou, “alimento” (ver com. de Mt.3:4). A grande prova final diz respeito à medida em que os princípios da verdadeira religião (ver Tg.1:27) são aplicados à vida diária, especialmente em relação aos interesses e necessidades dos outros.

E Me hospedastes. Ou, “Me recebeste com hospitalidade”; “Me entretiveste”.

Mt.25:36 36. estava nu, e me vestistes; enfermo, e me visitastes; preso, e fostes ver-me.

E Me visitastes. Ver com. de Lc.1:68.

Mt.25:37 37. Então, perguntarão os justos: Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer? Ou com sede e te demos de beber?

Quando foi que Te vimos [...]? O espírito e a prática do serviço abnegado se tornam um hábito do “justo” de tal maneira que eles respondem prontamente às necessidades de seus semelhantes.

Mt.25:38 38. E quando te vimos forasteiro e te hospedamos? Ou nu e te vestimos?

Sem comentário para este versículo.

Mt.25:39 39. E quando te vimos enfermo ou preso e te fomos visitar?

Sem comentário para este versículo.

Mt.25:40 40. O Rei, respondendo, lhes dirá: Em verdade vos afirmo que, sempre que o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.

O Rei. Ou, Cristo (ver os v. Mt.25:31; Mt.25:34).

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

A Mim. Que consolo é saber que Cristo Se identifica com Seus escolhidos – tudo o que diz respeito a eles interessa a Ele, pessoalmente. Não há dor ou decepção que possamos experimentar ou qualquer necessidade que venhamos a ter com a qual Cristo não simpatize. Ao tomar as necessidades dos outros como nossa responsabilidade, refletimos esse mesmo aspecto do caráter divino. Quando refletirmos o caráter de Jesus perfeitamente, agiremos como Ele pelos necessitados e, por meio de nós, Ele poderá consolar e socorrer os outros. A melhor prova de amor a Deus é o amor que nos move a levar “as cargas uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo” (Gl.6:2; 1Jo.3:14-19; ver com. de Mt.5:43-48). O princípio envolvido na declaração de Mateus 25:40 é bem ilustrado na parábola do bom samaritano (ver com. de Lc.10:25-37). A melhor prova de que uma pessoa se tornou um filho de Deus é a prática das obras dEle (cf. Jo.8:44).

Mt.25:41 41. Então, o Rei dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos.

Fogo eterno. Descrito em outros lugares como “fogo inextinguível” (ver com. de Mt.3:12) e “fogo do inferno” (ver com. de Mt.5:22). Todos os três se referem às chamas do último dia que hão de consumir os maus e todas as suas obras (2Pe.3:10-12; Ap.20:10; Ap.20:14-15). A palavra aionios traduzida como “eterno” ou “para sempre”, significa “que dura um tempo”, no sentido de ser algo contínuo e não sujeito à mudança caprichosa. Os antigos papiros gregos contêm numerosos exemplos de imperadores romanos descritos como aionios. A referência é à natureza contínua do seu mandato já que eles assumiam um cargo vitalício. É, portanto, claro que as palavras “eterno” e “para sempre”, na língua portuguesa, não refletem com precisão o significado de aionios. O termo significa, literalmente, “época duradoura”, e expressa permanência ou perpetuidade dentro dos limites. Por sua vez, “eterno” e “para sempre” é de duração ilimitada. A duração de aionios deve, em cada caso, ser determinada pela natureza da pessoa ou coisa que ele descreve. No caso de Tibério César, por exemplo, aionios descreve um período de 23 anos, ou seja, o tempo de sua ascensão ao trono até sua morte. No NT, aionios é usado para descrever tanto o destino dos ímpios quanto o estado futuro dos justos. Seguindo o princípio acima referido, de que a duração de aionios deve ser determinada pela pessoa ou coisa a que se refere, vemos que a recompensa do justo é a vida que não tem fim, a recompensa dos ímpios é morte para a qual não há fim (Jo.3:16; Rm.6:23). Em Jo.3:16, “vida eterna” se opõe a “perecer”. Em 2Ts.1:9, Paulo diz que os ímpios sofrerão “a penalidade de eterna destruição”. A expressão não significa um processo que vai durar para sempre, mas um ato cujos resultados são permanentes. “Fogo” é o meio pelo qual a punição para o pecado será infligida (Mt.18:8; Mt.25:41). Esse “fogo eterno”, aionios, não significa que ele é de duração infinita. Isso fica claro a partir de Jd.1:7. Obviamente, o “fogo eterno” que destruiu Sodoma e Gomorra queimou por um tempo e depois se extinguiu. As Escrituras se referem ao fogo do último dia como “inextinguível” (Mt.3:12), ou seja, ele não se extinguirá até que tenham queimado os últimos vestígios do pecado e dos pecadores (ver com. do v. Mt.25:12; sobre olam, o equivalente a aionios do NT, ver com. de Ex.21:6).

Para o diabo. Ver 2Pe.2:4; Jd.1:6-7. O destino do diabo e dos seus anjos já está determinado. Esses seres “que não guardaram o seu estado original” estão destinados a perecer nas chamas do último dia. Todos os que seguem o seu exemplo de rebeldia sofrerão o mesmo destino.

Mt.25:42 42. Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber

Sem comentário para este versículo.

Mt.25:43 43. sendo forasteiro, não me hospedastes; estando nu, não me vestistes; achando-me enfermo e preso, não fostes ver-me.

Sem comentário para este versículo.

Mt.25:44 44. E eles lhe perguntarão: Senhor, quando foi que te vimos com fome, com sede, forasteiro, nu, enfermo ou preso e não te assistimos?

Quando foi que Te vimos [...]? Eles não conseguiram aprender a grande verdade que o amor genuíno de Deus se revela no amor para com os Seus filhos sofredores. A verdadeira religião envolve mais do que o assentimento passivo aos dogmas.

Mt.25:45 45. Então, lhes responderá: Em verdade vos digo que, sempre que o deixastes de fazer a um destes mais pequeninos, a mim o deixastes de fazer.

Sempre. Ver com. do v. Mt.25:40.

Mt.25:46 46. E irão estes para o castigo eterno, porém os justos, para a vida eterna.

Castigo eterno. Ver com. do v. Mt.25:41.

Vida eterna. Comparar com Jo.3:16; Rm.6:23.

Mt.26:1 1. Tendo Jesus acabado todos estes ensinamentos, disse a seus discípulos:

Todos estes ensinamentos. [O plano para tirar a vida de Jesus, Mt 26:1-5 = Mc.14:1-2 = Lc.22:1-2 = Jo.11:45-53. Comentário principal: Mt. Ver gráfico 9, p. 230]. Ou seja, o discurso sobre os sinais da prometida segunda vinda, e as parábolas relatadas nos cap. Mt.24-25.

Mt.26:2 2. Sabeis que, daqui a dois dias, celebrar-se-á a Páscoa; e o Filho do Homem será entregue para ser crucificado.

Daqui a dois dias. A declaração do v. Mt.26:1 coloca esta previsão da traição e da crucifixão como posterior ao discurso relatado nos cap. Mt.24-25 (ver com. de Mt.24:1). Não se sabe se isso ocorreu nas altas horas da noite de terça ou de quarta-feira. Os comentaristas, ao pensarem na traição da quinta-feira à noite e nos “dois dias” em termos de contagem de tempo ocidental, geralmente colocam essa declaração na terça-feira à noite. No entanto, o período designado pode ser mais curto. Por exemplo, de acordo com a terminologia do NT, “depois de três dias” e “no terceiro dia” são equivalentes (p. 245-249), e pode ser que a expressão “após dois dias” deva ser entendida em sentido semelhante. Com a traição ocorrendo na quinta-feira à noite, o computo judaico indicaria, portanto, quarta-feira como o dia em que Cristo pronunciou estas palavras. No ano 31 d.C., o dia 14 de nisã, dia em que o cordeiro pascal foi morto, caiu numa sexta-feira (ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75).

Páscoa. Ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75.

O Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Será entregue. Do gr. paradidomi, “ser levado”, ou “ser preso”. Jesus especifica o tempo em que seria levado em custódia.

Mt.26:3 3. Então, os principais sacerdotes e os anciãos do povo se reuniram no palácio do sumo sacerdote, chamado Caifás

Os principais sacerdotes. Os homens aqui mencionados, sem dúvida, eram todos membros do Sinédrio, o conselho nacional dos judeus. Poucas semanas antes, logo após a ressurreição de Lázaro, o conselho decidiu condenar Jesus à morte na primeira oportunidade (Jo.11:47-53; DTN, 537-541). O sentimento popular em favor de Cristo tornou o assunto ainda mais urgente (DTN, 557; sobre a expressão “sacerdotes”, ver com. de Mt.2:4). Em vista do fato de vários ex-sumos sacerdotes estarem vivos na época, pode ser que eles sejam aqui mencionados como “principais sacerdotes”.

Os escribas (ARC). Ver p. 43. Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a omissão destas palavras.

Reuniram. Não se pode dizer com certeza se Mateus seguiu, aqui, uma ordem rigorosamente cronológica e se, assim, teve a intenção de mostrar que a reunião dos sacerdotes e dos anciãos ocorrera “dois dias” antes da Páscoa, ou se ele estava expondo o tema por tópicos. Ele pode, simplesmente, ter registrado uma declaração de Jesus (v. Mt.26:2), antes de falar sobre a reunião dos sacerdotes e dos anciãos (v. Mt.26:4-5). O fato de Mateus ter agrupado vários eventos da vida de Cristo de forma temática, em vez de cronológica (ver com. de Mt.8:2; Mt.12:1; Mt.13:1; Mt.26:6), levanta dúvida sobre como ele procedeu aqui. Mateus usou a palavra tote, “então”, cerca de 90 vezes (mais do que todos os outros escritores do NT juntos), mas nem sempre no sentido de uma relação estritamente cronológica entre o incidente assim introduzido e o imediatamente anterior (ver p. 276).

Pode-se notar que o relato sobre o banquete na casa de Simão está mais adiante neste capítulo (v. Mt.26:6-13), aparentemente, ocorrendo no sábado anterior, provavelmente à noite (ver Jo.12:1-2; Jo.12:12-13; ver DTN, 557, 563; a palavra deipnon, “ceia”, geralmente se refere a uma refeição à noite, como em Jo.13:2; ver com. de Lc.14:12). Cronologicamente, o banquete deveria ter sido relatado antes da narrativa de Mt.21 (ver com. de Mt.26:5). A reunião dos sacerdotes e dos anciãos, aqui mencionada, parece ter ocorrido na mesma noite de sábado (ver DTN, 558), e foi por ocasião da ceia de Simão que Judas foi até eles com a oferta de trair o Mestre (v. Mt.26:14-15; DTN, 563,564). O mais provável, portanto, é que os incidentes registrados nos v. 3 a 15 tenham ocorrido na noite do sábado anterior. No entanto, Mateus os coloca aqui por causa de sua influência significativa na traição de Jesus. Os motivos e interesses que levaram à convocação desta assembleia de líderes judeus eram urgentes (ver DTN, 557, 558). Este parece ter sido o primeiro encontro secreto de Judas com os líderes judeus (DTN, 563, 564). Aparentemente, ele se reuniu com eles uma segunda vez antes da última Ceia, na noite de quinta (DTN, 720) ou na de terça-feira.

No palácio. Onde Jesus compareceu, mais tarde, diante de Anás e Caifás (ver v. Mt.26:58), provavelmente ao lado, ou talvez dentro da área do templo (ver mapa, p. 587).

Caifás. Ver com. de Lc.3:2.

Mt.26:4 4. e deliberaram prender Jesus, à traição, e matá-lo.

Deliberaram. A primeira reunião formal a respeito de Jesus ocorrera dois anos antes (Jo.5:16; DTN, 213). Outra sessão semelhante havia sido realizada havia pouco tempo, logo após a ressurreição de Lázaro (DTN, 558; Jo.11:47-53). A assembleia de Mateus 26:4 aparentemente foi realizada na noite do sábado que antecedeu a crucifixão (ver com. do v. Mt.26:3), e a outra ocorreu na terça- feira de manhã (DTN, 593).

A traição. Desde a ressurreição de Lázaro, a crescente popularidade de Jesus enchera os líderes judeus de medo (DTN, 558). Alguns eventos dos primeiros dias da semana da crucifixão só serviram para intensificar o sentimento do povo de que, em Jesus, a nação tinha encontrado o líder do qual os profetas haviam falado, e os fariseus exclamavam em verdadeira perplexidade: “Não estamos conseguindo nada! Vejam! Todos estão indo com Ele!” (Jo.12:19, NTLH; DTN, 570, 572, 590, 594). A crise era iminente e, a menos que os líderes judeus pudessem se livrar dEle, a queda deles parecia certa. Eles sentiam que deviam agir de forma rápida e secreta. Além disso, uma revolta popular, em apoio a Jesus como Rei-Messias (ver DTN, 558, 570-572, 590), certamente traria o poder opressor de Roma ainda mais firme sobre a nação. Por outro lado, prender Jesus abertamente poderia desencadear uma revolta popular em Seu favor.

Mt.26:5 5. Mas diziam: Não durante a festa, para que não haja tumulto entre o povo.

Não durante a festa. O sentimento popular entre as multidões reunidas em Jerusalém para celebrar a Páscoa, o evento que marcou a primeira libertação de Israel como nação, era fortemente favorável a proclamar Jesus como Rei Messias (ver com. do v. Mt.26:4). Os líderes arrazoavam que não seria seguro resolver o caso de Jesus antes que essas multidões deixassem a cidade; mas, quando suas deliberações atingiram esse ponto, Judas chegou com uma proposta que, aparentemente, mudou os planos deles (v. Mt.26:14-15). Mateus insere aqui a narrativa do banquete na casa de Simão (v. Mt.26:6-13), que ocorreu em Betânia, enquanto os sacerdotes e os fariseus estavam em conselho no palácio de Caifás, em Jerusalém, para discutir a mudança de planos. Depois da repreensão recebida no banquete de Simão, Judas foi diretamente ao palácio, disposto a trair Jesus.

Tumulto. Ver com. do v. Mt.26:4. Isto ocorreu, presumivelmente, na noite de sábado que antecedeu a crucifixão (ver com. do v. Mt.26:3). No dia seguinte, houve uma grande manifestação popular aclamando Jesus como o Rei Messias, quando Ele entrou triunfante em Jerusalém (ver com. de Mt.21:1-11; DTN, 570-572). Sem dúvida, quando os sacerdotes saíram ao encontro de Jesus no cume do monte das Oliveiras, eles sentiram que seus piores temores estavam prestes a se realizar (ver DTN, 578, 580, 581).

Mt.26:6 6. Ora, estando Jesus em Betânia, em casa de Simão, o leproso,

Betânia. [Jesus ungido em Betânia, Mt 26:6-13 = Mc.14:3-9 = Lc.7:36-50 = Jo.12:1-8. Comentário principal: Mt e Lc. Ver mapa, p. 221; gráficos 7, 9, p. 228, 230]. Sobre a ocasião do banquete, ver DTN, 557. Em geral, os comentaristas negam que o jantar de Lc.7:36-50 deva ser identificado com o que foi aqui registrado por Mateus (e também por Marcos e João), e colocam o evento durante o ministério de Jesus na Galileia, mais de um ano e meio antes. Este Comentário considera que se trata de um único banquete descrito pelos quatro evangelhos (ver Nota Adicional a Lucas 7; Lc.7:50).

Simão. Um fariseu (Lc.7:36-40) a quem Jesus havia curado de lepra. Ele se considerava um discípulo e tinha se associado abertamente a Jesus, mas não estava completamente convencido de sua messianidade (DTN, 557, 566; Lc.7:39). A festa foi realizada em honra a Jesus. Lázaro também era um convidado de honra. Marta servia, e Maria Madalena, a quem Simão levara a cair em pecado e que Jesus havia curado de possessão demoníaca, também estava presente (DTN, 558, 559; ver a Nota Adicional a Lucas 7; Lc.7:50).

O leproso. Não que ele tivesse lepra na época, pois, se assim fosse, ele teria sido impedido de frequentar encontros sociais (ver com. de Mc.1:40). Algum tempo antes, Jesus o curara de lepra, e ele, por sua vez, ofereceu esse banquete como expressão de gratidão (DTN, 557).

Mt.26:7 7. aproximou-se dele uma mulher, trazendo um vaso de alabastro cheio de precioso bálsamo, que lhe derramou sobre a cabeça, estando ele à mesa.

Uma mulher. Era Maria, a irmã de Marta e Lázaro (Jo.12:1-3; ver Nota Adicional a Lucas 7; Lc.7:50).

Um vaso de alabastro. Ver com. de Lc.7:37. De acordo com Mc.14:3, um “vaso”, ou jarro, que precisava ser quebrado para que o seu conteúdo pudesse ser liberado.

Precioso. Ou, “caro”, um significado anteriormente ligado à palavra “precioso”.

Bálsamo. Do gr. muron, “unguento”. Marcos o identifica como nardo (ver com. de Lc.7:37).

Sobre a cabeça. Mateus e Marcos falam da unção da cabeça de Jesus por Maria, enquanto Lucas e João mencionam a unção dos pés. A primeira vista, isso pode parecer uma discrepância entre os relatos, no entanto, não há razão para se duvidar de que ambas foram feitas (cf. Sl.133:2).

Estando [...] à mesa. Literalmente, “reclinado” (ver com. de Mc.2:15).

Mt.26:8 8. Vendo isto, indignaram-se os discípulos e disseram: Para que este desperdício?

Os discípulos. De acordo com Jo.12:4-5, o protesto começou com Judas. Outros discípulos devem ter se juntado a ele na crítica, o que se transformou em sussurros que circulavam ao redor da mesa. Este desperdício, Judas se ressentiu do fato de o perfume não ser vendido e o dinheiro depositado no tesouro comum, ao qual ele poderia ter acesso, “porque ele era ladrão” (Jo.12:6).

Mt.26:9 9. Pois este perfume podia ser vendido por muito dinheiro e dar-se aos pobres.

Vendido por muito dinheiro. De acordo com Mc.14:5, o valor estimado do bálsamo era de mais de 300 denários (ver p. 37). Um denário era o salário de um dia normal de trabalho (ver com. de Mt.20:2). Assim, o valor gasto no perfume era quase equivalente ao rendimento anual de um trabalhador comum.

Aos pobres. Judas, o orador (ver com. do v. Mt.26:8), sabia bem que a lei judaica atribuía a responsabilidade definitiva de cuidar dos pobres àqueles que tinham melhores condições (Dt.15:7-11) e que a atenção às suas necessidades era encarada como meritória (ver com. de Mt.5:3).

Mt.26:10 10. Mas Jesus, sabendo disto, disse-lhes: Por que molestais esta mulher? Ela praticou boa ação para comigo.

Sabendo. Ou, Jesus Se tornou ciente (ver com. de Mc.2:8).

Mt.26:11 11. Porque os pobres, sempre os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes

Os pobres, sempre os tendes. Jesus não questiona o dever para com os pobres. Ele simplesmente declara que há obrigações que superam esse dever.

Nem sempre. Mesmo os mais próximos a Jesus não sabiam o que a semana seguinte traria. Só Maria parecia entender, embora vagamente, o que estava adiante (ver DTN, 559). Seu desejo sincero de fazer “o que podia” (Mc.14:8, ARC) foi altamente valorizado por Jesus, que estava prestes a enfrentar a crise por vir.

Mt.26:12 12. pois, derramando este perfume sobre o meu corpo, ela o fez para o meu sepultamento.

O Meu sepultamento. Tinha sido a intenção original de Maria usar o bálsamo na preparação do corpo de Jesus para o enterro (DTN, 559, 560; cf. Mc.16:1). No entanto, evidentemente, o Espírito de Deus a impressionou a usá-lo naquela ocasião.

Mt.26:13 13. Em verdade vos digo: Onde for pregado em todo o mundo este evangelho, será também contado o que ela fez, para memória sua.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Este evangelho. Jesus antecipou claramente a proclamação de Seu “evangelho” (ver com. de Mc.1:1) em todos os lugares (ver também Mt.24:14). Aqueles que afirmam que Jesus nunca teve a intenção de fundar uma religião fariam bem em ponderar sobre esta declaração.

Para memória sua. Ou, “ela será lembrada” (NTLH). O ato de devoção de Maria reflete o mesmo espírito que levou Jesus a descer a esta Terra escura (Fp.2:6-8).

Mt.26:14 14. Então, um dos doze, chamado Judas Iscariotes, indo ter com os principais sacerdotes, propôs:

Judas Iscariotes. [O pacto da traição, Mt 26:14-16 = Mc.14:10-11 = Lc.22:3-6]. Sobre a vida de Judas, ver com. de Mc.3:19 (cf. DTN, 716-722).

Indo ter. Este evento se relaciona aos fatos alistados anteriormente neste capítulo (ver com. dos v. Mt.26:3; Mt.26:5). O sermão na sinagoga de Cafarnaum, cerca de um ano antes (Jo.6:22-65), tinha sido o ponto crucial na história de Judas (DTN, 719). Embora exteriormente ele tenha permanecido com os doze, em seu coração ele havia abandonado a Jesus. Aqui a exaltação por parte de Cristo do ato de devoção de Maria, no jantar de Simão, foi uma condenação indireta da atitude de Judas e o impulsionou à ação (DTN, 563, 564, 720). Como é estranho que o supremo ato de amor de Maria a Jesus possa ter levado Judas ao seu supremo ato de deslealdade! Ao procurar os “principais sacerdotes”, Judas agiu sob influência do maligno (Lc.22:3).

Mt.26:15 15. Que me quereis dar, e eu vo-lo entregarei? E pagaram-lhe trinta moedas de prata.

Que me queres dar [...]? A vantagem pessoal era a principal razão que levara Judas a se oferecer para trair o Mestre. Na verdade, a vantagem pessoal era o motivo dominante de toda a sua vida.

Eu vo-Lo entregarei. A oferta de Judas resolveu o dilema dos líderes em Jerusalém. Eles queriam silenciar Jesus, mas estavam paralisados pelo medo do povo (ver com. do v. Mt.26:5). O problema deles era como levar Jesus em custódia sem provocar uma revolta popular em Seu favor (ver com. do v. Mt.26:16).

Moedas de prata. Do gr. arguria, cogita-se que a referência seja aos shekels, que, no tempo de Cristo, eram equivalentes aos estáteres gregos (ver com. de Mt.17:24; Mt.17:27) e à tetradrachma tíria. Um stater pesava 14,245 g, e seria equivalente ao salário de quatro dias de um trabalhador comum. “Trinta moedas de prata” equivaleriam, portanto, ao salário de 120 dias. Trinta moedas de prata era, também, o preço tradicional de um escravo (Ex.21:32; comparar com Zc.11:12).

Mt.26:16 16. E, desse momento em diante, buscava ele uma boa ocasião para o entregar.

Ocasião. Do gr. eukairia, “um tempo favorável”, ou, um momento adequado às exigências dos líderes da nação (ver com. dos v. Mt.26:4-5). Judas proveu o elo que faltava na trama sacerdotal para prender Jesus, de forma conveniente (Mc.14:11), “sem tumulto” (Lc.22:6; Mc.14:1-2). Não é de admirar que os sacerdotes e os anciãos “alegraram-se” (Mc.14:11).

Mt.26:17 17. No primeiro dia da Festa dos Pães Asmos, vieram os discípulos a Jesus e lhe perguntaram: Onde queres que te façamos os preparativos para comeres a Páscoa?

No primeiro dia. [Os discípulos preparam a Páscoa, Mt 26:17-19 = Mc.14:12-16 = Lc.22:7-13. Comentário principal: Mt]. Marcos faz a observação adicional de que o “primeiro dia da Festa dos Pães Asmos” era o momento “quando se fazia o sacrifício do cordeiro pascal” (Mc.14:12). Lucas identifica o dia como o tempo “em que importava sacrificar a páscoa” (Lc.22:7, ABC). A designação “primeiro dia dos Pães Asmos”, para o dia do sacrifício da Páscoa, é incomum. Normalmente, 14 de nisã é designado como o dia da morte do cordeiro pascal, e 15 de nisã como o primeiro dia dos Pães Asmos (Lv.23:5-6; ver vol. 2, p. 89). Devido à estreita relação entre a Páscoa e a Festa dos Pães Asmos, os dois termos foram, por vezes, utilizados como sinônimos, e toda a festa era chamada por um ou outro dos dois nomes. O presente incidente ocorreu na quinta-feira (sobre a relação entre este evento e a Páscoa, e a respeito da aparente discrepância entre os evangelhos sinóticos e João sobre o dia da Páscoa, ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75).

Pães Asmos. Ver com. de Ex.12:8; Lv.23:6; Nm.28:17; Dt.16:3; Dt.16:8; ver voI. 1, p. 764; vol. 2, p. 92.

Vieram os discípulos. O chefe da família tinha a responsabilidade de fazer arranjos para a celebração da Páscoa, assim como era seu dever cuidar de todos os outros interesses religiosos da família. Ele era, em certo sentido, o sacerdote da família. Como “membros da família de Jesus” (DTN, 349), no sentido espiritual, os discípulos, naturalmente, foram a Ele para obter instruções sobre a preparação para a Páscoa. Aparentemente, receberam dEle as orientações na quinta-feira, 13 de nisã (ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75), para celebrarem a Páscoa juntos na mesma noite (ver Mt.26:17; Mt.26:20; Mt.14:12; Mt.14:16-18; Lc.22:7-8; Lc.22:13-15).

Onde queres que Te façamos [...]? Aparentemente, mesmo os discípulos mais próximos de Cristo (Lc.2:88; cf. DTN, 292) ainda não sabiam em detalhes quais eram os planos de Jesus para a Páscoa. Parece, portanto, que Judas também não sabia. Desde seu primeiro contato com o Sinédrio, na noite do sábado anterior (ver com. de Mt.26:3; Mt.26:5) e, em particular, desde seu segundo contato com eles, que provavelmente ocorreu na noite de terça (DTN, 645, 655, 716, 720). Judas procurava um momento oportuno para trair Jesus (ver com. do v. Mt.26:16). Alguns sugeriram que essa situação pode ter contribuído para o fato de Jesus esperar até quase o último momento antes de fazer os arranjos para a Páscoa. No entanto, mesmo assim, as instruções que Ele deu a Pedro e a João foram discretas de tal forma que nem eles nem os demais discípulos sabiam onde deveriam celebrar a Páscoa. De algum modo, somente mais tarde, naquele mesmo dia, é que, após o retorno de Pedro e João, todos saberiam onde devia ser. Assim, Judas teria pouco tempo para planejar trair Jesus junto aos líderes, durante a hora tranquila em que Ele passaria com Seus discípulos no cenáculo. Essas precauções podem ter sido tomadas porque Jesus escolheu não ser perturbado durante essa ocasião sagrada, a última vez em que estaria com os doze, pois Ele tinha instruções muito importantes para eles.

Páscoa. Ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75.

Mt.26:18 18. E ele lhes respondeu: Ide à cidade ter com certo homem e dizei-lhe: O Mestre manda dizer: O meu tempo está próximo; em tua casa celebrarei a Páscoa com os meus discípulos.

Ide à cidade. Jesus deve ter passado a noite, ou seja, quarta-feira à noite, fora de Jerusalém. De sexta a terça-feira, Ele havia passado as noites em Betânia, provavelmente na casa de Lázaro (DTN, 557; ver com. de Mt.21:17). Na noite de terça, Ele dormiu no monte das Oliveiras (ver DTN, 674, 685). Não se sabe onde Ele passou o dia e a noite da quarta-feira (ver com. de Mt.21:17; Mt.26:12). Provavelmente foi na terça-feira que Judas procurou os líderes judeus pela segunda vez e completou os arranjos para trair o Mestre, e concordando em fazê-lo num de Seus locais de retiro (DTN, 645, 716; ver com. do v. Mt.26:4). Jesus sabia da conspiração secreta de Judas contra Ele, e Ele poderia ter deliberadamente alterado Seu lugar de estada para dificultar os planos de Judas (ver Jo.6:64).

Certo homem. Do gr. deina, um homem “assim-e-assim”, uma designação de alguém a quem a pessoa que fala não deseja nomear. Jesus não revelou o nome do homem que tinha em mente, mas deu um sinal para que os dois discípulos enviados nessa missão pudessem reconhecê-lo quando o encontrassem. Com base em At.12:12 (cf. At.1:13), a tradição conjecturou que o pai de João Marcos era o dono da casa, e que em sua casa havia um quarto no andar superior, que se tornou a morada dos doze e a sede da igreja em Jerusalém por certo tempo (ver com. de Mc.14:51).

O Mestre manda dizer. Estas palavras sugerem que o dono da casa estava familiarizado com Jesus e era amigável a Ele. Talvez, como Simão de Betânia (DTN, 557), Nicodemos (Jo.19:39; DTN, 177) e José de Arimateia (Mt.27:57), esse homem já fosse um discípulo de Jesus.

Meu tempo. No início de Seu ministério, Jesus tinha comentado que Seu “tempo” ou “hora” ainda não tinha chegado (ver Jo.2:4; Jo.7:6; Jo.7:8; Jo.7:30; Mt.8:20). O uso desta expressão, de modo geral, significava que o tempo de encerrar Seu ministério e de Sua morte ainda não havia chegado. Nesta ocasião, em que o dia da traição tinha chegado, Ele declarou em palavras claras que Seu “tempo” estava à mão. Mais tarde, na mesma noite, Ele disse: “É chegada a hora” (Jo.17:1).

Em tua casa. Nos dias de Jesus, a Páscoa era celebrada dentro da cidade de Jerusalém, e todas as casas deviam ser disponibilizadas para os peregrinos presentes na festa. Por um tempo, de acordo com as instruções dadas quando a primeira Páscoa foi instituída (Ex.12:22), os participantes da ceia pascal eram obrigados a ficar até pela manhã na casa em que se hospedavam. Com o número crescente de peregrinos que iam para as festividades da Páscoa, eventualmente, tornou-se necessária a permissão para retirar a ceia pascal dos locais de hospedagem para uma área limitada e definida nas imediações de Jerusalém.

Mt.26:19 19. E eles fizeram como Jesus lhes ordenara e prepararam a Páscoa.

Prepararam a Páscoa. A preparação, provavelmente, incluía o seguinte: busca de um espaço para a ceia, varrer o local e colocar nele uma mesa, almofadas, estofados e os utensílios para servir a refeição. Embora as Escrituras nada informem, especificamente, sobre um cordeiro para a Ceia de Jesus com os discípulos, dificilmente eles a celebrariam sem um (ver Mc.34:12; Mc.34:16-18; Lc.22:7-8; Lc.22:13-15). Pedro e João devem ter comprado, matado e assado um cordeiro. Eles também poderiam ter preparado os pães asmos, as ervas amargas, o molho e o vinho. Essa preparação, sem dúvida, ocupava uma parte considerável do dia e, provavelmente por isso, Pedro e João voltaram quase à noite.

Mt.26:20 20. Chegada a tarde, pôs-se ele à mesa com os doze discípulos.

Chegada a tarde. [O traidor é indicado, Mt 26:20-25 = Mc.14:17-21 = Lc.22:14; Lc.22:21-23 = Jo.13:21-30. Comentário principal: Mt e Jo]. Isto ocorreu na quinta-feira à noite, durante as primeiras horas de 14 de nisã (ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75).

Mt.26:21 21. E, enquanto comiam, declarou Jesus: Em verdade vos digo que um dentre vós me trairá.

Enquanto comiam. Mateus e Marcos não mencionam o rito do lava-pés dos discípulos (Jo.13:1-17). Além disso, em suas narrativas, Mateus e Marcos invertem a ordem da Ceia do Senhor e da identificação do traidor. O relato de Lucas é, de certo modo, mais cronológico, pois Judas, antes de deixar o cenáculo, participou do pão e do vinho quando Jesus instituiu a Ceia (DTN, 653). De acordo com a Mishnah, o ritual da ceia pascal se dava do seguinte modo: (1) O chefe da família ou do grupo que celebrava a ceia misturava a primeira taça de vinho e a passava para os outros, pronunciando uma bênção sobre o dia e sobre o vinho. (2) Em seguida, o chefe realizava um ritual de lavagem das mãos. (3) A mesa era então posta. Os alimentos servidos na refeição pascal consistiam do cordeiro pascal, de pães asmos, de ervas amargas, alface e outros legumes e um molho saboroso chamado charoseth, feito de amêndoas, tâmaras, passas de figo, especiarias e vinagre. Nessa fase, alguns dos vegetais eram comidos como entrada. (4) A segunda taça de vinho era então passada ao círculo de pessoas, e o chefe da família explicava o significado da Páscoa. (5) A primeira parte da Páscoa, Hallel, que consistia dos Sl.113-114, era cantada. (6) Os participantes, em seguida, comiam a refeição da Páscoa. O chefe da família dava graças e partia os pães asmos e distribuía uma parte a cada hóspede. Partes do cordeiro pascal eram comidas. (7) A terceira taça de vinho era passada, e a bênção sobre a refeição, proferida. (8) A quarta taça de vinho era passada, após a qual todos se uniam na segunda parte do Hallel, que consistia dos Sl.115-118.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Um dentre vós. De acordo com o relato, esta foi a primeira vez em que Jesus anunciou claramente que um dos doze seria o traidor. Todos ficaram perplexos, mas ninguém ainda tinha suspeitado de Judas. Este último, no entanto, começava a perceber que Jesus lia seu segredo sinistro como um livro aberto. As cinco declarações de Jesus que revelam o conspirador foram ditas na seguinte ordem progressiva (ver DTN, 653, 654): (1) As palavras: “Nem todos estais limpos” (Jo.13:11) foram proferidas durante o lava-pés. (2) A seguinte declaração: “Aquele que come o pão comigo, levantou contra Mim seu calcanhar” (Jo.13:18, ARC), foi feita quando os discípulos retomaram seus lugares à mesa. (3) O anúncio de Mt.26:21: “Um dentre vós Me trairá”, ocorreu poucos momentos depois. (4) As palavras: “O que mete comigo a mão no prato, esse Me trairá” (v. Mt.26:23), provavelmente surgiram em algum ponto durante a ceia. (5) O reconhecimento final: “Tu o disseste” (v. Mt.26:25), veio no fim da ceia e levou Judas a deixar o ambiente imediatamente (comparar com Sl.41:9).

Trairá. Do gr. paradidomi, “entregar a”. Em pelo menos quatro ocasiões anteriores a esta, Jesus tinha feito referência à traição que iria sofrer (cf. Mt.17:22; Mt.20:18; Mt.26:2; Jo.6:64; Jo.6:70-71).

Mt.26:22 22. E eles, muitíssimo contristados, começaram um por um a perguntar-lhe: Porventura, sou eu, Senhor?

Sou eu, Senhor? A forma da pergunta em grego implica que uma resposta negativa era esperada, como se dissessem: “Não sou eu, Senhor, não é?” No caso de Judas, esta forma de pergunta seria utilizada como um blefe.

Mt.26:23 23. E ele respondeu: O que mete comigo a mão no prato, esse me trairá.

O que mete comigo a mão no prato. Ver com. do v. Mt.26:21. Jesus fez esta declaração em resposta a uma pergunta de João (Jo.13:23-26), mas Judas não ouvira a pergunta (DTN, 654). Os dedos eram usados para comer a refeição da Páscoa. O “prato” aqui referido era o charoseth, ou um molho usado com pão asmo e ervas amargas (ver com. de Mt.26:21).

Esse. Nos tempos antigos, violar os direitos de hospitalidade marcava um homem como fora dos limites da respeitabilidade. Em regiões orientais, até hoje, evitar comer à mesma mesa com alguém pode significar querer tirar vantagem da situação, ou não querer a amizade dessa pessoa.

Mt.26:24 24. O Filho do Homem vai, como está escrito a seu respeito, mas ai daquele por intermédio de quem o Filho do Homem está sendo traído! Melhor lhe fora não haver nascido!

Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Vai. Do gr. hupago, um eufemismo para morte.

Está escrito. Jesus devia Se referir a passagens como Sl.22 e Is.53.

Ai. O fato de as Escrituras terem predito a conspiração de Judas em nada o absolveu de sua responsabilidade pessoal no assunto. Deus não o havia predestinado a trair o Mestre. A decisão de Judas foi uma escolha deliberada de sua parte.

Não haver nascido. Comparar com Mt.18:6.

Mt.26:25 25. Então, Judas, que o traía, perguntou: Acaso, sou eu, Mestre? Respondeu-lhe Jesus: Tu o disseste.

Judas. Ver com. de Mc.3:19. Judas não tinha ouvido a declaração de Cristo a respeito dele como o traidor (ver com. de Mt.26:23). Na confusão, ele tinha se mantido em silêncio enquanto os outros perguntavam: “Serei eu?” E seu silêncio então se fez evidente (DTN, 654).

Tu o disseste. Ver com. do v. Mt.26:21. Esta afirmação foi uma indireta, talvez um modo ambíguo de dizer: “sim” (v. Mt.26:64). Os outros discípulos, com a possível exceção de João (ver Jo.13:25-27), não compreenderam a importância da declaração final de Jesus a Judas (ver Jo.13:28). Judas, porém, percebeu que Jesus descobrira seu segredo e partiu logo para sua terceira conferência com os líderes judeus (Jo.13:31; DTN, 654, 655).

Mt.26:26 26. Enquanto comiam, tomou Jesus um pão, e, abençoando-o, o partiu, e o deu aos discípulos, dizendo: Tomai, comei; isto é o meu corpo.

Enquanto comiam. [A Ceia do Senhor, Mt 26:26-29 = Mc.14:22-26 = Lc.22:14-20 = 1Co.1:23-25. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 222; gráficos, p. 229, 230]. Eles comiam a ceia da Páscoa.

Tomou Jesus um pão. O pão asmo comido na Páscoa.

Abençoando-o. Alguns têm sugerido que Jesus pode ter dito a bênção judaica: “Bendito és Tu, ó Senhor, nosso Deus, Rei do mundo, que fazes brotar o pão da Terra.”

Tomai, comei. Como o corpo encontra alimento no pão material, a mente encontra alimento espiritual nas verdades proferidas por Cristo.

Isto é o Meu corpo. Alguns têm interpretado literalmente esta afirmação simbólica de Jesus, aparentemente esquecendo que Ele, muitas vezes, falou em sentido figurado em relação a Si mesmo. Por exemplo, disse: “Eu sou a porta” (Jo.10:7) e “o caminho” (Jo.14:6). Mas é lógico que Ele não estava Se transformando assim numa porta ou num caminho. Que Jesus falou em sentido figurado sobre o “pão” se torna evidente em Lc.22:20 (cf. 1Co.11:25): “Este cálice é a nova aliança no Meu sangue.” Se o pão se tornasse em Seu próprio corpo, pelo mesmo processo o “cálice” deveria, literalmente, ter se tornado na “nova aliança”. O verbo “é” na frase “isto é o Meu corpo” é usado no sentido de “representar” (como em Mc.4:15-18; Lc.12:1; Cl.4:24).

Mt.26:27 27. A seguir, tomou um cálice e, tendo dado graças, o deu aos discípulos, dizendo: Bebei dele todos

Um cálice. Refere-se ao cálice usado na celebração do serviço pascal. O copo continha o puro suco de uva (ver DTN, 653), intocado pela fermentação e, provavelmente, diluído com água de acordo com o costume judaico contemporâneo. Não se conhece o método utilizado nos tempos antigos para preservar o suco de uva em um estado não fermentado da vindima, cerca de seis meses antes da época da Páscoa. Em certas regiões do Oriente, hoje isso é feito mediante a desidratação parcial do suco de uvas frescas, preservando-o em um estado semigelatinoso. A adição de certa quantidade de água o restaura ao estado original. O suco de uva também pode ser feito a partir de uvas passas.

Tendo dado graças. Ver com. do v. Mt.26:26.

Bebei dele todos. Nenhum deles devia deixar de tomar do cálice.

Mt.26:28 28. porque isto é o meu sangue, o sangue da [nova] aliança, derramado em favor de muitos, para remissão de pecados.

Isto é o Meu sangue. Como o pão representava o corpo de Jesus, o vinho representava Seu sangue (ver com. do v. Mt.26:26).

Aliança. O sangue que Jesus derramou no Calvário validou a “nova aliança” ou “testamento” assim como o sangue de bois ratificava a antiga aliança (Ex.24:5-8; Hb.9:15-23; Gl.3:15). Sem a morte vicária de Cristo, o plano de salvação nunca teria se tornado uma realidade. Mesmo os que foram salvos no tempo do Antigo Testamento o foram salvos em virtude do sacrifício então por vir (Hb.9:15). Eles foram salvos ao olhar pela fé para o que estava ainda no futuro, assim como as pessoas encontram a salvação hoje, olhando para a morte de Cristo no passado (sobre a natureza da “nova aliança”, ver com. de Hb.8:8-11).

Derramado. A natureza vicária da morte expiatória de Cristo é claramente confirmada (cf. Is.53:4-6; Is.53:8; Is.53:10-12). Lucas diz: “derramado em favor de vós” (Lc.22:20), isto é, derramado “por nossa salvação” (comparar com Mt.20:28).

Remissão. Do gr. aphesis, “libertar”, “perdoar”, do verbo aphiemi, “mandar embora”, “despedir”, “perdoar” (ver com. de Mt.6:12). A palavra é usada nos papiros para “libertar” os cativos e para a remissão de dívida ou punição. Aqui é preferível o significado de “perdão” (ver Jo.3:16; Jo.20:28; Mt.20:28).

Mt.26:29 29. E digo-vos que, desta hora em diante, não beberei deste fruto da videira, até aquele dia em que o hei de beber, novo, convosco no reino de meu Pai.

Não beberei. A expressão “desta hora em diante” implica que Jesus bebeu do cálice nessa ocasião. Como os discípulos deveriam beber do cálice “em memória” de Jesus “até que Ele venha” (1Co.11:25-26), Ele mesmo iria se abster até “beber novamente” com eles no reino de Seu Pai.

Até aquele dia. Pode ser que Jesus aqui esteja Se referindo à “ceia das bodas do Cordeiro” (Ap.19:9). À medida que a última Ceia se relacionava estreitamente com o grande evento que possibilitou o plano da salvação, do mesmo modo, a ceia das bodas do Cordeiro comemorará o triunfo desse plano.

Novo. Isto não se refere ao vinho novo em contraste com o vinho fermentado, mas ao fato de que tudo no reino será “novo” (cf. Ap.21:5).

No reino de Meu Pai. Beber do cálice da comunhão significava anunciar “a morte do Senhor até que Ele venha” (1Co.11:26). É uma promessa da parte de Deus que o reino finalmente se tornará uma realidade e, de nossa parte, devemos ter fé na promessa de que será assim. A ordenança da Ceia do Senhor liga a primeira vinda à segunda. O serviço de comunhão foi designado para manter viva na mente dos discípulos a esperança na secunda vinda de Cristo, bem como a memória de Sua morte vicária (ver 1Co.11:25-26; cf. DTN, 659).

Mt.26:30 30. E, tendo cantado um hino, saíram para o monte das Oliveiras.

Cantado um hino. Os Sl.115-118 eram geralmente cantados no fim da ceia pascal. No cenáculo e a caminho do Getsêmani, Jesus deu diversos conselhos aos discípulos (ver Jo.14-17).

Monte das Oliveiras. Assim chamado por causa dos olivais plantados nas suas encostas. Josefo se refere a ele por este nome. Monte das Oliveiras é o nome geralmente aplicado à parte ocidental de uma elevação montanhosa em frente ao vale de Cedrom, a leste de Jerusalém. O cume norte do monte das Oliveiras atinge uma altura de 830 m, cerca de 90 m mais alto do que o templo na cidade (ver com. de Mt.21:1; Mt.24:1). Pensa-se que antes de Tito destruir todas as árvores nos arredores de Jerusalém, o monte das Oliveiras era coberto de olivais, pomares de figo, murta e outros arbustos. Betânia, 3,2 km a leste da cidade, estava situada na encosta sudeste da montanha (ver ilustração, p. 550).

Mt.26:31 31. Então, Jesus lhes disse: Esta noite, todos vós vos escandalizareis comigo; porque está escrito: Ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho ficarão dispersas.

Escandalizareis. [Pedro é avisado, Mt 26:31-35 = Mc.14:27-31; = Lc.22:31-38 = Jo.13:36-38. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 222]. Do gr. skandalizo (ver com. de Mt.5:29). Jesus pronunciou estas palavras de advertência quando Ele e os discípulos começaram a descida da cidade para o vale de Cedrom, a caminho do monte das Oliveiras (DTN, 672, 673). Mas a advertência em Jo.13:36-38 fora dada no cenáculo.

Esta noite. Isto ocorreu, provavelmente, uma hora ou mais antes da meia-noite, durante as primeiras horas de 14 de nisã (ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75).

Está escrito. Jesus cita Zc.13:7.

As ovelhas. Jesus aplica esta previsão à fuga dos discípulos, no momento de sua prisão (v. Mt.26:56).

Mt.26:32 32. Mas, depois da minha ressurreição, irei adiante de vós para a Galiléia.

Depois da Minha ressurreição. Diante da traição, condenação e morte, Jesus fala com clareza sobre a ressurreição. O compromisso feito aqui com os discípulos para encontrá-los novamente na Galileia seria para eles uma fonte de encorajamento durante as horas de amarga decepção imediatamente diante deles; porém eles devem ter se esquecido disso (ver com. do v. Mt.26:33).

Mt.26:33 33. Disse-lhe Pedro: Ainda que venhas a ser um tropeço para todos, nunca o serás para mim.

Pedro. Muitas vezes, ele fora o porta-voz dos discípulos (cf. Mt.14:28; Mt.16:16; Mt.16:22; Mt.17:4; Mt.17:24). Aqui, no entanto, parece que ele falou em seu próprio nome, como se sentindo superior aos demais. As palavras de Jesus em Mt.26:31-32, aparentemente, não haviam provocado nenhuma impressão sobre ele. Sua resposta impulsiva era característica (ver com. de Mc.3:16), mas irrefletida.

Mt.26:34 34. Replicou-lhe Jesus: Em verdade te digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, tu me negarás três vezes.

Em verdade. Ver com. de Mt.5:18.

Nesta mesma noite. Ver com. do v. Mt.26:31. A advertência, relatada em Jo.13:38, foi dada quando Jesus e os doze ainda estavam no cenáculo; aqui, é dada novamente a caminho do Getsêmani (DTN, 673). Tanto a previsão quanto a realização são registradas em todos os evangelhos.

Antes que o galo cante. Marcos diz: “antes que duas vezes cante o galo” (Mc.14:30). O “cantar do galo” era uma designação comum para o início da manhã. Por exemplo, a Mishnah explica que “qualquer pessoa que desejasse remover as cinzas do altar costumava levantar cedo e se banhar antes que o superintendente chegasse. Em que momento o superintendente deveria chegar? Ele nem sempre vinha na mesma hora. Às vezes, chegava ao cantar do galo; outras vezes, um pouco antes ou um pouco depois” (sobre a relação entre o cantar do galo e as vigílias da noite, ver p. 38).

Mt.26:35 35. Disse-lhe Pedro: Ainda que me seja necessário morrer contigo, de nenhum modo te negarei. E todos os discípulos disseram o mesmo.

Morrer contigo. Pedro tinha boas intenções, mas não sabia o que falava (ver Rt.1:16-17, sobre a lealdade de Rute para com Noemi e a maneira como ela viveu).

Disseram o mesmo. Quão pouco os discípulos sabiam das circunstâncias que em breve os levariam a abandonar Jesus e a fugir para salvar a vida (Mc.14:50).

Mt.26:36 36. Em seguida, foi Jesus com eles a um lugar chamado Getsêmani e disse a seus discípulos: Assentai-vos aqui, enquanto eu vou ali orar

Em seguida, foi Jesus. [Jesus no Getsêmani, Mt 26:36-46 = Mc.14:32-52 = Lc.22:39-46 = Jo.18:1. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 222; gráficos, p. 229, 230].

Getsêmani. Vem de uma palavra aramaica que significa “prensa de azeite”. O Salvador recorria, frequentemente, a esse lugar a fim de meditar, orar e repousar, e ali passou a noite muitas vezes (Lc.22:39; Jo.18:2; DTN, 685, 686). Parece provável que este tenha sido o seu lugar de retiro terça e quarta-feira nas duas noites que antecederam a crucifixão (ver Lc.21:37; ver com. de Mt.21:17; Mt.24:1; Mt.24:3; Mt.26:17-18). O local exato do jardim dos tempos bíblicos não é conhecido. Esse lugar tranquilo, provavelmente, situava-se na parte inferior da encosta do monte das Oliveiras (ver com. de Mt.21:1; Mt.26:30), saindo diretamente do templo e atravessando o vale de Cedrom, cerca de dez minutos a pé desde a cidade. O lugar comumente apontado aos visitantes atualmente repousa sobre uma tradição que não pode ser encontrada antes dos dias de Constantino, o Grande, três séculos depois de Cristo. Na opinião de muitos comentaristas e viajantes na Palestina, o Getsêmani original ficava em um local mais elevado na encosta (ver a ilustração, p. 550).

Assentai-vos aqui. Oito dos discípulos foram convidados a permanecer por perto, provavelmente do lado de dentro do portão do jardim.

Mt.26:37 37. e, levando consigo a Pedro e aos dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se.

Levando consigo. Pedro, Tiago e João tiveram o privilégio de desfrutar uma associação mais íntima com Jesus do que os demais discípulos. Eles estiveram com Ele na ressurreição da filha de Jairo (Lc.8:51) e, depois, no monte da transfiguração (Mt.17:1). Nesta hora extrema, Jesus ansiava por companhia humana, pela simpatia e compreensão de pessoas afins.

A entristecer-Se e a angustiar-Se. Ver com. do v. Mt.26:38.

Mt.26:38 38. Então, lhes disse: A minha alma está profundamente triste até à morte; ficai aqui e vigiai comigo.

Minha alma. O equivalente a uma expressão idiomática hebraica comum que significa “eu” (ver com. do Sl.16:10; Mt.10:28).

Profundamente triste. Não é possível compreender a tristeza profunda e a dor misteriosa que se abateu sobre Jesus quando Ele entrou no jardim do Getsêmani. Essa estranha tristeza confundiu os discípulos. Aqui era o Filho divino-humano de Deus, o Filho do Homem (ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10; Lc.1:35), sofrendo com uma intensidade que eles jamais haviam testemunhado antes. Em parte, o sofrimento era físico, mas isso era apenas o reflexo visível do sofrimento infinito de Cristo como o portador dos pecados do mundo (sobre o sofrimento do Salvador no Getsêmani e as tentações que suportou, ver DTN, 685-694; cf. com. de Mt.4:1-11; Lc.2:40; Lc.2:52; Hb.2:17; ver Ellen G. White, Material Suplementar sobre Mt.26:36-46, ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51).

Até à morte. Está além da compreensão humana a angústia do Salvador ao suportar o peso dos pecados do mundo (ver com. de Lc.22:43).

Vigiai comigo. Um apelo por solidariedade humana e companheirismo na luta com os poderes das trevas. “Vigiar” significa, literalmente, “ficar acordado”, mas aqui significa manter-se acordado para um propósito: compartilhar a vigília com Cristo.

Mt.26:39 39. Adiantando-se um pouco, prostrou-se sobre o seu rosto, orando e dizendo: Meu Pai, se possível, passe de mim este cálice! Todavia, não seja como eu quero, e sim como tu queres.

Adiantando-Se um pouco. Lucas acrescenta que a distância era cerca de um tiro de pedra (Lc.22:41). Ele estava dentro do campo de visão e de audição de Pedro, Tiago e João, que viram o anjo (Lc.22:43) e ouviram sua voz (DTN, 686, 694).

Orando. Sobre a vida de oração de Jesus, ver com. de Mc.1:35; Mc.3:13; Lc.6:12.

Pai. Ver com. de Mt.6:9.

Este cálice. O “cálice” é uma metáfora bíblica comum que denota as experiências de vida, boas ou más (ver com. de Mt.20:22).

Todavia. Apesar de todo o sofrimento e das ferozes tentações de Satanás que pressionavam Jesus, Ele Se submeteu sem dúvida ou hesitação à vontade do Pai. Sua total submissão à vontade de Deus é um exemplo perfeito.

Como Tu queres. Ver com. de Mt.6:10; Lc.2:49; Hb.5:8.

Mt.26:40 40. E, voltando para os discípulos, achou-os dormindo; e disse a Pedro: Então, nem uma hora pudestes vós vigiar comigo?

Voltando para os discípulos. Jesus desejava simpatia humana e companheirismo.

Dormindo. Por um tempo, eles permaneceram acordados e unidos em oração, mas, depois, um estupor paralisante caiu sobre eles. Eles poderiam ter resistido a isso se tivessem persistido em oração (ver com. de Mt.24:42; Mt.24:44).

Disse a Pedro. Ele tinha se gabado com orgulho desmedido, dizendo que acompanharia Jesus até a prisão e a morte (ver com. dos v. Mt.26:33; Mt.26:35). Naquele momento, ele não conseguia nem mesmo ficar acordado, muito menos cumprir sua difícil promessa.

Então. Do gr. houtos, “portanto” ou “então”. A profunda decepção de Jesus, ao ver Seus amigos terrenos mais próximos sonolentos demais para orar com Ele por “uma hora”, encontra expressão nesta exclamação, num misto de censura e de decepção.

Nem uma hora. Isto sugere que Cristo passou cerca de uma hora no jardim do Getsêmani.

Mt.26:41 41. Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca.

Vigiai e orai. Sobre a “vigilância” que o cristão deve manter, ver com. de Mt.24:42. Cristo havia Se preparado para enfrentar a tentação (ver T2, 200-215). Ele jejuou, envolveu-Se nas orações mais fervorosas e Se entregou totalmente a Deus (sobre a oração eficaz, ver com. de Mt.6:5-13; Lc.11:1-9; Lc.18:1-8).

Em tentação. Ver com. de Mt.6:13.

Espírito. Ou, as capacidades mais elevadas da mente (comparar com a experiência de Paulo, em Rm.7:15-8:6).

Está pronto. Do gr. prothumos, “disposto”, “inclinado a”, “preparado”. Antes, naquela mesma noite, eles tinham dado provas de sua disposição de espírito (ver v. Mt.26:33-35).

Carne. Ou, as tendências e desejos naturais estimulados pelos sentidos. Com a expressão “carne”, os escritores do NT em geral se referem à natureza pecaminosa, de apetites ou desejos (cf. Rm.8:3).

É fraca. Jesus não desculpa a “carne” por ser “fraca”, mas estabelece essa fraqueza como a razão para a necessidade de “vigiar e orar”. A relativa facilidade com que os discípulos adormeceram nessa hora de crise é a fraqueza à qual Cristo se refere aqui em particular (ver com. do v. Mt.26:40).

Mt.26:42 42. Tornando a retirar-se, orou de novo, dizendo: Meu Pai, se não é possível passar de mim este cálice sem que eu o beba, faça-se a tua vontade.

Se não é possível. A forma desta declaração no grego indica que a sugestão feita poderia ser cumprida ou não.

Mt.26:43 43. E, voltando, achou-os outra vez dormindo; porque os seus olhos estavam pesados.

Seus olhos estavam pesados. Como ocorreu no monte da transfiguração (Lc.9:32; ver DTN, 425).

Mt.26:44 44. Deixando-os novamente, foi orar pela terceira vez, repetindo as mesmas palavras.

Pela terceira vez. O momento da crise havia chegado, quando o destino da humanidade estava em jogo.

Mt.26:45 45. Então, voltou para os discípulos e lhes disse: Ainda dormis e repousais! Eis que é chegada a hora, e o Filho do Homem está sendo entregue nas mãos de pecadores.

Ainda dormis. Não está claro por que Jesus disse aos discípulos: “Dormi, agora, e descansai” (ARC); então, sem interrupção, lhes diz: “Levantai-vos, vamos!” (v. Mt.26:46). Alguns sugerem que isto era uma repreensão indireta por eles terem adormecido, uma observação irônica que implica que o tempo de vigiar e orar havia passado. No entanto, a ironia parece fora de lugar em uma ocasião como esta. Outros sugerem a tradução: “Vocês ainda estão dormindo e descansando?” (NTLH).

O Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Está sendo entregue. Literalmente, “entregar” (ver com. de Lc.6:16).

Nas mãos. Jó foi uma vez entregue a Satanás, com a condição de que sua vida fosse poupada (Jó.2:6). Jesus, porém, havia sido entregue a pessoas tão completamente sob o controle de demônios como os endemoniados a quem Ele havia restaurado a mente e o corpo (ver DTN, 256, 323; 746, 749).

Mt.26:46 46. Levantai-vos, vamos! Eis que o traidor se aproxima.

Vamos. Em vez de Se esconder ou escapar da multidão prestes a prendê-Lo, Jesus saiu ao encontro dela. Ele poderia ter evitado o local que Judas conhecia como Seu lugar habitual de retiro (Lc.22:39; Jo.18:2; ver com. de Mt.26:36; cf. DTN, 685, 716), ou poderia ter saído antes de os inimigos chegarem. Ele, porém, não Se afastou, mesmo quando ouviu passos se aproximando.

Mt.26:47 47. Falava ele ainda, e eis que chegou Judas, um dos doze, e, com ele, grande turba com espadas e porretes, vinda da parte dos principais sacerdotes e dos anciãos do povo.

Judas. [Jesus é preso, Mt 26:47-56 = Mc.14:43-50 = Lc.22:47-53 = Jo.18:2-11]. O traidor sabia onde encontrar Jesus (Jo.18:2). Acordos foram feitos para pegá-Lo “no retiro aonde [Jesus] costumava ir para orar e meditar” (DTN, 716). O Getsêmani era um lugar que Ele visitava frequentemente com essa finalidade, às vezes, passando a noite ali (ver DTN, 685, 686). A tarefa de Judas era levar os líderes a Jesus quando Ele estivesse na quietude e reclusão de um local tranquilo e identificá-Lo para os soldados (ver At.1:16).

Um dos doze. Este comentário adicional é, sem dúvida, para tornar ainda mais vívida a natureza hedionda da traição de Judas (ver com. dos v. Mt.26:21; Mt.26:23).

Grande turba. Entre a multidão heterogênea estava o próprio sumo sacerdote, acompanhado por vários líderes judeus (ver DTN, 695, 696), alguns dos fariseus (Jo.18:3), a polícia do templo, cujos oficiais eram judeus (Jo.18:12; cf. DTN, 696), e um destacamento de soldados romanos (ver DTN, 694, 695). Além disso, havia uma turba da ralé comum, alguns deles bandidos, sem dúvida, que foram junto a fim de acompanhar o momento com algazarra (ver DTN, 696).

Porretes. Ou, varapaus (TB).

Dos principais sacerdotes. Esta ação foi executada pela autoridade do Sinédrio que era composto dos “principais sacerdotes e escribas” e dos “anciãos” (cf. Mc.14:43). João registra que, quando os líderes da multidão se aproximaram de Jesus, um poder sobrenatural os levou a cair ao chão (Jo.18:6). O anjo que pouco antes havia erguido o Salvador quando Ele desfalecia em agonia (Lc.22:43) se interpôs visivelmente entre Cristo e eles (ver DTN, 694). O objetivo dessa manifestação de poder e glória era dar aos que queriam prender Jesus evidências de que a ação que estavam prestes a realizar era reprovada pelo Céu. Estavam lutando contra Deus (Lc.22:51; Jo.18:10).

Mt.26:48 48. Ora, o traidor lhes tinha dado este sinal: Aquele a quem eu beijar, é esse; prendei-o.

Este sinal. Do gr. semeion. Marcos usa sussemon, uma palavra comum no grego antigo para um sinal previamente combinado. À noite, e entre uma grande multidão, os judeus temiam prender a pessoa errada, e que Aquele a quem buscavam prender pudesse escapar. Talvez, também, temessem uma resistência.

Beijar. Um modo comum de saudação nos tempos antigos, como em algumas partes do mundo ainda hoje (ver Lc.7:45; At.20:37; 1Co.16:20; 1Ts.5:26; 1Pe.5:14). Era apropriado que o discípulo cumprimentasse o mestre desta forma (ver Pv.27:6).

Prendei-O. Isto indica que Judas não pretendia ajudar na captura de Jesus. Ele esperava cumprir sua parte no trato com o beijo identificador e, então, não seria considerado responsável pelo que pudesse acontecer em seguida. Alguns sugeriram o significado, “prenda-O com segurança”, isto é, sem feri-Lo.

Mt.26:49 49. E logo, aproximando-se de Jesus, lhe disse: Salve, Mestre! E o beijou.

Beijou. Do gr. kataphileo, uma forma intensiva de phileo, “beijar”, portanto, “beijar efusivamente”. O tempo do verbo denota ação continuada (comparar com a frase: “ele O beija repetidamente” (DTN, 696).

Mt.26:50 50. Jesus, porém, lhe disse: Amigo, para que vieste? Nisto, aproximando-se eles, deitaram as mãos em Jesus e o prenderam.

Amigo. Do gr. hetairos, “camarada”, “parceiro”, “companheiro”. Somente Mateus registra a resposta de Jesus. Hetairos era, por vezes, utilizado para abordar uma pessoa cujo nome era desconhecido. Jesus pode ter evitado o nome pessoal de Judas a fim de chamar a atenção para a amizade fingida do traidor.

Para que vieste? Ou, “por que estás aqui?” De acordo com Lucas, Jesus perguntou a Judas, “com um beijo trais o Filho do Homem?” (Lc.22:48).

Mt.26:51 51. E eis que um dos que estavam com Jesus, estendendo a mão, sacou da espada e, golpeando o servo do sumo sacerdote, cortou-lhe a orelha.

Um dos que estavam com Jesus. Ou seja, Pedro (Jo.18:10). Mateus, Marcos e Lucas não o mencionam pelo nome, provavelmente porque escreveram o episódio enquanto Pedro ainda vivia. Talvez o objetivo fosse poupá-lo do constrangimento de um lembrete direto dessa ação precipitada. João menciona o nome de Pedro ao escrever muitos anos depois de sua morte.

Sacou da espada. Pedro tinha erroneamente interpretado as palavras de Jesus sobre o uso de armas em legítima defesa (ver Lc.22:38). O zelo equivocado de Pedro aqui é um aviso para as testemunhas de Cristo a fim de não tomarem medidas drásticas e irrefletidas em promover o que, no momento, julgam ser os interesses do reino dos céus.

O servo. João, que conhecia pessoalmente o sumo sacerdote (ver Jo.18:15), identifica o servo como Malco (v. Mt.26:10). Malco pode ter sido um daqueles que “deitaram as mãos em Jesus” (Mt.26:50).

Cortou-lhe a orelha. Pedro provavelmente tinha a intenção de cortar a cabeça do homem, mas uma mão invisível teria desviado o golpe. Apenas Lucas registra a recuperação milagrosa da orelha decepada (ver com. de Lc.22:51).

Mt.26:52 52. Então, Jesus lhe disse: Embainha a tua espada; pois todos os que lançam mão da espada à espada perecerão.

Embainha a tua espada. Estas palavras de Jesus tornam muito claro que Sua afirmação anterior (ver Lc.22:36; Lc.22:38) não devia ser interpretada como aprovação ao uso da força em promover os interesses de Seu reino. Durante Seu julgamento, Jesus disse: “O Meu reino não é deste mundo; se o Meu reino fosse deste mundo, lutariam os Meus servos” (Jo.18:36, ARC). Somente quando os cristãos erroneamente acreditam que o reino de Cristo é deste mundo é que recorrem à força para defender o que consideram Seus interesses. O ato irrefletido de Pedro poderia facilmente ter sido interpretado pelos líderes judeus como prova de que Jesus e Seus discípulos eram um bando de revolucionários perigosos. Essa acusação atribuída a Ele poderia ser uma prova válida de que Sua morte era em favor do interesse público. Mas, o registro segue sem que nada seja dito sobre o lamentável incidente. Não fosse a cura da orelha, isso poderia ter sido de outra forma.

Os que lançam mão da espada. Aqueles que recorrem à força podem, mais cedo ou mais tarde, encontrar-se à mercê de homens cruéis e sem coração. Além disso, visto que o Céu não aprova o uso da força, os que professam ser servos de Deus não podem esperar proteção e assistência divina quando violam os princípios do Céu. O poder do evangelho é o poder do amor. Vitórias conquistadas pela força ou por outros métodos tortuosos são, na melhor das hipóteses, temporárias e, no resultado final, as perdas são maiores que os ganhos imediatos. A organização religiosa que tem recorrido ao uso da espada é declaradamente apóstata (ver com. de Dn.7:25; Ap.13:10).

Mt.26:53 53. Acaso, pensas que não posso rogar a meu Pai, e ele me mandaria neste momento mais de doze legiões de anjos?

Rogar a Meu Pai. Jesus contou com a certeza do amor do Pai e o conforto que Lhe trouxe um anjo do Céu (cf. Lc.22:43). Por Sua própria escolha, Jesus Se deixou prender. Ele não é impotente nem teria que passar por essa experiência amarga senão por ter voluntariamente escolhido fazê-Lo.

Doze legiões. Sobre a legião romana, ver com. de Mc.5:9.

Mt.26:54 54. Como, pois, se cumpririam as Escrituras, segundo as quais assim deve suceder?

As Escrituras. Jesus devia ter em mente textos como o Sl.22; Is.53, que prediziam Sua morte.

Mt.26:55 55. Naquele momento, disse Jesus às multidões: Saístes com espadas e porretes para prender-me, como a um salteador? Todos os dias, no templo, eu me assentava [convosco] ensinando, e não me prendestes.

Porretes. Ou, “varapaus” (TB).

Um salteador. Do gr. lestes, “ladrão”, “salteador”. A força de uma multidão como aquela não seria necessária para prender um simples “ladrão”. Lestes é traduzido como “ladrão” ou “ladrões” (em Jo.10:1; Jo.10:8; Jo.18:40 [salteador]; 2Co.11:26, NTLH). Os líderes judeus trataram Jesus como se Ele fosse um homem como Barrabás, um “endurecido criminoso” (ver DTN, 735).

Eu Me assentava convosco. Jesus mostra que Sua conduta nega a acusação implícita de que Ele era um malfeitor; e, portanto, Ele não devia, de forma alguma, ser preso por força e violência. Ele jamais agiu em segredo, mas à vista de todos (ver Jo.18:19-21). E não havia razão para acusá-Lo de conspirar secretamente contra as autoridades judaicas ou romanas.

E não Me prendestes. O fato de as autoridades não terem nenhuma tentativa de prender Jesus publicamente era uma evidência de que não havia motivo real para isso. A ordem de prisão secreta provou que eles não estavam agindo de boa fé e que sabiam que estavam errados.

Mt.26:56 56. Tudo isto, porém, aconteceu para que se cumprissem as Escrituras dos profetas. Então, os discípulos todos, deixando-o, fugiram.

As Escrituras. Como, por exemplo, o Sl.22; Is.53.

Deixando-O. Jesus pediu que os discípulos não fossem agredidos (Jo.18:8). Os sacerdotes e os líderes tinham sido obrigados por uma promessa a não prenderem os seguidores de Jesus (ver DTN, 741). Os discípulos ficaram com Jesus até que ficou claro que Ele não tinha intenção de Se livrar da turba. Se Jesus não resistisse, que esperança haveria para eles? Os discípulos não estavam dispostos a se submeter à experiência que Cristo estava prestes a encarar. Foi Pedro, o discípulo mais veemente em sua confissão de lealdade (Mt.26:33-35), que propôs aos outros que eles deviam salvar a si mesmos (ver DTN, 697).

Mt.26:57 57. E os que prenderam Jesus o levaram à casa de Caifás, o sumo sacerdote, onde se haviam reunido os escribas e os anciãos.

E [...] O levaram. Jesus perante o Sinédrio, Mt 26:57-68 = Mc.14:53-65 = Lc.22:63-71 = Jo.18:12-14; Jo.18:19-24. Comentário principal: Mt. Ver mapa, p. 222; gráfico, p, 230]. Jesus foi preso à meia-noite (ver DTN, 698, 699, 760). Seu julgamento consistiu de duas fases, sendo a primeira o julgamento eclesiástico perante as autoridades religiosas judaicas, e a segunda, o processo civil diante de Pilatos e Herodes. Ele teve duas audiências preliminares, uma diante de Anás sozinho e outra diante de Anás e Caifás (cf. DTN, 698, 703, 760), e foi indiciado duas vezes perante o Sinédrio, primeiramente à noite e, depois, de dia (cf. DTN, 703, 714, 760). Ele compareceu duas vezes diante de Pilatos (cf. DTN, 723, 760), e uma vez diante de Herodes, entre as duas audiências com Pilatos (cf. DTN, 728, 760). Cada uma dessas fases tinha uma finalidade específica no julgamento e na condenação de Jesus (ver Nota Adicional 2 a Mateus 26; Mt.26:75).

Caifás. Ver com. de Lc.3:2. Caifás deve ter atuado como sumo sacerdote de 18 a 36 d.C., tendo sido nomeado por Valério Gratus, antecessor de Pôncio Pilatos (ver cronologia de Lc.3:1-2; ver gráficos 3, 11, p. 225, 231).

Haviam reunido. Ou seja, para o julgamento de Jesus à noite, cerca de 3 horas da madrugada. Os membros do Sinédrio que eram simpáticos a Jesus, ou pelo menos interessados em Lhe dar um julgamento justo, deliberadamente não foram convidados (ver com. do v. Mt.26:66).

Os escribas e os anciãos. O Sinédrio era composto por membros desses dois grupos e dos sacerdotes. Todos os três são alistados na passagem paralela em Mc.14:53 (sobre os escribas, ver p. 43; ver com. de Mt.2:4; Mc.1:22).

Mt.26:58 58. Mas Pedro o seguia de longe até ao pátio do sumo sacerdote e, tendo entrado, assentou-se entre os serventuários, para ver o fim.

Pedro O seguia. Assim como João (ver Jo.18:15). Todos os discípulos abandonaram Jesus no momento em que ficou claro que Ele não resistiria à prisão (Mt.26:56). Mas esses dois homens recuperaram o ânimo, até certo ponto pelo menos, e seguiram a multidão até o palácio do sumo sacerdote. Os outros eram, aparentemente, menos ousados.

De longe. Ou, à distância. Pedro não tinha coragem para tomar uma posição aberta ao lado de Jesus, mas provou ser mais corajoso que a maioria de seus colegas.

Pátio. Do gr. aule, o “pátio” descoberto de uma casa ou um edifício. A palavra ocorre muitas vezes nos papiros com este sentido. Um pátio desse tipo era completamente rodeado pelo edifício ou por uma parede (ver com. do v. Mt.26:71).

Tendo entrado. A pedido de João, que era familiarizado com a família sacerdotal, Pedro recebeu permissão para entrar (ver Jo.18:16).

Assentou-se. Ele também permaneceu ali, a fim de se aquecer (Jo.18:25).

O fim. Pedro queria saber por si mesmo o que aconteceria durante o julgamento e qual seria o veredito.

Mt.26:59 59. Ora, os principais sacerdotes e todo o Sinédrio procuravam algum testemunho falso contra Jesus, a fim de o condenarem à morte.

Os principais sacerdotes. Provavelmente, o sumo sacerdote Caifás, juntamente com Anás, ex-sumo sacerdote e outros homens que haviam ocupado o cargo em um momento ou outro (ver com. de Lc.3:2; Mt.2:4).

Sinédrio. Ou seja, exceto os membros do conselho simpáticos a Jesus. Esses tinham sido deliberadamente excluídos do plano para capturar e condenar Jesus; e, por isso, não foram convocados nessa ocasião (ver com. do v. Mt.26:66). Este “conselho” era o Grande Sinédrio que normalmente consistia de 71 membros e que era, naquele momento, o órgão executivo, legislativo e judiciário mais elevado da nação (ver p. 54).

Procuravam. Ou, “estavam procurando”. O tempo do verbo grego sugere que os líderes tiveram considerável dificuldade para encontrar o tipo de testemunha que desejavam e que tiveram que procurar por algum tempo.

Algum testemunho falso. Durante dois anos, o Sinédrio tinha espiões seguindo a Jesus, a fim de que tudo o que Ele dissesse e fizesse pudesse ser testemunhado (ver DTN, 213, 699). Mas esses espiões não haviam retornado com informação útil para os propósitos dos líderes (sobre o relatório de um grupo enviado para prender Jesus, ver Jo.7:32; Jo.7:45-48). Havia aspectos ilegais no julgamento de Jesus, e os líderes judeus temiam não poder assegurar a condenação (ver Nota Adicional 2 a Mateus 26; Mt.26:75).

A fim de O condenarem à morte. Isto já havia sido determinado, embora eles não tivessem nenhuma acusação contra Jesus, independentemente do quanto não gostassem dEle; e, em sua precipitação, não tiveram tempo de inventar uma. Eles esperavam desacreditar Jesus aos olhos de Seus compatriotas, comprovando a acusação de blasfêmia e incriminando-O diante dos romanos sob a acusação de sedição (ver DTN, 699). Sem dúvida, eles esperavam resolver o caso imediatamente e entregar Jesus nas mãos dos romanos. Sob a lei romana, se fosse acusado de incitar rebelião, Ele não teria nenhuma chance de escapar, mesmo com a influência de Seus amigos. Os judeus contestaram Sua reivindicação de ser o Filho de Deus e pensavam que os romanos se oporiam a Ele como Rei dos judeus.

Mt.26:60 60. E não acharam, apesar de se terem apresentado muitas testemunhas falsas. Mas, afinal, compareceram duas, afirmando:

E não acharam. Eles foram incapazes de encontrar mesmo falsas testemunhas cujas histórias forjadas pudessem ter alguma semelhança. Procuravam evidências sobre a qual construiriam uma acusação. Mas seus esforços se provaram infrutíferos. De acordo com a Mishnah, todas as testemunhas deviam ser interrogadas a fim de testar a exatidão das declarações; e, quando as testemunhas se contradiziam, suas provas se tornavam inválidas. O depoimento dessas falsas testemunhas não se sustentava durante o interrogatório.

Compareceram duas. O depoimento destas testemunhas pareceu concordar; e, de acordo com a lei mosaica (Dt.17:6; Dt.19:15), presumia-se como verdade o que elas relataram. Os juízes, neste caso o Sinédrio, eram obrigados a empreender todos os esforços a fim de que a justiça fosse feita (Dt.25:1). Eles interrogavam diligentemente as testemunhas a fim de determinar se o que diziam era verdade ou não (Dt.19:16-19). Mas, aqui, a corte suprema de Israel foi conivente com as falsas testemunhas em seu perjúrio, em violação direta à lei de Moisés (ver Ex.23:1) e ao nono mandamento do decálogo (Ex.20:16). Mesmo essas duas últimas testemunhas, na verdade, discordaram (Mc.14:59) em pontos essenciais, e o testemunho foi vago e contraditório. No entanto, o sumo sacerdote fingiu aceitar o depoimento (Mt.26:62), embora ele bem soubesse que Jesus não poderia ser condenado com base no mesmo. Sua conduta posterior revelou mais sobre isso (v. Mt.26:62-63).

Mt.26:61 61. Este disse: Posso destruir o santuário de Deus e reedificá-lo em três dias.

Este disse. Uma maneira desdenhosa de se referir a Jesus.

Destruir o santuário. As testemunhas deviam se referir a uma declaração feita durante a primeira parte do ministério de Jesus (ver Jo.2:19; Jo.2:21; Mt.24:2; Mc.13:1-2; At.6:14). Mas, somente tirando-a de seu contexto, a declaração poderia ser usada como uma afronta ao templo. Em sentido estrito e legal, no entanto, mesmo isso não tornaria Jesus digno de morte.

E reedificá-Io em três dias. Jesus Se referiu ao templo do corpo (cf. 1Co.3:16-17; 1Co.6:19-20) e, em particular, à Sua própria ressurreição (cf. Jo.2:19; Jo.2:21; sobre a expressão “três dias”, ver p. 246-248).

Mt.26:62 62. E, levantando-se o sumo sacerdote, perguntou a Jesus: Nada respondes ao que estes depõem contra ti?

Levantando-se o sumo sacerdote. Sabendo que não tinha provas contra Jesus, ele procurou com arrogância fingir que havia uma.

Mt.26:63 63. Jesus, porém, guardou silêncio. E o sumo sacerdote lhe disse: Eu te conjuro pelo Deus vivo que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus.

Guardou silêncio. Ou, “continuou em silêncio”. Jesus persistentemente Se recusava a falar. Essa característica fora profetizada havia mais de sete séculos (Is.53:7).

Eu Te conjuro. Caifás exigiu que Jesus respondesse, sob juramento, à pergunta que então Lhe fazia. Apesar do falso depoimento das testemunhas, o Sinédrio ainda não tinha uma prova contra Jesus. Caifás esperava que Jesus incriminasse a Si mesmo, isso também era ilegal. Um homem não podia ser condenado por seu próprio testemunho (ver Nota Adicional 2 a Mateus 26; Mt.26:75; ver com. do v. Mt.26:59).

Pelo Deus vivo. Caifás pretendia acusar Cristo diante do tribunal divino.

O Cristo. Isto é, o Messias (ver com. de Mt.1:1). Jesus tinha evitado afirmar diretamente ser o Messias, ou o Cristo, provavelmente, porque, na fantasia popular, o Messias levaria os judeus a uma revolta armada contra Roma. Jesus proibiu Seus discípulos de fazerem essa afirmação a respeito dEle (Mt.16:20). Esta não foi a primeira vez que fizeram esta pergunta a Jesus (Jo.10:24).

O Filho de Deus. Ver com. de Lc.1:35. Jesus comumente Se referia a Si mesmo como o “Filho do Homem” (ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10). A expressão “Filho do Deus Bendito” (Mc.14:61) é um circunlóquio comumente usado para evitar pronunciar o nome divino (ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51).

Mt.26:64 64. Respondeu-lhe Jesus: Tu o disseste; entretanto, eu vos declaro que, desde agora, vereis o Filho do Homem assentado à direita do Todo-Poderoso e vindo sobre as nuvens do céu.

Tu o disseste. Isto é equivalente a “sim”. Em Mc.14:62, Ele diz: “Eu sou.” Quando posto sob juramento, Jesus não Se recusou a testemunhar, na verdade, foi justamente nesse momento que Ele testemunhou. É evidente que a instrução de Mt.5:34 não se aplica aos juramentos judiciais. Aqui Jesus deu um exemplo de Sua instrução aos doze, registrada em Mt.10:32.

Entretanto. Do gr. plen, “além disso”, ou “mas”.

Vereis. Jesus aponta para o futuro, quando, como Juiz do universo, Ele aparecerá para “retribuir a cada um segundo as suas obras” (Ap.22:12; comparar com Ap.1:7).

O Filho do Homem. Ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10. O sumo sacerdote tinha usado a expressão “Filho de Deus”, mas, em Sua resposta, como de costume, Jesus Se referiu a Si mesmo como o “Filho do Homem”.

A direita. Posteriormente, escritores do NT, muitas vezes, falaram que Jesus está à destra de Deus (At.2:33; At.7:55; Ef.1:20; Cl.3:1; Hb.1:3; Hb.8:1; Hb.10:12; Hb.12:2; 1Pe.3:22; ver com. do Sl.16:8; Lc.1:11).

Todo-Poderoso. Aqui usado como uma substituição para o nome sagrado Yahweh (ver vol. 1, p. 149, 150).

Mt.26:65 65. Então, o sumo sacerdote rasgou as suas vestes, dizendo: Blasfemou! Que necessidade mais temos de testemunhas? Eis que ouvistes agora a blasfêmia!

Rasgou as suas vestes. Isto é, como um sinal de indignação à suposta blasfêmia de Jesus (ver v. Mt.26:64). A lei mosaica proibia ao sumo sacerdote rasgar suas vestes (Lv.10:6; Lv.21:10) porque elas representavam o caráter perfeito de Jesus Cristo (DTN, 709). Caifás, assim, condenou a si mesmo diante da própria lei que defendia e se desqualificou para servir como sumo sacerdote (DTN, 708). Contudo, os regulamentos rabínicos permitiam rasgar as vestes em caso de ouvir uma blasfêmia.

Blasfemou! Ver com. de Mc.2:7. Os judeus consideravam blasfêmia um homem se igualar a Deus (Jo.10:29-33), e Caifás se recusou a reconhecer que Jesus de Nazaré era diferente de qualquer outro homem. Se Ele fosse apenas um homem, teria sido blasfêmia declarar o que está relatado em Mt.26:64. Jesus tinha afirmado, sob juramento, ser o Messias, e tinha concordado com o título “Filho de Deus” (v. Mt.26:63-64). O Sinédrio sabia havia dois anos que Jesus havia feito essa afirmação no sentido mais elevado da palavra (ver DTN, 207, 208; Jo.5:17-18; Mt.10:29-36).

Mt.26:66 66. Que vos parece? Responderam eles: É réu de morte.

Que vos parece? Caifás, então, colocou a decisão de voto diante dos membros do Sinédrio presentes. Ele pediu um veredito aos juízes sentados no mais alto tribunal da nação.

É réu de morte. A morte era a sentença mosaica para a blasfêmia (Lv.24:15-16), mas Jesus não tinha blasfemado de fato, ou de acordo com a definição rabínica aceita (ver com. de Mt.26:65). O voto era ilegal, pois fora tomado à noite (ver Nota Adicional 2 a Mateus 26; Mt.26:75). Apesar do voto, o veredito não poderia ser legitimado, a menos e até que fosse ratificado pelos romanos (ver DTN, 698). De acordo com Mc.14:64, “todos o julgaram réu de morte”. Ou seja, todos os que estavam presentes. Nicodemos, José de Arimateia e outros conhecidos por serem favoráveis a Jesus, ou, pelo menos, por serem conscienciosos em seu desejo de que a justiça em relação a Ele fosse feita, não tinham sido convocados (ver DTN, 699). Lc.23:51 afirma que José não consentia com a execução de Jesus. Nicodemos tinha, em ocasiões anteriores, impedido a condenação dEIe (Jo.7:50-51; cf. DTN, 539, 699). Para os líderes, homens como José e Nicodemos eram tendenciosos em favor de Cristo; porém, eles próprios se esqueceram de que estavam sendo tendenciosos contra Cristo.

Mt.26:67 67. Então, uns cuspiram-lhe no rosto e lhe davam murros, e outros o esbofeteavam, dizendo:

Cuspiram-Lhe no rosto. Isto havia sido predito pelo profeta Isaías (ver Is.50:6). Marcos e Lucas acrescentam que Jesus estava com os olhos vendados (Mc.14:65; Lc.22:64). As indignidades mencionadas em Mt.26:67-68 ocorreram após o encerramento do julgamento noturno, em uma sala da guarda (ver DTN, 710), junto à câmara em que o Sinédrio se encontrara, e onde Jesus fora detido para o julgamento formal durante o dia (ver com. do v. Mt.26:57).

Mt.26:68 68. Profetiza-nos, ó Cristo, quem é que te bateu!

O Cristo. Este título foi usado para ridicularizar a resposta que Jesus dera à conjuração solene do sumo sacerdote (v. Mt.26:63-64).

Mt.26:69 69. Ora, estava Pedro assentado fora no pátio; e, aproximando-se uma criada, lhe disse: Também tu estavas com Jesus, o galileu.

Estava Pedro assentado fora. [Pedro nega a Jesus, Mt 26:69-75 = Mc.14:66-72 = Lc.22:55-62 = Jo.18:15-18; Jo.18:25-27]. Sobre a entrada de Pedro no pátio, ver com. do v. Mt.26:58. Ele estava assentado no pátio, em frente ao prédio em que o julgamento era realizado. O pátio estava em um nível inferior ao do piso da sala do conselho (ver Mc.14:66).

No pátio. Ou, o “pátio” do palácio (ver com. do v. Mt.26:58). Pedro estava se aquecendo diante de um fogo aceso no pátio (ver Mc.14:67; Lc.22:55; Jo.18:18; Jo.18:25).

Uma criada. Era a mulher que atendeu à porta e deixara Pedro entrar (Jo.18:16-17; DTN, 710, 711).

Mt.26:70 70. Ele, porém, o negou diante de todos, dizendo: Não sei o que dizes.

Ele, porém, O negou. Pedro devia ter se esquecido da advertência dada por Jesus, poucas horas antes (ver com. dos v. Mt.26:31-35). Ele esperava não ser reconhecido e até mesmo se uniu à multidão em suas brincadeiras grosseiras a respeito de Jesus (ver DTN, 712). Esta foi a primeira negação de Pedro. O registro indica que as três negações foram feitas durante o primeiro julgamento perante o Sinédrio, que teve lugar entre 3 e 5 horas da madrugada. Nesta época do ano, na latitude de Jerusalém, a primeira luz da aurora era visível por volta das 4 horas da manhã, e por volta das 5h30 nascia o sol.

Não sei. Os evangelistas concordam com a ideia de que Pedro respondeu à pergunta de diferentes formas (Mc.14:68; Lc.22:57; Jo.18:17; ver Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17).

Mt.26:71 71. E, saindo para o alpendre, foi ele visto por outra criada, a qual disse aos que ali estavam: Este também estava com Jesus, o Nazareno.

O alpendre. Do gr. pulon, “portão”, ou, “varanda”. Possivelmente, pulon, aqui, seja referente à passagem que levava do pátio à rua, portanto, seria um espaço dentro do portão. É bem provável que Pedro teve medo de ser levado para dentro em custódia, caso sua identidade fosse descoberta.

Outra criada. A segunda pessoa a identificar Pedro.

Mt.26:72 72. E ele negou outra vez, com juramento: Não conheço tal homem.

Negou outra vez, com juramento. A segunda negação foi mais enfática.

Mt.26:73 73. Logo depois, aproximando-se os que ali estavam, disseram a Pedro: Verdadeiramente, és também um deles, porque o teu modo de falar o denuncia.

Logo depois. De acordo com Lc.22:59, decorreu cerca de uma hora entre as duas primeiras negações e a terceira. Aproximando-se os que ali estavam. João identifica a terceira pessoa a acusar Pedro como uma serva do sumo sacerdote, parente de Malco, cuja orelha Pedro linha cortado (Jo.18:26). Pedro imediatamente percebeu a gravidade da situação. Se ele fosse identificado como o homem que tinha ferido Malco, estava em perigo de ser levado ao tribunal por tentativa de assassinato.

Teu modo de falar. O sotaque galileu ou a pronúncia de Pedro (ver Mc.14:70). O sotaque galileu era mais amplo e rude do que o da Judeia. Diz-se que a pronúncia galileia das guturais não era tão suave como a dos habitantes da Judeia.

Denuncia. O grego diz, literalmente, “torna evidente”.

Mt.26:74 74. Então, começou ele a praguejar e a jurar: Não conheço esse homem! E imediatamente cantou o galo.

A praguejar. Esta foi uma violação direta do princípio do discurso puro e simples de Jesus no Sermão do Monte (ver com. de Mt.5:33-37). O juramento falso de Pedro não dava garantia de veracidade a suas palavras. Jesus tinha advertido exatamente acerca disso. No momento, Pedro não era melhor do que as falsas testemunhas que depuseram contra Jesus.

Mt.26:75 75. Então, Pedro se lembrou da palavra que Jesus lhe dissera: Antes que o galo cante, tu me negarás três vezes. E, saindo dali, chorou amargamente.

Pedro se lembrou. Era óbvio que Pedro havia esquecido todas as repetidas advertências de Jesus, proferidas pela primeira vez no cenáculo e novamente a caminho do Getsêmani (ver com. do v. Mt.26:34). A raiz de seu erro estava em sua própria autoconfiança e vanglória (v. Mt.26:35). Então, tarde demais, ele se lembrou. Inconscientemente, ele havia cumprido as palavras de Jesus. Muitas vezes, humildade e disposição para atender a um bom conselho são a melhor proteção contra grandes erros e tolices.

E, saindo dali. Ou, fora do pátio onde ele havia entrado cerca de duas ou três horas antes. De acordo com Lc.22:61, Jesus olhou na direção de Pedro antes de ele sair apressadamente. Depois de perambular sem rumo por um momento, Pedro se encontrou no Getsêmani, no mesmo local onde o Mestre havia Se prostrado em agonia havia pouco tempo (ver DTN, 713).

Chorou amargamente. Ou, “irrompeu em lágrimas”. Se Pedro tivesse acatado com seriedade a admoestação de Jesus para “vigiar e orar” (v. Mt.26:41), como então derramava lágrimas por suas palavras traiçoeiras, ele nunca as teria proferido. Mas, embora parecesse a Pedro que tudo estava perdido, incluindo a si mesmo, o amor do Salvador o ergueu e o resgatou de forma segura através de sua trágica experiência. Nenhuma hora é tão escura, nenhuma mágoa ou derrota tão amarga que a luz do amor de Jesus não possa fortalecer e salvar o perdido (ver DTN, 382).

NOTA ADICIONAL 1 A MATEUS 26

Os quatro evangelhos concordam que Jesus e os discípulos celebraram a última Ceia na noite anterior à crucifixão, que Ele descansou no túmulo durante o sábado e que ressuscitou no domingo de manhã. Os sinóticos, no entanto, chamam a última Ceia, na noite anterior à crucifixão, de “Páscoa”, enquanto, de acordo com João, os judeus celebraram a ceia da Páscoa na noite após a crucifixão. As declarações de João e dos sinóticos, portanto, parecem estar em conflito. A maioria dos comentaristas críticos descarta esse aparente conflito com a observação casual de que, obviamente, João ou os escritores sinóticos estavam enganados. Mas os que acreditam na inspiração das Escrituras rejeitam tal explicação e propõem, em vez disso, soluções possíveis para o problema. A fim de avaliar de forma inteligente essas soluções é necessário, primeiramente, revisar a data referente ao tempo e ao significado típico da Páscoa, e os fatores de tempo relacionados com a última Ceia e a crucifixão. O tempo da Páscoa – O cordeiro pascal era morto no final da tarde de 14 de nisã, após o sacrifício regular da tarde, e comido com pães asmos, depois do pôr do sol, naquela mesma noite, durante as primeiras horas de 15 de nisã (Ex.12:6-14; Ex.12:29; Ex.12:33; Ex.12:42; Ex.12:51; Ex.13:3-7; Nm.9:1-5; Nm.33:3; Dt.16:1-7).

O dia 15 de nisã, um sábado cerimonial, também marcava o início da Festa dos Pães Asmos (Ex.12:8; Ex.12:18; Ex.12:34; Ex.12:39; Lv.23:5-6; Nm.28:16-17; Dt.16:3-4; Dt.16:8). Em 16 de nisã, o segundo dia dessa festa, o molho das primícias era apresentado no templo (ver Lv.23:10-14). O termo “Páscoa” era originalmente aplicado somente a 14 de nisã, mas, no tempo de Cristo, era empregado, às vezes, para a besta dos Pães Asmos também. Aparentemente, também a Festa dos Pães Asmos era um termo que igualmente incluía a Páscoa (Lc.22:7; At.12:3-4; Mt.20:6). As tabelas que se propõem a dar as datas da era cristã para cada lua cheia pascal durante o ministério do Senhor não são de grande ajuda nesse problema, pois todas elas estão baseadas em métodos modernos judaicos de cálculo do tempo da Páscoa. Hoje não se sabe como os judeus do tempo de Cristo coordenavam seu calendário lunar com o ano solar. Por isso, não é possível determinar com certeza absoluta o dia da semana ou até mesmo o mês em que a Páscoa de qualquer ano do ministério do Senhor pode ter ocorrido (sobre esse problema, ver vol. 2, p. 84-89; vol. 5, p. 248-266). Um notável desvio da data bíblica em relação ao tempo da última Ceia é a teoria da crucifixão na quarta-feira, que pressupõe: (1) que a data da era cristã da lua cheia pascal do ano da crucifixão pode ser determinada com precisão absoluta (ver p. 257); (2) que a expressão idiomática hebraica “três dias e três noites” indica um período de 72 horas completas (ver vol. 1, p. 160; vol. 2, p. 119-121; vol. 5, p. 246-249); e (3) que o grego de Mt.28:1 (ver com. ali) fixa a ressurreição no sábado à tarde.

Essa teoria não se baseia em conhecimentos sólidos e está totalmente em desacordo com os significados bíblicos dos termos; por isso, é insustentável. Alguns supõem que a expressão “no crepúsculo da tarde”, de Ex.12:6, literalmente, “entre o pôr do sol e o anoitecer”, denota o momento do pôr do sol, marcando o início de 14 de nisã ou o período entre o crepúsculo e o anoitecer. Embora alguns comentaristas modernos tenham adotado essa teoria, um exame cuidadoso de outras passagens bíblicas, dos escritos de Flávio Josefo e Filo, e da Mishnah, não fornece nenhuma evidência clara em favor dessa teoria (ver p. 266, 267). O significado típico da Páscoa – O cordeiro pascal prefigurava Cristo, “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo.1:29); “Cristo, nossa Páscoa, foi sacrificado por nós” (1Co.5:7, ARC). Da mesma forma, o molho da Festa dos Pães Asmos tipificava “Cristo” ressuscitado “dentre os mortos, [...] as primícias dos que dormem” (1Co.15:20). A última Ceia e a crucifixão – As seguintes declarações cronológicas parecem estar explícitas ou implícitas na narrativa do evangelho e são geralmente bem aceitas pelos estudiosos da Bíblia: 1. A crucifixão ocorreu na “véspera da Páscoa”, isto é, em 14 de nisã (Jo.19:14; Ex.12:6; cf. GC, 399). 2. A morte de Cristo ocorreu na sexta à tarde (Mc.15:42-16:2; Lc.23:54-24:1; Jo.19:31; Jo.19:42; Jo.20:1), na hora do sacrifício da tarde (DTN, 756, 757; cf. GC, 399). 3. Portanto, no ano da crucifixão, 14 de nisã, o dia designado para matar os cordeiros pascais, caiu em uma sexta-feira.

A preparação para a (ou véspera da) Páscoa coincidiu com a preparação (ou véspera) do sábado semanal (Jo.19:14; Jo.19:31; Jo.19:42; Mt.20:1). O primeiro sábado cerimonial da Festa dos Pães Asmos, 15 de nisã, coincidiu assim com o sábado semanal (Lv.23:6-8; Mc.15:42-16:2; Lc.23:5-24:1). 4. A última Ceia ocorreu na noite anterior à crucifixão (Mt.26:17; Mt.26:20; Mt.26:26; Mt.26:34; Mt.26:47; Mc.14:12; Mc.14:16-17; Mc.22:7-8; Mc.22:13-15; Jo.13:2; Jo.13:4; Jo.13:30; Jo.14:31; Jo.18:1-3; Jo.18:28Jo.19:16; cf. DTN, 642; CC, 399). Isto é, durante as primeiras horas de 14 de nisã (ver vol. 2, p. 85), portanto, numa noite de quinta-feira. 5. Os relatos sinóticos chamam a última Ceia de ceia pascal (Mt.26:17; Mt.26:20; Mc.14:12; Mc.14:16-17; Lc.22:7-8; Lc.22:13-15; cf. DTN, 642, 652; GC, 399). 6. O relato de João coloca a celebração oficial judaica da ceia pascal 24 horas depois da última Ceia, portanto, na sexta-feira à noite após a crucifixão, durante as primeiras horas do sábado semanal (Jo.18:28; Jo.19:14; Jo.19:31; cf. DTN, 774), que seria 15 de nisã. 7. Na hora da última Ceia (Jo.13:1), durante o percurso do julgamento (Mt.26:5; Mc.14:2; Jo.18:28; Jo.19:14; cf. DTN, 703, 723), e no caminho para o Calvário (cf. DTN, 742), a celebração oficial da Páscoa estava, aparentemente, ainda no futuro. 8. Jesus descansou no túmulo no sábado (Mt.27:59-28:1; Mc.15:43-16:1; Lc.23:54-24:1; Jo.19:38-20:1), que seria 15 de nisã. 9. Jesus levantou do túmulo na madrugada de domingo, 16 de nisã (Mt.28:1-6; Mc.16:1-6; Lc.24:1-6; Jo.20:1-16; ver com. de Mc.15:42; Mc.15:46; cf. GC, 399; DTN, 785, 786).

Proposta de soluções do problema – A luz desses dados, deve-se examinar o problema do tempo da Páscoa no ano da crucifixão. Os comentaristas conservadores têm geralmente tentado resolver o problema com base em um dos quatro pressupostos que se seguem: 1. Quando se referem à última Ceia, os evangelhos sinóticos descrevem não a refeição da Páscoa, mas uma refeição cerimonial que a precedeu em 24 horas. De acordo com esse pressuposto, 14 de nisã cairia na sexta-feira, no ano da crucifixão, e a Páscoa de João seria a ceia oficial da Páscoa. 2. “A Páscoa , à qual João se refere, não era a ceia da Páscoa, mas uma refeição cerimonial ligada à Festa dos Pães Asmos. De acordo com esse pressuposto, sexta-feira foi 15 de nisã, e a última Ceia, na noite anterior, foi uma celebração da ceia oficial da Páscoa, na época regular. Esta explicação é contrária à precedente. 3. A última Ceia foi uma verdadeira ceia pascal, como relatam os sinóticos, embora celebrada apenas por Jesus e os discípulos, 24 horas antes da refeição oficial da Páscoa a que se refere João, quando todos os judeus a celebraram. De acordo com esse pressuposto, sexta-feira foi 14 de nisã. 4. No tempo de Cristo, as diferenças sectárias em relação ao computo do calendário, quanto à possibilidade de 14 e 16 de nisã estarem relacionados a certos dias da semana, haviam levado, na prática, à celebração da Páscoa em dois dias consecutivos, que seria uma dupla comemoração.

Segundo esse pressuposto, uma facção religiosa (os fariseus e outros conservadores) considerava que 14 de nisã caía na quinta-feira, no ano da crucifixão, enquanto outros (os saduceus, betusianos e outros liberais), que caía na sexta-feira. Cristo e os discípulos, portanto, presumivelmente, celebraram a Páscoa com o primeiro grupo, a “Páscoa” dos sinóticos; e os líderes judeus celebraram na noite seguinte, a “Páscoa” de João. Esta hipótese difere da anterior no sentido de que, aqui, Cristo e os discípulos não estavam sozinhos em sua celebração da Páscoa. Para uma discussão mais detalhada das várias tentativas de harmonizar as declarações de João com os sinóticos com relação à data da última Ceia, é proveitoso consultar: Grace Amadon, “Ancient Jewish Calendation”, Journal of Biblical Literature, vol. 61, parte 4, 1942, p. 227-280; C. K. Barrett, The Gospel According to St. John, p. 38-41; J. H. Bernard, International Critical Commentary, on St. John, vol. 1, p. cvi-cviii; D. Chwolson, Das Letzte Passamahl Christi und der Tag Seines Todes; The International Standard Bible Encyclopedia, art. “Chronology of the New Testament”; J. K. Klausner, Jesus of Nazareth, tr. Herbert Danby, p. 326-329; A. T. Robertson, Word. Pictures in the New Testament, sobre Mt.26:17; Jo.18:28; H. L. Strack e Paul Billerbeck, Kommentar zum Neuen Testament, vol. 2, p. 812, 813 (ver notas bibliográficas nas p. 69, 70, 88, 89, 266, 267). Para uma discussão dos problemas de calendário envolvidos, ver p. 246-266.

Avaliação das soluções propostas – As quatro soluções propostas para o problema podem ser avaliadas como se segue: 1. O ponto de vista de que a última Ceia foi uma refeição cerimonial preliminar antes da refeição regular da Páscoa assume que os sinóticos usaram a palavra “Páscoa” em um sentido fora do regular. Embora seja possível admitir que a palavra “Páscoa” poderia ter sido usada nesse sentido (ver p. 574, 575), a evidência disponível é fortemente contrária a um uso irregular da palavra. (1) Este ponto de vista repousa sobre a conjectura de que uma refeição cerimonial preliminar poderia ter sido celebrada no tempo de Cristo. (2) A leitura mais natural e óbvia dessas passagens em seu contexto (ver referências alistadas na p. 575, item 5) aponta para a conclusão de que os sinóticos consistente e repetidamente falam da última Ceia como a “Páscoa”. (3) O comentário de Mc.14:12 e Lc.22:7 de que o dia anterior à última Ceia foi “o primeiro dia da Festa dos Pães Asmos, quando se fazia o sacrifício do cordeiro pascal” (ver Mc.14:12), parece excluir qualquer possibilidade de que a “Páscoa” do sinóticos pode ter sido apenas uma ceia preliminar, e não a verdadeira ceia pascal (cf. DTN, 642, 646, 652, 653; PE, 165; GC, 399).

Os discípulos pareciam ter como certo que a quinta-feira era o dia da preparação para a Páscoa, isto é, o dia em que o cordeiro pascal deveria ser morto e assado (ver p. 574, 575). 2. O ponto de vista de que “a Páscoa” de Jo.18:28; Jo.19:14 foi uma refeição cerimonial ligada à Festa dos Pães Asmos, 24 horas após a ceia pascal oficial, em 15 de nisã, assume que João usou a palavra “Páscoa” num sentido fora do regular. Em favor desta ideia, pode-se observar que o uso comum no tempo do NT, que se reflete, por exemplo, em Josefo (ver p. 574), comumente aplicava o termo “Páscoa” à celebração conjunta da Páscoa e da Festa dos Pães Asmos. Mas, embora seja possível afirmar que João poderia ter usado a palavra “Páscoa” no sentido fora do regular (ver p. 574), a evidência disponível é fortemente contrária a que ele tenha feito isso nas passagens citadas: (1) Não há nenhum uso claro da palavra “Páscoa”, nesse sentido, em qualquer lugar do NT. (2) A leitura mais natural e óbvia das declarações de João em seus contextos leva à conclusão de que a Páscoa a que o apóstolo se refere era a celebração oficial da Páscoa, pelo menos, conforme os líderes judeus a reconheciam de modo geral. (3) A ansiedade dos líderes judeus para concluir o julgamento e a execução de Jesus imediatamente antes da festa, a fim de não postergar o caso para depois dela, parece excluir qualquer possibilidade de que a celebração já houvesse começado (Mt.26:3-5; Mc.14:1-2; cf. DTN, 703). (4) A lei judaica, conforme codificada, mais tarde, na Mishnah e no Talmude, proibia o julgamento de um caso envolvendo a pena de morte em um dia de festa, ou fazer compras, como a do lençol e, possivelmente, também de especiarias para embalsamar o corpo de Jesus (Mc.15:46; Lc.23:56; entretanto, ver Mishnah, Shabbath, 23.5, ed. Soncino, Talmude, p. 771).

Caso essas normas estivessem em vigor em épocas anteriores, como parece provável, e se de fato fosse dada a devida atenção a elas, o que, no entanto, não pode ser determinado aqui (ver Nota Adicional 2 a Mateus 26; Mt.26:75), a violação delas parece excluir a possibilidade de que a prisão, o julgamento e a crucifixão tenham ocorrido em 15 de nisã, o primeiro dia da Festa dos Pães Asmos e um sábado cerimonial. (5) Os preparativos para embalsamar o corpo de Jesus (Lc.23:54-24:1), como as mulheres fizeram no dia da crucifixão, eram considerados trabalho e, como tal, parecia ser impróprio até mesmo para um sábado cerimonial (Lv.23:7; entretanto, ver Mishnah, Shabbath, 23.5, ed. Soncino, Talmude, p. 771). (6) Ao pôr do sol do dia da crucifixão, as mulheres, “no sábado, descansaram, segundo o mandamento” (Lc.23:56), obviamente, uma referência ao sábado do quarto mandamento. (7) Se, como este ponto de vista assume, a crucifixão caiu em 15 de nisã, que seria o primeiro dia dos Pães Asmos, então, a ressurreição caiu em 17 de nisã, ou no terceiro dia. Mas a oferta das primícias, um tipo da ressurreição do Senhor, aconteceu no segundo dia, ou 16 de nisã (ver Lv.23:10-14; 1Co.15:20; 1Co.15:23; GC, 399; DTN, 785, 786).

Portanto, de acordo com essa ideia, a ressurreição não ocorreu no momento exigido para o tipo de cerimonial do molho das primícias. (8) Na literatura judaica, “a preparação da Páscoa” (Jo.19:14, ARC) é consistentemente aplicada a 14 de nisã e, portanto, jamais a 15 de nisã, como requer este ponto de vista (ver Mishnah, Pesahim, 4.1, 5, 6, ed. Soncino, Talmude, p. 243, 268, 271). (9) “A Páscoa era observada (pelos judeus em geral) como tinha sido havia séculos [em outras palavras, durante as primeiras horas de 15 de nisã (ver p. 574)], enquanto Aquele para quem ela apontava tinha sido morto por mãos ímpias [na noite de 14 de nisã], e colocado no túmulo de José” (DTN, 774; cf. GC, 399). 3. O ponto de vista de que a última Ceia, como uma verdadeira ceia pascal, ocorreu 24 horas antes do momento em que os judeus, geralmente, a comemoravam assume que tal prática era possível. Essa ideia, contrária à anterior, considera que a crucifixão ocorreu em cumprimento do tipo fornecido pela morte do cordeiro pascal em 14 de nisã. Era, na verdade, impossível para Cristo comer o cordeiro pascal no horário habitual e ainda assim, sendo Ele mesmo o verdadeiro Cordeiro pascal, ser morto no momento em que habitualmente os cordeiros pascais eram sacrificados. Parece mais importante que Sua morte estivesse em sincronia com a morte dos cordeiros do que Sua ceia da Páscoa em sincronia com o tempo oficial para se comer essa refeição (p. 574, 575; GC, 399).

Assim, Sua ceia pascal deveria ocorrer mais cedo do que o tempo regularmente definido uma vez que os tipos do sacrifício do cordeiro e da oferta das primícias deviam se cumprir, “não somente quanto ao acontecimento, mas também quanto ao tempo” (GC, 399). No entanto, essa ideia também enfrenta dificuldades. É difícil assumir que Jesus e os discípulos, como únicas exceções à regra, poderiam ter celebrado a Páscoa um dia antes do tempo habitual. Deve-se considerar que: (1) Não há evidência histórica de que alguém tenha comido a ceia antes do início da Páscoa. Os cordeiros pascais deviam ser imolados no templo (Mishnah, Pesahim, 5.5-7, ed. Soncino, Talmude, p. 323, 324) em um determinado momento (ver p. 574); e, de forma consistente, tanto quanto o registro informa, não havia provisão para matá-los em qualquer outro momento senão no final da tarde de 14 de nisã (para uma exceção, ver Nm.9:6-11). (2) Os discípulos, aparentemente, reconheceram a quinta-feira como o dia em que os preparativos para a Páscoa deviam ser feitos corretamente, no ano de crucifixão (ver Mt.26:17; Lc.22:7), e pareciam ter certeza de que quinta-feira à noite era o tempo adequado para se comer a ceia pascal. De fato, não há informações quanto a se o assunto foi discutido entre eles, se Jesus lhes informou que o tempo de celebração seria uma exceção e que seria na quinta-feira ao invés de sexta à noite, nem ainda se eles consideravam que quinta-feira à noite era um tempo normal para a celebração. Os evangelhos sinóticos silenciam quanto a qualquer coisa fora do comum sobre a celebração da Páscoa na quinta-feira à noite por Jesus e os discípulos.

4. O ponto de vista de que havia uma dupla comemoração da Páscoa se baseia em uma ou outra das várias conjecturas. A que talvez seja mais plausível delas assume que a “Páscoa” mencionada pelos sinóticos era a celebrada pelos fariseus e outros judeus conservadores, enquanto que a “Páscoa” mencionada por João era a observada pelos saduceus e outros betusianos mais liberais e empáticos com uma interpretação mais liberal das Escrituras. Os saduceus betusianos dos dias de Cristo são conhecidos por argumentar que o “sábado” de Lv.23:11 é um sábado semanal e não um sábado cerimonial. Aqueles que defendem a hipótese de que, em um ano como 31 d.C., conforme assumem, o dia 16 de nisã teria caído no sábado semanal afirmam que os saduceus defenderiam o ajuste do calendário lunar judaico para que 16 de nisã, ao invés disso, caísse no primeiro dia da semana. Isso pode ter dado origem a uma dupla comemoração da Páscoa, mas não há evidências de que, na prática, tenha ocorrido assim. No entanto, ao se considerar a “Páscoa” dos sinóticos e de João, ambas como ocasiões válidas para a celebração da festa, esta teoria oferece uma solução possível para as declarações aparentemente contraditórias dos evangelhos.

Conclusões – Este é mais um exemplo em que a falta de informações sobre as práticas judaicas antigas parece ser a causa da incapacidade de harmonizar de forma definitiva as declarações aparentemente contraditórias de João e dos evangelhos sinóticos. No entanto, com base nas evidências disponíveis, mas sem aceitar qualquer uma dessas quatro explicações propostas, este Comentário sugere a possibilidade da seguinte sequência de eventos relacionados com a última Ceia, a crucifixão, e a Páscoa: 1. No ano da crucifixão, seja como resultado de controvérsias entre os elementos liberais e conservadores do judaísmo, ou devido a outras circunstâncias desconhecidas, pode ter havido uma dupla comemoração da Páscoa. 2. Cristo e os discípulos celebraram a última Ceia na quinta-feira à noite, junto com outros judeus conservadores, durante as primeiras horas do que foi oficialmente 14 de nisã, e a última Ceia foi uma verdadeira celebração da Páscoa. 3. Jesus morreu na cruz na hora do sacrifício da tarde e no momento em que os cordeiros pascais estavam sendo sacrificados, na sexta-feira, 14 de nisã. 4. No ano da crucifixão, a celebração oficial da Páscoa ocorreu na sexta-feira à noite, depois da crucifixão. 5. Jesus descansou na tumba durante o sábado semanal, que, naquele ano, coincidiu com o sábado cerimonial ou anual, em 15 de nisã, o primeiro dia da Festa dos Pães Asmos.

6. Jesus ressuscitou do sepulcro bem cedo, na manhã de domingo, 16 de nisã, o dia em que a oferta das primícias, que tipificava a ressurreição, foi apresentada no templo. Deve-se reconhecer ainda que não é imperativo resolver esse problema a fim de que possamos nos valer da salvação por intermédio de “Cristo, nossa páscoa”, que foi “sacrificado por nós” (1Co.5:7, ARC).

NOTA ADICIONAL 2 A MATEUS 26

Os líderes da nação já haviam tomado uma decisão quanto ao que fazer com Jesus. Tudo o que faltava era uma evidência plausível para justificar a ação deles. Estavam totalmente determinados a condená-Lo à morte, mas não sabiam como fazer isso e ainda manter a aparência de legalidade. Quando o Sinédrio se reuniu, os líderes judeus estavam em estado de tensão mental, com medo de que seu plano maligno pudesse falhar. Eles temiam: (1) que as pessoas, que cada vez mais tomavam o lado de Jesus em oposição a eles (ver Jo.12:19), pudessem tentar resgatá-Lo; (2) que o atraso na resolução do caso, particularmente o adiamento do julgamento para depois da época da Páscoa, pudesse levar a uma reação do público em favor de Cristo à qual não poderiam resistir; (3) que alguns dentre eles mesmos pudessem falar em Sua defesa, como em ocasiões anteriores (ver com. de Mt.26:66) e exigir justiça; (4) que, apesar de todos os esforços, eles pudessem falhar em seu propósito de condenar Jesus; (5) que Caifás não fosse capaz de levar o caso até o fim; (6) que pudesse haver alguma tentativa de examinar a natureza dos milagres de Jesus, praticados no sábado; (7) que Jesus pudesse excitar os preconceitos conflitantes dos fariseus e saduceus e, assim, dividir o Conselho, como Paulo o fez em uma ocasião posterior (At.23:6-10), tornando impossível a continuidade do caso; (8) que Jesus revelasse fatos desagradáveis sobre a vida pessoal deles e também sobre os dispositivos ilegais usados no processo contra Ele.

A medida que o julgamento avançava, Jesus também lhes deu motivos para um temor mortal do grande dia do juízo final (ver DTN, 698-708). Dois passos fundamentais eram necessários a fim de condenar e executar Jesus: (1) o julgamento religioso perante o Sinédrio (ver com. do v. Mt.26:57), de modo que a acusação contra Ele parecesse justificada com base na lei judaica; e (2) o processo civil diante de Pilatos (ver com. do v. Mt.26:57), a fim de garantir a aprovação romana para executar a sentença de morte. A acusação contra Jesus, proferida diante do Sinédrio, com base na qual Ele foi condenado à morte, era de blasfêmia, especificamente Sua reivindicação de ser o Filho de Deus. A acusação proferida contra Ele perante as autoridades romanas era de sedição e insurreição. Houve, ao todo, sete etapas no julgamento (ver DTN, 760), sendo quatro delas perante as autoridades religiosas e três diante das autoridades civis. O objetivo, a natureza e o resultado de cada uma dessas sete audiências e dos julgamentos foram os seguintes: 1. Audiência preliminar diante de Anás. Ver com. de Jo.18:13-24; cf. DTN, 698-703. Anás (ver com. de Lc.3:2) tinha sido sumo sacerdote entre 7 e 14 d.C. Ele era honrado e respeitado como o estadista mais velho da nação; “buscava-se e cumpria-se seu conselho como a voz de Deus” (DTN, 698). Por causa da popularidade de Jesus, considerou-se necessário preservar a aparência de legalidade ao lidar com Ele.

O Sinédrio já tinha decidido eliminar Jesus (Jo.5:16; Jo.5:18; Jo.7:19; Jo.8:37; Jo.8:40; Jo.11:53; Mt.12:14; Mc.3:6; Jo.10:31; Jo.10:39). Mas, depois de dois anos de esforços para abrir um processo contra Ele (ver DTN, 213, 699), eles ainda não tinham sido capazes de formular um plano pelo qual lhes fosse possível alcançar tal propósito. Assim, eles consideraram conveniente que Anás interrogasse pessoalmente a Jesus, a fim de obter, se possível, as acusações que pudessem ser sustentadas contra Ele. Essa audiência preliminar ocorreu entre uma e duas horas da madrugada de sexta-feira. Anás falhou completamente e foi totalmente silenciado pela lógica incisiva das respostas de Jesus (Jo.18:23; DTN, 700). 2. Audiência preliminar diante de Anás e Caifás. Ver DTN, 703, 760. Tendo tomado Jesus sob custódia, Anás e Caifás convocaram um grupo cuidadosamente selecionado de membros do Sinédrio (ver com. do v. Mt.26:59) para uma sessão de emergência, na esperança de condenar Jesus antes que os simpatizantes dEle pudessem falar em Seu favor e antes que o peso da opinião pública pudesse ser exercido contra a decisão de eliminá-Lo.

De acordo com O Desejado de Todas as Nações (p. 703), Anás e Caifás fizeram uma segunda tentativa de extrair provas incriminatórias contra Jesus, que pudessem ser usadas no julgamento, enquanto os membros selecionados do Sinédrio estavam reunidos, mas não obtiveram êxito. Como sumo sacerdote, Caifás era presidente ex-officio do Sinédrio e, por isso, devia presidir o julgamento, mas a sua relativa falta de experiência (ver DTN, 698) despertou temores de que ele não fosse capaz de conduzir o caso satisfatoriamente rumo a uma decisão. Os evangelhos não mencionam essa segunda audiência informal preliminar ao primeiro julgamento perante o Sinédrio, que ocorreu por volta de 2 e 3 horas da madrugada (ver DTN, 703). 3. Julgamento noturno perante o Sinédrio. Ver com. de Mt.26:57-75; cf. DTN, 703-714. De acordo com a lei judaica, o tribunal devia julgar casos de pena capital durante o dia. A Mishnah diz: “Processos civis devem ser julgados durante o dia e encerrados à noite. Mas a pena capital deve ser julgada durante o dia e encerrada durante o dia” (Sanhedrin, 32.a [p. 200]). Os dirigentes temiam uma tentativa popular para resgatar Jesus se Ele permanecesse em sua própria custódia. Lembravam-se também de que as tentativas anteriores de eliminar Jesus tinham sido contrariadas por alguns membros influentes do Sinédrio (ver com. do v. Mt.26:66).

Então, eles decidiram resolver o caso e colocar Jesus sob a custódia dos romanos antes que alguém pudesse ter qualquer oportunidade de falar em Sua defesa. Esse julgamento ocorreu por volta de 3 e 4 horas da madrugada. Nessa época do ano, o amanhecer ocorria por volta das 4 horas na latitude de Jerusalém, e o sol nascia às 5h30 da manhã. Esse julgamento resultou em um veredito unânime de morte (ver com. do v. Mt.26:66), mas o veredito devia ser confirmado à luz do dia, para que fosse legal. 4. Julgamento diurno perante o Sinédrio. Ver com. de Lc.22:66-71; cf. DTN, 714, 715. A lei judaica proibia a realização de julgamentos noturnos nos casos de pena capital, e nenhuma sentença de morte poderia, sob quaisquer circunstâncias, ser emitida à noite. Portanto, a decisão unânime do Sinédrio, tomada durante a noite, devia ser reafirmada durante o dia a fim de preservar a aparência de legalidade. Foi isso o que o Sinédrio fez quando se reuniu logo depois do nascer do sol. Eles condenaram Jesus à morte e concordaram em entregá-Lo às autoridades romanas para a execução. 5. Primeiro julgamento diante de Pilatos. Ver com. de Lc.23:1-5; Jo.18:28-38; cf. DTN, 723-728. Pilatos fora despertado logo cedo, por volta das 6 horas, ou pouco depois.

Durante sua investigação, ele se familiarizou com os fatos e ficou con

Mt.27:1 1. Ao romper o dia, todos os principais sacerdotes e os anciãos do povo entraram em conselho contra Jesus, para o matarem

Ao romper o dia. [Jesus é entregue a Pilatos, Mt.27:1-2 = Mc.15:1 = Lc.23:1-2 = Jo. 18:23-32. Comentário principal: Lc e Jo]. Mateus e Marcos relatam, de modo mais completo, a noite do Julgamento perante o Sinédrio, porém mencionam o julgamento do dia apenas brevemente. Como é evidente a partir do relato de Lucas sobre o julgamento durante o dia, os procedimentos foram praticamente os mesmos do julgamento da noite, no que diz respeito aos pontos essenciais.

Mt.27:2 2. e, amarrando-o, levaram-no e o entregaram ao governador Pilatos.

Amarrando-O. Jesus tinha sido preso no jardim pelos oficiais e fora obrigado a comparecer diante de Anás (Jo.18:12-13; Jo.18:24). Parece que, em algum momento durante o julgamento perante o Sinédrio, Suas mãos tinham sido desamarradas.

Levaram-No. De acordo com Josefo (Guerra dos Judeus, v.4.2 [143, 144]), a edificação onde o Sinédrio se reunia ficava no quadrante sudoeste do templo (ver mapa, p. 222). Daí, Jesus foi conduzido ao pretório romano, residência oficial de Pilatos. Alguns a identificaram com a torre Antônia, ao norte da área do templo; outros, com o antigo palácio de Herodes, meio quilômetro a oeste do templo. Sabe-se que os governadores romanos posteriores residiam nesse lugar, quando estavam em Jerusalém (Josefo, Guerra dos judeus, ii. 14.8; 15.5 [301, 328]).

E O entregaram. Aparentemente, todo o Sinédrio acompanhou Jesus ao palácio (Mc.15:1; Lc.23:1).

Governador. Do gr. hegemon, mais precisamente traduzido como “procurador”. Uma hegemon era uma ordem equestre romana nomeada por César e que respondia diretamente a ele. A residência oficial do procurador romano, ou “governador”, ficava em Cesareia. No entanto, especialmente nos dias das grandes festas judaicas, quando havia milhares de peregrinos em Jerusalém, era costume do “governador” deslocar-se temporariamente para Jerusalém, a fim de protegê-la de qualquer desordem. Havia sempre a possibilidade de uma revolta popular contra Roma, e uma ocasião como a Páscoa era a oportunidade ideal para os judeus suscitarem uma insurreição. Esperava-se de Pilatos a confirmação da sentença de morte e execução de Jesus (ver DTN, 723).

Pilatos. Ver com. de Lc.3:1.

Mt.27:3 3. Então, Judas, o que o traiu, vendo que Jesus fora condenado, tocado de remorso, devolveu as trinta moedas de prata aos principais sacerdotes e aos anciãos, dizendo:

Então, Judas. [O suicídio de Judas, Mt.27:3-10. Ver gráfico 9, p. 230]. Judas apareceu para fazer sua confissão quando o julgamento oficial, ou durante o dia, perante o Sinédrio, se aproximava do fim, provavelmente na hora em que o veredito foi proferido. Judas via que Jesus estava prestes a ser condenado, ou tinha ouvido a sentença ser proferida.

Condenado. Ver com. de Mt.26:66.

Tocado de remorso. Do gr. metamelomai, literalmente, “se arrependeu depois”. Paulo usa metamelomai para descrever a tristeza que sentiu depois de enviar uma forte censura à igreja de Corinto (2Co.7:8). O arrependimento de Judas era como o de Esaú, um remorso não acompanhado de uma mudança de mente. No caso de Judas, o remorso o levou ao suicídio. Não houve nenhuma mudança básica de caráter.

Trinta moedas. Ver com. de Mt.26:15.

Mt.27:4 4. Pequei, traindo sangue inocente. Eles, porém, responderam: Que nos importa? Isso é contigo.

Pequei. Judas tinha certeza de que Jesus Se livraria de Seus algozes (ver DTN, 721). A constatação de que Jesus não faria isso levou Judas à confissão. O traidor deu um passo à frente como a única testemunha a depor em favor da inocência de Jesus (ver Nota Adicional 2 a Mateus 26, Mt.26:75).

Que nos importa? O Sinédrio ignorou o novo depoimento introduzido forçosamente no julgamento pela confissão de Judas. Sua confissão deve ter envergonhado muito os líderes, cuja cumplicidade na conspiração se tornou então pública. Era evidente que haviam subornado Judas, e este ato era uma violação direta das leis de Moisés (ver Ex.23:8).

Mt.27:5 5. Então, Judas, atirando para o santuário as moedas de prata, retirou-se e foi enforcar-se.

Para o santuário. O Sinédrio não se reunia no templo, mas em um prédio próximo (ver com. do v. Mt.27:2).

Foi enforcar-se. Isto ele deve ter feito quase imediatamente, pois os que conduziram Jesus ao Calvário encontraram o corpo de Judas à beira da estrada quando saíram da cidade (ver DTN, 722; cf. At.1:18).

Mt.27:6 6. E os principais sacerdotes, tomando as moedas, disseram: Não é lícito deitá-las no cofre das ofertas, porque é preço de sangue.

Não é lícito. A restrição era provavelmente baseada em Dt.23:18.

Cofre. Do gr. korbanas, a transcrição de uma palavra aramaica que significa “presente” ou “dádiva”. Como utilizada aqui, korbanas deve designar o lugar onde as dádivas eram armazenadas.

É preço de sangue. Os sacerdotes se negaram a colocar as trinta moedas de prata de volta no tesouro do templo, mas estavam ansiosos para derramar o sangue inocente que tinham comprado com esse valor. Eles manifestaram um escrúpulo semelhante quando se recusaram a entrar na sala de julgamento de Pilatos a fim de não se contaminarem e, assim, ficarem impedidos de comer a Páscoa (Jo.18:28).

Mt.27:7 7. E, tendo deliberado, compraram com elas o campo do oleiro, para cemitério de forasteiros.

Tendo deliberado. Se neste momento ou mais tarde, não é indicado. Uma questão trivial como esta teria sido adiada para depois da Páscoa.

Campo do oleiro. Chamado de “Aceldama, isto é, Campo de Sangue” (At.1:19). O “campo do Oleiro” se tornou o nome de um local de sepultamento de indigentes e estrangeiros cuja localização não é conhecida.

Mt.27:8 8. Por isso, aquele campo tem sido chamado, até ao dia de hoje, Campo de Sangue.

Até o dia de hoje. Ou seja, quando Mateus escreveu seu evangelho.

Mt.27:9 9. Então, se cumpriu o que foi dito por intermédio do profeta Jeremias: Tomaram as trinta moedas de prata, preço em que foi estimado aquele a quem alguns dos filhos de Israel avaliaram

Então, se cumpriu. Sobre o sentido em que Mateus se refere às profecias do AT em cumprimento, ver com. de Mt.1:22.

Jeremias. Ou, o profeta Jeremias. A citação, no entanto, é principalmente de Zc.11:13, com possíveis alusões a Je.18:2-12; Je.19:1-15 e Je.32:6-9. Uma citação pode ser derivada de vários escritores do AT ainda que creditada só ao primeiro deles (ver com. de Mc.1:2).

Filhos de Israel. Literalmente, “[alguns] dos filhos de Israel”.

Mt.27:10 10. e as deram pelo campo do oleiro, assim como me ordenou o Senhor.

Como me ordenou. Isto é, “determinou”, ou “mandou fazer”.

Mt.27:11 11. Jesus estava em pé ante o governador; e este o interrogou, dizendo: És tu o rei dos judeus? Respondeu-lhe Jesus: Tu o dizes.

Jesus estava em pé. [Jesus perante Pilatos, Mt.27:11-26 = Mc.15:1-15 = Lc.23:1-5; Lc.23:13-25 = Jo.18:33-19:16. Comentário principal: Mt e Jo. Ver mapa, p. 222; gráficos 9, 11, p. 230, 231]. Mateus retoma a narrativa iniciada no v. Mt.27:2 (ver com. ali), depois de tê-la interrompido para contar o que Judas fez no final do julgamento, no dia anterior, diante do Sinédrio (ver com. do v. Mt.27:3). Os membros do Sinédrio se recusaram a entrar na sala de julgamento para não se contaminarem, o que os impediria de comer a Páscoa (Jo.18:28).

Governador. Ver com. do v. Mt.27:2.

És Tu [...]? O pronome “tu” no texto grego está com ênfase, o que implica que Pilatos não acreditava que uma pessoa como Jesus poderia ser um revolucionário perigoso, como os judeus indicaram em suas acusações (Lc.23:2; Lc.23:5; Lc.23:14). Lc.23:2 registra a tríplice acusação de Caifás contra Jesus: agitação sediciosa, proibição do pagamento de impostos e pretensão ao trono real. Apenas João dá um relato mais extenso do primeiro julgamento diante de Pilatos (Jo.18:28-38) e o pano de fundo para a questão aqui abruptamente indicada pelos sinóticos.

Tu o dizes. Isto é equivalente a “sim” (ver com. de Mt.26:64). Ao longo de todo o julgamento, diante dos judeus ou de Pilatos e Herodes, as únicas perguntas às quais Jesus respondeu foram as que envolviam Sua messianidade. Ele alegou ser tanto o Filho de Deus como o Rei dos judeus (Mt.26:63-64; Jo.18:33-36). A primeira afirmação foi considerada blasfêmia pelos judeus, e a segunda, um ato de traição pelos romanos.

Mt.27:12 12. E, sendo acusado pelos principais sacerdotes e pelos anciãos, nada respondeu.

Nada respondeu. Comparar com Mt.26:63.

Mt.27:13 13. Então, lhe perguntou Pilatos: Não ouves quantas acusações te fazem?

Não ouves [...]? Seria esperado que pessoas comuns protestassem em voz alta a sua inocência, fossem inocentes ou culpadas. Pilatos se maravilhou com o autocontrole de Jesus, pois, para ele, isso era tão inexplicável quanto admirável. A essa altura, Pilatos bem sabia que as acusações contra Jesus eram maliciosas (ver Mc.15:10). Não houve, portanto, necessidade de Jesus falar em Sua autodefesa.

Mt.27:14 14. Jesus não respondeu nem uma palavra, vindo com isto a admirar-se grandemente o governador.

Admirar-se grandemente. Ver com. do v. Mt.27:13.

Mt.27:15 15. Ora, por ocasião da festa, costumava o governador soltar ao povo um dos presos, conforme eles quisessem.

Governador. Do gr. hegemon (ver com. do v. Mt.27:2). João faz um relato mais completo e cronológico do segundo e último julgamento do que os sinóticos. Sem dúvida, o relato de João deve ser inserido entre os v. Mt.27:23 e Mt.27:27 de Mateus 27, antes do clímax do julgamento conforme registrado nos v. Mt.27:24-26.

Soltar. A anistia para os presos políticos em tempo de festival era uma prática de origem pagã (ver DTN, 733). Era uma demonstração da política conciliatória de Roma para com o povo das províncias subjugadas, a fim de ganhar a simpatia do povo.

Mt.27:16 16. Naquela ocasião, tinham eles um preso muito conhecido, chamado Barrabás.

Muito conhecido. Do gr. episemos, “marcado”, “ilustre” ou “notório”. Aqui parece tratar-se do último significado. Barrabás era provavelmente o líder, ou um dos líderes de um motim que ocorrera havia pouco tempo em Jerusalém. Registros históricos contemporâneos indicam que motins e insurreições eram comuns na Judeia e na Galileia.

Barrabás. Evidências textuais (cf. p. 136) apoiam a variante “Jesus Barrabás” (NTLH). Pilatos ofereceu ao povo a escolha entre um pretenso salvador político (ver DTN, 733), que prometeu livramento da tirania de Roma, e o Salvador do mundo, que viera para salvar as pessoas da tirania do pecado. Eles preferiram submissão à liderança de Barrabás em vez de aceitar a liderança de Cristo.

Mt.27:17 17. Estando, pois, o povo reunido, perguntou-lhes Pilatos: A quem quereis que eu vos solte, a Barrabás ou a Jesus, chamado Cristo?

Chamado Cristo. Os membros do Sinédrio já tinham acusado Jesus diante de Pilatos como aquele que dizia ser “Cristo, o Rei” (Lc.23:2). O título grego “Cristo” é o equivalente de “Messias”, transliterado do hebraico (ver com. de Mt.1:1). Para os judeus do tempo de Cristo, o Messias da profecia era concebido como um líder militar destinado a libertar a nação da escravidão de Roma. Pilatos, sem dúvida, entendia bem o significado do título “Messias”, ou “Cristo”. A proposta de libertar Jesus dava a entender que, para fins de negociação, Pilatos reconhecia Jesus como um prisioneiro, culpado das acusações feitas contra Ele, que, como tal, era elegível para a anistia com base no costume.

Mt.27:18 18. Porque sabia que, por inveja, o tinham entregado.

Por inveja. Pilatos já havia presumido os motivos maliciosos do Sinédrio e pode ter proposto a escolha entre Cristo e Barrabás com a intenção deliberada de provar, tanto para o público quanto para sua própria satisfação, a insinceridade já detectada nos líderes. Os judeus haviam acusado a Cristo de ser rebelde contra Roma, mas eles quiseram a libertação de Barrabás que era abertamente culpado de rebelião.

Mt.27:19 19. E, estando ele no tribunal, sua mulher mandou dizer-lhe: Não te envolvas com esse justo; porque hoje, em sonho, muito sofri por seu respeito.

Sua mulher mandou dizer-lhe. A carta da esposa de Pilatos, a quem a tradição nomeou como “Claudia Procla”, chegou logo a Pilatos, entregue por um mensageiro (ver DTN, 732, 733). Pilatos já estava convencido da inocência de Jesus, o que foi reforçado pela advertência da esposa, provida por uma iluminação sobrenatural.

Em sonho. Comparar com os sonhos dados a Nabucodonosor (ver com. de Dn.2:1) e aos sábios que foram ver Jesus (ver com. de Mt.2:1).

Mt.27:20 20. Mas os principais sacerdotes e os anciãos persuadiram o povo a que pedisse Barrabás e fizesse morrer Jesus.

Persuadiram o povo. Os esforços dos líderes para influenciar a decisão da multidão irrefletida constituíram prova absoluta da falsidade das acusações contra Jesus. Grande parte do apoio popular a Jesus vinha da Galileia e da Pereia, onde Ele havia ministrado havia pouco tempo. Os peregrinos dessas regiões provavelmente dormiam fora da cidade e ainda não tinham entrado, naquela hora da manhã. Os líderes temiam uma tentativa de libertar Jesus por parte desses peregrinos (ver com. de Mt.26:59). Esses líderes astutos, evidentemente, propuseram que o assunto fosse resolvido antes de isso ocorrer. A multidão de Jerusalém, que Josefo descreve como turbulenta, estava totalmente sob o controle dos líderes religiosos. Pilatos antecipou que alguns dos amigos de Jesus falariam em nome dEle. Aparentemente, ele não sabia que a multidão diante do tribunal era composta, principalmente, se não totalmente, de homens hostis ou pelo menos indiferentes em relação a Jesus. Por essa razão, o ardil de Pilatos falhou, sem dúvida, para sua grande surpresa e desgosto.

Mt.27:21 21. De novo, perguntou-lhes o governador: Qual dos dois quereis que eu vos solte? Responderam eles: Barrabás!

Perguntou-lhes. Os líderes pediram a libertação de um homem culpado do próprio crime (ser um falso messias) de que eles acusavam Jesus (ver com. do v. Mt.27:16), e ordenaram a condenação do verdadeiro Messias! Em outras palavras, se Jesus fosse realmente o verdadeiro messias político a quem esperavam e se Ele se proclamasse rei dos judeus, levando a nação em revolta contra Roma, sem dúvida, eles teriam se unido a Ele!

Mt.27:22 22. Replicou-lhes Pilatos: Que farei, então, de Jesus, chamado Cristo? Seja crucificado! Responderam todos.

Que farei [...]? Pilatos não teve a coragem moral de dar o veredito que ele sabia ser o certo. Como ele, muitos procuram maneiras diversas de evitar o problema (ver com. do v. Mt.27:24). Porém, cedo ou tarde, eles deverão tomar a decisão final a favor ou contra Cristo.

Mt.27:23 23. Que mal fez ele? Perguntou Pilatos. Porém cada vez clamavam mais: Seja crucificado!

Que mal fez Ele? Pilatos, representando o poder de Roma imperial, estava discutindo a questão com a turba de Jerusalém! Não só isso, ele estava perdendo a discussão. Na verdade, eles não poderiam responder à sua pergunta, pois a única resposta válida seria que Jesus nada tinha feito de errado. Mas o que lhes faltava em lógica sobrava no clamor irracional.

Clamavam mais. Como uma matilha de lobos uivando atrás da presa, a turba de Jerusalém, literalmente, “continuava a clamar ainda mais alto”. Deve-se notar que os incidentes registrados em Jo.19:1-16 adequadamente se encaixam na narrativa neste ponto (ver DTN, 736, 737). Esses incidentes consistem de novas tentativas por parte de Pilatos para libertar Jesus.

Mt.27:24 24. Vendo Pilatos que nada conseguia, antes, pelo contrário, aumentava o tumulto, mandando vir água, lavou as mãos perante o povo, dizendo: Estou inocente do sangue deste [justo]; fique o caso convosco!

O tumulto. A multidão foi rapidamente ficando fora de controle, e um motim estava em formação, pelo qual Pilatos teria de prestar contas a seus superiores em Roma (cf. At.19:40). Pilatos começou a perceber que cada tentativa para obter o consentimento do povo e seus líderes a fim de libertar Jesus servia apenas para aumentar a fúria irracional deles.

Lavou as mãos. Pilatos usou de uma estratégia que o levou à sua ação final (Jo.19:12-16). Ele declarou repetidamente a inocência de Cristo e se esforçou, dentro das possibilidades, para libertar Jesus. E, se isso não fosse possível, ele desejava se eximir da responsabilidade de pronunciar a sentença (Jo.18:38). Primeiramente, ele tentou convencer os judeus a resolver o caso entre si mesmos, dentro dos limites da lei (Jo.18:31). Depois, ele mandou Jesus para Herodes (Lc.23:7) e tentou libertá-Lo através do indulto da Páscoa (Jo.18:39). Por fim, mandou açoitar Jesus, na esperança de despertar compaixão por Ele e, então, salvá-Lo da pena de morte (Lc.23:22). Comparado com outros povos antigos, os romanos eram conhecidos por seu senso de justiça no trato com os acusados, uma atitude que Pilatos, sem dúvida, compartilhava.

O imperador Tibério é conhecido pelo trato severo com as autoridades romanas que maltratavam qualquer de seus súditos. Pilatos já tinha incorrido no desagrado imperial por causa do tratamento insensível e brutal aos judeus, e foi pelo mesmo motivo, em parte, que ele foi deposto, cinco anos depois e, em seguida, cometeu suicídio (DTN, 738; cf. Josefo, Antiguidades, xviii.3.2; 4.1, 2). Pilatos hesitava em desagradar os judeus, mas se ele ordenasse a execução de Jesus, sabendo que era inocente, também podia ser chamado a prestar contas ao imperador. A lavagem simbólica das mãos como prova de inocência era bem conhecida entre os judeus, e, em certos casos, era prevista na lei (ver Dt.21:6-7; cf. Sl.26:6; Sl.73:13). Contudo, por mais que Pilatos pudesse tentar fugir à responsabilidade pela morte de Jesus, sua culpa permaneceu.

Mt.27:25 25. E o povo todo respondeu: Caia sobre nós o seu sangue e sobre nossos filhos!

Caia sobre nós o Seu sangue. Os judeus aceitaram avidamente a responsabilidade pela morte de Jesus, pois eles quase pareciam se orgulhar de suas ações. Mais tarde, os apóstolos acusaram os líderes da nação do assassinato de Cristo (At.2:23; At.3:14-15; At.7:52). Por sua vez, esses líderes, esquecendo-se da aceitação anterior da responsabilidade, ressentiram-se da acusação (At.5:28).

E sobre nossos filhos. Deus não pune os filhos pelos pecados dos pais; no entanto, os resultados das decisões e ações erradas têm seu efeito natural em gerações posteriores (ver Ex.20:5; ver com. de Ez.18:2). No cerco de Jerusalém, em 70 d.C., uma geração depois da crucifixão (ver com. de Mt.24:15-20), os judeus sofreram o resultado inevitável da decisão tomada no dia em que quebraram a aliança (ver DTN, 739) com a declaração: “Não temos rei, senão César” (Jo.19:15). Como um povo, eles têm sofrido por quase 19 séculos desde então.

Mt.27:26 26. Então, Pilatos lhes soltou Barrabás; e, após haver açoitado a Jesus, entregou-o para ser crucificado.

Açoitado a Jesus. Nos v. 26 a 31, como em outras passagens (ver p. 178-180), Mateus se afasta da estrita ordem cronológica. O propósito dele é completar a parte de Pilatos, na narrativa, antes de falar dos soldados (v. 26; cf. v. Mt.27:31). A zombaria (v. Mt.27:27-31) realmente precedeu a flagelação e a liberação para a crucifixão (v. 26, Mt.27:31). Houve duas flagelações. O propósito da primeira era obter a aprovação da multidão para libertar Jesus (Lc.23:16; Lc.23:20; Lc.23:22; Jo.19:1; DTN, 734, 735); a segunda seria uma punição preliminar à crucifixão (Mt.27:26; Mc.15:15; DTN, 738, 742). Josefo (Guerra, dos judeus, ii.14.9 [306]) afirma que Florus, o governador romano da Judeia, açoitou certos habitantes de Jerusalém antes de sua execução (sobre a flagelação administrada pelos judeus, ver com. de Mt.10:17).

Entregou-O. Pilatos atendeu ao pedido para crucificar Jesus; e, por isso, devia cumprir a sentença conforme a lei (ver Lc.23:24). Ao fazê-lo, ele cedeu cada gota de justiça e misericórdia aos líderes sedentos de sangue e àqueles que os seguiam.

Mt.27:27 27. Logo a seguir, os soldados do governador, levando Jesus para o pretório, reuniram em torno dele toda a coorte.

Os soldados. [Jesus entregue aos soldados, Mt 27:27-31 = Mc.15:16-20 = Jo.19:2-3]. Ou, os soldados romanos, pois isso ocorreu sob a jurisdição imediata de Pilatos. A segunda corte italiana ficava, então, na Palestina.

O pretório. Do gr. praitorion (Mc.15:16; ver com. de Mt.27:2). A referência pode ser ao próprio edifício ou ao tribunal adjacente.

Mt.27:28 28. Despojando-o das vestes, cobriram-no com um manto escarlate

Despojando-O. Do gr. ekduo. As evidências textuais (cf. p. 136) se dividem entre esta e a variante de enduo, “vestido”.

Escarlate. Do gr. kokkine, um corante feito a partir dos corpos dissecados de moluscos. Mc.15:17 traz “púrpura”, do gr. porphura. Seriam alguns tons do antigo escarlate e roxo misturados entre si de forma quase imperceptível, de modo que seria fácil para dois observadores usarem os dois termos para descrever a mesma cor. Esse “manto” pode ter sido a capa de um soldado, possivelmente um modelo de vestuário anteriormente usado por Pilatos. Ele foi lançado sobre os ombros de Cristo como uma imitação zombeteira de um manto de púrpura real.

Mt.27:29 29. tecendo uma coroa de espinhos, puseram-lha na cabeça e, na mão direita, um caniço; e, ajoelhando-se diante dele, o escarneciam, dizendo: Salve, rei dos judeus!

Uma coroa. Do gr. stephanos, em geral, uma “coroa de vitória”. Uma stephanos geralmente consistia de uma guirlanda de folhas ou flores, como um possível prêmio aos vencedores em competições atléticas e na guerra. Mal sabiam os algozes de Jesus quão apropriado foi dar-Lhe uma coroa de vitória; pois, neste caso, Aquele que a usava, por Sua morte, triunfou sobre os “principados e as potestades” (Cl.2:15) e conquistou a maior vitória do tempo e da eternidade.

Espinhos. Possivelmente um arbusto com ramos flexíveis e numerosos espinhos afiados, comumente encontrado nas regiões mais quentes da Palestina e conhecido tecnicamente como Zizyphus spina Christi.

Um caniço. Era a imitação de um cetro real.

Ajoelhando-se. Para prestar uma lealdade simulada.

Rei dos judeus. Uma alusão à acusação sob a qual Jesus foi condenado e executado (ver com. dos v. Mt.27:11; Mt.27:37).

Mt.27:30 30. E, cuspindo nele, tomaram o caniço e davam-lhe com ele na cabeça.

Cuspindo nEle. Comparar com o abuso sofrido por Jesus depois do julgamento perante o Sinédrio (ver Mt.26:67).

Mt.27:31 31. Depois de o terem escarnecido, despiram-lhe o manto e o vestiram com as suas próprias vestes. Em seguida, o levaram para ser crucificado.

Em seguida, O levaram. Esta hora talvez tenha sido 8 ou 9 da manhã. O percurso do pretório de Pilatos até o Calvário não é conhecido, devido ao fato de o local não poder ser identificado com certeza (sobre essa localização, ver com. do v. Mt.27:2). A atual Via Dolorosa, em Jerusalém, é o caminho tradicional para a cruz. Essa tradição pressupõe que o julgamento perante Pilatos teria ocorrido na torre Antônia, ao norte do templo (ver Guerra dos Judeus, ii.15.5 [328]), e que a moderna igreja do Santo Sepulcro estaria em cima do Gólgota antigo (ver com. do v. Mt.27:33). Essa identificação tradicional pode ser rastreada até o tempo de Constantino, no 4 século (ver com. de Mt.26:36; Mt.27:33).

Mt.27:32 32. Ao saírem, encontraram um cireneu, chamado Simão, a quem obrigaram a carregar-lhe a cruz.

Cireneu. [Simão leva a cruz do Senhor, Mt 27:32 = Mc.15:21 = Lc.23:26]. Nativo de Cirene, uma cidade da Líbia, no norte da África. Nos tempos antigos, havia uma grande colônia de judeus em Cirene. Havia uma sinagoga em Jerusalém identificada com os cireneus e outros (At.6:9).

Obrigaram. Enfraquecido devido à Sua recente provação, Jesus foi incapaz de levar a cruz, conforme exigia o costume. Os discípulos de Jesus poderiam ter ido à frente e se oferecido para fazê-lo, mas o medo os impediu de qualquer demonstração de lealdade a Ele. Que privilégio foi para Simão carregar a cruz e, assim, ter uma participação com Jesus em Seus sofrimentos! Hoje, é privilégio do cristão carregar a cruz de Cristo, permanecendo fiel aos princípios em face da impopularidade.

Mt.27:33 33. E, chegando a um lugar chamado Gólgota, que significa Lugar da Caveira,

Gólgota. [A crucifixão, Mt 27:33-44 = Mc.15:22-32 = Lc.23:32-43 = Jo.19:17-24. Comentário principal: Mt e Jo. Ver mapa, p. 222; gráficos 8, 9, p. 229, 230]. Esta é a transliteração do gr. Golgotha, que, por sua vez, é uma transliteração do aramaico Golgotha (do heb. Gulgoleth), cujo significado é “caveira”. A Vulgata Latina transformou a palavra “caveira” em Calvaria, daí, o nome Calvário (Lc.23:33). A igreja do Santo Sepulcro, no lugar do Gólgota antigo para alguns, fica dentro do que hoje se conhece como a Cidade Antiga de Jerusalém, mas pode, eventualmente, ter se situado fora da segunda muralha da cidade, na época de Cristo. A evidência para esse local do Gólgota é uma tradição do 4 século. Jesus “padeceu fora da porta” (Hb.13:12, ARC). O local não ficava longe da cidade (Jo.19:20). Pensa-se que o Portão das Ovelhas pode ter se localizado no quadrante nordeste da cidade, não muito longe do templo (ver mapa, vol. 3, p. 445), e o Gólgota devia ficar perto desse portão (ver DTN, 576; ver com. de Mt.26:36; Mt.27:31).

Lugar da Caveira. Isto provavelmente se refira à forma da colina em que a crucifixão ocorreu, ao invés da suposição de alguns de que crânios humanos ficavam ali expostos. Os que apontam para a forma de um crânio numa colina da atual Jerusalém, centenas de metros além do muro norte, como identificação do local do Calvário, ignoram que a superfície antiga da região em questão provavelmente foi bastante alterada durante séculos de resistência e de modificação por mãos humanas. As tentativas de identificar o local com qualquer ponto particular conhecido hoje são inconclusivas.

Mt.27:34 34. deram-lhe a beber vinho com fel; mas ele, provando-o, não o quis beber.

Vinho. Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a variante oinos, “vinho”, em vez de oxos, “vinagre” (ACF). Segundo o rabino Hisda (c. 309 d.C.), “quando uma pessoa é levada à execução, recebe uma taça de vinho contendo um grão de incenso, a fim de entorpecer os sentidos”. Este costume era destinado a mitigar o sofrimento do condenado.

Fel. Mc.15:23 afirma que o “vinho” era misturado com “mirra” (ver com. de Lc.7:37).

Não quis beber. Ver DTN, 746.

Mt.27:35 35. Depois de o crucificarem, repartiram entre si as suas vestes, tirando a sorte.

Crucificarem. Como Ele havia predito (ver Mt.20:19; Mt.26:2). A crucifixão foi realizada pelos soldados romanos (Jo.19:23). Em geral, os crucificados morriam devido à exposição e ao cansaço, depois de 12 horas aproximadamente. Contudo, em alguns casos, a morte não vinha antes de dois ou três dias. Mc.15:25 afirma que Jesus foi crucificado na terceira hora, pela contagem judaica, ou cerca de 9h da manhã.

Repartiram entre si as Suas vestes. A veste de Cristo foi dividida em quatro partes, uma para cada um dos soldados que participaram na execução; sobre a sua túnica lançaram sortes (Jo.19:23-24), como havia sido predito (Sl.22:18).

Mt.27:36 36. E, assentados ali, o guardavam.

Ali, O guardavam. Ou seja, eles montaram guarda. A autoridade romana tinha decretado a sentença de morte, e os soldados romanos a cumpriram.

Mt.27:37 37. Por cima da sua cabeça puseram escrita a sua acusação: ESTE É JESUS, O REI DOS JUDEUS.

Sua acusação. Em Jo.19:20, afirma-se que a acusação foi escrita em hebraico (aramaico), a linguagem comum do povo; em grego, a língua da aprendizagem e da cultura; e em latim, a língua oficial do império romano. João também diz que o “título” foi dado por Pilatos (Mt.27:19). Os judeus protestaram (Mt.27:21) porque o título parecia ser um insulto à sua nação. Pilatos recusou-se a alterá-lo (Mt.27:22) em ressentimento contra a pressão que os líderes judeus haviam exercido no caso, até mesmo a ponto de ameaçá-lo.

Rei dos Judeus. João, sem dúvida, dá o “título” na íntegra (Jo.19:19), ao passo que cada um dos sinóticos dá uma parte dele (Mt.27:37; Mc.15:26; Lc.23:38; ver Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17). O “título”, que também era uma acusação, consistia do nome do condenado, local de residência e a ofensa. Os judeus estavam irritados com o fato de a acusação constituir uma advertência romana de que qualquer homem que se fizesse passar por rei dos judeus poderia esperar destino semelhante. Isso implicava submissão perpétua implícita a Roma, a perspectiva mais irritante para o orgulho dos judeus.

Mt.27:38 38. E foram crucificados com ele dois ladrões, um à sua direita, e outro à sua esquerda.

Ladrões. Do gr. lestai, “salteadores” ou “bandidos” (ver com. de Mt.26:55). A cruz de Jesus foi erguida no centro, o local reservado para o líder de um grupo criminoso.

Mt.27:39 39. Os que iam passando blasfemavam dele, meneando a cabeça e dizendo:

Meneando a cabeça. Como um gesto de desprezo e escárnio (ver Sl.22:7; Sl.109:25; Is.37:22; Je.18:16).

Mt.27:40 40. Ó tu que destróis o santuário e em três dias o reedificas! Salva-te a ti mesmo, se és Filho de Deus, e desce da cruz!

Tu que destróis. Isto era uma reafirmação de uma acusação contra Jesus proferida pelo Sinédrio (Mt.26:61).

Se és. Estas palavras são uma reminiscência do desafio proferido por Satanás quando ele se aproximou de Cristo no deserto da tentação (ver com. de Mt.4:3). Para a turba, ao que parecia, Jesus não devia ser o Filho de Deus. Até mesmo os discípulos tinham perdido completamente a esperança de que Ele pudesse sê-Lo (ver Lc.24:21; cf. DTN, 772). Mais uma vez, falando por meio de homens possuídos por demônios, Satanás tentou atingir a fé que Jesus tinha em Seu Pai celestial (ver DTN, 733, 746, 760). Esta provocação, enquanto Ele pendia na cruz, reflete a pergunta feita a Jesus pelo sumo sacerdote perante o Sinédrio (Mt.26:63).

Filho de Deus. Ver com. de Lc.1:35.

Mt.27:41 41. De igual modo, os principais sacerdotes, com os escribas e anciãos, escarnecendo, diziam:

Os principais sacerdotes. Os membros das três classes aqui nomeadas compunham o Sinédrio, muitos dos quais deviam estar presentes na crucifixão para testemunhar o clímax de sua trama sanguinária. Quão cruéis e insensíveis eram os homens que lideravam a nação, totalmente desprovidos de misericórdia e compaixão, exultando com o sofrimento de sua vítima. Assim foi com os líderes religiosos apóstatas durante a Idade Média, assim é hoje em lugares onde há perseguição religiosa.

Mt.27:42 42. Salvou os outros, a si mesmo não pode salvar-se. É rei de Israel! Desça da cruz, e creremos nele.

Salvou os outros. Jesus havia salvado pessoas de doenças, possessão demoníaca e morte. Talvez aqueles que zombavam estivessem pensando na então recente ressurreição de Lázaro.

A Si mesmo não pode salvar-Se. Caso salvasse a Si mesmo, Jesus teria perdido o poder de salvar os outros. O plano de salvação teria falhado. Embora não soubessem, os líderes judeus deram expressão a uma verdade profunda. A recusa de Cristo em salvar a Si mesmo era a demonstração suprema do amor divino (cf. Jo.15:13). Precisamente porque Jesus não quis salvar a Si mesmo naquele momento é que Ele pode salvar os outros. Na cruz, Ele deu um exemplo do princípio enunciado em Mt.10:39. No deserto da tentação, Jesus enfrentou a questão do uso de Seu poder divino para benefício pessoal e tomou a decisão de que não iria fazê-lo.

É rei. Ele havia alegado ser (Jo.18:33-37). Como a inscrição acima de Sua cabeça anunciava, Ele fora condenado à morte por essa afirmação. Não poder descer da cruz, para alguns ali, era prova de que Jesus não era o que afirmava ser e também de que merecia o destino que Lhe fora dado.

Creremos. De acordo com o pensamento judaico, prosperidade era uma evidência do favor divino, e a adversidade era o contrário disso. A lição exemplificada na experiência de Jó não tinha alterado a filosofia do sofrimento na mente dos judeus (ver com. de Jó.42:5; Sl.38:3; Sl.39:9). Em vários momentos durante Seu ministério, Jesus tinha tentado refutar esse falso conceito, mas sem sucesso (ver com. de Mc.1:40; Mc.2:5; Jo.9:2). Essa falsa visão do sofrimento era um dispositivo pelo qual Satanás pretendia obscurecer a mente dos que testemunharam o sofrimento de Jesus na cruz. Para o judeu comum era inconcebível que Deus permitisse que o Messias sofresse como Jesus estava sofrendo, por isso Jesus não devia ser quem Ele afirmava ser.

Mt.27:43 43. Confiou em Deus; pois venha livrá-lo agora, se, de fato, lhe quer bem; porque disse: Sou Filho de Deus.

Confiou em Deus. Por meio de hipócritas astutos, Satanás procurou atingir a fé de Cristo em Seu Pai (ver com. do v. Mt.27:40). Na experiência de Cristo no Getsêmani e, então, pendurado na cruz, Satanás não poupou nenhum dispositivo, mesmo os mais cruéis e falsos, para abalar a confiança do Salvador no amor de Seu Pai e em Sua soberana providência. Esse amor era o fator da resistência do Salvador em suportar a prova e obter vitória sobre todos os dardos inflamados do maligno (ver DTN, 119).

Venha livrá-Lo. Inconscientemente, os algozes de Jesus usaram as próprias palavras da profecia (Sl.22:8).

Quer. Do gr. thelo, aqui significando, “desejar”.

Porque disse: sou filho de Deus. Ver com. do v. Mt.27:40.

Mt.27:44 44. E os mesmos impropérios lhe diziam também os ladrões que haviam sido crucificados com ele.

Os ladrões. Ver com. do v. Mt.27:38. Sobre o ladrão arrependido, ver com. de Lc.23:40-43.

Mt.27:45 45. Desde a hora sexta até à hora nona, houve trevas sobre toda a terra.

Hora sexta. [A morte de Jesus, Mt.27:45-56 = Mc.15:33-41 = Lc.23:44-49 = Jo.19:28-30]. Ou seja, meio-dia, de acordo com a contagem judaica. A “hora sexta” de Jo.19:14 é hora romana, cerca de 6h da manhã. O evangelho não canônico de Pedro (sec. 5; ver p. 113, 114) diz que “era meio-dia, e as trevas baixaram sobre toda a Judeia”. De acordo com Mc.15:25, Jesus foi crucificado na “hora terceira”, ou 9h da manhã. Ele, portanto, estava na cruz já havia três horas.

Nona hora. Ou, cerca de 3h da tarde.

Houve trevas. Era uma escuridão sobrenatural (ver com. de Lc.23:45). Não poderia ter sido provocada por um eclipse solar porque a fase da lua cheia já havia passado.

A terra. Não fica evidente por estas palavras até que ponto a escuridão se prolongou.

Mt.27:46 46. Por volta da hora nona, clamou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lamá sabactâni? O que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?

Clamou Jesus. Sobre as sete declarações de Jesus sobre a cruz, ver com. de Lc.23:34. Esta é a única das sete registradas por Mateus e Marcos. Lucas e João alistam três, embora não sejam as mesmas três.

Eli. Ver com. do Sl.22:1. A forma “Eloí” (Mc.15:34) é uma transliteração do aramaico equivalente ao hebraico.

Mt.27:47 47. E alguns dos que ali estavam, ouvindo isto, diziam: Ele chama por Elias.

Ele chama por Elias. Talvez o sofrimento e a fadiga tenham tornado a voz de Jesus indistinta. A tradição judaica fizera de Elias o santo padroeiro das pessoas piedosas em suas horas extremas.

Mt.27:48 48. E, logo, um deles correu a buscar uma esponja e, tendo-a embebido de vinagre e colocado na ponta de um caniço, deu-lhe a beber.

Vinagre. Do gr. oxos (ver com. de v. Mt.27:34), “vinagre” ou “vinho azedo” por fermentação (ver com. de Nm.6:3; sobre esta predição, ver Sl.69:21).

Mt.27:49 49. Os outros, porém, diziam: Deixa, vejamos se Elias vem salvá-lo.

Deixa. Com zombaria, os sacerdotes propuseram esperar para ver se o que eles interpretaram como um apelo de Jesus por Elias seria respondido com a vinda do profeta para amenizar Seus sofrimentos ou livrá-Lo. Evidências textuais (cf. p. 136) apoiam o acréscimo: “E um dos soldados Lhe abriu o lado com uma lança e saiu sangue e água.”

Mt.27:50 50. E Jesus, clamando outra vez com grande voz, entregou o espírito.

Com grande voz. Comparar com Lc.23:46; Sl.31:5.

Entregou o espírito. Do gr. apheken to pneuma, literalmente, “saiu-Lhe o fôlego” (ver com. de Lc.8:55). Marcos e Lucas usam a palavra ekpneo, literalmente, “expirou” (Mc.15:37; Lc.23:46). Ele morreu triunfante sobre a sepultura (Ap.1:18) e sobre todas as forças do mal (Cl.2:15). Embora o senso da presença do Pai tenha sido perdido, de modo que pendurado na cruz Ele “não podia enxergar além dos portais do sepulcro” (DTN, 753), e “o sentimento da perda do favor do Pai [então] se desvanecia” (DTN, 756), Jesus não morreu derrotado. Ele estava plenamente consciente de Seu triunfo e estava confiante em Sua própria ressurreição.

Mt.27:51 51. Eis que o véu do santuário se rasgou em duas partes de alto a baixo; tremeu a terra, fenderam-se as rochas

O véu. Ou seja, a cortina que separava o lugar santo do santíssimo (ver com. de Ex.26:31-33; 2Cr.3:14). O acesso ao lugar santíssimo era restrito ao sumo sacerdote, que ali entrava só uma vez por ano. O rasgar do véu e a consequente exposição do espaço, até então restrito, era um sinal do Céu de que o ritual típico havia encontrado o antítipo. Era a hora do sacrifício regular da tarde, quando o sacerdote estava prestes a sacrificar o cordeiro do holocausto diário. Era a “hora nona”, cerca de 3 horas da tarde, de acordo com o cômputo judaico (ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75; cf. DTN, 756, 757; GC, 399).

De alto. Indicando que não foi realizado por mãos humanas.

Mt.27:52 52. abriram-se os sepulcros, e muitos corpos de santos, que dormiam, ressuscitaram

Muitos corpos. Apenas Mateus registra este incidente relacionado com a crucifixão e a ressurreição de Jesus (comparar com Sl.68:18; Ef.4:8). Deve-se notar que, embora os túmulos tenham sido abertos no momento da morte de Cristo, os santos não ressuscitaram até o momento de Sua ressurreição (Mt.27:53). Quão apropriado foi que Cristo trouxesse consigo do túmulo alguns dos prisioneiros a quem Satanás havia mantido no cárcere da morte. Esses mártires saíram com Jesus imortalizados e, depois, subiram com Ele para o Céu (ver DTN, 786).

Mt.27:53 53. e, saindo dos sepulcros depois da ressurreição de Jesus, entraram na cidade santa e apareceram a muitos.

Sem comentário para este versículo.

Mt.27:54 54. O centurião e os que com ele guardavam a Jesus, vendo o terremoto e tudo o que se passava, ficaram possuídos de grande temor e disseram: Verdadeiramente este era Filho de Deus.

O centurião. Ou, o responsável pela crucifixão (sobre a palavra “centurião”, ver com. de Lc.7:2). Segundo a tradição, o nome deste centurião era Petrônio, alguns dizem Longinus (Acta Pilati, xvi.7; Evangelho de Pedro, Fragmento i.31).

O Filho de Deus (ARC). A expressão grega aqui não tem artigo, portanto, pode ser traduzida mais precisamente como “Filho de Deus” (ARA). A tradução “um Filho de Deus” é vaga (ver Problems in Bible Translation, p. 191, 192, cf. DTN, 770; ver com. de Dn.7:13; Lc.1:35).

Mt.27:55 55. Estavam ali muitas mulheres, observando de longe; eram as que vinham seguindo a Jesus desde a Galiléia, para o servirem

Muitas mulheres. Havia muitas mulheres discípulas que acreditavam em Jesus, algumas das quais O acompanharam e atendiam às necessidades do pequeno grupo (ver com. de Lc.8:2-3; Jo.19:27 também menciona a mãe de Jesus).

Mt.27:56 56. entre elas estavam Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago e de José, e a mulher de Zebedeu.

Maria Madalena. Ver Nota Adicional a Lucas 7; Lc.7:50; ver com. de Lc.8:2.

Mãe de Tiago. Possivelmente, “Maria, mulher de Clopas” (Jo.19:25).

A mulher de Zebedeu. Possivelmente a Salomé de Mc.15:40 (cf. Mt.20:20).

Mt.27:57 57. Caindo a tarde, veio um homem rico de Arimatéia, chamado José, que era também discípulo de Jesus.

Caindo a tarde. [O sepultamento de Jesus, Mt.27:57-61 = Mc.15:42-47 = Lc.23:50-56 = Jo.19:38-42. Comentário principal: Mt e Mc. Ver mapa, p. 222; gráficos 8, 9, p. 229, 230]. Ou seja, o fim da tarde de sexta-feira, o dia da crucifixão. Jesus morreu por volta das 15h (Mc.15:34-37), e o sol se punha por volta de 18h30, nessa época do ano na latitude de Jerusalém.

Um homem rico. Marcos descreve José de Arimateia como um conselheiro honrado, que “também esperava o reino de Deus” (Mc.15:43). Lucas acrescenta que ele era “homem bom e justo”, que “não tinha concordado com o desígnio e ação dos outros” líderes (Lc.23:50-51). João o descreve como “um discípulo de Jesus, ainda que ocultamente pelo receio que tinha dos judeus” (Jo.19:38). A provisão para o sepultamento de Jesus, organizada por José de Arimateia, cumpriu a predição de Is.53:9 de que o Messias teria “sepultura [...] com o rico, na Sua morte”.

Arimateia. A forma grega de Ramá. Houve várias cidades com o nome de Ramá, mas não se sabe qual delas se identifica com a Arimateia do NT (ver Nota Adicional a 1 Samuel 1; 1Sm.1:28).

José. João acrescenta que Nicodemos (cf. Jo.3:1; Jo.7:50) se associou a José na organização do sepultamento de Jesus (ver Jo.19:39).

Discípulo de Jesus. Tanto José quanto Nicodemos haviam sido intencionalmente excluídos do julgamento de Jesus perante o Sinédrio, pois, anteriormente, eles haviam falado em favor de Jesus e frustrado os planos de silenciar o Salvador (ver com. de Mt.26:66; cf. DTN, 773). Então, eles corajosamente se adiantaram para fazer o que nenhum outro amigo de Jesus podia fazer. Na crucifixão, Nicodemos testemunhara o cumprimento do que Jesus tinha dito três anos antes sobre o levantamento do Filho do Homem (Jo.3:14-15); e, para ele, as cenas vividas daquele dia constituíam uma evidência positiva da divindade de Cristo (ver DTN, 775, 776).

Mt.27:58 58. Este foi ter com Pilatos e lhe pediu o corpo de Jesus. Então, Pilatos mandou que lho fosse entregue.

Foi ter com Pilatos. Nicodemos foi comprar especiarias a fim de embalsamar o corpo de Jesus (ver com. de Jo.19:39-40); e, provavelmente, ao mesmo tempo, José foi ver Pilatos. O tempo era curto, pois a tarefa devia ser concluída antes do pôr do sol (ver com. de Mt.27:57). Era preciso ter coragem para ir adiante e manifestar simpatia por um homem condenado e executado como traidor de Roma, e que tinha sido rotulado pela mais alta corte judaica como um blasfemador. A coragem de José e Nicodemos brilha em contraste com a covardia dos discípulos.

E lhe pediu. Na mesma hora, os líderes judeus foram a Pilatos com o pedido de que o corpo de Jesus e dos dois ladrões devia ser retirado da cruz antes do sábado (Jo.19:31). A lei de Moisés exigia que corpos pendurados em madeiro fossem removidos antes do pôr do sol (Dt.21:22-23). Era ofensivo que permanecessem pendurados na cruz ao longo do sábado, especialmente em vista de que era “grande aquele dia” de sábado (Jo.19:31; Jo.19:42; comparar com Josefo, Guerra dos Judeus, iv.5.2 [317, 318]). No curso normal dos acontecimentos, Jesus, como um traidor de Roma, teria um enterro desonroso em um campo reservado aos mais vis criminosos (ver DTN, 773).

Pilatos mandou. Antes de ordenar a custódia do corpo de Jesus a José, Pilatos pediu a confirmação oficial de Sua morte a um centurião (Mc.15:44-45). Era incomum que uma pessoa crucificada morresse em seis horas. Normalmente, a agonia continuava por muitas horas mais, às vezes por dias.

Mt.27:59 59. E José, tomando o corpo, envolveu-o num pano limpo de linho

Pano limpo de linho. Comparar com Mc.15:46.

Mt.27:60 60. e o depositou no seu túmulo novo, que fizera abrir na rocha; e, rolando uma grande pedra para a entrada do sepulcro, se retirou.

No seu túmulo novo. Isto é, ninguém ainda tinha sido sepultado no túmulo (ver Lc.23:53). O fato de José possuir esse túmulo tão perto de Jerusalém sugere que ele já não residia nessa cidade, que fora, provavelmente, sua cidade natal, o lugar onde sua família possuía terras.

Abrir na rocha. Cavernas naturais e túmulos rupestres talhados são abundantes nas proximidades de Jerusalém. Eram locais habituais de sepultamento na antiga Palestina. Ao adentrar um túmulo típico, provavelmente seria encontrado um recesso nas paredes de cada lado, onde os corpos eram colocados. Muitas vezes, havia uma pequena câmara atrás da parte principal da tumba onde os ossos das gerações anteriores eram depositados, a fim de dar espaço a outros corpos. O generoso presente de José, ao prover um local de sepultamento, resolveu um problema para o qual os discípulos não tinham solução.

Rolando uma grande pedra. Provavelmente, uma pedra semelhante a uma mó, colocada de modo a rolar para a posição em uma pequena ranhura a fim de fechar a porta do sepulcro.

Mt.27:61 61. Achavam-se ali, sentadas em frente da sepultura, Maria Madalena e a outra Maria.

Maria Madalena. Ou, Maria, irmã de Marta (ver Nota Adicional a Lucas 7; Lc.7:50; cf. DTN, 558-560, 568). Maria foi uma das últimas a deixar o túmulo na sexta-feira e a primeira a voltar no domingo de manhã (Mt.28:1; cf. DTN, 568, 788).

Outra Maria. Provavelmente, “Maria, mãe de José” (Mc.15:47) e de Tiago (Mc.16:1). Algumas mulheres devotas acompanhavam Jesus e os discípulos e atendiam às suas necessidades (ver com. de Lc.8:2-3). A “outra Maria” foi com Maria Madalena ao sepulcro na manhã da ressurreição (Mt.28:1).

Mt.27:62 62. No dia seguinte, que é o dia depois da preparação, reuniram-se os principais sacerdotes e os fariseus e, dirigindo-se a Pilatos,

No dia seguinte. [A guarda no sepulcro, Mt.27:62-66. Ver mapa, p. 222; gráfico 9, p. 230]. Este incidente é registrado apenas por Mateus, embora ocorra também no evangelho não canônico de Pedro (sec. 8-11; ver p. 113, 114). Este “dia seguinte” foi o dia semanal de sábado (ver Lc.23:54; Lc.23:56). Alguns críticos têm feito tentativas elaboradas para desacreditar o incidente a que Mateus aqui se refere. Eles consideram como inacreditável que as autoridades judaicas soubessem que Jesus havia predito Sua própria ressurreição, que eles fossem a Pilatos no dia de sábado, que Pilatos atendesse a esse pedido, que os soldados romanos conspirassem para fazer um relatório falso, que recebessem suborno, que eles estivessem apavorados e que caíssem ao chão quando o anjo apareceu e rolou a pedra. É verdade que Mateus é a única fonte inspirada para essa informação. Mas pode-se salientar que tanto Pilatos quanto as autoridades judaicas estavam agindo de forma inteiramente característica, e isso constitui forte evidência interna da autenticidade do relato.

Os evangelhos evidenciam que os sacerdotes e os governantes foram tão longe quanto puderam. Além disso, a profunda preocupação deles ao longo dos últimos dois dias era de que fossem bem-sucedidos em seu plano sinistro para destruir Jesus (ver Nota Adicional 2 a Mateus 26; Mt.26:75). Isso, somado à suspeita de que Ele era de fato o Messias, iria levá-los a fazer a mesma coisa que Mateus diz que fizeram. Pilatos, com relutância, concordou com o pedido insistente para derramar o sangue de Jesus (cf. Jo.19:12), e eles tinham todos os motivos para acreditar que ele iria cumprir essa solicitação também. Era a época da Páscoa; e, em vista das dificuldades que ele havia passado com os judeus, sem dúvida, faria tudo para apaziguá-los (ver com. de Mt.27:24).

Depois da preparação. Ver com. de Mc.15:42.

Os principais sacerdotes. Ver com. de Mt.26:59.

Fariseus. Ver p. 39, 40.

Mt.27:63 63. disseram-lhe: Senhor, lembramo-nos de que aquele embusteiro, enquanto vivia, disse: Depois de três dias ressuscitarei.

Lembramo-nos. Jesus tinha dado isto a entender quando falou publicamente (Mt.12:40) e o afirmou com clareza, embora veladamente, em resposta a uma pergunta que pedia por um sinal (Jo.2:19). Aparentemente, eles entenderam o que Jesus queria dizer, mesmo que em seu julgamento estivessem prontos a interpretar mal as Suas palavras (ver com. de Mt.26:61).

Aquele embusteiro. Ou, “enganador” (ARC; ver Jo.7:47). Críticos do cristianismo, tanto judeus quanto pagãos, durante o 2º e o 3º séculos, frequentemente, acusaram Jesus de enganador.

Três dias. Ver p. 246-248.

Mt.27:64 64. Ordena, pois, que o sepulcro seja guardado com segurança até ao terceiro dia, para não suceder que, vindo os discípulos, o roubem e depois digam ao povo: Ressuscitou dos mortos; e será o último embuste pior que o primeiro.

Ao terceiro dia. Aqui (v. 63, 64), os termos “depois de três dias” e “ao terceiro dia” são obviamente sinônimos (ver p. 247).

Embuste. Para eles, o primeiro “embuste” ou engano seria a ideia de que Jesus era o Messias da profecia (ver com. de Mt.26:63-66). O “último” seria a afirmação de que Ele tinha ressuscitado dos mortos.

Mt.27:65 65. Disse-lhes Pilatos: Aí tendes uma escolta; ide e guardai o sepulcro como bem vos parecer.

Uma escolta. Do gr. koustodia, “guarda”, uma palavra emprestada do latim.

Como bem vos parecer. Estas palavras irônicas são uma reminiscência da declaração anterior: “o que escrevi, escreví”. Pilatos aqui fala segundo o que lhe era natural. Ele desprezava os líderes judeus e tratou o pedido deles com desdém. Os esforços das autoridades judaicas para impedir a ressurreição só resultaram em uma prova mais positiva e conclusiva da realidade desse grande evento.

Mt.27:66 66. Indo eles, montaram guarda ao sepulcro, selando a pedra e deixando ali a escolta.

Montaram guarda ao sepulcro. Sobre o método de selar a sepultura, ver DTN, 778.

Mt.28:1 1. No findar do sábado, ao entrar o primeiro dia da semana, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro.

No findar do sábado. [A ressurreição de Jesus. Seu aparecimento às mulheres, Mt.28:1-10 = Mc.16:1-8 = Lc.24:1-12 = Jo.20:1-10. Comentário principal: Mt e Jo. Ver mapa, p. 223; gráficos, p. 229, 230]. Do gr. opse de sabbaton. A palavra opse, aqui traduzida como “findar”, pode significar tanto “depois” quanto “tarde”. Assim, alguns acham que as mulheres teriam ido ao sepulcro no sábado à tarde (ver ARC). No entanto, a NVI e a NTLH traduzem como “depois do sábado”, no que têm apoio de diversos eruditos. O termo opse é usado só três vezes no NT, aqui, em Mc.11:19 e Mc.13:35, em que é traduzido por “tarde”. Em Mc.11:19, opse pode designar o fim da tarde do dia anterior mencionado na narrativa, ou as horas depois do pôr do sol, o que seria, segundo o método hebraico de calcular o tempo, no dia seguinte (ver ARC). Em Mc.13:35, opse designa a primeira vigília da noite, do pôr do sol até cerca das 21 horas. Uma forma relacionada, opsia, ocorre mais frequentemente no NT. Opsia é sempre traduzida como “tarde”, “noite” ou “entardecer”, e é usado para as horas após o pôr do sol ou o ocaso (Mt.8:16; Mt.14:23; Mc.1:32; Mc.6:47; Jo.6:16; cf. DTN 377, 380). Em Mt.26:20 e Mc.14:17, o termo é usado para o momento em que a ceia pascal devia ser consumida, durante as primeiras horas de 15 de nisã, após o pôr do sol, finalizando o dia 14 de nisã (ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75).

Em Jo.20:19, opsia também se refere ao período após o pôr do sol, provavelmente depois de a escuridão se estabelecer (cf. DTN, 800-802). Comentando sobre opse de sabbaton, E. J. Goodspeed conclui que “o sentido claro da passagem é: depois do sábado, ao amanhecer do primeiro dia da semana” (Problems of New Testament Translation, p. 45). Da mesma forma, J. H. Moulton atribui a opse o significado de “depois”, em Mt.28:1 (A Grammar of New Testament Greek, vol. 1, p. 72). Goodspeed (op. cit., p. 43) cita escritores gregos do 2° e do 3° séculos que usam opse com o sentido de “depois”. As passagens paralelas nos outros evangelhos indicam que aqui Mateus quis dizer “depois do sábado”, e não a “tarde no sábado”. De acordo com Mc.16:1-2, “passado o sábado”, as mulheres “compraram aromas”, depois do pôr do sol, no sábado à noite, e foram ao sepulcro bem cedo na manhã do primeiro dia da semana, “ao despontar do sol”. As palavras de Marcos são claras e definidas, e não parece haver razão para se duvidar de que ele se refira à mesma visita mencionada em Mt.28:1. Também pode ser observado que os regulamentos judaicos de viagem no sábado (ver com. de Ex.16:29) teriam impedido qualquer visita ao túmulo a partir de uma distância superior a 500 metros. A casa de Maria Madalena era em Betânia, a 2 km de Jerusalém (ver com. de Mt.21:1).

Se ela passou o sábado em Betânia (Lc.23:56), não teria ido ao túmulo antes do fim do sábado. Se, como alguns sugerem (cf. ARA e ARC), a visita das mulheres ao sepulcro (Mt.28:1) tivesse ocorrido no final da tarde do sábado, a narrativa dos v. Mt.28:2-15 ficaria desconectada da declaração de tempo do v. 1. No entanto, os v. Mt.28:2-15 dão um relato do que ocorreu no tempo designado no v. 1. Não há razão para se considerar que a declaração de tempo do v. 1 deva ser atribuída à visita ao sepulcro na suposta tarde de sábado, pois isso deixaria os acontecimentos importantes dos v. Mt.28:2-15 sem um tempo definido. Além disso, nada há que indique uma transição de tempo de uma suposta tarde de sábado, no v. 1, para um domingo de manhã, nos v. Mt.28:2-15. Em segundo lugar, se, como alguns sugerem, a própria ressurreição tivesse ocorrido sábado à tarde, outras dificuldades aparecem. Os soldados romanos teriam montado guarda no sepulcro durante as horas do sábado (Mt.27:62-66), mas houve uma noite entre o início de sua vigília e a ressurreição (Mt.28:13). Tanto quanto a linguagem e o contexto permitem interpretar Mateus 28:1, em harmonia com as declarações unânimes dos demais evangelhos, não há razão válida para se insistir na visita das mulheres ao sepulcro no sábado à tarde, mas na manhã seguinte. Alguns sugerem que a frase “no fim do sábado” deveria ser conectada a Mt.27:66. No entanto, o grego não favorece tal relação.

Ao entrar o primeiro dia. Do gr. epiphosko, literalmente, “ao despontar da luz”, “ao amanhecer”. Epiphosko é usado tanto para a “madrugada” de um dia de 12 horas, ou seja o nascer do sol, quanto para o início de um dia de 24 horas judaico, ou seja ao pôr do sol. Em Lc.23:54, epiphosko é traduzido como “começava”, em referência à aproximação do sábado, ao entardecer. Os expositores, em geral, concordam que em Mateus 28:1 se deve manter esse significado literal, e isso é confirmado pelas declarações paralelas dos demais evangelhos. Naquela estação do ano astronômico, o amanhecer começava cerca das 4h da manhã, na latitude de Jerusalém, e o sol se levantava cerca das 5h30 da manhã. Se Maria Madalena acordou na hora em que começava a clarear o dia (ver Jo.20:1) e caminhou de Betânia ao Calvário, ela teria chegado por volta do nascer do sol (ver Mc.16:1-2; Jo.20:1).

Primeiro dia da semana. Do gr. mia sabbaton. A palavra sabbaton, em sua forma plural ou como ocorre aqui, no singular, significa tanto “sábado”, o sétimo dia da semana, quanto “semana” (para este último sentido, ver Lc.18:12; 1Co.16:2). Sem qualquer base gramatical, alguns interpretam mia sabbaton como “o primeiro dos sábados” e concluem que Mateus aqui designa o domingo da ressurreição como a primeira ocasião em que o caráter sagrado do sábado foi transferido para o primeiro dia da semana. No entanto, estudiosos do grego jamais tentaram defender a santidade do domingo com base nesta tradução gramaticalmente incorreta de Mateus 28:1.

Maria Madalena. Ver Nota Adicional a Lucas 7; Lc.7:50. As mulheres “observaram onde Ele [Jesus] foi posto” (ver com. de Mc.15:47), a fim de retornar após o sábado e completar a preparação do Seu corpo.

A outra Maria. Provavelmente a mãe de Tiago (Mc.16:1) e José (Mt.15:47).

Ver o sepulcro. Em vista de Mc.16:1-2 e Lc.24:1 falarem em trazer especiarias, alguns concluíram que Mateus se refere a uma visita anterior ao sepulcro, talvez na tarde de sábado, uma simples visita para ver o túmulo (sobre a improbabilidade de tal visita, ver com. de Mt 28:1).

Mt.28:2 2. E eis que houve um grande terremoto; porque um anjo do Senhor desceu do céu, chegou-se, removeu a pedra e assentou-se sobre ela.

Houve. Cada um dos quatro evangelistas dá sua própria versão dos acontecimentos rápidos e intensos da manhã da ressurreição. Na superfície, cada relato é diferente dos demais (ver Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17). As diferenças aparentes não são devido a discrepâncias entre os relatos, mas sim à brevidade das narrativas.

Um anjo. Lc.24:4 fala de dois anjos, dos quais Mateus menciona apenas um. O fato de Mateus e Marcos (Mc.16:5) mencionarem um só anjo não significa uma discrepância entre os evangelhos. Gabriel é o anjo principal (ver DTN, 780), e Mateus e Marcos se referem a ele. O fato de o outro anjo não ser mencionado não deve ser tomado como uma negação de sua presença (sobre casos semelhantes, em que os evangelhos diferem quanto ao número de pessoas envolvidas em certos incidentes, ver com. de Mc.5:2; Mc.10:46).

Mt.28:3 3. O seu aspecto era como um relâmpago, e a sua veste, alva como a neve.

Sem comentário para este versículo.

Mt.28:4 4. E os guardas tremeram espavoridos e ficaram como se estivessem mortos.

Guardas. Ou, soldados romanos.

Tremeram. Do gr. seio, a forma verbal de seismos (ver com. de Mt.8:24).

Espavoridos. Comparar com a experiência de Zacarias (ver com. de Lc.1:12-13) e de Maria (ver com. de Lc.1:29-30) diante da aparição do anjo.

Mt.28:5 5. Mas o anjo, dirigindo-se às mulheres, disse: Não temais; porque sei que buscais Jesus, que foi crucificado.

Que foi crucificado. Elas não foram ao túmulo procurar um Salvador ressuscitado.

Mt.28:6 6. Ele não está aqui; ressuscitou, como tinha dito. Vinde ver onde ele jazia.

Ele não está aqui. O túmulo vazio proclamava a ressurreição de Jesus. Tudo que as autoridades judaicas precisavam fazer para refutar a ressurreição de Jesus era preservar o corpo morto do Salvador. Se pudessem, eles certamente teriam feito isso. Pela própria sugestão deles e sob sua vigilância (Mt.27:62-66), o túmulo fora selado, e alguns deles, sem dúvida, testemunharam tal vedação.

Como tinha dito. Ver Mt.16:21; Mt.20:19.

Vinde ver. Um convite para verificar os fatos relativos ao sepulcro vazio.

Mt.28:7 7. Ide, pois, depressa e dizei aos seus discípulos que ele ressuscitou dos mortos e vai adiante de vós para a Galiléia; ali o vereis. É como vos digo!

Dizei aos Seus discípulos. Deus resolveu fazer dessas mulheres piedosas mensageiras divinas da alegre nova da ressurreição, ao invés de dar a notícia diretamente aos próprios discípulos, por causa do ministério delas de contínuo amor e devoção no momento em que os discípulos tinham praticamente abandonado Jesus.

Vai adiante de vós. Como Jesus havia predito, na noite em que fora traído (Mt.26:32).

Ali O vereis. Esta promessa foi cumprida quando cerca de 500 crentes se reuniram secretamente em uma determinada montanha na Galileia (1Co.15:6; cf. DTN, 818, 819). As aparições na Judeia foram, em sua maior parte, muito breves.

Mt.28:8 8. E, retirando-se elas apressadamente do sepulcro, tomadas de medo e grande alegria, correram a anunciá-lo aos discípulos.

Correram. A distância era menos de um quilômetro.

Mt.28:9 9. E eis que Jesus veio ao encontro delas e disse: Salve! E elas, aproximando-se, abraçaram-lhe os pés e o adoraram.

E indo elas (ARC). Evidências textuais (cf. p. 136) favorecem a omissão desta frase. O contexto, porém, confirma o fato, assim declarado.

Jesus veio ao encontro. Ver Nota Adicional a Mateus 28; Mt.28:20. Esta aparição deve ter ocorrido próximo do túmulo, pois é improvável que Jesus tenha Se manifestado às mulheres dentro da cidade.

Salve. Literalmente, “seja feliz”, ou “se alegre”. Esta era uma forma comum de saudação (cf. Mt.26:49; Mt.27:29; Lc.1:28; At.15:23; Tg.1:1).

Abraçaram-Lhe os pés. Pouco tempo antes, Jesus havia proibido Maria Madalena de “tocá-Lo” (ver com. de Jo.20:17). No entanto, entre essas duas aparições, Jesus tinha subido rapidamente ao Céu (Jo.20:17; ver Nota Adicional a Mateus 28; Mt.28:20; cf. DTN, 790, 793).

Adoraram. Sem dúvida, em reconhecimento de Sua divindade (ver com. de Mt.14:33).

Mt.28:10 10. Então, Jesus lhes disse: Não temais! Ide avisar a meus irmãos que se dirijam à Galiléia e lá me verão.

Não temais. Uma admoestação comum feita pelos visitantes celestiais (ver Mt.28:5; cf. Lc.1:13; Lc.1:30).

Ide avisar a Meus irmãos. Comparar com Mc.16:7.

Que se dirijam à Galileia. Ver Nota Adicional a Mateus 28; Mt.28:20.

Mt.28:11 11. E, indo elas, eis que alguns da guarda foram à cidade e contaram aos principais sacerdotes tudo o que sucedera.

E indo elas. [Os judeus subornam os guardas, Mt.28:11-15]. Ou, enquanto as mulheres estavam a caminho levando a mensagem de Jesus aos discípulos.

Alguns da guarda. Ou, a escolta romana (ver Mt.28:4).

Mt.28:12 12. Reunindo-se eles em conselho com os anciãos, deram grande soma de dinheiro aos soldados,

Reunindo-se. Provavelmente uma sessão formal do Sinédrio (ver com. de Mt.26:3), que entregou Jesus a Pilatos.

Em conselho. Como Jesus havia predito, na forma indireta de uma parábola, os líderes de Israel não se convenceram, embora Ele já tivesse ressuscitado dos mortos (cf. Lc.16:27-31). Antes, quando Lázaro fora ressuscitado, os líderes judeus haviam se tornado ainda mais determinados em tirar a vida de Jesus (Jo.11:47-54).

Deram grande soma. Eles haviam subornado Judas a fim de que pudessem matar Jesus, então subornaram os soldados romanos para contradizer o relato de Sua ressurreição.

Mt.28:13 13. recomendando-lhes que dissessem: Vieram de noite os discípulos dele e o roubaram enquanto dormíamos.

Vieram de noite os discípulos. Se esta acusação fosse verdadeira, os sacerdotes que fabricaram a mentira, provavelmente teriam sido os primeiros a pedir punição severa para os soldados envolvidos no suposto caso de negligência. Em vez disso, os soldados foram recompensados generosamente. Ademais, o fato de os discípulos duvidarem dos sucessivos relatórios da ressurreição (Mc.16:11; Lc.24:11; Jo.20:24, Jo.20:25) elimina qualquer possibilidade de eles terem concebido um plano para remover o corpo e anunciar publicamente que Jesus tinha ressuscitado. Por fim, o temor que os envolveu no jardim (Mt.26:56) e o medo de Pedro durante o julgamento (ver Mt.28:69-74) excluem a possibilidade de algum deles ter coragem de passar pelos guardas romanos, apesar de adormecidos, quebrar o selo romano, rolar a pedra e levar consigo o corpo de Jesus.

Enquanto dormíamos. A morte era a pena romana para quem permitisse a fuga de um prisioneiro. Sabendo disso, a guarda não teria dormido. Além disso, é inconcebível que todos os soldados tivessem adormecido ao mesmo tempo e que permanecessem adormecidos durante a remoção da pedra e do corpo de Jesus. Finalmente, se os soldados estivessem dormindo quando o corpo foi removido, como eles poderiam saber que alguém o removeu? De todos os ângulos, o conto inventado pelos líderes judeus apresenta grandes problemas.

Mt.28:14 14. Caso isto chegue ao conhecimento do governador, nós o persuadiremos e vos poremos em segurança.

Do governador. Ver com. de Mt.27:2.

Nós o persuadiremos. Isto os líderes judeus realmente fizeram pessoalmente (ver DTN, 782). Talvez eles tivessem um suborno real guardado para Pilatos, se as circunstâncias assim o exigissem.

Em segurança. Literalmente, “sem ansiedade ou preocupação”, ou seja, eles seriam protegidos da pena de morte. Os sacerdotes e anciãos assumiram toda a responsabilidade pela situação, assim como já haviam feito em relação à morte de Jesus (Mt.27:24, Mt.27:25). Com certeza, eles não tinham alternativa; o caso todo era invenção deles.

Mt.28:15 15. Eles, recebendo o dinheiro, fizeram como estavam instruídos. Esta versão divulgou-se entre os judeus até ao dia de hoje.

Como estavam instruídos. Durante vários séculos, esse relato fabricado do túmulo vazio apareceu em ataques judeus e pagãos ao cristianismo. Justino Mártir, na metade do 2° século, e Tertuliano, no início do 3°, o mencionam.

Mt.28:16 16. Seguiram os onze discípulos para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes designara.

Seguiram. [Jesus aparece aos discípulos na Galileia, Mt.28:16-17]. Sobre esta aparição, ver Nota Adicional a Mateus 28; Mt.28:20.

Para o monte. O lugar não é especificado, mas deve ter sido algum já associado ao ministério de Jesus na mente dos discípulos, como o local onde o Sermão do Monte fora proferido (ver com. de Mt.5:1), ou o monte da transfiguração (ver com. de Mt.17:1). Cerca de 500 fiéis estavam reunidos nesta ocasião (1Co.15:6; cf. DTN, 818).

Mt.28:17 17. E, quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram.

Quando O viram. Eles estavam reunidos, aguardando a chegada dEle. De repente, Ele apareceu entre eles. Assim foram as aparições anteriores após a ressurreição.

Adoraram. Em reconhecimento de Sua divindade e messianidade. Antes da crucifixão e ressurreição, era raro que mesmo os doze adorassem a Jesus.

Duvidaram. Ver com. de Mt.14:31. Isto não se refere aos onze, os quais estavam então convencidos, mas a outros, entre os 500 crentes reunidos na encosta da montanha, muitos dos quais nunca tinham visto Jesus (DTN, 819).

Mt.28:18 18. Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra.

Toda a autoridade. [A Grande Comissão, Mt.28:18-20 = Mc.16:15-18 = Lc.24:44-49. Comentário principal: Mt]. Do gr. exousia (ver com. de Mt.10:1; Mc.2:10). Jesus exerceu exousia durante todo o Seu ministério terreno (Mt.7:29; Mt.21:23). No entanto, Sua autoridade tinha sido voluntariamente limitada. Nesse momento, Ele retomou toda a autoridade que exercia antes de vir a Terra para assumir as limitações da humanidade (cf. Fp.2:6-8). O sacrifício em favor da raça humana tinha sido concluído. Jesus já tinha entrado em Sua obra mediadora no santuário celestial (ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51; DTN, 819).

Mt.28:19 19. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo

Ide. Os v. 19 e 20 constituem o grande fundamento da missão cristã. No pronome “vós” (subentendido em português), Cristo incluiu todos os crentes até o fim dos tempos (ver DTN, 822; cf. 819). Como discípulos, os onze foram alunos na escola de Cristo. Como apóstolos, eles foram então enviados a ensinar aos outros (ver com. de Mc.3:14; sobre a responsabilidade dos crentes de compartilhar a fé, ver com. de Mt.5:13-16; Lc.24:48). Portanto. Ou seja, tendo em vista o “poder” referido no v. Mt.28:18.

Fazei discípulos de todas as nações. Incluindo judeus e gentios de todas as nações (cf. Rm.1:16; Rm.2:10). Isto retoma a grande promessa de que o evangelho do reino “será pregado em todo o mundo, para testemunho a todas as nações” (ver com. de Mt.24:14). Esta comissão foi muitas vezes chamada de “carta das missões estrangeiras”. O cristianismo foi a primeira religião a assumir um caráter verdadeiramente mundial. As religiões pagãs eram, em grande parte, desprovidas da atividade e do zelo missionário. Tinham um caráter local e cultural e não se propunham a fazer conversões em outras nações. A comissão evangélica elimina eficazmente as fronteiras nacionais, e pessoas de todas as nações se tornam membros de uma grande irmandade em que “não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus” (Cl.3:28; cf. Cl.3:11). O cristianismo desfaz efetivamente todas as barreiras de raça, nacionalidade, sociedade, economia e costumes. O sucesso do cristianismo depende da desarticulação de todas as peculiaridades nacionais, formas de governo, instituições sociais e tudo o que é de caráter puramente local.

Batizando-os. Ver com. de Mt.3:6; Mc.16:16.

Em nome. Isto pode significar tornar as pessoas membros da família do Pai, Filho e Espírito Santo, ou que o batismo é com base na autoridade delegada por Deus Pai, Filho e Espírito Santo.

Pai. Ver com. de Mt.6:9.

Filho. Sobre o título “Filho” aplicado a Cristo, ver com. de Mc.2:10; Lc.1:35; sobre Jesus como o Filho do Homem, ver com. de Mt.1:1; Mc.2:10.

Espírito Santo. Ver com. de Mt.1:18; sobre o ofício e a obra do Espírito Santo, ver Jo.14:16-18; Jo.16:7-14. A natureza do Espírito Santo é um mistério divino, sobre o qual as Escrituras não consideram sábio especular.

Mt.28:20 20. ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século.

Ensinando-os. A aceitação do evangelho de Jesus Cristo envolve a ação da inteligência. Apenas um cristão inteligente pode ser um verdadeiro discípulo. Conceitos do cristianismo que fazem da conversão e da salvação um simples assentimento à fé em Jesus Cristo como salvador, por mais importante que seja, omitem a parte mais importante da comissão evangélica. É essencialmente importante ensinar às pessoas, ao batizá-las, a observar as coisas que Cristo ordenou. Na verdade, a fé em Cristo requer crescimento constante “na graça e no conhecimento do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2Pe.3:18). Sem o exercício das faculdades mentais para entender a vontade revelada de Deus, não pode haver cristianismo verdadeiro, nem crescimento real. A instrução é, portanto, de importância vital antes e depois do batismo. Sem instrução adequada nas grandes verdades vitais do evangelho, não pode haver verdadeira vida religiosa. Ao mesmo tempo, é o maravilhoso amor de Cristo que atrai o coração. Sem genuíno amor a Cristo, as doutrinas e as formas de religião perdem o significado e o valor.

Todas as coisas. Nada deve ser omitido. Não cabe ao ser humano declarar que alguns dos ensinamentos de Cristo estão fora de moda.

Que vos tenho ordenado. Tradições e exigências humanas são de nenhum valor diante de Deus. Qualquer ensinamento sem a autoridade de Cristo não tem lugar na igreja cristã. Jesus fez uma distinção vital entre o “mandamento de Deus” e a “tradição dos homens” (ver com. de Mc.7:7-8; Mc.7:13).

Estou convosco todos os dias. À primeira vista, parece estranho que Jesus fizesse este anúncio, estando prestes a subir ao Céu e a Se afastar fisicamente dos discípulos até o dia da Sua volta em poder e glória. No entanto, pela virtude do dom do Espírito Santo, Jesus estaria mais perto dos crentes em todo o mundo do que seria possível se permanecesse como antes, na Terra (ver Jo.16:7). As Escrituras tornam a presença de Cristo real para cada crente humilde. Através do dom e da orientação do Espírito Santo, cada discípulo do Mestre pode encontrar comunhão com Cristo, como o fizeram os discípulos no passado.

A consumação do século. Ou, “o fim do mundo” (ver com. de Mt.13:39; Mt.24:3). Desde “a fundação do mundo” (Mt.25:34) Jesus tem trabalhado para a salvação de Seu povo e continuará com ele até o fim dos tempos.

Amém (ARC). Ver com. de Mt.5:18. Evidências textuais (cf. p. 136) apoiam a omissão desta palavra.

NOTA ADICIONAL A MATEUS 28

Pelo fato de os evangelhos fornecerem um relato tão conciso dos acontecimentos da manhã da ressurreição e de alguns não mencionarem certos detalhes, é difícil determinar a ordem exata dos acontecimentos no sepulcro. O seguinte arranjo experimental parece estar mais de acordo com todas as informações disponíveis sobre o assunto: 1. Na última hora da noite, pouco antes do amanhecer da manhã de domingo, o corpo de Jesus ainda estava no túmulo (ver DTN, 779; ver mapa, p. 223). 2. Enquanto ainda estava escuro, Maria Madalena iniciou a jornada para o túmulo (Jo.20:1). As outras mulheres deviam estar com ela quando se aproximou do sepulcro (ver DTN, 788). Talvez elas tivessem combinado encontrar Maria no túmulo na hora do nascer do sol (ver Mc.16:2). 3. Enquanto ainda estava escuro (ver DTN, 779, 780), e enquanto as mulheres estavam a caminho do túmulo (ver DTN, 788), “um anjo do Senhor desceu do céu”, “chegou-se, removeu a pedra” (Mt.28:2), e bradou: “Filho de Deus, ressurge, Teu Pai Te chama” (DTN, 780). 4. Quando Cristo e os anjos (ver com. de Mt.28:2) partiram, os soldados romanos, que tinham visto o anjo rolar a pedra, que o ouviram evocar o Filho de Deus e que tinham realmente visto Cristo sair do túmulo, deixaram o sepulcro e foram apressadamente para a cidade com a maior notícia do tempo e da eternidade (v. Mt.28:3-4; Mt.28:11-15; cf. DTN, 780, 781).

5. Maria Madalena chegou ao sepulcro e encontrou a pedra revolvida (Jo.20:1), e se apressou a dizer aos discípulos (Jo.20:2; cf. DTN, 788). 6. As outras mulheres, inclusive Maria, mãe de Tiago, juntamente com Salomé e Joana (ver Mc.16:1; Lc.24:1, Lc.24:10), chegaram ao sepulcro. Elas encontraram, sentado na pedra, o anjo que descera do céu, rolara a pedra da porta do sepulcro e chamara Cristo dentre os mortos (Mt.28:2; cf. DTN, 788). Ao vê-lo, as mulheres se viraram para fugir, mas foram contidas pela mensagem do anjo que lhes falou as palavras dos v. Mt.28:5-7 (cf. Mc.16:6-7; DTN, 789). Entrando no sepulcro, elas encontraram outro anjo sentado na laje de pedra onde o corpo de Jesus estivera (Mc.16:5; cf. Jo.20:12). Ele lhes falou as palavras registradas em Lc.24:5-7 (cf. DTN, 789). 7. Sem resistência, as mulheres deixaram o sepulcro para relatar a ressurreição aos discípulos, como ordenaram os anjos (Mt.28:8-9; Mc.28:11; cf. Mc.16:8; Lc.24:9-10). Os eventos devem ter ocorrido em rápida sucessão, pois quando as mulheres estavam a caminho para encontrar os discípulos, os guardas romanos chegaram à residência dos “principais sacerdotes”, com o seu relatório (Mt.28:11). 8. Nesse ínterim, Maria Madalena encontrou Pedro e João e lhes contou a descoberta do sepulcro vazio (Jo.20:2). Os dois discípulos correram ao sepulcro, e João chegou primeiro (Jo.20:3-4). Pedro e João entraram no sepulcro, mas nenhum deles viu os anjos (Jo.20:5-10; cf. Lc.24:12). Maria os seguiu até o sepulcro e permaneceu ali depois que Pedro e João partiram (Jo.20:11; cf. DTN, 789).

9. Maria se inclinou para olhar dentro do sepulcro e viu dois anjos sentados na laje de pedra onde o corpo de Cristo estivera (Jo.20:11-13; cf. DTN, 789). 10. Levantando-se de sua posição inclinada, Maria ouviu a voz de Jesus, que lhe fez a mesma pergunta anteriormente feita pelos anjos, mas ela não percebeu que era Jesus (Jo.20:14-15). Então Jesus Se revelou a ela, o primeiro ser humano, depois da retirada dos soldados romanos (ver DTN, 790), a vê-Lo ressuscitado (Mc.16:9). A conversa de Jo.20:15-17 ocorreu, e Maria se apressou a comunicar aos discípulos que ela tinha visto o Senhor (Jo.20:18). 11. Depois da partida de Maria, Jesus subiu rapidamente ao Céu para obter a garantia pessoal de que Seu sacrifício fora aceitável, e que o Pai confirmara (aceitara ou aprovara) o pacto celebrado entre Ele e Cristo antes da fundação do mundo (Jo.20:17; cf. DTN, 790). 12. Depois de ascender ao Pai, Jesus apareceu às outras mulheres (DTN, 793), cumprimentando-as com “Salve!” (Mt.28:9, Mt.28:10; ver DTN, 793). Isso ocorreu enquanto essas mulheres estavam a caminho para relatar o acontecido aos discípulos (v. Mt.28:9). Os eventos, portanto, devem ter ocorrido em rápida sucessão. Esta parece ter sido a última aparição ligada aos acontecimentos da manhã da ressurreição, a menos que o aparecimento a Pedro (Lc.24:34; 1Co.15:5) tenha ocorrido logo em seguida ao das mulheres. Deve-se notar que, após a ressurreição, Jesus apareceu apenas a Seus seguidores pessoais (ver Ellen G. White, Material Suplementar sobre 1Co.15:6).

As aparições que tiveram lugar durante o dia da ressurreição foram: 1. A Pedro (Lc.24:34; 1Co.15:5), antes da caminhada a Emaús. 2. Aos dois discípulos no caminho de Emaús, um dos quais era Cleopas (Lc.24:13-32; Mc.16:12). 3. Aos dez discípulos no cenáculo, após o regresso dos dois discípulos de Emaús (Mc.16:14; Lc.24:33-48; Jo.20:19-23; 1Co.15:5). Tomé estava ausente (Jo.20:24-25). Aparições adicionais entre o dia da ressurreição e o da ascensão foram: 1. Aos onze com Tomé presente, no cenáculo, uma semana mais tarde, provavelmente no domingo seguinte (Jo.20:26-29). 2. Logo após o encerramento da semana da Páscoa (DTN, 809, ver Nota Adicional 1 a Mateus 26; Mt.26:75), os discípulos partiram para a Galileia a fim de cumprir o compromisso que Jesus tinha com eles (Mt.28:7; Mc.16:7). As aparições na Galileia ocorreram, em geral, dentro dos limites da sexta-feira, 28 de nisã, e do domingo, 21 de zive, ou Iyar. Esses limites se baseiam no tempo da viagem de/para a Galileia. Os discípulos voltaram a Jerusalém a tempo para a ascensão, em 25 de zive. Eles permaneceram, assim, na Galileia, cerca de três semanas e, durante essas três semanas, Jesus se reuniu com eles duas vezes. A primeira dessas aparições foi a sete dos discípulos quando estavam pescando no lago da Galileia (Jo.21:1-23; ver gráfico 10, p. 230).

3. O aparecimento a cerca de 500 pessoas em uma montanha na Galileia, no lugar e na hora designados por Jesus antes de Sua morte (Mt.28:16; Mc.16:7; 1Co.15:6; DTN, 818). Nessa ocasião, Jesus pronunciou as palavras de Mt.28:17-20 (ver DTN, 819). Os irmãos de Jesus foram convertidos nesse momento (ver Ellen G. White, Material Suplementar sobre At.1:14). 4. Jesus também apareceu a Tiago, não se diz se na Galileia ou em Jerusalém (1Co.15:7). 5. A aparição aos onze em Jerusalém, na quinta-feira, 25 de zive, quando Jesus os levou ao monte das Oliveiras, nos arredores de Belém, e ascendeu ao Céu (Mc.16:19-20; Lc.24:50-52; At.1:4-12). Esta é provavelmente a reunião com os apóstolos mencionada em 1Co.15:7. As sucessivas aparições de Jesus após a ressurreição tinham o propósito de convencer os discípulos e outros crentes da realidade da ressurreição, dar-lhes a oportunidade de se familiarizarem com o Mestre em Seu corpo glorificado, e ainda permitir que Jesus os preparasse para a tarefa de proclamar a boas-novas de salvação para o mundo (ver DTN, 829). Os esforços para impedir a ressurreição e fazer circular um relato falso sobre ela (Mt.27:62-66) serviram apenas para prover uma confirmação adicional da ressurreição como um fato histórico.

Foi a certeza de um Senhor ressuscitado e vivo que atribuiu convicção à mensagem dos apóstolos quando eles saíram para proclamar as boas-novas da salvação. Eles falaram dessa certeza repetidas vezes, em palavras carregadas de poder e inspiradas pelo Espírito Santo (ver At.3:12-21; At.4:8-13, At.4:20; At.5:29-32; 1Co.15:1-23; 1Ts.1:10; 1Ts.1:17; 1Jo.1:1-3). O fato dinâmico da religião cristã é que Seu fundador está “vivo pelos séculos dos séculos” e tem “as chaves da morte e do inferno” (Ap.1:18). A essa verdade transcendente, dão testemunho as muitas aparições após a ressurreição do Senhor. As Escrituras têm certificado esse acontecimento de uma forma que convencerá a todos que estão dispostos a examinar as evidências.