"As coisas encobertas pertencem ao nosso Deus, mas as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que observemos todas as palavras desta lei."
Deuteronômio 29:29

Capítulo e Verso Comentário Adventista > Tiago
Tg.1:1 1. Tiago, servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo, às doze tribos que se encontram na Dispersão, saudações.

Tiago. O fato de o apóstolo se referir a si mesmo de forma simples demonstra que era bem conhecido e não sentia necessidade de dizer nada mais para se identificar. Porém, existe considerável dúvida quanto a qual Tiago da época do NT foi o escritor desta epístola (sobre o significado do nome Tiago, ver com. de Mc.3:17; sobre a autoria desta epístola, ver p. 541-543).

Servo. Do gr. doulos (ver com. de Rm.1:1). Com simplicidade, Tiago se autodenomina “servo”, em vez de “apóstolo”, título que sem dúvida deve ter usado com propriedade. Embora fosse um obreiro respeitado do reino de Cristo na Terra, refere-se a si mesmo apenas como “servo”. Esse é um exemplo digno a todos que possuem responsabilidades na igreja. Não existe honra maior do que ser um servo de Deus.

E do Senhor. Tiago reconhecia que suas credenciais como “servo” o tornavam representante tanto do Filho como do Pai. Embora esta epístola faça frequentes alusões aos ensinos de Cristo, a única referência adicional direta a Ele por nome está no cap. Tg.2:1.

Às doze tribos. Isto é, as doze tribos de Israel (ver Gn.35:22-26; Gn.49:28; At.7:8). As dez tribos do reino do norte foram levadas ao cativeiro em 722 a.C. (2Rs.17:6; 2Rs.17:23). Apenas alguns de seus descendentes retornaram à Palestina (cf. com. de Ed.6:17; Ed.8:35). Contudo, existem algumas evidências de que na época do NT ao menos algumas dessas tribos ainda eram reconhecidas. Por exemplo, Ana era da tribo de Aser (Lc.2:36; ver com. de At.26:7). Contudo, Tiago pode ter usado o termo “doze tribos” num sentido coletivo de judeus em geral, independentemente da procedência. Alguns defendem que Tiago se dirige às doze tribos do Israel espiritual (ver com. de Ap.7:4); outros, que sua carta é dirigida principalmente aos cristãos judeus. Este Comentário apoia o segundo ponto de vista. No entanto, seja qual for a opinião considerada, a instrução espiritual da epístola permanece a mesma. Tiago claramente identifica a si mesmo e a seus leitores como judeus.

Por exemplo, ele se refere a Abraão como “nosso pai” (Tg.2:21) e à “sinagoga” (v. Tg.2:2) como o lugar onde os judeus costumavam realizar reuniões religiosas (ver vol. 5, p. 32, 33). Mas o escritor e os leitores aos quais a epístola foi dirigida originalmente também eram cristãos, conforme evidenciam as repetidas referências a Jesus Cristo como “Senhor” (ver Tg.1:1; Tg.1:7; Tg.1:12; Tg.2:1; Tg.5:7; Tg.5:11). Assim, ao escrever para as “doze tribos” na dispersão, Tiago se dirige a cristãos de origem judaica que viviam em todas as partes do mundo romano (cf. 1Pe.1:1). Não existe razão para se pensar que ele tenha se dirigido a judeus não convertidos, ou que antevisse que a carta seria necessariamente lida por membros de todas as doze tribos de Israel. Deve-se lembrar de que, em geral, os cristãos hebreus dos tempos apostólicos se consideravam judeus piedosos, que eles permaneceram leais em certo sentido ao judaísmo, e em vários níveis esperavam que, por meio de Jesus Cristo, seriam cumpridas todas as promessas feitas a Israel pelos antigos profetas (cf. At.1:6).

Poucos deles compreendiam que Israel como nação tinha perdido, em benefício da igreja cristã, o mandato divino de ser o povo escolhido de Deus (ver vol. 4, p. 21, 22). A menção das “doze tribos” relembraria esses cristãos judeus do início de sua história como nação e inspiraria a esperança de que, em Cristo, poderiam em breve ter a rica herança prometida aos seus pais (ver vol. 4, p. 13-17). Mesmo Paulo, o apóstolo dos gentios, emprega o termo “doze tribos” (ver At.26:7; Mt.19:28; cf. com. de Rm.11:25-26).

Na dispersão. Cf. 1Pe.1:1. Faz-se referência específica à dispersão dos judeus entre as outras nações na época de Ester (Et.3:8) e no Pentecostes (At.2:5; At.2:9-11; ver, no vol. 6, mapa p. 124; sobre os judeus da diáspora, ver vol. 5, p. 47, 48). O propósito original de Deus era que os judeus fossem missionários para o mundo todo. Embora Israel tenha falhado em cumprir esse plano, tal como era originalmente, o efeito dos dois cativeiros cumpriria em parte esse propósito (ver vol. 4, p. 14-19).

Saudações. Do gr. chairo, “regozijar-se” (comparar com o emprego de chairo em Lc.1:28; ver também com. de Rm.1:7). A palavra era usada também ao se despedir, no sentido de “que a alegria esteja convosco” (comparar com a saudação hebraica, ver com. de Je.6:14). Essa forma de saudação não ocorre em outras passagens das epístolas. Seu emprego em At.15:23 é uma das poucas peculiaridades de estilo que sugerem uma possível identificação do autor desta epístola com o Tiago da última parte do livro de Atos (ver p. 541-544).

Tg.1:2 2. Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações,

Meus irmãos. Desde o início, o apóstolo expressa o espírito de irmandade que o une a seus leitores. Essa afeição revelava a natureza construtiva de suas admoestações acerca de problemas do cotidiano. Tiago usa essa forma de tratamento 15 vezes, ou uma vez a cada sete versículos, num aparente esforço de enfatizar o elo entre seu coração e o deles na irmandade cristã.

Tende por motivo. Ou, “considerem”, “estimem”, “pensem”. É privilégio e dever do cristão considerar com inteligência as provas e dificuldades que o assolam. Ele precisa estudar e entender o desígnio de Deus ao permiti-las (ver com. de Jó.42:5; SI.38:3; Sl.39:9; Mt.6:13; Rm.8:28).

Toda alegria. Isto é, alegria pura. Para o cristão maduro, as provas e dificuldades da vida não provocam desilusões nem desencorajamento. O cristão suporta tudo com fé e esperança “como quem vê aquele que é invisível” (Hb.11:27). A alegria e a coragem do cristão se baseiam na fé na providência soberana de Deus e na compreensão inteligente de Seu trato com a humanidade, não em circunstâncias externas, que podem com frequência ser sumamente desagradáveis. Filosofias humanas, religiosas ou seculares talvez preparem o ser humano para enfrentar os problemas de forma filosófica, com um espírito calmo e paciente, mas o cristianismo ensina as pessoas a serem felizes sob essas circunstâncias, por meio da compreensão inteligente das causas do sofrimento e da fé em Deus.

Quando cairdes (ARC). A palavra “quando” mostra que o cristão terá provações periódicas. A palavra “cairdes” não necessariamente reflete declínio espiritual. “Cairdes em |...] tentações” significa simplesmente enfrentá-las (cf. Lc.10:30; At.27:41). É comum que tais situações não sejam esperadas, buscadas nem bem-vindas. Além disso, as provações às quais Tiago se refere constituem grandes obstáculos que podem facilmente derrotar a pessoa cuja mente não está firme em Deus (ver com. de Is.26:3-4).

Várias. Muitas são as provações às quais a humanidade está sujeita, principalmente os cristãos.

Tentações (ARC). Do gr. peirasmoi, “testes”, “dificuldades”, “aflições”, “problemas”, “induções [ao pecado]” (ver com. de Mt.6:13; Mt.4:1). A palavra peirasmoi engloba muito mais do que o sentido de “tentações”. Inclui aflições como enfermidade, perseguição, pobreza e calamidade. “Provações” (ARA), quer causadas diretamente por Satanás para tentar o ser humano a pecar, ou apenas para perturbá-lo, são sempre uma prova para a experiência cristã. Com frequência, até os cristãos mais sinceros não conseguem entender o papel do sofrimento e da tentação na formação do caráter, e, como resultado, não só deixam de se beneficiar com essas experiências como deveriam, mas tornam seu caminho mais difícil e perdem a comunhão com Deus. Não há experiência na vida, não importando quão amarga ou desanimadora, que não possa contribuir para o crescimento cristão. Na providência divina e pela graça de Cristo, as dificuldades podem nos levar para mais perto de Deus e enriquecer nosso entendimento de Seu amor por nós. Paulo é o exemplo clássico do NT de como um cristão pode transformar cada derrota em vitória (ver com. de 2Co.2:14; 2Co.4:8-11; 2Co.12:7-10; SI.38:3).

Tg.1:3 3. sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança.

Sabendo. O v. 3 declara o motivo da alegria mencionada no v. Tg.1:2. Tiago relembra a seus leitores que a alegria em meio às aflições só pode ser experimentada pela pessoa que as enfrenta com uma firme mentalidade cristã.

Provação. Do gr. dokimion, “probante”, “que testa”. Esta palavra se refere não apenas à provação da fé cristã, mas mais precisamente ao atributo de fé que a torna vitoriosa sobre os problemas da vida. Os papiros (ver vol. 5, p. 91, 92) usam esta palavra para descrever o “ouro genuíno”, isto é, o ouro que passa por uma prova e é tido por genuíno. A frase “a provação da vossa fé” pode assim descrever a fé que é provada.

Fé. Do gr. pistis, “fé”, “convicção”, “crença”, “confiança”. Tiago fala da fé vitoriosa que com êxito enfrenta os diversos problemas da vida ou as “várias tentações”. Cada conflito com a “provação” fortalece a fé de um cristão vitorioso. Assim como um veterano de muitas batalhas que aprendeu a enfrentar o perigo habitual com coragem é mais digno de confiança do que um recruta inexperiente, o cristão vitorioso está mais preparado para as provas futuras do que o cristão cuja fé não é provada. Essa fé é a convicção inabalável de que Jesus Cristo tem um plano de vida satisfatório para cada um e que provê solução para cada prova. A pessoa de fé acredita que nada nem ninguém pode frustrar o plano que Deus tem para a felicidade de Seus filhos.

Paciência (ARC). Do gr. hupomone, “firmeza”, “constância”, “perseverança” (ARA; ver com. de Rm.5:3). Esse poder de perseverar é o resultado da fé que foi provada e triunfou. Com frequência, a palavra “paciência” sugere mera submissão. Porém, hupomone enfatiza o poder ativo e permanente que torna o ser humano vitorioso sobre as “várias tentações” (ver Lc.8:15; Rm.2:7; Hb.10:36; Ap.14:12). Essa qualidade positiva do caráter é necessária a todos que enfrentam grandes adversidades, sejam de natureza pessoal ou as que envolvem o avanço na causa de Deus. Pela fé, cremos que Deus trabalha conosco, e essa convicção desenvolve uma firme perseverança que não se submete à derrota.

Tg.1:4 4. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes.

Ter. Adquirir perseverança paciente é na verdade o processo de desenvolver um caráter semelhante ao de Cristo. Para obter uma perseverança ativa, que em si é produto da fé sólida, não devemos limitar nem enfraquecer nosso poder de perseverar devido a murmurações, reclamações ou rebeldia (ver Is.26:3).

Ação completa. Ou, “obra perfeita” (AA, ACF; ver com. de Mt.5:48). O significado pode ser expresso melhor assim: “Que a perseverança prossiga firme sua obra até que a tenha terminado” (comparar com Jo.17:4, em que Jesus fala de Sua tarefa designada, “consumando a obra”).

Perfeitos e íntegros. Não deve faltar nenhum traço de caráter desejável. Cada um deve ser desenvolvido até a perfeição. Essas duas palavras juntas sugerem o mais completo desenvolvimento possível de uma vida semelhante à de Cristo. A perseverança constante nos ajuda a cumprir essa tarefa de reproduzir o caráter de Cristo, que é a “obra” que Deus nos deu a fazer.

Em nada deficientes. Isto é, nada faltando.

Tg.1:5 5. Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida.

Se, porém, algum de vós. Provavelmente, com base na sua experiência espiritual, Tiago percebe que seus companheiros crentes ainda não tinham atingido o objetivo desejado de maturidade cristã descrita no v. Tg.1:4. Ele explica como é possível encontrar o poder e a compreensão que os tornam cristãos vitoriosos em meio aos problemas da vida.

Necessita. Do gr. leipo, “não tem o suficiente” (comparar com o emprego da palavra em Lc.18:22).

Sabedoria. Do gr. sophia, “inteligência plena” (ver com. de Lc.2:52; 1Co.1:17). Isso inclui mais do que o conhecimento verdadeiro, pois só o conhecimento não garante a atitude correta nem conclusões acertadas. A sabedoria ajuda a atribuir o valor correto a tudo o que compete por nossa atenção e garante o uso adequado do conhecimento ao buscarmos a atitude certa.

Peça-a. Deve-se buscar sabedoria constantemente, a fim de se ter êxito em todo teste de fé e perseverança, como observado nos v. Tg.1:3-4. Muitos problemas da vida frustram quem não consegue enfrentá-los a partir da perspectiva cristã. Para enxergar a vida como Deus quer que a vejamos é preciso nos assegurar diariamente de que nossos olhos foram ungidos com o azeite da sabedoria divina (ver com. de Mt.7:11; Lc.18:1-18).

Deus, que a todos dá. O AT com frequência se refere a essa sabedoria que apenas Deus pode dar (ver Pv.2:6). Por meio de Sua Palavra Sagrada, Ele nos encoraja em meio a provas atemorizantes e difíceis; e, devido ao ponto de vista celestial que essa sabedoria traz, é que podemos ter “por motivo de toda alegria” o passarmos por problemas. Nosso Deus é generoso, justo e amoroso. O Salmo Sl.145:17-19 sugere que, por ser justo, o Senhor está sempre pronto a atender o desejo dos que O temem. Deus é generoso por natureza (ver com. de Jo.3:16), e O honramos ao buscarmos com humildade Seus dons de sabedoria e força a cada dia.

Liberalmente. Ou, “generosamente”, “sinceramente”. Deus fica feliz ao prover. Quando alguém busca sabedoria, Deus atende ao pedido sem hesitar ou relutar. Não é mesquinho nem parcial.

E nada lhes impropera. Ou, “não reprova”. Deus não nos censura por nossas muitas falhas, nem nos relembra continuamente dos muitos favores que já nos concedeu. Tiago busca enfatizar o contraste entre o modo como Deus concede Suas dádivas e como o ser humano com frequência humilha ou insulta quem recebe seus favores. Esse fato deve nos encorajar a tornar conhecidos nossos pedidos a Deus. Devemos ir até Ele como crianças que buscam o amor e a ajuda de um Pai solícito (ver Hb.4:16; Mt.7:11).

Ser-lhe-á concedida. O requisito para receber sabedoria de Deus é sinceridade. Para o bem do ser humano, Deus não concede todo pedido, mas se buscarmos sabedoria com sinceridade, ela nos será concedida. Há muitas formas de Deus dar sabedoria aos seres humanos. Ele pode aumentar nossa compreensão de Sua Palavra, de modo que possamos discernir com clareza Sua vontade; pode impressionar nosso coração por meio de Seu Espírito Santo quanto à melhor decisão a tomar (ver Is.30:21). Ele pode falar conosco por meio de amigos, ou dirigir os eventos e circunstâncias de forma tal a nos revelar Sua vontade. Contudo, Deus nos deu inteligência, e Ele é honrado quando a empregamos para solucionar problemas sob a direção do Espírito Santo. Não seria sábio que fizesse por nós o que deseja que façamos por nós mesmos sob Sua direção.

A fim de que aprendamos a exercitar a maturidade de juízo e entendimento (ver Fp.1:9), Ele nos proporciona a oportunidade de criarmos o hábito de tomar decisões certas com base nos princípios amplos de Sua vontade revelada nas Escrituras. Então, poderá impressionar melhor nossa mente com Sua vontade e nos proteger dos enganos sutis de Satanás. Após termos consultado toda fonte disponível de sabedoria divina, fazermos nosso pedido e, com paciência e confiança, abrirmos o coração a Ele, reconheceremos Sua resposta (ver Mt.7:7).

Tg.1:6 6. Peça-a, porém, com fé, em nada duvidando; pois o que duvida é semelhante à onda do mar, impelida e agitada pelo vento.

Com fé. Isto é, fé que Deus atenderá ao pedido. A oração sem fé é inútil. Quando pedimos sabedoria devemos confiar que a receberemos (ver v. Tg.1:5). Devemos ir até a verdadeira fonte de bênçãos com a atitude correta. Devemos nos aproximar de nosso Pai, confiantes no Seu poder e em Sua disposição de nos ajudar, aguardando na certeza de Suas promessas e apresentando a Ele nossas necessidades, não nossos méritos. “A fé é a confiança em Deus, ou seja, a crença de que Ele nos ama e conhece perfeitamente o que é para o nosso bem” (Ed, 253).

Nada duvidando. Quem pede “com fé” não hesita, como quem não está seguro se Deus atenderá ou não seu pedido. A fé genuína confia em Deus, e o crente descansará na certeza de que suas necessidades serão supridas rapidamente, visto que Deus tudo sabe. Porém, se alguém duvida que Deus ouve seu pedido, sua oração corre o risco de não ser atendida. Deus quer que o ser humano coopere com Ele para atender a seu pedido, e essa cooperação estará em falta se houver incerteza. A fé genuína está acima da prova do tempo ou da circunstância, fazendo com que nossa fidelidade a Deus seja firme e de propósito imutável (PJ, 147). Esse estado de divisão e incerteza mental é descrito no v. Tg.1:8 como “ânimo dobre”.

O que duvida. Tiago não fala de dúvidas intelectuais, mas de instabilidade espiritual. Quem duvida pode estar inseguro, não apenas sobre se Deus responde ou não ao seu pedido, mas se Ele requererá mais sacrifício de sua parte do que está disposto a fazer. Ele tem reservas mentais, e seus pensamentos são egocêntricos. Não deseja com toda sua alma a graça que seus lábios pedem.

Semelhante à onda. Quando a mente está cheia de incerteza e dúvida, a pessoa fica tão inquieta e agitada quanto o oceano. Por outro lado, quem está convencido da prontidão divina em cuidar de suas necessidades e submete sem reservas sua vida à vontade de Deus está acima de suas provas e aflições (comparar com Is.57:20).

Impelida e agitada pelo vento. A onda não tem vontade própria; está totalmente sujeita à força do vento. Sobe e desce à medida que o vento a impulsiona. O vento, neste caso, representa as circunstâncias que podem fazer com que o cristão duvide.

Tg.1:7 7. Não suponha esse homem que alcançará do Senhor alguma coisa;

Não suponha [...] que alcançará. Tiago diz ao vacilante que não espere resposta. A indecisão é suficiente para arruinar o bondoso propósito divino para o vacilante, pois, se Deus considerasse melhor negar seu pedido, a desilusão apenas fortaleceria sua dúvida.

Esse homem. Esta expressão é enfática e um pouco desdenhosa. Ela representa a pessoa cuja fidelidade vacila, que não está certa das coisas de que necessita ou da suficiência divina para satisfazê-las. Essa pessoa pode orar, mas, visto que não tem fé genuína, sua mente não está em condições de obter uma resposta positiva (ver com. de Jo.4:48). Deus pode demorar para atender nossos pedidos, até que estejamos prontos para exercer uma fé inabalável.

Do Senhor alguma coisa. Isto se refere a favores específicos, pois todos recebem as bênçãos temporais que Deus concede dia a dia (ver com. Mt.5:45). As bênçãos especiais, que estariam disponíveis se pedissem com fé, são-lhes negadas por causa da confiança vacilante. Contudo, não devemos supor que Deus demora em responder até que tenhamos obtido o direito de ter a resposta a nossas orações. Ninguém merece favores de Deus. Nosso único argumento é nossa necessidade. Nossa única esperança está na Sua misericórdia, que faz com que dê a todos liberalmente (v. Tg.1:5). Mas Deus não concede dons de forma indiscriminada. Ele não pode atender pedidos que alimentariam o orgulho e o egoísmo e dificultariam o desenvolvimento do caráter. Devemos ter consciência de nossa impotência e da necessidade de confiança imutável nas promessas de Deus. Força de caráter é o resultado de modificar nossos desejos e nossas aspirações para harmonizá-los à sabedoria e vontade divinas, não de tentar mudar a vontade divina para se adaptar à nossa.

Tg.1:8 8. homem de ânimo dobre, inconstante em todos os seus caminhos.

Ânimo dobre. Do gr. dipsuchos, literalmente “duas almas”. Essa palavra descreve bem o vacilante do v. Tg.1:6. Sua mente está dividida entre a sedução dos prazeres terrenos e a vontade de ser totalmente fiel a Deus. Na obra O Peregrino, John Bunyan caracterizou esse tipo de pessoa como o senhor Duas Caras. A pessoa de “ânimo dobre” possui duas “almas”, ou seja, sua lealdade tem dupla motivação (comparar com a expressão hebraica “ânimo resoluto”, ver 1Cr.12:33). Sem dúvida, Tiago tinha em mente as palavras de Cristo no Sermão do Monte: “Ninguém pode servir a dois senhores” (Mt.6:24). A pessoa de “ânimo dobre” vacila entre crer e não crer, ao passo que o indivíduo com unidade de propósito de modo algum hesita. Este versículo, na verdade, complementa o anterior, e os dois poderiam ser traduzidos assim: “Não suponha esse homem [o vacilante] que alguém de ânimo dobre, instável em todos os seus caminhos, receberá do Senhor alguma coisa”.

Inconstante. Do gr. akatastatos, “inconstante”, “agitado”, “instável”. A forma substantivada de akatastatos é comumente empregada no sentido de “desordem”, “confusão”, “agitação”, “instabilidade”, e tem a ver com “guerras”, o oposto de “paz” (ver Lc.21:9; 1Co.14:33; 2Co.6:5; 2Co.12:20).

Em todos os seus caminhos. Enquanto a instabilidade mencionada no v. Tg.1:6 se refere, em específico, à oração, o apóstolo aproveita a oportunidade para enfatizar que tal pessoa é instável em outros aspectos de sua vida. Todos os seus “caminhos”, ou hábitos, ações e pensamentos refletirão seu duplo propósito na vida, e sua experiência religiosa nunca será satisfatória, nem para si mesmo, nem para Deus. A perturbação mental e a confusão em todas as questões da vida são consequência natural de uma confiança instável em Deus. Precisamos de sabedoria para discernir o caminho para viver dia a dia, pois não é sábio alternar entre confiar em si mesmo e confiar em Deus. A unidade de propósito é essencial ao êxito espiritual do cristão.

Tg.1:9 9. O irmão, porém, de condição humilde glorie-se na sua dignidade,

Irmão. Deixando de lado a consideração das provas em geral, Tiago passa a falar de duas provas em particular: pobreza e riqueza. Ao introduzir esse assunto delicado, Tiago repete (v. Tg.1:2) o termo afetuoso “irmão”, a fim de enfatizar o laço comum de irmandade que une ricos e pobres na fraternidade cristã. Não se deve permitir que riqueza ou pobreza prejudiquem essa relação entre cristãos.

De condição humilde. Do gr. tapeinos, “em circunstâncias humildes”, de baixa hierarquia e, portanto, numa condição de dependência ou de pobreza. Esta frase está em contraste com “o rico” do v. Tg.1:10. Essa condição de dificuldade econômica é uma prova que muitos enfrentam. Talvez muitos membros da igreja na época de Tiago se considerassem desprezados e oprimidos, devido à falta de bens materiais, muito embora a aceitação da fé cristã pudesse ser a causa, ao menos em parte, dessa condição. Essas circunstâncias eram uma prova no sentido de que testavam a fé e a lealdade a Deus. O irmão “de condição humilde” é sempre tentado a ter inveja e ressentimento de seu irmão “rico”. O irmão “rico” tende a se considerar superior ao irmão “de condição humilde” e a tirar vantagem dele.

Glorie-se. Literalmente, “jactar-se”. Tiago faz uma aplicação prática da advertência geral apresentada no v. Tg.1:2. Com a “sabedoria” (v. Tg.1:5) que Deus nos dá podemos ver a vida numa perspectiva adequada. Podemos ver as coisas temporais à luz da eternidade. A “sabedoria” atribui o devido valor às posses terrenas e sinaliza que a natureza moral do ser humano é mais importante que suas posses. Portanto, o progresso que alguém faz espiritualmente é muito mais importante do que o progresso econômico. A atitude de “gloriar-se” consiste na percepção de que, a despeito da falta de posses terrenas, Deus compensa o cristão humilde muito além das alegrias que as posses materiais transitórias podem dar.

Na sua dignidade. Ou, “em sua alta condição”. A exaltação do irmão mais pobre deve consistir nas bênçãos espirituais que recebe no presente e também nas promessas de alegria a serem cumpridas na eternidade, que compensam em muito suas dificuldades econômicas na Terra. Tiago tenta comparar as riquezas abundantes das misericórdias de Deus com a natureza transitória das posses terrenas (ver 1Jo.2:16-17). Há mais segurança na experiência de um cristão maduro do que em toda a riqueza do mundo. Aqueles que aprendem a ver os problemas da vida a partir do ponto de vista divino, que adquirem a “sabedoria” da qual Tiago fala (v. Tg.1:5), estão acima de qualquer dificuldade que possa lhes sobrevir.

Tg.1:10 10. e o rico, na sua insignificância, porque ele passará como a flor da erva.

O rico. Isto é, o irmão rico, em contraste com o “irmão” pobre do v. Tg.1:9. Tiago encoraja o cristão abastado a se regozijar nas provas particulares que o confrontam. A Bíblia não insinua que possuir riquezas seja pecado, ou que um rico não pode ser um seguidor genuíno de Deus (ver com. de Mt.19:23). Existem muitos exemplos de bons cristãos que são ricos materialmente, embora não muitos, em comparação com os pobres. Porém, as Escrituras enfatizam claramente que as riquezas constituem um constante perigo para uma experiência cristã de êxito (ver com. de Mt.6:19-21; Lc.12:13-22).

Na sua insignificância. Ou “na sua humilhação”. Alguns comentaristas consideram esta frase um estreito paralelo da frase “na sua dignidade” (v. Tg.1:9). Assim, o pobre deve se alegrar com seus privilégios cristãos, tanto os presentes quanto os futuros, e o rico, na humildade cristã e no menosprezo do mundo, em vez de em suas posses materiais. Em outras palavras, o rico deve se regozijar com o fato de que, embora seja desprezado como um membro de uma seita perseguida, um dia será exaltado como membro do reino eterno de Deus. Tiago enfatiza, nos v. Tg.1:9 e 10, o fato de que, a despeito das condições materiais, o cristão, pobre ou rico, terá os melhores motivos de regozijo nos privilégios da fé cristã. Outros pensam que Tiago trata da perda de bens, algo comum para um rico que abraçava o cristianismo no primeiro século. O rico convertido encontrava muitas oportunidades de usar sua riqueza.

A condição de outros membros da igreja que perdiam a fonte de sustento por causa de sua fé dava-lhes a oportunidade de compartilhar suas posses. O avanço missionário dos apóstolos, que foi fenomenal, mesmo quando comparado com os tempos atuais, requeria apoio financeiro, e os membros ricos da igreja respondiam a esse desafio. Sem dúvida, havia muitos que utilizavam sua riqueza para o benefício de seus irmãos (cf. AA, 105). Consequentemente, o cristão rico via suas posses materiais diminuírem, mas podia se alegrar pelo privilégio de empregar seus meios para o avanço da causa de Cristo, mesmo que significasse perda de segurança temporal e um padrão de vida mais humilde. Esse senso de mordomia da parte dos primeiros cristãos com respeito aos fundos confiados a eles por Deus é um exemplo digno para os membros da igreja hoje que são abençoados com abundância material.

Ele passará. O apóstolo recorda ao rico que ele finalmente morrerá. Nessa ocasião, todas as posses materiais, pelas quais trabalhou tanto para reunir, passarão a outra pessoa. O cristão rico vê essa situação na perspectiva correta e se regozija com a oportunidade de gastar suas riquezas antes de morrer (ver com. do v. 10), mesmo que, ao fazê-lo, experimente dificuldades econômicas e desprezo. As riquezas atraem, mas, como a flor, também são frágeis e transitórias, e o ser humano que confia apenas nas suas riquezas um dia perecerá junto com elas, sem assegurar a maior de todas: a vida eterna. Assim, o irmão que possui riquezas precisa refletir nas passagens das Escrituras que advertem contra pôr a confiança nas riquezas, que podem facilmente desaparecer (ver com. de Mt.6:19; Lc.12:16-21). O cristão deve fixar os olhos da fé na riqueza e nos privilégios cristãos nesta vida e nas riquezas da eternidade (ver com. de Mt.19:29).

Como a flor da erva. Tiago usa uma ilustração do AT (ver Is.40:6) para enfatizar a natureza transitória da vida humana (comparar com Is.51:12, que declara que o “filho do homem [...] não passa de erva”).

Tg.1:11 11. Porque o sol se levanta com seu ardente calor, e a erva seca, e a sua flor cai, e desaparece a formosura do seu aspecto; assim também se murchará o rico em seus caminhos.

O sol se levanta. Tiago amplia sua parábola da flor (v. Tg.1:10), que tem apenas uma breve existência (cf. Mt.13:6; Mt.13:21).

A formosura do seu aspecto. Ou, “a beleza de sua aparência”, literalmente, “a beleza de sua face”. A formosura desaparece quando a flor murcha e morre. Quando o rico é comparado a uma flor, sua “formosura” ou “beleza” consiste naquilo que sua riqueza pode comprar e que os pobres não podem adquirir. Pode ser uma casa bonita, bons móveis, roupas caras, enfeites de pedras ou metais preciosos ou qualquer coisa que acrescente à chamativa ostentação de sua aparência. Tudo isso desaparece em tempos de crise econômica ou em face da morte, assim como a beleza da flor tem curta duração.

Assim também se murchará o rico. Tiago reforça a advertência de Cristo sobre tesouros terrenos, que “a traça e a ferrugem corroem e que “ladrões escavam e roubam” (ver com. de Mt.6:19-21). Relembra ao cristão rico que tesouros terrenos podem se perder antes da morte e, ainda que os tenha por toda a vida, serão completamente inúteis, em face da morte. A única razão segura para o cristão rico se alegrar é na segurança que encontra na comunhão com Jesus Cristo, pois essa é a única posse que não se perderá.

Tg.1:12 12. Bem-aventurado o homem que suporta, com perseverança, a provação; porque, depois de ter sido aprovado, receberá a coroa da vida, a qual o Senhor prometeu aos que o amam.

Bem-aventurado. Do gr. makarios (ver com. de Mt.5:3). Tiago menciona os ensinos de Jesus com frequência (ver p. 544), neste caso, talvez, os do Sermão do Monte. Nesta passagem, parece ampliar o tom enfático dos v. Tg.1:2; Tg.1:9-10. A pessoa que enfrenta os problemas da vida pode, às vezes, se considerar infeliz e também ser considerada pelos outros assim. No entanto, o apóstolo deseja corrigir esse ponto de vista com uma nova perspectiva que abrange os resultados de uma perseverança fiel, bem como uma visão clara de como as dificuldades começam (ver v. Tg.1:14).

Suporta. Do gr. hupomeno, “suportar com firmeza” (ver com. do v. Tg.1:3).

Provação. Do gr. peirasmos, “prova” (ver com. do v. Tg.1:2), indicando qualquer coisa que tente ou prove a fé ou o caráter. Peirasmos inclui aflições como doença, pobreza ou calamidade, bem como insinuações diretas ao pecado. Este versículo enfatiza a bênção que há na firme perseverança, que mantém o indivíduo ileso ao passar pelas provações.

Aprovado. Literalmente, “tornar-se aprovado” [dokimos, ver com. do v. Tg.1:3]. O cristão tentado não só foi provado, mas saiu vitorioso da provação. O cristão fiel pode ser comparado ao ouro genuíno que permanece depois que a escória foi queimada (cf. Jó.23:10).

Coroa da vida. Isto é, a coroa que é a vida, ou que consiste de vida (ver com. de Ap.2:10). A recompensa pela perseverança fiel em meio às provações e dificuldades será a vida eterna. Esse dom (ver Rm.6:23) é a coroa de todos os dons. Conquanto seja certo que a vida eterna começa quando a pessoa permite que o Espírito Santo a guie, a “coroa da vida” será dada a todos os remidos ao mesmo tempo, no segundo advento de Cristo (ver com. de Jo.3:16; Jo.11:25; 2Tm.4:8; 1Jo.5:11-12).

Senhor. As evidências textuais (cf. p. xvi) favorecem a omissão desta palavra, embora o contexto deixe claro que é Deus quem promete. Nosso Senhor pessoalmente promete o dom da vida eterna a todos que escolhem aceitar o plano divino da redenção (ver com. de Jo.3:16).

Aos que O amam. O requisito para a vida eterna é claramente revelado ao ser humano. Fé em Deus (ver Rm.3:28; Rm.4:5; Rm.4:13) e amor a Ele são duas características estreitamente relacionadas que formam a base da resposta sincera à oferta divina de salvação. Não podemos amar a Deus a menos que estejamos dispostos a confiar nEle plenamente e crer que Seu caminho é o melhor para nós.

Tg.1:13 13. Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta.

Ninguém [...] diga. A ideia de que os deuses eram responsáveis pelas tentações do ser humano e pelos seus pecados prevalecia em especial entre os gregos da época de Tiago e, aparentemente, também permeava a mentalidade dos cristãos. Foi esse tipo de acusação que nossos primeiros pais fizeram contra Deus depois de terem pecado (Gn.3:12-13). Adão culpou a Deus por criar Eva como esposa, e Eva culpou a Deus por ter colocado a serpente no jardim do Éden. A advertência de Tiago é oportuna em todos os tempos, a fim de que ninguém acuse o Criador, indireta ou inconscientemente, de criar as insinuações ao pecado que o ser humano enfrenta dia após dia.

Tentado. Do gr. peirazo, “tentar”, “provar”, usado neste caso no mau sentido de induzir ao pecado (ver com. dos v. Tg.1:2-3). Tiago deixa claro que jamais se deve entender que os sofrimentos, provas e problemas que todo cristão enfrenta são permitidos por Deus com o propósito de levá-lo a pecar. Deus permite que o ser humano enfrente provas, mas nunca com a intenção de que caia em pecado. O propósito divino é como o do refinador, que lança o minério no crisol, com a esperança de que resulte num metal mais puro, e não com a intenção de obter escória. Satanás lança suas tentações com o objetivo de derrotar, e nunca de fortalecer o caráter humano (ver com. de Mt.4:1). “O sofrimento é infligido por Satanás, mas Deus predomina sobre ele para fins misericordiosos” (DTN, 471).

Deus não pode ser tentado. Do gr. apeirastos. Tiago mostra ser inconcebível que Deus tente o ser humano a pecar, Ele não tem nenhuma intenção de tentar o ser humano a fazer o que é mau. Embora Deus conceda a todos o poder do livre-arbítrio, não deve ser responsabilizado pelas más ações que essa liberdade possibilita cometer. Tiago categoricamente nega que Deus seja a fonte de qualquer insinuação para o pecador.

Tg.1:14 14. Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz.

Cada um é tentado. Se Deus não é a fonte da tentação, surge a pergunta inevitável: “Quem ou o que é a fonte?” O apóstolo enfatiza que a fonte do pecado não está fora do ser humano, mas dentro dele.

Cobiça. Do gr. epithumia, “desejo”, “anelo”, “anseio” (ver com. de Mc.4:19). A fonte de toda tentação é a “cobiça” do próprio ser humano pelo que é mau. Cada pessoa tem seus anseios particulares, originados de seu próprio temperamento e de suas experiências. Porém, o fato de existir essa cobiça interna não nega a existência e a atividade de um tentador externo que busca tomar vantagem de nossas tendências fracas (cf. Jo.14:30; ver com. de Mt.4:1-3). Satanás e suas hostes malignas são os agentes da tentação (ver Ef.6:12; 1Ts.3:5). Embora tentem o ser humano ao erro, suas tentações não teriam êxito se não existisse no ser humano um desejo de responder a essa sedução. “Nenhum homem pode ser forçado a transgredir. É preciso primeiro obter seu próprio consentimento; a pessoa tem de se propor a praticar o ato pecaminoso, antes de a paixão poder dominar a razão, ou a iniquidade triunfar sobre a consciência” (MJ, 67). A natureza da tentação, assim definida, remove qualquer possibilidade de que seja Deus quem decreta as tentações do ser humano, ou que Satanás é de fato responsável por nossas quedas morais. O ser humano cai diante da tentação devido ao desejo de satisfazer um anseio particular que é contrário à vontade de Deus.

Quando esta o atrai. A cobiça do ser humano o arrasta ou o seduz. “O vício é um monstro de semblante tão horrível; Que basta vê-lo para odiá-lo; Porém, se é visto com frequência, e se torna familiar, Primeiro, o toleramos, depois nos compadecemos dele, e por fim o abraçamos” (Alexander Pope, Essay on Man, Epístola 11, linha 217).

Seduz. Do gr. deleazo, “atrair com isca”, “seduzir”. Assim como um peixe é atraído ao seu destino pela isca no anzol, os seres humanos são induzidos a cair em pecado pela isca dos enganos e lisonjas do pecado. A força e o poder do pecado não poderiam prevalecer se não fosse por sua astúcia e sedução. Esse fato fica evidente quando relembramos a triste história de homens e mulheres pecadores, começando com Adão e Eva e estendendo-se até os nossos dias (ver com. de Gn.3:1-6).

Tg.1:15 15. Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte.

Então. Isto é, o próximo passo.

Cobiça. Ou, concupiscência. Cobiça ou desejo não são necessariamente pecado. Existem desejos naturais e legítimos que Deus colocou no ser humano ao criá-lo, tal como o desejo por alimento, por bem-estar físico, de paternidade e aceitação social. Porém, quando a pessoa busca satisfazer até mesmo esses anelos básicos de formas contrárias ao plano divino, ela flerta com o pecado e se permite ser induzida a pecar (ver com. de Mt.4:1-4).

Concebido. Se nutrido e acariciado, o desejo desenfreado finalmente resulta em atos pecaminosos.

Dá à luz. Do gr. tikto “produz”.

Pecado. Eis a prova de que, quando se permite que o desejo mau (“cobiça”) controle a mente, o resultado só pode ser o pecado.

Consumado. Ou, “completado”, “maduro”. Antes de ser totalmente desenvolvido, o pecado pode, devido á sua natureza enganosa, ser facilmente confundido com algo bom. Mas, quando está “consumado” ou “amadurecido”, seus resultados destrutivos se evidenciam.

Morte. O pecado destrói amizades, círculos familiares, futuros promissores e o respeito próprio. Não importa quão sutil seja a camuflagem, o resultado inevitável do pecado é a deterioração e a morte (ver com. de Rm.6:23), tanto espiritual como física. A “morte” mencionada nesta passagem não é meramente a primeira morte, que é o fim comum a todos (ver com. de Rm.5:12; 1Co.15:22), mas a segunda morte, o aniquilamento (ver com. de Ap.20:6). Deus é o autor da vida, não da morte. Assim sendo, Ele não é o autor do pecado, que produz a morte. A morte, em quaisquer de suas formas, tem sua origem no pecado, e o pecado natural e inevitavelmente a produz.

Tg.1:16 16. Não vos enganeis, meus amados irmãos.

Não vos enganeis. Ou, “não sejais desviados”, “não sejais enganados”. O propósito planejado de Satanás é cegar os seres humanos com respeito ao papel de Deus na história do pecado. A maioria das filosofias e religiões deste mundo tem sua base em conceitos falsos pelos quais Satanás busca distorcer o caráter divino. Tiago não queria que os cristãos acreditassem que Deus é responsável pelo pecado e pelo mal que este produz. Os dois versículos seguintes sugerem outras razões para esse ponto, a fim de que ninguém seja inclinado a pensar que Deus seja, de alguma forma, responsável pela tentação.

Meus amados irmãos. Ver com. do v. Tg.1:2.

Tg.1:17 17. Toda boa dádiva e todo dom perfeito são lá do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não pode existir variação ou sombra de mudança.

Toda. Deus é a única fonte de benefícios morais e físicos, sejam eles concedidos a cristãos ou a não cristãos.

Boa. O contraste entre esta palavra, que descreve o trato de Deus com a humanidade, e as palavras “tentado” e “cobiça” (v. Tg.1:14-15), é óbvio. Deus não dá aos seres humanos presentes que poderão lhes prejudicar (ver com. de Mt.7:11).

Dádiva. Do gr. dosis, literalmente, “o ato de dar”. Todo impulso de dar vem de Deus. Conceder dádivas faz parte da natureza divina (ver v. Tg.1:5), e é em resposta ao Seu Espírito e exemplo que os seres humanos dividem suas posses com outros.

Dom. Do gr. dorema, “presente”, “benefício”, “dádiva”. A palavra ocorre no NT apenas nesta passagem e em Rm.5:16.

Perfeito. Todo elemento do mal é excluído.

Do alto. Isto é, de Deus (ver com. de Jo.3:3; Jo.3:31). Deus opera por meio dos seres humanos e, conquanto seus pensamentos sejam verdadeiros, Ele revelará uma parte da verdade mais plena que anseia que o ser humano compreenda (cf. Ed, 14).

Descendo. Este é o argumento final de Tiago contra o engano de que Deus, direta ou indiretamente, é a fonte da tentação. A “perfeita” bondade de Deus é a certeza do ser humano de que Ele não envia nem os problemas da vida que surgem de fora ou as tentações que vêm de dentro.

Pai. No sentido de “Criador” (ver Ml.2:10; Hb.12:9; Jó.38:28).

Das luzes. À luz do contexto, parece que se mencionam os corpos celestes (ver SI.8:3; Am.5:8). Pelo que conhecemos do sistema solar, o mais importante corpo celeste é o Sol, fonte indispensável de bênçãos para o nosso mundo. Contudo, o esplendor dos corpos celestes é apenas uma débil ilustração da natureza de Deus, “que habita em luz inacessível, a quem homem algum jamais viu” (1Tm.6:16). Com frequência, “luz” equivale a “vida”, para descrever com uma débil comparação, própria da compreensão humana, o supremo esplendor de Deus (ver com. de Mt.5:14; Jo.1:4; Jo.1:9).

Não pode existir variação. Fontes físicas de luz variam de intensidade. Até o sol parece mudar desde o amanhecer até o entardecer, e de estação a estação. Mas, em Deus, não há variação de ânimo, nem de propósito. Sempre é o Deus imutável, com eterno anelo de salvar por todos os meios possíveis os seres humanos perdidos num mundo extraviado. Esse é um feliz contraste com a inconstância e o capricho atribuídos aos deuses pagãos.

Sombra de mudança. Em Deus não existe mudança. Não existe sequer a menor desculpa plausível para responsabilizá-Lo de inconstância.

Tg.1:18 18. Pois, segundo o seu querer, ele nos gerou pela palavra da verdade, para que fôssemos como que primícias das suas criaturas.

Querer. Ou, “propósito planejado”, “decisão deliberada”. O querer de Deus para nós está em contraste com o querer humano, que com frequência está submetido à “cobiça” humana (ver com. dos v. Tg.1:14-15).

Gerou. Do gr. tikto (ver com. do v. Tg.1:15). Em vez de ser a causa última de nossos pecados, Deus é o autor de toda santidade que já se desenvolveu no coração humano. Assim como os filhos se parecem com os pais, os cristãos nascidos de novo crescem para refletir o caráter de Seu Pai celestial. Um cristão verdadeiro é uma pessoa diferente da que era antes da conversão, como se fosse formado de novo e nascido outra vez.

Palavra da verdade. Isto é, o evangelho da salvação (ver com. de Ef.1:13). Paulo expressa essa ideia com mais clareza: “pelo evangelho, vos gerei em Cristo Jesus” (1Co.4:15; ver também 1Pe.1:23; 1Pe.1:25). A conversão é resultado de um compromisso pleno com os princípios das Escrituras. O processo de crescimento, que se segue ao novo nascimento, depende do quanto da Palavra de Deus a pessoa pratica em sua vida.

Prímícias. A oferta das “primícias” era um símbolo da consagração de toda a colheita (ver com. de Ex.23:19). Conquanto os primeiros frutos fossem, ou devessem ser, o melhor de sua espécie e os primeiros a amadurecer, também eram uma garantia da colheita a seguir. Cristo é “as primícias dos que dormem”, uma promessa da ressurreição porvir (ver 1Co.15:20; 1Co.15:23). Essa expressão é comum no NT (ver também Rm.8:23; Rm.16:5; Ap.14:4). Ao aplicar esse termo aos crentes, o apóstolo cuidadosamente o qualifica com a expressão “uma espécie de”, ou “uma sorte de”. A vontade de Deus para os seres humanos é que se tornem como Ele, e o dever da igreja é instruir os novos cristãos até que se aproximem da “medida da estatura da plenitude de Cristo” (Ef.4:13).

Tg.1:19 19. Sabeis estas coisas, meus amados irmãos. Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar.

Sabeis estas coisas. Este versículo apresenta a conclusão de que, como Deus é a fonte do bem e a ninguém tenta, e visto que gerou cada um dos cristãos e lhes conferiu a honra de serem “como que primícias”, eles devem pôr em prática os princípios que aprenderam do evangelho.

Amados irmãos. Ver com. do v. Tg.1:2.

Pronto para ouvir. Embora membros de igreja já tenham nascido de novo por meio da Palavra (ver v. Tg.1:18), isso não os exime de continuarem ouvindo-a. Em vez disso, deveriam ouvi-la com mais atenção e fervor, como Cristo disse: “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça” (Lc.8:8; Lc.14:35). Paulo insta os membros a crescer continuamente “no pleno conhecimento de Deus” (ver com. de Cl.1:10; ver 2Pe.1:5). Embora esse seja evidentemente o principal sentido da frase, seu significado com certeza inclui também a sugestão geral de que as pessoas deveriam ser mais prontas a ouvir do que a falar.

Tardio para falar.

Tendo em vista as repetidas referências às línguas desenfreadas nesta epístola (Tg.1:26; Tg.3:1-18; Tg.4:11), parece que Tiago teve que lidar com frequência com o problema de pessoas que falavam com precipitação. Esse mal é mencionado em outras partes das Escrituras (ver Pv.10:19; Pv.17:27-28; Ec.5:2). A ênfase é em ser tardio para começar a falar, e não em falar devagar.

Tardio para se irar. Acima de tudo, um cristão deve ser capaz de controlar seu humor (ver Jó.5:2; Pv.15:18; Pv.16:32; Pv.19:19; Pv.22:24; Pv.25:28; Pv.27:3; Rm.12:18). As três admoestações deste versículo são apresentadas à luz do privilégio referido em Tg.1:18. Por exemplo, aqueles que fazem a vontade de Deus serão conhecidos por seu anseio de aprender continuamente da verdade, por seu autocontrole em não forçar outros a aceitar prematuramente a verdade e pela forma amigável de estudar com quem discorda de seu ponto de vista.

Tg.1:20 20. Porque a ira do homem não produz a justiça de Deus.

Ira. Ou, “cólera”. A ira é em especial imprópria ou prejudicial quando manifestada numa controvérsia religiosa. O zelo irascível pela causa de Cristo demonstra que a pessoa não está familiarizada com o espírito do Senhor. Ainda é verdade o que o cristão bondoso e cortês é o mais poderoso argumento que se pode apresentar em favor do cristianismo” (OE, 122).

Justiça de Deus. O caráter de um Pai amoroso não é refletido num membro de igreja que se irrita facilmente. Essa declaração é parte de uma verdade conhecida por todos: a ira produz o contrário da justiça. Não nos induz a abraçar a verdade, mas nos leva ao oposto. Não cura, mas fere.

Tg.1:21 21. Portanto, despojando-vos de toda impureza e acúmulo de maldade, acolhei, com mansidão, a palavra em vós implantada, a qual é poderosa para salvar a vossa alma.

Portanto. Tiago faz uma aplicação prática do princípio geral apresentado no v. Tg.1:20.

Despojando-vos. Ou, “despindo-vos” (ver Ef.4:25; Cl.3:9; 1Pe.2:1).

Toda Impureza. Assim como uma pessoa que tira a roupa suja, os membros da igreja devem remover toda a “impureza” da mente e do corpo.

Acúmulo. Do gr. perisseia, “abundância”, “resíduo”. Qualquer mal é supérfluo na vida cristã. Com toda diligência, o cristão deve se dedicar à tarefa de eliminar qualquer imperfeição de caráter que ainda possa persistir.

Maldade. Do gr. kakia, “má vontade”, “mal”, “impiedade” (ver Ef.4:31; Cl.3:8; Tt.3:3). O espírito de gentileza e humildade, tanto em receber instrução cristã e em transmiti-la a outros, é enfatizado como objetivo prático de cada membro de igreja. O problema da língua desenfreada poderia ser eliminado se os membros da igreja deixassem de lado toda maldade e desconfiança.

Mansidão. Do gr. prautes, “amabilidade” (sobre o adjetivo praus, ver com. de Mt.5:5). A “mansidão” é o antônimo da “ira” (v. Tg.1:20), que torna a pessoa indócil. Mansidão não significa baixa estima de si mesmo, mas um espírito modesto, gentil e uma disposição de tranquilidade e perdão.

A palavra em vós implantada. Ou melhor, “a palavra implantada”. O evangelho é um dom de Deus, uma “semente” plantada no solo do coração (ver com. de Mt.13:3-8). A salvação não é o resultado de estudo pessoal ou de qualquer outra conquista humana. A “palavra” é “implantada” quando a pessoa escolhe fazer dos princípios das Escrituras o padrão de sua vida.

É poderosa para salvar. A “palavra” pode ser comparada ao “evangelho”, o qual Paulo declara ser o “poder de Deus” (ver com. de Rm.1:16). As Escrituras revelam esse evangelho do poder de Deus, disponível a todos. Quando, pelo poder de Deus, uma pessoa vive de acordo com os princípios da “palavra”, ela é interiormente guiada pela “palavra implantada” (ver com. de Rm.10:17).

Tg.1:22 22. Tornai-vos, pois, praticantes da palavra e não somente ouvintes, enganando-vos a vós mesmos.

Praticantes. Tiago se refere ao Sermão do Monte (ver p. 544; Mt.7:21-29). Isso qualifica o preceito já mencionado: ser “pronto para ouvir” (Tg.1:19). Não é suficiente lembrar o que ouvimos ou mesmo ser capaz de ensiná-lo a outros. Devemos, sistemática e persistentemente, praticar a “palavra da verdade” (v. Tg.1:18) em nossa vida. Desse modo, o apóstolo Tiago concorda perfeitamente com os ensinos de Paulo: “Porque os simples ouvidores da lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados” (Rm.2:13).

E não somente ouvintes (ARC). Certamente isso não é uma condenação daqueles que ouvem a “palavra da verdade”. O erro está em “somente” ouvir e não colocá-la em prática na vida (ver com. de Mt.7:21-27; Rm.2:13).

Enganando-vos (ARC). Do gr. paralogizomai, “enganar mediante um raciocínio falso”. Esse tipo de engano consiste em alguém enganar-se a si mesmo, por meio do raciocínio falso. Quem ouve se engana quando racionaliza que meramente ouvir a palavra ou debater muito acerca da verdade ou ser membro da igreja é o suficiente para a salvação. Deve haver uma transformação completa de vida pelo poder do Espírito Santo, que dá o poder aos crentes para serem “praticantes da palavra”.

Tg.1:23 23. Porque, se alguém é ouvinte da palavra e não praticante, assemelha-se ao homem que contempla, num espelho, o seu rosto natural;

Não praticante. Por si mesmo, o ouvir produz somente impressões fugazes e convicções de dever momentâneas. O cristão sincero aprende a vontade de Deus para cumpri-la, não apenas para saber dela.

Contempla. Isto é, considera com atenção. Presume-se que a pessoa que se olha num espelho demonstra com isso um desejo genuíno de encontrar os fatos. Da mesma forma, um “ouvinte da palavra” deve buscar, como resultado do que ouve, entender sua condição espiritual. Mas isso não é o suficiente; ele deve fazer algo a respeito.

Espelho. Espelhos antigos eram feitos de metal polido, não de vidro.

Rosto natural. Assim como um espelho reflete a aparência humana suja ou manchada, a lei de Deus revela a face moral, arruinada com defeitos e manchada de pecado. Ouvir e entender a Palavra de Deus é como olhar para um espelho. Ao ver os preceitos perfeitos da lei conforme ampliados no caráter de Jesus Cristo, nos tornamos cientes de nossos próprios erros e defeitos. O espelho da verdade jamais adula. Paulo não tinha ciência de sua natureza pecaminosa até se ver no espelho da lei. Sem a lei, ele pensava que era moralmente adequado, que “vivia”; mas, quando compreendeu verdadeiramente seus princípios elevados, percebeu que estava morto espiritualmente (ver com. de Rm.7:9).

Tg.1:24 24. pois a si mesmo se contempla, e se retira, e para logo se esquece de como era a sua aparência.

E se retira. No momento era que se retira, ou se afasta do espelho, a pessoa se esquece de sua verdadeira aparência. O teste de sinceridade e propósito está na resposta que se dá ao desafio da Palavra de Deus. Aqueles que são “somente ouvintes”, como resultado de adiar seus deveres, ou de um “raciocínio falso” (ver com. do v. Tg.1:22), escolhem não entregar a vida a Deus. Aquele que apenas ouve pode ser comparado ao que está à “beira do caminho” na parábola do semeador (Mt.13:4).

Logo se esquece. O apóstolo não se refere necessariamente a uma intenção deliberada de se esquecer, mas ao que acontece inevitavelmente quando falta sinceridade. Se a decisão de se harmonizar com a vontade de Deus não for de todo o coração, mesmo a melhor das intenções “logo” desaparece.

Tg.1:25 25. Mas aquele que considera, atentamente, na lei perfeita, lei da liberdade, e nela persevera, não sendo ouvinte negligente, mas operoso praticante, esse será bem-aventurado no que realizar.

Considera. Neste ponto começa a aplicação da ilustração do “espelho” (v. Tg.1:24).

Lei. Deve haver uma alusão aos ensinos de Cristo concernentes à lei no Sermão do Monte (ver com. de Mt.5:17-18). Além disso, é óbvio que há um estreito paralelo com os comentários de Paulo sobre a “lei” (ver com. de Rm.2:12; Rm.7:12). No cap. 2, Tiago equipara a “lei” ao decálogo (v. Tg.2:10-11) e é possível que também tenha se referido a esse código na presente passagem (ver GC, 466; sobre outra declaração inspirada a respeito da “lei” como “perfeita”, ver SI.19:7). A “lei perfeita” pode ser comparada à “palavra da verdade” (Tg.1:18) e à “palavra em vós implantada” (v. Tg.1:21), cujo cumprimento resulta numa vida de obediência. A “lei” é uma descrição do caráter de Deus, o verdadeiro padrão de justiça, e esboça o relacionamento verdadeiro entre Deus e a humanidade, bem como entre as pessoas. A “lei”, portanto, se torna um “espelho” por meio do qual a pessoa pode avaliar suas motivações e atitudes.

Perfeita. Ver com. de Mt.5:48; Tg.1:4.

Liberdade. Aquele que viola a lei restringe sua liberdade. O lema: “a obediência à lei é liberdade” é visto com frequência em paredes das salas de tribunais e é digno de lembrança para todo cristão. Quando, pela graça de Deus, a pessoa aceita o jugo do Salvador (Mt.11:28-30), ela considera que a lei está claramente de acordo com seus interesses mais elevados e produz a máxima felicidade possível (ver DTN, 329). Então, ela enxerga a vontade divina como liberdade, e o pecado, como escravidão. O apóstolo aponta a lei moral como a regra infalível do dever (ver com. de Tg.2:12). Quando percebemos os defeitos de caráter que ela revela em nós, e nos voltamos para Cristo para remediá-los, vemos que a lei aponta ao caminho da verdadeira liberdade, pois a mais plena liberdade é ficar livre do pecado. Porém, observar a lei, seja moral ou cerimonial, como meio de justificação a converte em um jugo de servidão (ver vol. 6, p. 1030-1033; ver com. de Gl.2:16).

Persevera. A lei será o caminho para a “liberdade” apenas para aqueles que buscam o reino de Deus em primeiro lugar (ver com. de Mt.6:33). Ela traz liberdade somente aos que, pela graça de Deus, convertem num hábito o refletir o caráter de Cristo (ver com. de Jo.8:31-36).

Operoso praticante. A lei de Deus dá direção e motivação para se viver uma experiência cristã genuína. Assim, o cristão será um praticante de atos semelhantes aos de Cristo. Finalmente, todos serão julgados “segundo o seu procedimento” (Rm.2:6), e apenas a “lei” fornece uma norma segura pela qual avaliar seus atos (ver com. de Rm.2:6; Rm.2:13).

Bem-aventurado. Não há limites para as bênçãos que advêm àqueles que submetem totalmente sua vida a Deus (ver com. de SI.1:1-3; Mt.19:29).

No que realizar. Literalmente “no seu fazer”. Ele será abençoado por obedecer à lei divina (ver SI.19:11). A ação em si não é a fonte de bênção, pois isso seria a justiça humana pelas obras. Porém, fazer a vontade de Deus remove barreiras que de outra forma nos apartam de Suas bênçãos.

Tg.1:26 26. Se alguém supõe ser religioso, deixando de refrear a língua, antes, enganando o próprio coração, a sua religião é vã.

Se alguém. Tiago conclui com uma aplicação prática de sua comparação entre o mero ouvinte da lei e o feliz praticante.

Entre vós (ARC). As evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a omissão destas palavras.

Supõe. Do gr. dokeo, “pensar”, “crer”. A ênfase está no que alguém pensa de si mesmo, de como imagina ser e não no que parece ser para os demais. Tiago amplia a advertência que faz no v. Tg.1:22, que o mero conhecimento da verdade não constitui cristianismo genuíno. Pensar o contrário é enganar a si mesmo.

Religioso. Do gr. threskos, “religioso”, em especial, do ponto de vista da religião que se expressa em atos externos. Alguém pode pensar que mera atenção exterior à forma religiosa seja cristianismo genuíno; que ir à igreja regularmente, dar ofertas substanciais e presidir nos assuntos da igreja constituem “religião” que agrada a Deus (v. Tg.1:27). Essa pessoa não compreende que todos os atos externos de caráter religioso, sem a devoção íntima de coração, são vãos (ver com. de Mt.6:1-7; Mt.6:16-18).

Refrear. Tiago compara a língua imprudente e descontrolada a um cavalo desenfreado. Sem um “freio”, tanto a língua quanto o cavalo colocam em perigo todos ao redor. O apóstolo roga a seus irmãos na fé que adquiram o louvável hábito da discrição no falar (ver v. Tg.1:19), que reflete o homem interior (ver com. de Mt.12:34-37). Alguns creem que falar sobre “religião” é evidência de piedade, mas Tiago insta aos cristãos a fazer o que é correto, em vez de meramente falar sobre o que é correto. É necessária uma atenção às normas exteriores da “religião”, mas, se a língua é desenfreada, ou se qualquer outro pecado é acariciado, torna-se evidente que a pessoa ainda não foi transformada pela graça de Deus.

Enganando. Nenhum engano é mais lamentável do que enganar-se a si próprio. Uma demonstração externa de justiça pode ganhar elogios das pessoas, que olham para a aparência exterior (cf. 1Sm.16:7). O coração deve ser motivado pela “lei perfeita” (Tg.1:25), para que possa viver com mansidão (v. Tg.1:21) diante de Deus e das pessoas.

Vã. Do gr. mataios, “inútil”, “sem objetivo”, “sem propósito” (ver com. de 1Co.15:17). Piedade exterior e bons atos são nada se não forem motivados por um desejo sincero de ter todo pensamento e ação em harmonia com a “lei perfeita, lei da liberdade”.

Tg.1:27 27. A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo.

Pura. Ver com. de Mt.5:8.

Religião. Do gr. threskeia, religião, em especial, o que se refere ao culto (comparar com threskos, no v. Tg.1:26). No entanto, o apóstolo não define neste caso a “verdadeira religião”, mas aponta para o fato de que a evidência exterior naturalmente acompanha a genuína experiência do coração. Essa não é uma descrição de toda a religião, mas de apenas dois exemplos pertinentes do espírito religioso genuíno que impulsiona tais atos (ver com. de Mq.6:8).

Sem mácula. Os fariseus dependiam das formas de ritual visíveis para se manterem imaculados, mas por dentro estavam cheios de impureza moral (ver com. de Mc.7:1-23). Tiago aponta para um tipo bem superior de evidência externa de “religião pura”.

Deus e Pai. Ou, “Deus mesmo, o Pai”, isto é, “Deus, o Pai”. A verdadeira religião nos ensina a fazer tudo como se estivéssemos na presença de Deus. Além disso, Deus conhece as motivações, bem como as ações (ver com. de Mt.6:1-18). Mesmo a realização de boas obras não é evidência de “religião pura e sem mácula”, a menos que sejam impulsionadas pelos motivos corretos. Muitos fazem caridade apenas para ter uma boa imagem aos olhos dos demais, ou talvez apenas tendo em vista as deduções tributárias.

Visitar. Do gr. episkeptomai, “visitar” com a ideia de cuidar. O substantivo relacionado, episkopos é traduzido como “presbíteros” (ver com. de At.11:30). O “presbítero” ou “ancião” deve ser um exemplo para todos os crentes da prática da “religião pura” definida nesta passagem, revelando um coração cheio do amor de Deus (ver com. de SI.68:5).

Órfãos. Do gr. orphanoi (cf. com. de Jo.14:18).

Viúvas. Os leitores de Tiago, sem dúvida, conheciam bem as práticas contemporâneas dos fariseus, que tomavam vantagem das viúvas (ver com. de Mt.23:14). Órfãos e viúvas precisam do conforto e do encorajamento de amigos solícitos, não apenas de apoio financeiro.

A si mesmo guarde-se. O cristão se esforça para servir a Deus, exercendo o verdadeiro poder da vontade, ao mesmo tempo em que ora e depende totalmente dEle (ver Jo.17:15; Jd.1:24). O êxito na vida cristã acontece somente para quem une o esforço humano ao poder onipotente de Deus.

Incontaminado. Do gr. aspilon, “sem mácula moral” (ver 1Tm.6:14).

Do mundo. Assim como existe hoje, o “mundo” é sinônimo de princípios maus e práticas contrárias à vontade divina (ver Jo.17:14-16). O cristão verdadeiramente convertido evitará qualquer pensamento ou ato que permita que a imundícia do mundo o contamine.

Tg.2:1 1. Meus irmãos, não tenhais a fé em nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da glória, em acepção de pessoas.

Meus irmãos. Ver com. de Tg.1:2. Essa expressão comum é bastante adequada, devido à ênfase dada neste caso ao princípio da igualdade. Se os membros de igreja se guardarem “incontaminados do mundo” (Tg.1:27), evitarão discriminação com base em riqueza ou pobreza.

Não tenhais. O contexto sugere que havia favoritismo na igreja para com os “ricos”. Portanto, o conselho do apóstolo se dirigia a um problema imediato das igrejas locais.

Fé em nosso Senhor. O grego pode indicar tanto “nosso Senhor da fé” como a “fé em nosso Senhor”. Neste caso, o contexto aponta para o último (ver com. de Mc.11:22; Ef.3:12).

Glória. Literalmente, “a glória” (cf. 1Co.2:8). Nosso Senhor Jesus possui todas as prerrogativas da Divindade (ver vol. 5, p. 1015). Ele é o “Rei da glória” (SI.24:7). Considerado a partir da devida perspectiva, mesmo o mais rico dos homens é pobre, se comparado com o santo que compartilha a herança do Senhor da “glória” (ver com. de Rm.8:17).

Acepção de pessoas. Do gr. prosopolepsiai, “atos de parcialidade” (ver com. de Rm.2:11). Além de se guardarem “incontaminados do mundo” (Tg.1:27), os membros devem ter cuidado para que riquezas e posições mundanas não sejam consideradas qualidades essenciais dos dirigentes da igreja, em lugar dos dons espirituais.

Tg.2:2 2. Se, portanto, entrar na vossa sinagoga algum homem com anéis de ouro nos dedos, em trajos de luxo, e entrar também algum pobre andrajoso,

Se, portanto. Tiago faz uma ilustração prática para revelar os perigos da parcialidade.

Sinagoga. Do gr. sunagoge, “reunião”, “assembléia”. Esta é a única passagem do NT em que se aplica o termo sunagoge à igreja cristã.

Com anéis de ouro. Do gr. chrusodaktulios, “com um anel de ouro [ou anéis] no dedo [ou dedos]”. Era comum que os ricos usassem anéis como ornamento.

De luxo. Do gr. lampros, “brilhante”, “magnificente”, “esplêndido” (cf. Lc.23:11; Ap.18:14).

Pobre andrajoso. Isto é, vestimentas sujas e mal cuidadas, em contraste com as elegantes vestes do rico. Parece que Tiago se refere aos que casualmente visitam a igreja, em vez de aos membros regulares. É evidente que esses visitantes estavam sendo tratados segundo suas posses: uns negligenciados e outros honrados.

Tg.2:3 3. e tratardes com deferência o que tem os trajos de luxo e lhe disserdes: Tu, assenta-te aqui em lugar de honra; e disserdes ao pobre: Tu, fica ali em pé ou assenta-te aqui abaixo do estrado dos meus pés,

Tratardes com deferência. Ou, “olhar com atenção ”, “ter consideração”, com o objetivo de agradar.

Em lugar de honra. Do gr. kalos, termo que alguns creem significar “confortavelmente”, e outros, “agradar”. A despeito dessa divergência, a expressão indica grande deferência e respeito.

Em pé. O pobre não era tratado com cortesia. A alternativa era ficar em pé junto à parede ou sentar-se no chão entre os estrados onde os membros ou convidados considerados dignos de mais respeito apoiavam os pés.

Abaixo. Isto é, ao lado do estrado de outro. Essa pessoa mais favorecida, que tinha estrado e assento, tratava o pobre como se não fosse digno sequer da mínima atenção.

Tg.2:4 4. não fizestes distinção entre vós mesmos e não vos tornastes juízes tomados de perversos pensamentos?

Distinção. Do gr. diakrino, “fazer distinções”, “diferenciar” (cf. com. de Tg.1:6). Tal parcialidade é de fato um indício da falta de conhecimento dos claros ensinos do Senhor a respeito da humildade e do serviço aos outros. Com essa norma ambígua, segundo a qual os ricos e os pobres são tratados de forma tão diferente, os membros da igreja negam com suas atitudes sua professa lealdade ao humilde Jesus (ver com. de Tg.2:1). Ao se mostrarem parciais, tais pessoas demonstram que são de “ânimo dobre” (Tg.1:8), que vacilam entre Deus e o mundo.

Pensamentos. Do gr. dialogismois, “raciocínio”. O apóstolo chama os parciais de “juízes”, pois expressaram seu juízo por meio de sua conduta, julgaram o rico e o pobre por meio de padrões diferentes dos de Cristo. Seu juízo em fazer distinção entre o rico e o pobre se baseava num falso senso de valores, padrão que normalmente é praticado pelo “mundo” (ver Tg.1:27). Aos olhos do cristão genuíno, o irmão pobre é tão digno quanto o rico. O Calvário torna todos iguais.

Tg.2:5 5. Ouvi, meus amados irmãos. Não escolheu Deus os que para o mundo são pobres, para serem ricos em fé e herdeiros do reino que ele prometeu aos que o amam?

Ouvi. É como se Tiago fizesse comparecer perante o tribunal os que haviam se constituído como juízes (v. Tg.2:4).

Irmãos. Ver com. de Tg.1:2; Tg.2:1.

Escolheu. Do gr. eklegomai (ver com. de Rm.8:33). A forma da palavra grega usada nesta passagem enfatiza que Deus escolhe os seres humanos para Si. Isto é, escolhe pessoas que cultivam o hábito de contemplar a Jesus e nEle confiar (ver com. de Jo.6:40). Deus levará para Si apenas aqueles que genuinamente desejam ser como Ele. Paulo também usa eklegomai para descrever a escolha divina das “coisas fracas do mundo” na formação da igreja cristã (ver com. de 1Co.1:26-28).

Para o mundo são pobres. Isto é, pobre na perspectiva deste mundo. Devido ao fato de que o mundo (ver com. de Tg.1:27) julga o valor de alguém com base nas suas posses materiais, os pobres com frequência são desprezados pelos mais afortunados. Contudo, Cristo pronunciou uma bênção sobre eles, ensinando que Seu reino será constituído, em sua maioria, de pobres (ver com. de Lc.6:20-25). As pessoas não são chamadas porque são pobres, mas por se disporem a ser leais a Jesus Cristo de todo o coração e a confiar nEle (ver com. de Mt.6:33). Em geral, as posses dos ricos substituem a confiança em Deus. Por conseguinte, a completa confiança em Cristo pode não parecer tão necessária para o rico como para o pobre.

Ricos em fé. Isto é, ricos no exercício da fé. A pessoa pode ser pobre aos olhos do mundo, mas rica aos olhos de Deus.

Herdeiros do reino. Tiago fala do futuro reino da glória, cujo plano foi estabelecido antes da entrada do pecado no mundo (ver Dn.7:27; ver com. de Mt.25:34). Os cristãos não são apenas herdeiros, mas “coerdeiros” com Jesus, e obtêm todos os privilégios que tal honra confere (ver com. de Rm.8:17). Esse “reino” pode ser comparado à “coroa da vida” (Tg.1:12), dada “aos que O amam”.

Tg.2:6 6. Entretanto, vós outros menosprezastes o pobre. Não são os ricos que vos oprimem e não são eles que vos arrastam para tribunais?

Menosprezastes. Do gr. atimazo, “desonrar”. A primeira sentença deste versículo parece estar mais estreitamente ligada com a ideia do v. Tg.2:5. O modo pelo qual Deus lida com o ser humano é contrastado com o tratamento que os membros da igreja davam a seus semelhantes. Deus trata a todos da mesma forma, independentemente da posição social. Se Deus tivesse julgado e escolhido os seres humanos como esses membros da igreja faziam, poucos deles teriam permanecido na igreja e se tornado “herdeiros do reino” (cf. 1Co.1:26). Essa prática de discriminação pode ter parecido um procedimento cristão aos que não pertenciam à igreja, e é essa falsa representação de Jesus Cristo que Tiago queria evitar (ver com. do v. Tg.2:1).

Ricos. Isto é, os ricos como uma classe, em especial, os judeus ricos (ver v. Tg.2:7). A primeira perseguição da igreja cristã foi instigada por judeus politicamente poderosos, principalmente os saduceus (ver vol. 5, p. 41; ver com. de At.8:1), opressores tradicionais dos pobres.

Oprimem. Do gr. katadunasteuo, “exercer duro controle”. A mesma palavra grega é usada para descrever as aflições causadas por Satanás (ver At.10:38). Os membros da igreja devem tratar os demais como desejam ser tratados (ver com. de Mt.7:12). Tiago relembra aos que faziam distinções (v. Tg.2:4) das injustiças infligidas sobre eles pelos “ricos” e, com isso, os exorta a não cometer opressões parecidas contra os “pobres” da congregação.

Tribunais. Do gr. kriteria, “cortes de justiça” (ver com. de 1Co.6:2; 1Co.6:4). Essas cortes não se limitavam aos tribunais judaicos, embora judeus de posse com frequência liderassem a perseguição aos cristãos (ver At.16:19; At.17:6; At.18:12).

Tg.2:7 7. Não são eles os que blasfemam o bom nome que sobre vós foi invocado?

Eles. Esta palavra, no grego, transmite ênfase. Refere-se aos “ricos”, do v. Tg.2:6. Em outras palavras, ele afirmou: “Não são eles os ricos que blasfemam do vosso Senhor, aos quais estais dispostos a dar preferência?”

Blasfemam. Obviamente esses blasfemadores ricos eram judeus não crentes (ver At.13:45) ou pagãos, pois nenhum cristão blasfemaria o nome de Jesus Cristo. Era a obediência a Cristo que tornava o viver tão difícil nos primeiros séculos da era cristã.

Bom. Do gr. kalos, “bonito”, “excelente”, “honroso”.

Nome. Sem dúvida, o nome de Cristo, pelo qual os discípulos eram conhecidos (ver com. de At.11:26) e pelo qual sofreram (ver At.5:41; 1Pe.4:14-16). O nome de Cristo é “digno” ou “honroso”, pois reflete honra e concede valor aos que o carregam.

Sobre vós foi invocado. Uma expressão similar se encontra em At.15:17, na fala de Tiago (ver Am.9:12). Tiago diz que, tendo em vista essas práticas arrogantes dos “ricos” (v. Tg.2:6), o visitante rico não merece a parcialidade dispensada a ele, ao visitar a igreja. Os membros de igreja devem demonstrar respeito aos ricos, mas não mais do que o respeito e a consideração que demonstram pelo pobre.

Tg.2:8 8. Se vós, contudo, observais a lei régia segundo a Escritura: Amarás o teu próximo como a ti mesmo, fazeis bem;

Se. Literalmente, “se de fato”.

Observais. Do gr. teleo, “levar a cabo”, “realizar com perfeição”. Teleo é mais enfático que tereo (v. Tg.2:10; comparar com pleroo, “se cumpra”, em Mt.5:18, usado no sentido de “cumprir-se plenamente”).

Régia. Do gr. basilikos, “pertencente a um rei”, portanto, “chefe”, “supremo”. Sendo assim, “lei régia” pode significar tanto a lei dada por um rei, neste caso, o Rei dos céus, ou uma lei suprema. A lei do amor é o princípio supremo do qual depende toda a lei sagrada. Essa “lei régia”, o decálogo, que também é chamada de “lei perfeita” (ver com. de Tg.1:25; cf. GC, 466), baseia-se nesse princípio.

Escritura. Do gr. graphe, literalmente, “escrita”. A regra da prática cristã é estabelecida pelas Escrituras. Tiago, como todos os outros escritores do NT, emprega o termo graphe para indicar o AT (ver com. de 2Tm.3:16). O preceito “amar ao próximo como a si mesmo” surge primeiramente em Lv.19:18 e é respaldado e fortalecido pelos ensinos de Cristo (ver com. de Mt.5:43; Mt.19:16-19; Mt.22:37-40; Lc.10:27-29; Jo.13:34).

Fazeis bem. O membro de igreja que vive essa lei de amor com perfeição em sua vida diária tem a aprovação divina. Mas essa lei se aplica ao pobre bem como ao rico, pois ambos são o “próximo” e deveriam ser considerados como iguais. Amar somente ao “rico” como “a si mesmo” não é cumprir a lei.

Tg.2:9 9. se, todavia, fazeis acepção de pessoas, cometeis pecado, sendo arguidos pela lei como transgressores.

Acepção. Ver com. do v. Tg.2:3.

Pecado. Ao mostrar deferência ao “rico”, é provável que os cristãos pensassem que cumpriam a lei do amor. Mas essa mesma lei mostra que pecaram ao serem parciais ao tratar as pessoas.

Arguidos. Do gr. elegcho, “convencer [da culpa]”, “expor” (ver com. de Jo.16:8).

Lei. A lei é a norma perfeita de justiça pela qual se avaliam os atos (ver com. de Rm.3:20; Tg.1:25).

Transgressores. Do gr. parabatai, literalmente, “aqueles que se desviam do caminho [verdadeiro]”.

Tg.2:10 10. Pois qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos.

Guarda. Do gr. tereo, “guardar”, “prestar cuidadosa atenção”. Tiago cita o exemplo hipotético de um membro de igreja que guarda toda a lei, exceto um mandamento. Ele não diz que esse caso é real.

Tropeça. Do gr. ptaio, “tropeçar”, “falhar no dever”.

Ponto. A lei não é uma mera coleção de preceitos isolados; é uma transcrição harmônica e perfeita da vontade divina. Todos os preceitos são manifestações de amor na prática, seja a Deus ou ao próximo. Selecionar a parte da lei que é conveniente e ignorar as reivindicações do restante, mesmo que só um detalhe, revela o desejo de fazer a própria vontade e não a de Deus. A unidade do amor é quebrada e é revelado o pecado do capricho egoísta.

Culpado de todos. Para transgredir a lei, seja civil ou religiosa, não é necessário violar todas as leis; um erro apenas é suficiente. A questão básica está na lealdade à autoridade. Uma violação apenas é o bastante para revelar a disposição do coração. “Um vidro, mesmo que atingido num só ponto, é considerado um vidro quebrado. A lei não é um conjunto de dez pinos, um dos quais pode ser derrubado enquanto os outros permanecem em pé. A lei é uma unidade: o amor. Violá-la em um ponto é violar o amor como tal, ou seja, toda a lei” (R. C. H. Lenski, Interpretation of the Epistle to the Hebrews and of the Epistle of James, Wartburg Press, Columbus, Ohio, p. 572). Assim como uma corrente se rompe ao perder seu elo mais fraco, assim como uma nota pode arruinar a harmonia completa, assim como uma parte ferida prejudica todo o corpo, ou assim como a lepra em qualquer parte faz com que a pessoa seja chamada de leprosa, a transgressão de um mandamento arruina a plenitude e a harmonia de toda a lei.

Tg.2:11 11. Porquanto, aquele que disse: Não adulterarás também ordenou: Não matarás. Ora, se não adulteras, porém matas, vens a ser transgressor da lei.

Aquele. Há apenas um Legislador (cf. Tg.4:12), sendo a lei a expressão de Sua vontade (ver com. de Ex.20:1). Assim, a autoridade de Deus se revela igualmente em cada um dos dez preceitos pronunciados por Ele no Sinai. Aquele que de forma deliberada viola um mandamento se rebela contra a vontade expressa de Deus.

Disse. Provável referência ao fato de o Senhor ter pronunciado os dez mandamentos (ver Ex.20:1; Dt.5:26).

Não adulterarás. O apóstolo cita dois dos dez mandamentos como exemplos, embora qualquer um pudesse servir como ilustração. O próprio Senhor citou esses dois mandamentos no Sermão do Monte, quando mostrou que podem ser transgredidos no coração tanto como por meio de um ato exterior (ver Mt.5:21-28). Com essa ilustração, Tiago mostra que guardar uma parte da lei não justifica a violação da outra parte. Nenhum juiz terreno perdoará a transgressão de uma lei simplesmente porque o culpado tem observado muitas outras leis. Por isso relembrou àqueles que justificaram a deferência ao rico como o cumprimento da lei de amor que tal prática não anulava suas injustiças para com o pobre. A unidade do amor cristão genuíno havia sido abalada.

Transgressor. Ver com. do v. Tg.2:9.

Lei. O espírito de toda a lei é violado e revela falta de comprometimento com a vontade divina.

Tg.2:12 12. Falai de tal maneira e de tal maneira procedei como aqueles que hão de ser julgados pela lei da liberdade.

Falai. Em suma, o apóstolo exorta seus irmãos na fé a se esforçarem na prática diária de falar e fazer o que está em harmonia com a lei de Deus. A afirmação de Tiago de que somos responsáveis por nossas palavras e nossos atos é característica dele, e é outra alusão aos ensinos de Cristo (ver Mt.12:36-37).

Julgados. Deus um dia revisará o registro de vida de cada pessoa (ver com. de At.17:31; 2Co.5:10).

Lei da liberdade. Ver com. de Tg.1:25. Além do decálogo, as outras “palavras” que Jesus falou também julgarão as pessoas (ver com. de Jo.12:48). “O pecado só pode triunfar, enfraquecendo a mente e destruindo a liberdade da pessoa. A sujeição a Deus é restauração do próprio ser e da verdadeira glória e dignidade do homem. A lei divina, à qual somos postos em sujeição, é a “lei da liberdade” (DTN, 466; ver Mishnah, Aboth, 6.2).

Tg.2:13 13. Porque o juízo é sem misericórdia para com aquele que não usou de misericórdia. A misericórdia triunfa sobre o juízo.

Juízo. Tiago conclui o conselho específico sobre o favoritismo para com o rico. A advertência bíblica do juízo sem misericórdia àqueles que falham em praticar a misericórdia é um princípio equitativo, apresentado tanto no AT (ver com. de 2Sm.22:26-27; Pv.21:13) quanto no NT (ver com. de Mt.5:7; Mt.6:15; Mt.7:1; Mt.18:21-35; Mt.25:41-46).

Misericórdia. Do gr. eleos, “compaixão”, “piedade” (comparar com o com. de Mt.5:7; ver Nota Adicional ao Salmo 36; Sl.36:12; ver com. de Mq.6:8).

Triunfa. Do gr. katakauchaomai, “exultar”, “jactar-se”. O misericordioso encara o juízo com feliz confiança, sem temor. Ele sabe que Deus será misericordioso com quem demonstra misericórdia. Ao demonstrar misericórdia, Deus não anula a justiça, como Satanás O havia acusado. A cruz provou a falsidade dessa acusação (ver DTN, 761, 762) e revelou o esplendor transcendente característico da misericórdia divina (ver com. de SI.85:10).

Tg.2:14 14. Meus irmãos, qual é o proveito, se alguém disser que tem fé, mas não tiver obras? Pode, acaso, semelhante fé salvá-lo?

Qual é o proveito [...]? Isto é, quanto à salvação eterna. O apóstolo fala de outro aspecto dos deveres práticos da “religião pura” (ver com. de Tg.1:27). Talvez alguns membros (Tg.2:1-13) estivessem justificando sua deferência para com o rico, com base no uso indevido da lei de amor. Outros (v. Tg.2:14-26) pareciam se desculpar de seus deveres cristãos, como o de praticar boas obras, argumentando que tinham fé.

Irmãos. Ver v. Tg.2:1; Tg.2:5; ver com. de Tg.1:2.

Fé. Do gr. pistis, “convicção”, “confiança” (ver com. de Hb.11:1). Aparentemente, o membro em questão afirma que pode haver fé sem obras, ao passo que Tiago defende que a “fé” que não resulta em boas “obras” é inútil. A fé genuína se revela aos outros por meio das “obras” que produz; sua existência não depende de mero testemunho pessoal. A pessoa que reivindica a fé sem obras pode ser comparada àquela que se crê religiosa (cf. Tg.1:26), mas que não manifesta os atos da “religião pura”.

Obras. Nos capítulos 1 e 2, o apóstolo enfatiza a importância dos atos cristãos. Neste versículo, confronta diretamente aqueles que negligenciam os deveres da “religião pura” (cf. Tg.1:27), argumentando que possuem fé. Em harmonia com os escritos de Paulo (ver com. de Rm.2:6-10), a epístola de Tiago enfatiza a necessidade da fé e também das obras numa experiência cristã genuína. As obras são o resultado da conduta de uma pessoa convertida, ações que resultam espontaneamente da fé.

Pode, acaso, semelhante fé [...]? Literalmente, “pode a fé [isto é, fé sem obras]”. O grego deixa claro que Tiago espera uma resposta negativa: “Não, claro que não!” A fé que não encontra expressão em bons atos habituais jamais alcançará justiça, tampouco, boas ações sem fé genuína (ver com. de Rm.3:28).

Tg.2:15 15. Se um irmão ou uma irmã estiverem carecidos de roupa e necessitados do alimento cotidiano,

Se. Tiago faz referência a uma situação comum que com frequência testa a genuinidade da fé de um cristão.

Carecidos de roupa. Do gr. gumnos (ver com. de Jo.21:7). Esta palavra com frequência descreve os que não estão vestidos com o necessário para enfrentar as intempéries.

Necessitados. Estas pessoas carecem não apenas do supérfluo, mas do essencial para viver.

Tg.2:16 16. e qualquer dentre vós lhes disser: Ide em paz, aquecei-vos e fartai-vos, sem, contudo, lhes dar o necessário para o corpo, qual é o proveito disso?

Qualquer dentre vós. O apóstolo, sem referências pessoais, enfatiza de modo sensível a desumanidade de tal conduta, talvez, tendo em mente casos reais.

Ide em paz. Forma comum de despedida entre os judeus, embora não restrita a eles (ver At.16:36). Neste caso, revela o desejo de escapar de uma responsabilidade: “Vá, e que Deus ou algum amigo te dê o que necessitas”.

Aquecei-vos e fartai-vos. É necessário algo mais do que apenas fé para vestir o corpo que tem frio e remover a angústia da fome. Seria crueldade apresentar textos bíblicos e preceitos cheios de piedade, sem a ajuda material necessária. O texto grego implica que esses membros sugeriam que outra pessoa devia ajudar os necessitados.

O necessário. O que era necessário para a vida foi negado pelos irmãos em Cristo, que se jactavam de sua “fé”, embora esteja implícito que podiam satisfazer as necessidades.

Qual é o proveito disso? Essa fé vazia é inútil para os que precisam de ajuda material, bem como para o membro de igreja que perde outra oportunidade de ajudar a Cristo, representado pelos “mais pequeninos” (ver 1Jo.3:17; ver com. Mt.25:41-45).

Tg.2:17 17. Assim, também a fé, se não tiver obras, por si só está morta.

Fé. Isto é, a fé sem obras do v. Tg.2:14. Tal fé não passa de mera convicção intelectual de que algumas doutrinas são verdadeiras. A mente está convencida por causa das evidências incontestáveis da Palavra de Deus, mas o coração permanece frio e resistente.

Se não tiver obras. Assim como a autenticidade das boas intenções para com os pobres e necessitados só pode ser demonstrada por meio de obras, a fé não pode se provar genuína sem obras. Fé sem o fruto das obras cristãs é apenas nominal, carente do princípio de vida que rege as ações do coração (cf. Rm.2:13; 1Co.13).

Por si só. Tiago não compara a fé com as obras, mas fé genuína com fé morta. A fé morta crê em Deus, mas se prova inútil, pois a convicção mental não torna o serviço cristão um hábito de vida. Além de não ter valor nesta vida, a fé morta não pode salvar quem a possui (ver com. do v. Tg.2:14).

Morta. Como um cadáver, a fé sem obras pode se parecer com a fé genuína, porém, sem vida. Assim como uma vinha morta não produz frutos, a fé morta não produz um padrão consistente de atos cristãos. Ambas são inúteis.

Tg.2:18 18. Mas alguém dirá: Tu tens fé, e eu tenho obras; mostra-me essa tua fé sem as obras, e eu, com as obras, te mostrarei a minha fé.

Mas. Do gr. alla. Tiago apresenta duas pessoas hipotéticas envolvidas numa discussão. A primeira, aparentemente cristã, diz ser salva pela fé apenas; e a outra, aparentemente judia, talvez um judeu cristão, enfatiza as obras. Tiago não apoia nenhum desses pontos de vista. Em vez disso, dirige sua exortação (na última parte do versículo) contra o que defende a fé sem obras.

Mostra-me. Do gr. deiknumi, “demonstrar”, “dar prova de”. Tiago intervém no debate e expõe o engano de se pensar que a fé pode existir sem obras.

Sem. Demonstrar fé sem obras é uma tarefa impossível, pois a fé como um princípio e uma atitude mental sempre revelará sua natureza no comportamento exterior. Quem não exibe boas obras demonstra falta de fé genuína.

E eu [...] te mostrarei. A fé genuína se expressa em ações desinteressadas, pois gera o desejo de servir. Assim se dava com Cristo e assim será com todos que seguem Seu exemplo.

Tg.2:19 19. Crês, tu, que Deus é um só? Fazes bem. Até os demônios creem e tremem.

Crês. Tiago admite que fé “morta” pode acompanhar uma teologia correta.

Deus é um só. Esta doutrina sustenta todo o pensamento cristão. Crer em um único Deus, onipotente, pessoal, distinguia os judeus e os primeiros cristãos dos seguidores de outras religiões.

Fazes bem. Comparar a ironia empregada por Tiago com a de Cristo (Mc.7:9). É essencial ter conhecimento da teologia correta, mas ela é apenas um meio para o fim mais importante: uma vida cristã em harmonia com a vontade divina.

Demônios. Do gr. daimonia (ver com. de Mc.1:23; sobre a origem dos demônios, ver 2Pe.2:4). Ninguém duvida de que os demônios creem na existência de Deus (ver com. de Mc.3:11; Mc.5:7). Sua crença pode ser intelectualmente correta, contudo, continuam sendo demônios. Com base nisso, ninguém dirá que o conhecimento da teologia correta produz fé genuína. A fé que salva transforma a vida.

Tremem. Do gr. phrisso, “arrepiar-se”, “estar horrorizado”, “tremer”. Os demônios estão convencidos da existência de Deus, tanto que tremem ao pensar no castigo no dia do juízo (ver com. de Mt.25:41; 2Pe.2:4).

Tg.2:20 20. Queres, pois, ficar certo, ó homem insensato, de que a fé sem as obras é inoperante?

Queres. Do gr. thelo, “estar determinado”, “desejar”. Tiago apela ao intelecto, pois, com frequência, o obstáculo real à recepção da verdade é a ignorância voluntária.

Ficar certo. Do gr. ginosko, “conhecimento com base na análise e apreciação”.

Sem. Do gr. choris, “separado de” (cf. v. Tg.2:18). A ideia não é que as obras dão vida à fé, mas que a fé viva produz obras vivas.

Vão (ARC). Do gr. kenos, “vazio de conteúdo”, “deficiente” (ver com. de 1Co.15:14). Uma fé morta é vazia, pois não salva ninguém. Tiago exorta solenemente os membros de igreja cuja fé é tão eficaz quanto a dos demônios.

Morta. As evidências textuais favorecem a variante (cf. p. xvi) “inoperante” (ARA), “estéril”, “ineficaz”. A despeito da variante adotada, o significado é claro: mera profissão de fé é inútil (ver com. dos v. Tg.2:14; Tg.2:16), tanto para quem tem fé, quanto para os que dela necessitam.

Tg.2:21 21. Não foi por obras que Abraão, o nosso pai, foi justificado, quando ofereceu sobre o altar o próprio filho, Isaque?

Não foi. O grego indica que os leitores de Tiago responderiam afirmativamente a essa pergunta.

Por obras. Tiago não diz que apenas “obras” podem declarar um pecador como justificado. Ele destaca que as obras de Abraão provaram a autenticidade da fé que Deus tinha declarado correta. Como Paulo (ver com. de Rm.4:1-25; Hb.11:4-39), Tiago coloca a fé no cerne da justificação e ilustra sua vitalidade, citando as obras dignas de homens justificados.

Abraão, o nosso pai. Tanto os cristãos judeus como os cristãos gentios eram descendentes espirituais de Abraão (ver com. de Rm.4:10-12; Gl.3:7-9; Gl.3:29). Além do apelo à lógica (v. Tg.2:19), Tiago acrescenta o apelo às Escrituras. Cristãos sinceros não poderiam desejar algo melhor do que uma fé como a de Abraão.

Justificado. Do gr. dikaioo, “declarar justo” (ver com. de Rm.2:13; Rm.3:28).

Quando. A ocasião citada não foi a primeira vez na experiência de Abraão que Deus o declarou justo. Isso aconteceu alguns anos antes do nascimento de Isaque e está descrito em Rm.4. Anos mais tarde, Deus testou a fé de Abraão, pedindo-lhe que sacrificasse Isaque. Enquanto Abraão se ocupava das “obras” preparatórias desse sacrifício, dava prova cabal da genuinidade de sua fé.

Ofereceu. Ver Gn.22:5-13; Hb.11:17.

Altar. Somente a confiança inabalável de Abraão na fidelidade de Deus poderia explicar esse supremo ato de obediência. Sua fé, como evidência de suas “obras”, recebeu mais uma vez, como no primeiro ato de justificação (ver Gn.15:6), a declaração da aprovação divina (ver Gn.22:15-18).

Tg.2:22 22. Vês como a fé operava juntamente com as suas obras; com efeito, foi pelas obras que a fé se consumou,

Vês [...]? No grego, é apenas uma declaração, significando que todos são capazes de compreender a ilustração da experiência de Abraão.

Fé. Isto é, a fé que levou Abraão a oferecer Isaque.

Operava juntamente. Do gr. sunergeo, “cooperar com”. Este versículo marca o clímax lógico da argumentação sobre a relação entre fé e obras. O objetivo principal de Tiago não é defender a importância das obras, mas a união completa da fé genuína e dos atos cristãos. Ninguém pode encarar por vontade própria problemas e perigos, a menos que tenha uma fé firme. A fé verdadeira produz grandes obras.

Pelas obras. Ver com. do v. Tg.2:21. Estas “obras” de Abraão consistiam em obedecer às ordens divinas, não no cumprimento rotineiro de ordens prescritas por autoridades humanas.

Consumou. Do gr. teleioo, “trazer [algo] ao seu objetivo”, “completar” (ver com. de Mt.5:48; Lc.13:32). Fé e obras não podem estar separadas na vida de um cristão verdadeiro. Quando Abraão foi testado, suas obras deram prova de que sua fé era genuína.

Tg.2:23 23. e se cumpriu a Escritura, a qual diz: Ora, Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça; e: Foi chamado amigo de Deus.

E se cumpriu. Isto é, se realizou plenamente (cf. Gn.15:6; ver com. de Mt.5:17). Antes do nascimento de Isaque, Deus declarou que Abraão teria muitos descendentes (ver com. de Gn.15:1-5). Essa profecia dependia do nascimento de um filho e da perpetuação da linhagem familiar. Abraão cria que a promessa divina se cumpriria, embora estivesse com idade avançada (ver com. de Gn.15:6). Então, muitos anos depois, Deus ordenou algo que aparentemente contradizia a promessa original de tornar Abraão uma grande nação. Ainda assim, Abraão confiou na sabedoria de Deus e obedeceu.

Creu. Ver com. de Gn.15:6.

Imputado. Do gr. logizomai, “contar”, “computar” (ver com. de Rm.4:3). Abraão foi declarado justo porque confiou nas palavras de Deus e aceitou com alegria a promessa do Redentor (ver com. de Gl.3:6). A evidência culminante de que ele confiava em Deus foi revelada em sua disposição de oferecer Isaque em sacrifício quando Deus ordenou, ato que aparentemente teria anulado as próprias promessas divinas. Essa ordem justificou a declaração de Deus sobre a dignidade do patriarca.

Amigo de Deus. Ver 2Cr.20:7. Era comum os judeus atribuírem esse título a Abraão, e ainda é entre os árabes nos dias de hoje. A genuinidade transparente da confiança de Abraão em Deus é um exemplo que todos devemos imitar.

Tg.2:24 24. Verificais que uma pessoa é justificada por obras e não por fé somente.

Verificais. Ao usar o exemplo de Abraão para ilustrar a relação da fé com as obras, Tiago conclui o raciocínio dos v. Tg.2:14-23.

É justificada. Tiago não nega que uma pessoa seja declarada justa pela fé. A citação que fez de Gn.15:6 é evidência de que crê nisso. Porém, nega que a mera profissão de fé seja capaz de justificar alguém. Boas obras acompanham a fé e provam a eficácia dessa fé pela qual uma pessoa é justificada. Se não há “obras”, é evidente que não existe fé genuína (ver com. de Tg.2:17; Tg.2:20).

Por obras. Ninguém que escolhe ser cada vez mais semelhante a Cristo terá uma vida sem boas obras.

Somente. Ou, “sozinha”. O apóstolo continua a enfatizar que a fé não existe sem as obras (ver com. do v. Tg.2:22). É claro que ele discute o problema das “obras da lei”, no sentido das ordenanças rituais do judaísmo (ver com. de Rm.3:28).

Tg.2:25 25. De igual modo, não foi também justificada por obras a meretriz Raabe, quando acolheu os emissários e os fez partir por outro caminho?

De igual modo. Tiago cita outro incidente famoso do AT para ilustrar o princípio de que a fé é demonstrada por meio das boas obras. A lição é paralela com a extraída da experiência de Abraão, embora o ato supremo de fé em cada caso difira muito um do outro.

Justificada. Ver com. do v. Tg.2:21. Raabe decidiu ficar ao lado do povo de Deus e demonstrou sua fé no Deus de Israel, arriscando sua vida para salvar os espias. Tiago deixa implícito que, se ela tivesse professado fé no Deus de Israel e, contudo, não tivesse escondido os espias, sua fé seria estéril e morta.

Raabe. Ver com. de Js.2:1; Hb.11:31. Abraão foi notável por sua piedade; Raabe, por sua imoralidade. Quando ofereceu Isaque em sacrifício, Abraão já cria em Deus havia muitos anos; Raabe tinha uma fé recente. Porém, ambos provaram sua fé mediante uma completa despreocupação por sua segurança pessoal ao aceitar sem hesitação o plano divino. Tiago mostra que o mais venerado dos fiéis e a mais desprezada dos gentios foram igualmente justificados por meio de uma fé operante.

Tg.2:26 26. Porque, assim como o corpo sem espírito é morto, assim também a fé sem obras é morta.

Espírito. Ou, “fôlego”. O apóstolo conclui o tema com um fato irrefutável que leva seus oponentes à reflexão: sem fôlego não há vida no corpo (ver com. de Gn.2:7).

Fé. Ou, suposta fé, pois, separada das obras não é fé genuína. Aceitação intelectual ou a convicção baseada num credo pode existir sem boas obras, mas não a fé operante, que coopera com os planos de Deus para a restauração do ser humano.

Morta. Não havia nada de morto na fé de Abraão ou de Raabe, nem na de nenhum dos outros heróis da fé honrados em Hb.11. Pela fé, eles obedeceram. Membros da igreja apenas nominais, sem testemunho pessoal que reflete o ministério de Cristo a seu favor, são como meros corpos sem vida.

Tg.3:1 1. Meus irmãos, não vos torneis, muitos de vós, mestres, sabendo que havemos de receber maior juízo.

Meus irmãos. Ver Tg.2:1; Tg.2:5; Tg.2:14; ver com. de Tg.1:2. O apóstolo dá continuidade aos temas principais apresentados no capítulo 1. Ele insta seus irmãos de fé a se habituarem a ouvir e estudar a palavra que fora implantada neles (ver com. de Tg.1:19; Tg.1:21; Tg.1:25). Esse plano resulta em “mansidão” (Tg.1:21), imparcialidade para com o rico e o pobre (Tg.2:1-13) e fé genuína (Tg.2:15-26). Além disso, a compreensão adequada do objetivo de ser semelhante a Cristo torna urgente a necessidade de se controlar o modo de falar (ver com. de Tg.1:19; Tg.1:26; Tg.2:12). O capítulo 3 expõe a responsabilidade de cada membro de igreja com respeito ao falar precipitado e imprudente (ver com. dos v. Tg.3:2-8). Este capítulo também amplia o princípio de que a fé não existe sem obras e que a fé genuína é manifesta num caráter semelhante ao de Cristo (ver com. dos v. Tg.3:9-18).

Não vos torneis. Ou, “deixai de vos tornar”.

Mestres. Do gr. didaskoloi, “professores”. Para o bom andamento da igreja cristã, o Espírito Santo qualifica algumas pessoas a serem mestres (ver com. de Ef.4:11).

Havemos. O apóstolo se inclui, como mestre e alguém propenso a correr os perigos e a cometer os erros próprios desse ofício honroso. Desse modo, revela o espírito de humildade genuína, que também busca estimular em seus irmãos.

Maior juízo. Isto é, um juízo mais severo. Existem níveis de responsabilidade na obra do Senhor, e aqueles que se jactam em ensinar serão cobrados por sua conduta pessoal e influência sobre os demais (ver com. de Mt.23:14). Espera-se que o mestre conheça mais da vontade de Deus do que outros, e sua conduta deve ser exemplar.

Tg.3:2 2. Porque todos tropeçamos em muitas coisas. Se alguém não tropeça no falar, é perfeito varão, capaz de refrear também todo o corpo.

Tropeçamos. Do gr. ptaio, “tropeçar”, “falhar no dever”. Em outras palavras, “de muitas formas, todos cometemos erros todos os dias” (ver com. de 1Jo.1:8). A dura realidade é que os “mestres” (Tg.3:1) também tropeçam, ainda que tenham mais conhecimento que outros. Por isso, Tiago deixa implícito que apenas os melhores deveriam buscar se tornar mestres.

No falar. Isto é, no uso da língua (cf. Tg.1:26). Controlar a língua é tarefa sobremodo difícil (ver Mt.5:37).

Perfeito. Do gr. teleios (ver com. de Mt.5:48). Aquele que fala apenas o que é puro, honesto e amável alcançou a semelhança de Cristo. Essa pessoa é o melhor tipo de mestre.

Capaz. Uma vez que o membro do corpo mais difícil de ser controlado esteja sob domínio, deve ser relativamente mais fácil controlar os demais.

Refrear. Ver com. de Tg.1:26. As palavras de uma pessoa revelam o teor geral de seus pensamentos. Se ela controla seus pensamentos ao ponto de suas palavras serem sempre semelhantes às de Cristo, “todo o corpo” estará sob controle (ver com. de Mt.12:34-37).

Tg.3:3 3. Ora, se pomos freio na boca dos cavalos, para nos obedecerem, também lhes dirigimos o corpo inteiro.

Ora. As evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a variante “agora se”.

Freio. Ou, “rédeas”.

Na boca dos cavalos. Talvez o cavalo seja o mais indomado dos animais domésticos, mas basta um pequeno mecanismo na sua boca para controlar todas as suas ações.

Obedecerem. Assim como um cavalo desgovernado põe em risco a vida de quem o conduz, uma língua desenfreada põe em risco toda a experiência cristã. Obediência e controle são importantes para os seres humanos, bem como para os animais domésticos.

Corpo inteiro. Ver com. do v. Tg.3:2.

Tg.3:4 4. Observai, igualmente, os navios que, sendo tão grandes e batidos de rijos ventos, por um pequeníssimo leme são dirigidos para onde queira o impulso do timoneiro.

Navios. Os navios eram familiares para muitos dos leitores de Tiago, pois o império romano era margeado pelo Mar Mediterrâneo.

Grandes. Navios antigos pareciam grandes para as pessoas daquela época, embora os que hoje cruzam os oceanos excedam em muito o seu tamanho. A viagem de Paulo para Malta foi num grande navio, pois carregava 276 pessoas, incluindo a tripulação e passageiros (ver At.27:37). No entanto, qualquer navio é grande em comparação com o leme que o controla.

Rijos. Do gr. skleros, “duro”, “forte”, “obstinado”. O cavalo (cf. v. Tg.3:3) tem vontade própria e é difícil de ser domado; um navio está à mercê de fortes ventos, mas ambas as forças podem ser controladas por um dispositivo relativamente pequeno.

Leme. Ou, “timão”. A ênfase está no pequeno tamanho do indispensável leme.

Queira. Do gr. boulomai, “ter a intenção de”, “propor-se a”. Embora o leme guie o navio, é o timoneiro quem o controla. Da mesma forma, embora a língua dirija em certo sentido todo o corpo, ela é controlada pela vontade (cf. Tg.1:15).

Timoneiro. Ou, “piloto”.

Tg.3:5 5. Assim, também a língua, pequeno órgão, se gaba de grandes coisas. Vede como uma fagulha põe em brasas tão grande selva!

Assim, também. Tiago compara a relativa pequenez do leme à pequenez da língua e destaca as potencialidades da língua para o bem e para o mal.

De grandes coisas. A língua é capaz de inspirar grandes feitos, sejam bons ou maus.

Selva. Do gr. hule, “floresta”. A grandeza de uma floresta não é garantia de não ser destruída por uma pequena faísca. O mesmo se dá com as questões mais importantes de um indivíduo, ou de toda a igreja, que podem ser expostas ao perigo como resultado das forças que desencadeiem uma língua crítica.

Tg.3:6 6. Ora, a língua é fogo; é mundo de iniquidade; a língua está situada entre os membros de nosso corpo, e contamina o corpo inteiro, e não só põe em chamas toda a carreira da existência humana, como também é posta ela mesma em chamas pelo inferno.

A língua. Isto é, a língua que fala maldade.

Fogo. Tudo o que se pode dizer sobre o poder destrutivo de uma pequena chama pode também ser aplicado ao poder em potencial da língua. Irmãos de fé não devem só evitar o falar destrutivo, mas também as fagulhas destrutivas que se dispersam das palavras alheias.

Mundo. Do gr. kosmos (ver com. de Jo.1:9).

Contamina. Comparar com as palavras de Cristo: “O que sai da boca, isto, sim, contamina o homem” (Mt.15:11; ver com. da p. 544).

O corpo inteiro. Comparar com os v. Tg.3:2-3.

Carreira. Literalmente, “roda”, neste caso, indicando o ciclo que a roda faz quando gira em seu eixo.

Existência. A trajetória da vida de alguém, ou da igreja, com frequência é incendiada pela ira e por palavras mal escolhidas.

Inferno. Ver com. de Mt.5:22. Inferno ou gehenna, neste caso, simbolizam tudo o que é mal e digno de destruição. A “língua” que destrói a harmonia, a paz e a amizade é motivada por uma vontade que está sob o controle de Satanás (ver com. de Mt.13:25-28).

Tg.3:7 7. Pois toda espécie de feras, de aves, de répteis e de seres marinhos se doma e tem sido domada pelo gênero humano;

Espécie. Ou, “ordem”, neste caso, do reino animal, em contraste com a “espécie” humana.

Doma. Ou, subjuga (ver Mc.5:4).

Gênero humano. A natureza ou ordem animal fui subjugada pela natureza ou ordem humana, como o Criador propôs (Gn.1:28).

Tg.3:8 8. a língua, porém, nenhum dos homens é capaz de domar; é mal incontido, carregado de veneno mortífero.

Porém. Tiago estabelece um contraste notável entre a indomável língua e as quatro classes de animais selvagens (v. Tg.3:7) dominados pelo ser humano.

Nenhum dos homens. Isso não significa que a língua jamais possa ser controlada, mas que a natureza humana pecaminosa não tem o poder de subjugá-la. O ser humano pode domar os animais, mas não tem o poder de controlar sua própria língua. Somente a graça divina pode fazer isso. Tiago reconhece a possibilidade de dominá-la (ver v. Tg.3:2) e declara que os seguidores de Cristo devem obter vitória sobre o falar indisciplinado (ver com. do v. Tg.3:10).

Incontido. As evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a variante “inquieto”, “turbulento” (ver com. de Tg.1:8).

Mal. A língua é má apenas quando controlada por uma mente motivada pelas forças do mal. Quando a pessoa não permite que o Espírito Santo controle seus pensamentos e, consequentemente, sua fala, a língua funciona como um instrumento do mal.

Veneno mortífero. Isto é, atua sobre a felicidade individual e a paz da sociedade, como o veneno sobre o corpo humano. A perda da confiança, paz e amizade é o resultado inevitável de uma língua precipitada e imprudente (cf. SI.140:3; Rm.3:13).

Tg.3:9 9. Com ela, bendizemos ao Senhor e Pai; também, com ela, amaldiçoamos os homens, feitos à semelhança de Deus.

Com ela. Literalmente, “em conexão com ela”.

Bendizemos. Do gr. eulogeo, “falar bem de”, “louvar”, “abençoar”.

A Deus e Pai (ARC). As evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a variante “ao Senhor e Pai” (ARA; comparar com Tg.1:1).

Amaldiçoamos. Damos evidência de que somos cristãos genuínos quando bendizemos nossos inimigos (ver com. de Mt.5:44-45). O próprio Cristo não proferiu “juízo infamatório” contra Satanás (Jd.1:9). A maldição nasce da ira e exibe o espírito de Satanás, “o acusador de nossos irmãos” (ver Ap.12:10). Tiago mostra que a pessoa pode ter “língua dobre”, bem como “ânimo dobre” (ver com. de Tg.1:8).

Semelhança. Do gr. homoiosis. Este versículo se refere principalmente à “semelhança” de Deus com a qual o ser humano foi criado (ver com. de Gn.1:26) e que ainda retém em certa medida (ver 1Co.11:7). Embora essa imagem tenha sido quase apagada pelo pecado, Deus providenciou um meio pelo qual ela pode ser restaurada.

Tg.3:10 10. De uma só boca procede bênção e maldição. Meus irmãos, não é conveniente que estas coisas sejam assim.

De. A primeira frase do v. 10 completa a ideia do v. Tg.3:9.

Bênção e maldição. A mescla de maldição e bênção pode sugerir a falta de sinceridade da bênção (cf. Pv.18:21).

Meus irmãos. Mais uma vez Tiago apela à irmandade dos crentes em Cristo e à unidade que há na paternidade de Deus (ver v. Tg.3:9). Embora alguns dos membros a quem Tiago escreveu fossem culpados de amaldiçoar homens e bendizer a Deus, ele ainda os considerou com afeição.

Não é conveniente. Ou, “não é necessário que”. A repreensão é feita com muito tato. Uma narração incompleta intencional com frequência enfatiza e encoraja uma resposta afirmativa. Apesar da dificuldade de controlar a língua, o Senhor agirá por nós, se Lhe submetermos nossa vontade. Na verdade, os pensamentos devem primeiramente ser subjugados para que a língua seja domada (ver com. de 2Co.10:5). Mas, para controlar os pensamentos, a pessoa deve antes entregar o coração a Deus (ver com. de Tg.1:14).

Tg.3:11 11. Acaso, pode a fonte jorrar do mesmo lugar o que é doce e o que é amargoso?

Acaso. O grego indica que se espera uma resposta negativa.

Fonte. Do gr. pege, manancial. Assim como a fonte é um manancial de água, o coração é a fonte das palavras (ver com. de Pv.4:23-24). Embora uma fonte seja inanimada, sua corrente é regulada pelas leis da natureza. Da mesma forma, o cristão deve agir em harmonia com a lei de sua natureza renovada. O apóstolo racionaliza a partir do que é impossível e até absurdo na natureza, mas que infelizmente se percebe na conduta humana.

Lugar. Do gr. ope, “abertura”, “fenda”.

Doce. Isto é, fresco.

Amargoso. Isto é, salobre. Nenhuma fonte jorra água doce e amarga. Os que conheciam a Palestina imaginariam o contraste entre as fontes de água próximas ao Mar Morto, carregadas de minerais, e as correntes de água doce do norte, supridas pela neve do Líbano.

Tg.3:12 12. Acaso, meus irmãos, pode a figueira produzir azeitonas ou a videira, figos? Tampouco fonte de água salgada pode dar água doce.

Acaso. O grego indica que se espera uma resposta negativa.

Figueira. Árvores frutíferas e fontes de água produzem em conformidade com sua respectiva natureza. Não se espera nenhum outro resultado. Tiago sugere que maldições e outros usos indevidos da língua indicam que a pessoa não é uma cristã genuína. Ele não quer dizer que uma pessoa convertida nunca cometa erros (cf. v. Tg.3:2), mas argumenta que uma pessoa realmente convertida não terá o hábito de falar de forma não cristã (ver com. do v. Tg.3:10).

Videira. Estas ilustrações se assemelham às empregadas por Cristo (ver Mt.7:16). O principal objetivo de Tiago não é contrastar o bem com o mal, mas insistir que uma árvore vai produzir “segundo a sua espécie” (Gn.1:11-12) e que a natureza do fruto inevitavelmente testifica do tipo de árvore que o produziu (ver Mt.7:20).

Tampouco. As evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a variante da última frase do v. Tg.3:12 como segue: “tampouco pode água salgada produzir água fresca”. Tiago mostra que é impossível que uma adoração genuína venha de um coração cheio de maldade. Suas conclusões se aplicam em especial aos mestres.

Tg.3:13 13. Quem entre vós é sábio e inteligente? Mostre em mansidão de sabedoria, mediante condigno proceder, as suas obras.

Sábio. Tiago fala da sabedoria necessária para uma vida consagrada (ver 1Co.6:5; Ef.5:15).

Inteligente. Ou, “tem entendimento”.

Mostre. A sabedoria genuína será demonstrada nas obras. O caráter de uma pessoa é demonstrado pelo fruto que produz, como enfatizado no v. Tg.3:12.

Mansidão. Do gr. prautes, “amabilidade” (ver com. de Tg.1:21). A falsa mansidão é mera complacência e falta de iniciativa. A pessoa verdadeiramente mansa e sábia fala de suas convicções e traça seus planos de modo gentil, embora firme. A suavidade de espírito permite pensar com clareza, bem como administrar com tranquilidade. Um homem sábio é humilde perante Deus, e essa experiência espiritual é uma barreira contra a arrogância e o domínio impiedoso sobre seu próximo (cf. Tg.2:13). Ter um vasto conhecimento não constitui sabedoria. A mansidão revela que a pessoa instruída é verdadeiramente sábia.

Condigno. Do gr. kalos, “excelente”, “recomendável”.

Proceder. Do gr. anastrophe, “modo de vida”, “conduta” (comparar com Ef.2:3; Gl.1:13; 1Tm.4:12; Hb.13:7; 1Pe.1:15; ver com. de Ef.4:22).

Obras. Isto é, obras da fé.

Tg.3:14 14. Se, pelo contrário, tendes em vosso coração inveja amargurada e sentimento faccioso, nem vos glorieis disso, nem mintais contra a verdade.

Inveja. Do gr. zelos, “zelo”, num mal sentido, “ciúmes” (ver com. de Jo.2:17). A moralidade do “zelo” depende do objetivo perseguido. Tiago fala do zelo negativo, pois é amargo. Tal zelo está em notável contraste com a mansidão descrita anteriormente (Tg.3:13).

Faccioso. Do gr. eritheia, “partidarismo”, “espírito faccioso”, “interesse próprio”. O ser humano pode se tornar amarguradamente zeloso em promover seus interesses e mostrar pouca consideração pelos desejos dos outros. A “mansidão de sabedoria” (v. Tg.3:13) é o principal requisito.

Coração. A inveja e o sentimento faccioso podem ser ocultados, mas são como água amarga de uma fonte (cf. v. Tg.3:11): um dia jorrarão em palavras ou atos. Tiago indica que sempre devemos fazer um atento exame de coração.

Nem vos glorieis. Os cristãos não devem se gloriar de realizações nem de habilidades pessoais. Ouem possui espírito faccioso normalmente busca atrair apoio por meio de autoafirmação. Essa jactância revela falta de sabedoria. O espírito de serviço é a única base legítima para a popularidade.

Verdade. Isto é, a verdade do evangelho. Quem professa ser sábio não deve trair a verdade que ensina, demonstrando carecer do espírito da verdade. A verdade cristã consiste num estilo de vida. A teoria da verdade só tem valor quando expressa na conduta que revela Cristo, a personificação da verdade (ver com. de 1Jo.2:6; Jo.14:6; T3, 59).

Tg.3:15 15. Esta não é a sabedoria que desce lá do alto; antes, é terrena, animal e demoníaca.

Sabedoria. Isto é, a sabedoria daqueles que traem a verdade com um espírito desprovido de mansidão (ver com. do v. Tg.3:13). Tiago reconhece dois tipos de sabedoria, bem como dois tipos de fé (ver com. de Tg.2:17). Assim como no caso de uma fé morta, esse tipo de sabedoria é apenas nominal. Na verdade, é astúcia, habilidade lógica e argumentos sutis, empregados em interesse próprio.

Lá do alto. O conhecimento e a habilidade da liderança mal orientada não vêm de Deus, autor da verdadeira sabedoria (ver DTN, 219; ver com. de Tg.1:5). Deus não concede sabedoria para ajudar quem é egoísta e dado a discussões (ver com. de Tg.3:14).

Terrena. Esta professa sabedoria emana de princípios e motivações terrenos e objetiva servir a propósitos terrenos. Tem em vista apenas esta vida.

Animal. Do gr. psuchikos, “não espiritual” (ver com. de 1Co.15:44). A sabedoria terrena busca satisfazer os desejos e as propensões que brotam do ser humano natural.

Demoníaca. Ou, “semelhante a demônios” (comparar com Tg.2:19). A pretensa sabedoria não só carece das características da sabedoria que é “do alto”, como contém elementos próprios de demônios. Lúcifer, chefe dos demônios, não estava satisfeito com a sabedoria que Deus lhe havia concedido (ver Ez.28:17). Finalmente, esse espírito de inveja o levou a “inveja amargurada e sentimento faccioso” (cf. Tg.3:14). Alguns veem nas três expressões (“terrena”, “animal” e “demoníaca”) os três inimigos espirituais do ser humano: o mundo, a carne e o diabo.

Tg.3:16 16. Pois, onde há inveja e sentimento faccioso, aí há confusão e toda espécie de coisas ruins.

Inveja e sentimento faccioso. Ver com. do v. Tg.3:14.

Confusão. Do gr. akatastasia, “estado de desordem”, “inquietação” (comparar com Tg.1:8; Tg.3:8). O egoísmo no lar ou na igreja sempre gera instabilidade, que por sua vez traz infelicidade e confusão. Sendo assim, a sabedora que não vem “do alto” finalmente revelará sua verdadeira natureza por seu fruto.

Ruins. Do gr. phaulos, “inútil”. Um plano que nasce do egoísmo e é motivado por um espírito de contenda finalmente fracassará devido a sua própria debilidade. O pecado e o egoísmo nunca produzem harmonia.

Tg.3:17 17. A sabedoria, porém, lá do alto é, primeiramente, pura; depois, pacífica, indulgente, tratável, plena de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem fingimento.

Sabedoria. Isto é, a verdadeira sabedoria, que Deus promete a todos os que pedem por ela com sinceridade (ver com. de Tg.1:5).

Pura. Do gr. hagnos, “livre de contaminação”. Esta qualidade é a primeira, porque as seguintes nascem de uma vida incontaminada, com base numa filosofia de vida guiada por Deus. Essa sabedoria é livre de princípios, metas e propósitos terrenos.

Pacífica. Ver com. de Mt.5:9. Quem é verdadeiramente sábio busca evitar discussões e brigas, porém seu desejo por paz não o impedirá de apresentar a verdade, mesmo que com isso tenha problemas. Jesus previu que a proclamação da verdade traria contenda ao mundo (ver com. de Mt.10:34), mas a discórdia resultante é produzida pelos que se opõem à verdade, não pelos que a apresentam com sabedoria. Não se deve sacrificar pureza de vida e doutrina, no esforço de se assegurar a paz.

Indulgente. Do gr. epieikes, “razoável”, “moderado” (ver 1Tm.3:3; Tt.3:2). A verdadeira sabedoria é perdoadora diante da provocação e compreensiva com os erros dos outros. Ela transforma um ser humano rude em um cristão amável.

Tratável. Do gr. eupeithes, “fácil de persuadir”, isto é, não é obstinado, nem difícil de levar.

Misericórdia. Ver com. de Tg.2:13.

Bons frutos. Ver com. de Mt.7:17; Mt.21:34; Cl.5:22-23.

Imparcial. Ou, “firme”, “sem incerteza”, isto é, segura quanto a que medida tomar. O cristão não deve vacilar entre posições opostas apenas para ganhar vantagem. Um sábio não se envergonha de sua posição, não importa quantos se oponham a ele.

Sem fingimento. Do gr. anupokritos, “genuíno”, “sem disfarces”.

Tg.3:18 18. Ora, é em paz que se semeia o fruto da justiça, para os que promovem a paz.

E em paz. Um caráter justo se desenvolve apenas pelo pacificador. Tiago obviamente compara os resultados da inveja e da contenda, que produzem apenas frutos inúteis (ver com. do v. Tg.3:16), com a recompensa de objetivos e métodos pacíficos.

Fruto. Isto é, o produto ou a recompensa da conduta correta (ver com. de Pv.11:30; Mt.7:16).

Justiça. Neste caso, representada como algo que produz fruto (ver com. de Mt.3:8; cf. PJ, 69).

Promovem a paz. Cristãos genuínos são os conciliadores de diferenças no lar e na igreja (ver com. de Mt.5:9). Quem semeia paz desfruta paz, em parte nesta vida e, plenamente, na vida porvir no reino do “Deus da paz” (1Ts.5:23).

Tg.4:1 1. De onde procedem guerras e contendas que há entre vós? De onde, senão dos prazeres que militam na vossa carne?

De onde. O apóstolo fala dos males específicos dentro da igreja, produto de línguas desenfreadas e corações facciosos. A causa de toda divisão e contenda é o egoísmo (ver com. de Tg.3:14).

Guerras. Do gr. polemoi, “contendas”, “inimizades”, no sentido de conflitos que envolvem muitas pessoas. Talvez em contraste com machai (ver abaixo).

Contendas. Do gr. machai, “brigas”. Neste caso, este termo talvez descreva desentendimentos individuais.

Entre vós. Os irmãos ainda não estavam semeando “em paz” (ver com. de Tg.3:18).

De onde, senão [...]? A construção gramatical no grego indica que se espera uma resposta afirmativa.

Prazeres. Do gr. hedonai. No NT, em geral, o termo indica prazeres maus, concupiscência (ver Lc.8:14; Tt.3:3).

Militam. Quando a satisfação do egoísmo é o espírito que governa os seres humanos, não há fim para discussões e contendas. Cada pessoa vê na outra um obstáculo para a satisfação dos desejos pessoais (ver com. de Tt.3:3).

Nos vossos membros (ARC). Referência ao corpo propriamente dito (ver ARA) ou à igreja. A despeito da interpretação, o egoísmo que constantemente busca reconhecimento e satisfação é a fonte de todo conflito pessoal que, com frequência, leva a discussões.

Tg.4:2 2. Cobiçais e nada tendes; matais, e invejais, e nada podeis obter; viveis a lutar e a fazer guerras. Nada tendes, porque não pedis;

Cobiçais. Do gr. epithumeo, “ansiar com paixão” (comparar com Tg.1:14). O egoísmo, se não for refreado, transforma-se em cobiça (ver com. de Ex.20:17).

E nada tendes. Uma pessoa invejosa nunca está satisfeita com o que tem.

Matais. Tiago declara a verdade de que a busca desenfreada pela satisfação do prazer pessoal muitas vezes leva ao assassinato (ver com. de Mt.5:22). Isso não significa necessariamente que alguns de seus leitores fossem de fato culpados de assassinato. Alguns desejariam mudar a pontuação deste versículo, como segue: “Cobiçais, e porque nada tendes, matais; desejais ardentemente, mas não sois capazes de obter. Então, lutais e guerreais.” Aos olhos de Deus, odiar é um pecado tão horrível quanto matar (ver com. de Mt.5:22).

Nada podeis obter. Seja qual for o resultado da força e da violência, não se obtém verdadeira felicidade e satisfação.

Viveis a lutar e a fazer guerras. Ver com. do v. Tg.4:1 Como não se obtém satisfação genuína, persiste um estado interminável de contenda.

Não pedis. Esses contendores dependiam de seus esforços para obter o que desejavam, em vez de dependerem de Deus para prover o melhor para eles. Deus implantou desejos legítimos e anseios básicos no coração humano (ver com. de Tg.1:15), e, em parte, a felicidade depende de satisfazer esses desejos implantados por Deus. Quando o ser humano tenta satisfazer esses desejos básicos de formas ilegítimas, é certo que resulta em desilusão, inveja e brigas. Esses irmãos de fé não estavam trabalhando em harmonia com o plano de Deus para felicidade genuína, pois tinham negligenciado a oração. A oração indica que a pessoa está disposta a buscar aquilo que Deus deseja conceder.

Tg.4:3 3. pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres.

Pedis. Ver com. de Mt.7:7.

Não recebeis. Respostas à oração dependem tanto da natureza dos pedidos quanto do espírito com que se pede (ver com. de Lc.11:9).

Mal. Do gr. kakos, “de forma errada”, isto é, com motivações impróprias, e talvez por objetivos errados. Quem ora sem a determinação de harmonizar sua vontade à de Deus, ora “mal” (ver 1Jo.5:14).

Esbanjardes. Do gr. dapanao, “desperdiçar”, “gastar”.

Prazeres. Do gr. hedonai (ver com. do v. Tg.4:1). Orações dessa natureza não são respondidas, pois o motivo da oração será usado em benefício próprio. Deus não atende tais orações, mesmo que sejam por coisas boas em si.

Tg.4:4 4. Infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus.

Infiéis. Isto é, os infiéis a seus votos de casamento. Alguns consideram que Tiago fala de adultério num sentido figurado, de apostasia para com Deus (ver com. de Ez.16:15; 2Co.11:2). As pessoas às quais é dirigida a mensagem de Tg.4:1-5 pareciam ainda se considerar membros da igreja, entretanto, cometiam pecados graves. Sendo assim, é possível que Tiago estivesse falando de adultério literal. Seja como for, esses membros mostravam favoritismo para com os “ricos” (ver com. de Tg.2:1-13), negligenciavam as “obras” cristãs (ver com. de Tg.2:14-26), falavam precipitada e imprudentemente (ver com. de Tg.3:1-10), tinham “inveja amargurada e sentimento faccioso” (ver com. de Tg.3:14-18), bem como uma cobiça desenfreada pelo que é proibido (ver com. de Tg.4:1-3). Tudo isso demonstrava que não agiam de forma diferente do “mundo” (ver com. de Tg.1:27).

Não compreendeis [...]”? Esperava-se que compreendessem melhor como deveria ser a conduta cristã, devido à sua familiaridade com o AT e com as palavras de Cristo.

Amizade do mundo. Isto é, amizade com o mundo. O principal objetivo do “mundo” é satisfazer o desejo de complacência pessoal. O evangelho convida o ser humano a servir ao próximo. Entre o espírito e a prática do “mundo” e o da igreja deve haver uma diferença marcante (ver com. de 1Jo.2:15).

Inimiga. Isto é, inimizade do ser humano para com Deus.

Aquele. Sendo ou não parte da igreja, homens e mulheres guiados pelo egoísmo permanecem sob a condenação divina.

Quiser. Do gr. boulomai, “querer voluntariamente”. O coração está disposto a desfrutar algum prazer mundano.

Amigo do mundo. Quando membros da igreja que professam fidelidade a Deus continuam anelando a satisfação pessoal conforme dá o mundo, seu amor a Deus passa para segundo plano. Sua lealdade “duvida” (cf. Tg.1:6) e é inconstante (cf. v. Tg.1:8). O serviço para Deus não pode ser um interesse entre muitos, pois o modo de vida cristão é irreconciliável com o do mundo (ver com. de Mt.6:24).

Inimigo. Comparar com 1Jo.2:15.

Tg.4:5 5. Ou supondes que em vão afirma a Escritura: É com ciúme que por nós anseia o Espírito, que ele fez habitar em nós?

Em vão. Do gr. kenos, “vazio”, “sem conteúdo válido”. As palavras das Escrituras que declaram o amor de Deus pelo ser humano não são “em vão”.

Escritura. Isto é, o AT. Esta fala não é citação de alguma passagem das Escrituras. Porém, a ideia é paralela ao ensino geral do AT (cf. Gn.6:3-5; Ex.20:5).

Ciúme. Do gr. phthonos. Há dificuldade de se traduzir o termo. Alguns traduzem a passagem como: “Com ciúme Ele [Deus] anela pelo Espírito que fez habitar em nós”; outros, como: “O Espírito Santo que Ele [Deus] fez habitar em nós anela intensamente com ciúme.” Com frequência, Deus Se descreve como “zeloso” (ver Nm.25:11; 1Rs.14:22; Ez.23:25; Sf.1:18; Zc.1:14; Zc.8:2; ver com. de Ex.20:5; Dt.32:16; SI.78:58; Ez.36:5; Jl.2:18). Paulo comparava seu imenso amor pela igreja de Corinto com o zelo de Deus por Seu povo (ver com. de 2Co.11:2). A amizade dos membros da igreja com o mundo aflige o Espírito de Deus, que busca nossas afeições não divididas. O zelo ou ciúme do ser humano é egoísta; o zelo de Deus reflete simplesmente Sua intensa preocupação com o bem-estar de Seus filhos.

Anseia. Do gr. epipotheo, “buscar com amor”, “ansiar intensamente” (cf. Rm.1:11; 2Co.5:2; 2Co.9:14; Fp.1:8; Fp.2:26; 1Ts.3:6; 2Tm.1:4).

Espírito. Isto é, o Espírito Santo, caso seja adotada a tradução da ARA. Outras passagens do NT ensinam que o Espírito Santo habita em nós (ver com. de Jo.14:16-17; 1Co.6:19).

Habitar. Evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a variante “faz habitar”, “dar uma habitação para”.

Tg.4:6 6. Antes, ele dá maior graça; pelo que diz: Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes.

Graça. Do gr. charis (ver com. de Rm.3:24). Devido ao amor de Deus por Seu povo, continuamente se renova e se amplia entre eles a graça para habilitá-lo a resistir às tentações mundanas. Aquele que, com sinceridade ora pela graça, estará constantemente desenvolvendo o caráter cristão. Deus pede obediência completa, mas também provê força suficiente para nos capacitar a obedecer (ver com. de Hb.4:16).

Diz. A citação é de Pv.3:34, da LXX.

Deus. O Senhor participa ativamente da luta de Seu povo contra as forças do pecado. Paulo afirma que a graça de Deus é sempre suficiente para enfrentar as dificuldades (ver com. de 2Co.12:9).

Soberbos. São aqueles que escolhem os prazeres deste mundo para satisfazerem seu egoísmo (ver com. do v. Tg.4:1). Desprezam as exortações de Deus e os “humildes” que escolhem satisfazer seus desejos de acordo com a vontade divina.

Humildes. Ver com. de Mt.11:29.

Tg.4:7 7. Sujeitai-vos, portanto, a Deus; mas resisti ao diabo, e ele fugirá de vós.

Sujeitai-vos. Tiago dá início a uma série de dez imperativos, aos quais todo membro de igreja sujeito ao perigo de se tornar “amigo” do mundo (ver v. Tg.4:4) faria bem em atentar. Para que Deus conceda Sua “graça”, (v. Tg.4:6) os “humildes” devem estar dispostos a submeter sua vontade ao plano divino. Submissão implica confiança plena de que todos os desígnios de Deus são para o bem (ver Hb.12:9).

Portanto. Isto é, devido aos perigos do orgulho e do egoísmo, os cristãos devem se colocar sob a ordem divina. Ele promete que nenhuma tentação estará além do poder que nos dá para resisti-la (ver 1Co.10:13).

Resisti. Do gr. anthistemi, “opor-se”; comparar com Ef.4:27.

Diabo. A personalidade do diabo está implícita (ver com. de Mt.4:1). Paulo descreve o preparo do cristão para resistir com êxito aos ardis do diabo (ver com. de Ef.6:13-17). A vitória de Cristo sobre o diabo no deserto (ver com. de Mt.4:1-11) foi obtida “por meio da submissão e fé em Deus” (DTN, 130). Todo cristão resistirá à tentação assim como Cristo resistiu.

Fugirá. Satanás treme e foge diante da mais frágil alma que se refugia no poder de Cristo (DTN, 131).

Tg.4:8 8. Chegai-vos a Deus, e ele se chegará a vós outros. Purificai as mãos, pecadores; e vós que sois de ânimo dobre, limpai o coração.

Chegai-vos. Este imperativo é o segredo para se resistir com êxito a Satanás (cf. v. Tg.4:7). Embora Deus não esteja longe de cada um de nós (At.17:27), Ele espera que O busquemos (ver 2Cr.15:2; SI.145:18; ls.55:6). Aproximamo-nos de Deus por meio da fé (ver Hb.7:25) e pelo arrependimento sincero (ver Os.14:1; Ml.3:7).

Ele. Assim como o pai na parábola do filho pródigo avistou seu filho “ainda longe” (Lc.15:20), nosso Pai celestial anseia e espera que nos voltemos para Ele. Contudo, Ele não nos força a aceitar Seu amor (ver PP, 384).

Purificai. Purificar as mãos simbolizava a remoção da culpa (ver Dt.21:6; SI.24:4; Sl.26:6; Sl.73:13; Mt.27:24; ver com. de Is.1:15-16). Paulo especifica “mãos santas” como uma das condições para que a oração seja respondida (ver 1Tm.2:8).

Pecadores. Comparar com “infiéis” (v. Tg.4:4).

Limpai. Ver com. de 1Jo.3:3.

Ânimo dobre. Ver com. de Tg.1:8. A lealdade deve ser completa.

Tg.4:9 9. Afligi-vos, lamentai e chorai. Converta-se o vosso riso em pranto, e a vossa alegria, em tristeza.

Afligi-vos. Os pecadores devem sentir sua real condição deplorável. Todos devemos buscar estar sempre cientes de nossa condição espiritual. A igreja de Laodiceia recebeu exortação especial com respeito a esse assunto (ver com. de Ap.3:17). A amizade com o mundo (Tg.4:4), as contendas (Tg.3:16; Tg.4:1) e a cobiça (Tg.4:1-5) deveriam ter feito com que todos os membros sinceros se afligissem.

Lamentai. Ver com. de Mt.5:4. Esta é uma forte exortação ao arrependimento, com o objetivo de alcançar até aqueles a quem Tiago repreendeu duramente. Existe esperança, pois “a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação” (ver com. de 2Co.7:10).

Riso. Isto é, o riso que marcou seus “prazeres” (ver v. Tg.4:1). Esse tipo de regozijo se converte em um narcótico que encoraja a falsa satisfação e segurança, embora a alma esteja a todo o tempo à beira da destruição. No entanto, Tiago não dá a entender que a vida cristã deva ser caracterizada por uma tristeza sombria.

Pranto. O resultado inevitável do regozijo frívolo.

Alegria. ”Converta-se o vosso riso em pranto” forma um paralelismo poético com “e a vossa alegria, em tristeza” (ver vol. 3, p. 8-13).

Tristeza. Do gr. katepheia, “melancolia”, “desalento”; comparar com “humildes” (v. Tg.4:6).

Tg.4:10 10. Humilhai-vos na presença do Senhor, e ele vos exaltará.

Humilhai-vos. Ver com. de Mt.11:29; Mt.23:12; Tg.1:9. Tiago resume desta forma as várias admoestações sobre a lealdade completa á vontade de Deus. Para quem é honesto consigo mesmo, sua deplorável condição produz um espírito humilde diante de Deus, que está sempre disposto a perdoar (ver com. de Is.57:15).

Na presença. Essa contrição será genuína, pois os “humildes” não se mascaram com falsa modéstia, para serem vistos pelas pessoas. Nem os atos externos nem as motivações internas podem ser ocultados do Senhor (ver 2Cr.16:9; Hb.4:13). A despeito da natureza do pecado e de quem foi prejudicado por ele, o pecado é contra o próprio Senhor (ver com. de SI.51:4).

Exaltará. Comparar com Tg.1:9. Os “humildes” serão exaltados por Deus nesta vida, até certo ponto, e, mais plenamente, na vida porvir. É Deus quem vivifica “o espírito dos abatidos” (ver com. de Is.57:15). Assim como Jônatas e João Batista (Ed. 156, 157), os que, “mediante a abnegação, entraram na comunhão dos sofrimentos de Cristo” terão a recompensa da honra eterna. Aquele que se dispõe a ser ensinado por Deus e a confiar na Sua direção jamais será rejeitado (ver com. de Pv.15:33).

Tg.4:11 11. Irmãos, não faleis mal uns dos outros. Aquele que fala mal do irmão ou julga a seu irmão fala mal da lei e julga a lei; ora, se julgas a lei, não és observador da lei, mas juiz.

Não faleis mal. Ou, “parai de falar mal” ou “deixai de difamar”. Tiago deixa de se ocupar dos deveres dos membros da igreja para com o Senhor, a quem professam servir, e condena alguns males específicos que prejudicam a igreja. A falta de humildade perante Deus inevitavelmente leva a uma falta similar perante o semelhante. A prática de criticar os irmãos de fé revela flagrante egoísmo e se torna fonte de dissensão na igreja (ver Tg.3:2-6).

Irmão. Isto é, o membro de igreja.

Julga. Quem fala contra um membro da igreja o “julga”. Esse julgamento está associado com o hábito de criticar, cujo propósito é fazer dano (ver com. de Mt.7:1-5).

Lei. O juízo impiedoso, seja de qualquer tipo, é inconsistente com o espírito da lei moral. O princípio do amor é violado pelo desejo de autoafirmação e pela crítica a outros.

Julga a lei. Isto é, quem julga parece dizer que a lei não se aplica a ele. É como se dissesse que não existe lei para proteger o irmão prejudicado, nem lei que condene seu espírito crítico.

Não és observador da lei. Tiago mais uma vez censura o membro de igreja pela contradição entre sua profissão de fé e seus atos (ver Tg.1:22-25). Todo membro de igreja deve sentir a obrigação pessoal de ser guiado pelo espírito da lei de Deus, a despeito da natureza das provocações que possa sofrer.

Juiz. Isto é, da lei. Ao desconsiderar a jurisdição da lei sobre todos os seres humanos, o crítico aspira à posição de legislador, em vez de observador da lei. Com frequência, a causa das críticas está no próprio padrão de conduta do membro crítico ou nas suas interpretações particulares da Bíblia, que o levam a condenar todos os que não concordam com ele.

Tg.4:12 12. Um só é Legislador e Juiz, aquele que pode salvar e fazer perecer; tu, porém, quem és, que julgas o próximo?

Um só é Legislador. Evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) o acréscimo das palavras “e juiz”. Em assuntos espirituais, apenas o Legislador pode ser juiz. Somente Deus pode discernir, sem possibilidade de erro, o caráter de alguém. Consequentemente, só Ele pode decidir o destino eterno de alguém (ver com. de 1Co.4:5).

Salvar. Ver com. de At.4:12.

Perecer. Do gr. apollumi (ver com. de Jo.3:16).

Tu, porém, quem és [...]? Tiago enfatiza o absurdo de alguém tentar julgar o outro, tendo em vista que o ser humano não pode discernir as motivações. De uma forma ou de outra, todos são violadores da mesma lei, e é o orgulho egoísta que impele alguém a depreciar e a ferir outros com palavras.

Outrem (ARC). Evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a variante “próximo” (ARA).

Tg.4:13 13. Atendei, agora, vós que dizeis: Hoje ou amanhã, iremos para a cidade tal, e lá passaremos um ano, e negociaremos, e teremos lucros.

Atendei, agora. Uma frase com objetivo de chamar atenção, indicando desaprovação do que segue. Tiago continua seu tema: a lealdade dividida dos membros da igreja. A pessoa de “ânimo dobre” (Tg.1:8) não possui sabedoria divina (ver com. de Tg.1:5; Tg.3:14-18). Ela negligencia a gentileza que deveria ter para com seu próximo (ver com. de Tg.2:1-17; Tg.4:11-12) e não tem pureza de coração diante de Deus (ver com. de Tg.3:17; Tg.4:3-10). Tiago se dirige aos membros que negligenciam a relação com Deus no viver.

Dizeis. Seja pela palavra dita ou por pensamento.

Hoje. Essas pessoas planejam o futuro como se Deus não existisse. Além disso, fazem planos como se seu futuro estivesse em suas mãos (comparar com Pv.27:1).

Passaremos. A linguagem implica que, quando esse período tivesse passado, fariam planos similares para outra época.

Negociaremos. O apóstolo não condena o planejamento de negociações. Mas o caso típico que cita reflete a negligência em relação aos propósitos divinos.

Lucros. O ponto de vista “mundano” (ver com. de Tg.3:15) enfatiza a vantagem material em detrimento do espírito. A prosperidade material não é pecado (ver com. de Tg.1:10) se permanece secundária ao objeto principal de todo o cristianismo: o cumprimento da vontade divina (comparar com o caso do rico louco, ver com. de Lc.12:15-21).

Tg.4:14 14. Vós não sabeis o que sucederá amanhã. Que é a vossa vida? Sois, apenas, como neblina que aparece por instante e logo se dissipa.

No entanto (AA). Ou, “em vista de”. O v. 14 é um parêntese.

Que. Isto é, qual a natureza de Sua vida?

É (ARC). Evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) o verbo “sois” (ARA).

Neblina. Ou, “vapor”, “fôlego”. A existência humana neste mundo é incerta e de curta duração (ver 1Cr.29:15; Jó.8:9; SI.102:11; Tg.1:10-11).

Por instante. A ênfase está na brevidade da vida, em vez de na vida em si.

E logo se dissipa. Isto é, a vida humana começa a desaparecer quase tão logo quanto se inicia. Como o vapor, a vida pode se dissipar repentinamente.

Tg.4:15 15. Em vez disso, devíeis dizer: Se o Senhor quiser, não só viveremos, como também faremos isto ou aquilo.

Em vez disso. Do gr. anti.

Se o Senhor quiser. Tiago não quer dizer que o cristão deva sempre dizer isto, mas que o espírito de submissão refletido nestas palavras deveria guiar todos os planos. A pessoa do primeiro exemplo (ver com. do v. Tg.4:13) negligencia a vontade de Deus para seu futuro e prefere o ganho material. A segunda percebe a incerteza da vida e se esforça para pôr o serviço a Deus em primeiro lugar. Sabe que Deus tem um plano especial para ela, e que terá verdadeira alegria somente se adotar esse plano. Uma aplicação consistente desse princípio pode significar que alguns planos de vida serão modificados, a fim de que se concretize o plano melhor de Deus. O cristão genuíno aceita isso com alegria, na certeza de que Deus dirige seu viver. Paulo viveu um dia de cada vez, sabendo que sua vida estava nas mãos de Deus. Ele pôde dizer, em verdade, que todos os seus planos estavam subordinados à vontade do Senhor (ver At.18:21; 1Co.4:19; Fp.2:24).

Viveremos. Comparar com At.17:28.

Faremos. Quando nos submetemos à vontade divina (v. Tg.4:7) fazemos bem em lembrar que os caminhos de Deus muitas vezes são diferentes dos nossos (cf. Is.55:8-9). Portanto, um cristão fiel enfrenta cada dia com confiança na direção divina em tudo o que faz.

Tg.4:16 16. Agora, entretanto, vos jactais das vossas arrogantes pretensões. Toda jactância semelhante a essa é maligna.

Agora, entretanto. Ou, “mas na verdade”, isto é, em vez do que deveria estar dizendo.

Jactais. Do gr. kauchaomai, “gloriar-se”. Longe de perceberem a gravidade de sua condição, esses jactanciosos membros da igreja (cf. v. Tg.4:13) continuavam a fazer planos para o futuro. Em vez de serem humildes perante Deus, exibiam sua autossuficiência.

Pretensões. Do gr. alazoneiai, “alardes”. Está implícita a confiança presunçosa na esperteza, habilidade e força. Esses membros que confiavam em si mesmos agiam como se o futuro estivesse nas mãos deles e seu êxito dependesse de sua capacidade.

Semelhante a essa. Isto é, todo esse tipo de jactância, que com presunção exalta as habilidades do ser humano. Jactar-se ou gloriar-se nas realizações de Deus não é mau. Paulo, por exemplo, se gloriava na cruz de Cristo (ver Gl.6:14; 1Ts.2:19).

Maligna. Isto é, porque exalta a autossuficiência e fomenta a presunção. Esse tipo de pensamento é vil e se assemelha ao espírito de Lúcifer (ver com. de Is.14:13-14; Ez.28:14-18).

Tg.4:17 17. Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz nisso está pecando.

Portanto. Tiago se refere em específico ao tema dos versículos anteriores, isto é, fazer planos para o futuro. A verdade religiosa mais ensinada nas Escrituras é quanto à incerteza da vida e da tragédia da existência não entregue a Deus. Contudo, poucas verdades são tão desconsideradas quanto essa.

Sabe. Ver com. de Jo.13:17.

Bem. Isto é, em contraste com o mal (v. Tg.4:16). A parábola dos talentos ilustra esse princípio geral (Mt.25:14-30).

E não o faz. Aqueles que são apenas “ouvintes” e não “praticantes” mostram que sua religião é “vã” (ver com. de Tg.1:23; Tg.1:26). Uma pessoa de fé pervertida confia apenas no conhecimento e prova sua falsidade quando evita atos que o crente sincero faria com alegria (ver com. do Tg.2:17; Tg.2:20; Tg.2:26). Esta também é uma repreensão para quem negligencia o estudo da Palavra de Deus, tendo em vista que mais conhecimento aumentaria sua obrigação pessoal.

Pecando. O argumento de que não se fez nenhum dano será uma desculpa insuficiente no dia do juízo para pessoas como o servo negligente (ver com. de Mt.25:27). A fuga deliberada de um dever conhecido é rebelião contra a vontade divina. Essa situação aumenta a dificuldade que confronta o de “ânimo dobre” (ver com. de Tg.1:8), o que se supõe religioso (ver com. de Tg.1:26), o de fé morta (ver com. de Tg.2:17; Tg.2:20) e o “mundano” (ver com. de Tg.3:15). Todas essas características de membros de igreja imperfeitos são o resultado da falta de um comprometimento total com a obediência aos mandamentos de Deus. Eles vacilam entre o que sabem, o que devem fazer e o que pessoalmente desejam fazer (ver Tg.4:17), com o resultado de que não se submetem sem reservas à vontade de divina.

Tg.5:1 1. Atendei, agora, ricos, chorai lamentando, por causa das vossas desventuras, que vos sobrevirão.

Atendei, agora. A dura repreensão no cap. Tg.4:13 se dirige àqueles que buscam riquezas sem considerar o plano de Deus para sua vida. Tiago reprova aqueles que alcançaram seu objetivo material e enriqueceram.

Ricos. O contexto imediato indica que “ricos” são exemplos de pessoas que sabem de oportunidades para fazer o bem, mas as evitam. Neste caso, “ricos” podem ou não ser membros da igreja. Tiago apresenta a posição dos “ricos” a partir de uma perspectiva adequada, a fim de que os membros que sofrem adversidades materiais não os invejem. Existem posses de maior valor e mais duradoras do que as riquezas. Esse juízo sobre os ricos vem depois de se tratar o tema da negligência a Deus na busca dos prazeres mundanos no cap. 4 (comparar com o que Cristo diz sobre as riquezas, ver com. de Lc.6:24).

Chorai lamentando. Do gr. ololuzo, “chorar em aflição”, “lamentar audivelmente”.

Desventuras. Do gr. talaiporiai, “sofrimentos”, “desgraças”, “misérias”.

Sobrevirão. Literalmente, “estão vindo”. Sem dúvida, é um presente com caráter de futuro como em Jo.14:3 (ver com. ali). O apóstolo se refere não somente à incerteza que sempre cerca o acúmulo de riquezas, mas também às crescentes tensões à medida que se aproximam os últimos dias da história da Terra (ver com. dos v. Tg.5:3; Tg.5:7).

Tg.5:2 2. As vossas riquezas estão corruptas, e as vossas roupagens, comidas de traça;

Riquezas. Talvez um termo geral que inclui os itens que seguem: vestes, ouro e prata. No entanto, se a palavra “corruptas” for entendida literalmente, “riquezas” deve se referir à produção dos campos e dos rebanhos: cereais, frutos, vinho, azeite, etc., que foram armazenados e se perderam. A maior parte da riqueza do rico louco da parábola de Cristo consistia em produtos agrícolas (ver com. de Lc.12:16-20). Essas “riquezas” são inúteis, pois levam à satisfação própria e são adquiridas à custa dos direitos alheios (ver Tg.5:4). Apesar de toda riqueza terrena, o rico não convertido “não é rico para com Deus” (ver com. de Lc.12:21).

Corruptas. Ou, “em decomposição”.

Roupagens. A riqueza demonstrada pelas vestes caras é mais comum nas terras bíblicas do que no Ocidente, pois a moda no Oriente não muda com frequência. Porém, em toda parte, vestes caras são sinal de riqueza.

Traça. Ver com. de Mt.6:19-20.

Tg.5:3 3. o vosso ouro e a vossa prata foram gastos de ferrugens, e a sua ferrugem há de ser por testemunho contra vós mesmos e há de devorar, como fogo, as vossas carnes. Tesouros acumulastes nos últimos dias.

Gastos. Ou, “corroídos”. Tiago compara o melhor das riquezas mundanas com ferro inútil, sem valor.

Ferrugens. O desgaste no ouro e na prata da riqueza do rico evidencia o desuso por um longo período (comparar com a experiência do homem da parábola dos talentos, que enterrou seu único talento na terra, ver com. de Mt.25:25-30).

Testemunho. Essa ferrugem que indica que as posses não foram usadas será uma evidência clara contra os “ricos” no dia do juízo. O dinheiro que possuíam foi acumulado com egoísmo, quando poderia ter sido usado no serviço de Deus e para o próximo. A destruição de seus tesouros prevê sua condenação iminente. Homens do AT tinham o costume de deixar seu dinheiro num lugar secreto que consideravam seguro (ver Is.45:3), pois não havia bancos para se depositarem fundos particulares.

Devorar. Ou, “consumir”. Essas “ferrugens” envolvem destruição, não só de posses materiais, mas também do corpo e da alma.

Como fogo. É possível ligar esta frase com a que segue: “visto que acumulastes fogo nos [ou para] os últimos dias”. “Fogo” se refere neste caso ao juízo divino final sobre todos os ímpios. “Ferrugens” representam os tesouros inúteis que os ímpios escolhem de preferência às riquezas celestiais. Aquilo que se tornou em meras “ferrugens” será consumido no “fogo” do último dia. O fogo do juízo final aguarda todos os que se ocupam em adquirir posses materiais. Portanto, os “últimos dias” se referem ao dia do juízo final (comparar com Rm.2:5, que literalmente diz: “acumulas contra ti mesmo ira para o dia da ira”).

Tesouros acumulastes. Os avarentos acumulam com seus atos egoístas uma medida cheia de justiça, que Deus fará cair sobre eles no dia do juízo. Os “ricos” imaginam assegurar seu futuro com o acúmulo de riquezas materiais; mas, ao fazerem isso, negligenciam o que os tornaria “ricos para com Deus” (Lc.12:21). Todo homem, rico ou pobre, terá sua recompensa (ver com. de Mt.16:27; Lc.6:35; 1Co.3:8; Ap.22:11). A recompensa que os ímpios ricos têm armazenado será o “fogo” da ira de Deus (ver Ap.20:15; Ap.21:8).

Nos últimos dias. Ver com. de 2Tm.3:1. As declarações de nosso Senhor sobre o acúmulo de riquezas (ver com. de Mt.6:24-34; Lc.12:13-34) revelam que a condição descrita em Tg.5:1-6 prevalecia na época do NT. O mesmo acontecia na época do AT (ver Is.5:8; Am.2:6-8; Mq.2:1-3). A cobiça sempre leva à opressão, e sempre será assim. Mas, assim como a violência e a injustiça das quais Paulo fala em 2Tm.3:1-5 (ver com. ali; cf. Tg.5:7), a cobiça e a opressão atingirão um clímax nos dias precedentes à vinda do Senhor. Nos “últimos dias”, os ímpios receberão a recompensa reservada para eles.

Tg.5:4 4. Eis que o salário dos trabalhadores que ceifaram os vossos campos e que por vós foi retido com fraude está clamando; e os clamores dos ceifeiros penetraram até aos ouvidos do Senhor dos Exércitos.

Eis. Tiago descreve vividamente um método pelo qual alguns dos “ricos” acumulam fortuna. Desonestidade assim como atraso no pagamento de salários são proibidos no AT (ver com. de Dt.24:14-15). Os ricos pensam que estão acumulando “ouro”, quando na verdade podem estar acumulando “fogo” para si próprios no dia do juízo (ver com. de Tg.5:3).

Salário. Ou, “pagamento”.

Trabalhadores. Aqueles por cujo esforço os ricos se enriqueceram.

Ceifaram. Representa qualquer tipo de serviço assalariado.

Por vós. Condena-se todo esforço para tirar vantagem do trabalho de outro, seja por fraude pública ou pelo pagamento de salários miseráveis.

Retido com fraude. No grego está implícito que os salários foram e continuam sendo retidos.

Clamando. De modo figurado, como o sangue de Abel (ver com. de Gn.4:10), o pecado de Sodoma e Gomorra (ver Gn.18:20; Gn.19:13) e as almas dos mártires debaixo do altar (ver Ap.6:9-10). Nenhuma injustiça escapa da atenção do Deus onisciente.

Os clamores dos ceifeiros. Junto com o clamor inarticulado da fraude em si estão os clamores daqueles que foram oprimidos e, como resultado, estão em angústia.

Do Senhor dos Exércitos. Ver com. de Je.7:3; Rm.9:29. O Deus onipotente não ignorará o clamor por justiça. Os trabalhadores oprimidos podem estar certos de que um dia a justiça prevalecerá e que os males que sofreram serão reparados (ver Lc.16:19-25).

Tg.5:5 5. Tendes vivido regaladamente sobre a terra; tendes vivido nos prazeres; tendes engordado o vosso coração, em dia de matança;

Vivido regaladamente. Do gr. truphao, “ter uma vida tranquila e luxuosa”. As riquezas acumuladas à custa do pobre são gastas na busca do prazer (ver com. de Tg.3:15; Tg.4:3).

Sobre a terra. Esta Terra é o centro de suas afeições. As afeições do cristão verdadeiro estão no Céu (ver Cl.3:1-2).

Prazeres. Isto é, extravagantemente luxuoso.

Engordado o vosso coração. O objeto de uma vida dissoluta é alimentar todo desejo e capricho (cf. Lc.12:19). A complacência do egoísmo é inebriante, e quem se envolve nisso nunca se satisfaz.

Em dia de matança. O dia do acerto de contas se aproxima para todos, bons e maus (ver com. de 2Co.5:10). Uma vida alimentada pela satisfação egoísta é como a de uma ovelha que é engordada para o abate (cf. Tg.5:3; Je.12:3; Je.25:34).

Tg.5:6 6. tendes condenado e matado o justo, sem que ele vos faça resistência.

Condenado. Assim como em todas as épocas, a riqueza do rico muitas vezes influencia fortemente a justiça. Isso infelizmente acontecia nos tempos bíblicos (cf. com. de Tg.2:6).

O justo. Desde o assassinato de Abel (ver Gn.4:8) até o fim dos tempos, a mão de opressores egoístas traz miséria e, às vezes, morte ao inocente.

Resistência. Do gr. antitasso, “opor-se”, “oferecer resistência”. O testemunho desses justos “condenados” e maltratados se levantará em terrível condenação de todos os opressores no dia do juízo. Os justos oprimidos não podem resistir à tirania dos ricos nesta vida, e terão justiça somente quando Deus Se levantar para vingar a causa deles. Então, lhes será feita justiça; eles serão recompensados, e os opressores ímpios, destruídos (ver v. Tg.5:3; Tg.5:5).

Tg.5:7 7. Sede, pois, irmãos, pacientes, até à vinda do Senhor. Eis que o lavrador aguarda com paciência o precioso fruto da terra, até receber as primeiras e as últimas chuvas.

Sede [...] pacientes. Tendo em vista a vingança dos justos na vinda de Cristo, Tiago insta seus companheiros de fé a serem pacientes em face da provocação e a não perderem a coragem. A perspectiva da brevidade dos problemas terrenos comparada à alegria ilimitada da vida eterna sempre foi fonte de encorajamento para os de coração reto.

Pois. Alguns podem estar correndo o risco de se desviarem espiritualmente, pois veem a prosperidade terrena dos ímpios (cf. SI.73:2-3). Outros podem se desanimar com a incessante opressão dos ricos (ver Tg.2:6; Tg.5:6). Porém, a certeza do juízo por vir e da vingança dos justos (ver com. de Rm.2:6) constitui forte razão para renovar o ânimo.

Vinda. Do gr. parousia, “presença”, “chegada” (ver com. de Mt.24:3). Paulo descreve o advento como “bendita esperança” (Tt.2:13). Nesse dia, os justos terão sua recompensa (Lc.14:14).

Lavrador. Cristo compara o fim do mundo a uma colheita (ver com. de Mt.13:30; Mt.24:32).

Espera (ARC). Depois de plantada a semente, o fazendeiro pode apenas esperar com paciência seu crescimento. O cristão deve esperar ter problemas e dificuldades assim como um lavrador ao plantar uma lavoura.

Precioso. Isto é, querido, valioso.

Aguardando-o (ARC). O pronome pessoal oblíquo “o” pode se referir ao “fruto” que recebe a chuva ou ao lavrador, que considera a chuva como uma bênção divina.

As primeiras e as últimas chuvas. Evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) a omissão da palavra “chuvas”. Porém, sem dúvida, esta palavra é apropriada aqui (ver Je.5:24; Os.6:3; Jl.2:23; ver com. de Dt.11:14). O lavrador devia aguardar ambas as chuvas, pois se alguma faltasse não haveria colheita.

Tg.5:8 8. Sede vós também pacientes e fortalecei o vosso coração, pois a vinda do Senhor está próxima.

Também. Esta admoestação se baseia na ilustração do v. Tg.5:7. Se as pessoas estão dispostas a seguir o método do Senhor de plantar, cultivar e colher, devem também se submeter a Sua direção, a fim de que a colheita espiritual do mundo seja concluída (ver Mt.13:39).

Fortalecei. Do gr. sterizo, “assegurar”, “estabelecer”, “tornar estável”. Deus fortalece o coração (ver 1Ts.3:13), mas nos pede que cooperemos com Ele.

Vinda. Ver com. do v. Tg.5:7.

Está próxima. Do gr. eggizo, “aproximar-se”. Embora tenha dito que ninguém conhece “o dia e a hora” de Seu segundo advento, Jesus encorajou os cristãos a compreender o significado dos tempos e a saber quando o advento se aproxima (ver com. de Mt.24:36). Cristo admoestou Seus discípulos a sempre estarem preparados para Seu retorno, e cristãos consagrados de todas as épocas guardaram a esperança de que o advento do Senhor estava próximo nos seus dias (ver Nota Adicional a Romanos 13; Rm.13:14).

Tg.5:9 9. Irmãos, não vos queixeis uns dos outros, para não serdes julgados. Eis que o juiz está às portas.

Queixeis. Do gr. stenazo, “gemer”, “suspirar”. Um gemido contra o outro seria uma murmuração reprimida de impaciência ou condenação.

Uns dos outros. Depois de exortar seus leitores a serem pacientes para suportar as injustiças dos ricos opressores (ver v. Tg.5:7), o apóstolo os exorta a serem pacientes uns com os outros. Cristãos que enfrentam com destemor as mais severas injustiças às vezes se tornam impacientes com problemas menores dentro da igreja. Os cristãos precisam do encorajamento de seus irmãos de fé ao enfrentarem aflições.

Julgados. Do gr. krino, “julgar” (ver com. de Rm.2:1; Mt.7:1-5). Queixar-se e criticar é uma falta tão grave quanto a condenação direta e revela um espírito carente de amor e cheio de contenda.

Juiz. Isto é, o Senhor Jesus (cf. Fp.4:5; Tg.5:8). O Pai confiou o juízo deste mundo a Ele (ver com. de Jo.5:22; Jo.5:27; At.10:42).

Está. No grego está implícito que o Senhor estava às portas naquele mesmo instante (cf. Tg.5:8; ver com. de Mt.24:33). Tiago destaca a iminência do advento e que o tempo requer um caráter preparado para encontrar o Senhor. Não há tempo para buscar faltas nos outros.

Tg.5:10 10. Irmãos, tomai por modelo no sofrimento e na paciência os profetas, os quais falaram em nome do Senhor.

Tomai por modelo. Do gr. hupodeigma lambano, “tomar como modelo a ser imitado”.

No sofrimento. Do gr. kakopatheia, “sofrendo infortúnios”.

Paciência. Ver v. Tg.5:7. Assim como o exemplo do sofrimento dos profetas deve nos consolar em nosso desânimo, o exemplo da paciência deles deve nos encorajar a sermos pacientes.

Profetas. Comparar com Mt.5:12; Hb.11:1-12:11. A coragem persistente de outros que enfrentaram adversidades semelhantes com fé traz ânimo aos que os seguem. Além disso, se Jesus foi afligido, Seus discípulos devem esperar o mesmo (cf. Mt.10:24-25; Jo.16:33).

Em nome do Senhor. Isto é, com Sua autoridade e representando Sua pessoa (ver com. de At.3:16). Tiago e seus leitores criam que o AT consistia de mensagens dadas por Deus aos profetas (ver com. de 2Tm.3:16; 2Pe.1:20-21).

Tg.5:11 11. Eis que temos por felizes os que perseveraram firmes. Tendes ouvido da paciência de Jó e vistes que fim o Senhor lhe deu; porque o Senhor é cheio de terna misericórdia e compassivo.

Temos por felizes. Do gr. makarizo, “declarar feliz”, “chamar bendito”. A forma adjetiva, makarios, introduz cada uma das bem-aventuranças (ver com. de Mt.5:3).

Perseveram. A fidelidade constante em meio aos problemas (ver com. de Tg.1:3) revela lealdade completa a Deus e se torna um requisito para a vida eterna (ver com. de Mt.10:22; Mt.24:13). Quando os membros da igreja passam por dificuldades, podem reclamar as mesmas bem-aventuranças.

Jó. Poucos foram chamados a demonstrar sua fé em circunstâncias mais probantes. É evidente que o escritor da epístola considera Jó uma pessoa histórica, não alegórica.

Fim. Do gr. telos, “objetivo”, “propósito”, “meta”. Os membros da igreja são instados a considerar o propósito e o resultado das provas satânicas infligidas a Jó. O Senhor permitiu que Satanás afligisse Seu servo para que o esplendor de sua fé provada pudesse vindicar o juízo divino da sinceridade de Jó. Deus jamais abandonou Jó, e, quando este demonstrou sua fidelidade, Deus o recompensou amplamente (ver com. de Jó.42:12; Jó.42:16). Talvez os leitores de Tiago corriam o perigo de sentirem que suas aflições fossem um sinal do descontentamento de Deus. Caso tivessem perdido tudo por seguir a Cristo, seriam recompensados no mundo porvir (ver com. de Mt.19:29).

Terna misericórdia. Tiago encoraja todo membro da igreja a enfrentar as aflições com destemor e paciência, pois Deus os recompensará.

Compassivo. Ou, “generoso”.

Tg.5:12 12. Acima de tudo, porém, meus irmãos, não jureis nem pelo céu, nem pela terra, nem por qualquer outro voto; antes, seja o vosso sim sim, e o vosso não não, para não cairdes em juízo.

Acima de tudo. Tiago chega ao clímax de sua linha de pensamento (comparar com o com. de Mt.5:33-37).

Não jureis. Ver com. de Mt.5:34-37.

Sim sim. Quando as palavras de uma pessoa se provam verdadeiras por meio de seus atos, ela não terá a necessidade de reforçá-las com um juramento. Os rabis declararam: “O Santo, bendito seja, disse a Israel: Não imaginais que podeis jurar por Meu nome, mesmo quando seja verdade” (Midrash Rabbah, sobre o com. de Nm.30:2, ed. Soncino, p. 853, 854).

Juízo. Do gr. krisis (ver com. do v. Tg.5:9: cf. Ex.20:7).

Tg.5:13 13. Está alguém entre vós sofrendo? Faça oração. Está alguém alegre? Cante louvores.

Sofrendo. Do gr. kakopatheo, “sofrer adversidade” (cf. v. Tg.5:14). Com frequência, Tiago menciona que é inevitável ter problemas e dificuldades nesta vida (ver Tg.1:2; Tg.1:12; Tg.1:14; Tg.2:6; Tg.2:15; Tg.3:14-16; Tg.4:7; Tg.5:6).

Faça oração. Em vez de murmurar na aflição (v. Tg.5:7, ou fazer juramentos, v. Tg.5:12), o melhor é orar. A oração confere equilíbrio e perspectiva tanto no sofrimento quanto na alegria. O Senhor espera que oremos a Ele na adversidade (ver com. de SI.50:15; Hb.4:16).

Está alguém alegre? É plano de Deus que os membros da igreja vivam com alegria e serenidade (ver Pv.15:13; Pv.15:15; At.27:22; At.27:25). Em meio aos problemas, os cristãos podem ter a certeza de que Deus os ampara com Sua graça e Seu conforto.

Cante louvores. Do gr. psallo, “tocar instrumento de cordas”, “cantar um hino de louvor” (ver com. de Ef.5:19; Cl.3:16). Deus é a fonte de toda alegria, e lembrar-se disso impede que desanimemos. Seja no pesar ou na alegria, a oração e o louvor nos farão lembrar do cuidado amoroso de Deus.

Tg.5:14 14. Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo, em nome do Senhor.

Doente. Isto é, fisicamente. No v. Tg.5:13, a referência é à aflição em geral.

Chame. Encoraja-se o doente a tomar a iniciativa de pedir oração especial.

Presbíteros. Do gr. presbuteroi (ver com. de At.11:30).

Oração. Embora saibamos do “dever de orar sempre” (ver com. de Lc.18:1), quando estamos doentes deveríamos sentir mais necessidade de orar. Muitas vezes, a esperança e a confiança se enfraquecem em tempos de aflição física. Por isso, Cristo quer que Seus servos repartam Seu bálsamo curativo e Seu amor reconfortante. A oração genuína é uma manifestação do esforço humano para entender o plano de Deus e cooperar com ele (ver com. de Mt.6:8; Lc.11:9).

Ungindo-o. Do gr. aleipho, “ungir”, “untar” (cf. Mc.6:13). É evidente que a igreja apostólica não atribuía nenhuma eficácia sacramental à cerimônia de unção, embora mais tarde a igreja usasse o que se supunha ser “óleo santo” como um substituto da mágica pagã, numa tentativa de curar os enfermos. Por volta do 8º século, esta passagem das Escrituras passou a ser usada para apoiar a prática que os católicos atualmente chamam de extrema unção, ou os últimos ritos da igreja para um doente terminal. Na décima quarta sessão do Concílio de Trento, em 1.551, declarou-se oficialmente que Tiago ensina a eficácia sacramental do óleo.

Nome do Senhor. Os seres humanos são apenas os instrumentos; os milagres da saúde restaurada e do perdão dos pecados são realizados em nome de Jesus Cristo (ver Mc.16:17; ver com. de At.3:16). O serviço completo, incluindo a aplicação do óleo e o oferecimento da oração, deve ser feito em harmonia com a vontade do Senhor. A oração oferecida, seja qual for o propósito, é algo sério, pois significa que a pessoa está sinceramente disposta a cooperar com Deus e a obedecer a todos os Seus mandamentos. A falta de sinceridade invalida a oração (ver com. de SI.66:18). Sendo assim, o membro doente não pode esperar a bênção divina sem o propósito sincero de abandonar práticas que possam, ao menos em parte, ter causado sua doença, e dali em diante viver em harmonia com as leis da saúde.

Além disso, os pedidos devem estar em harmonia com a vontade de Deus, pois ninguém sabe o que é melhor para o outro (ver com. de Rm.8:26). Algumas das mais necessárias e preciosas lições de vida se aprendem no crisol do sofrimento (cf. Hb.2:10). Portanto, pode ser que, embora Deus não cause sofrimento (ver com. de Tg.1:13), Ele considere que seja melhor permitir que a questão se prolongue por algum tempo (ver CBV, 230). Portanto, a oração pelo doente deve ser feita com confiança e submissão, crendo que o sábio Pai celestial sabe o que é melhor e nunca erra. Assim sendo, toda oração cristã sincera inclui o submisso pensamento: “faça-se a Tua vontade” (ver com. de Mt.6:10; Tg.4:15; cf. CBV, 229-231).

Tg.5:15 15. E a oração da fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados.

Oração da fé. Ver com. de Tg.1:6. A falta de fé é um obstáculo para a cura (ver com. de Mc.6:5), assim como para a salvação (ver com. de Ef.2:8). A pessoa que possui fé confia na sabedoria e no amor de Deus e busca se identificar com Seu desígnio e cumpri-lo (CBV, 231). Por isso, a oração da fé é a oferecida pela pessoa que se destaca por sua fé.

Salvará. Do gr. sozo, “resgatar da destruição”, “curar, salvar”. O NT registra casos de pessoas que tiveram a saúde restaurada de forma repentina e miraculosa (ver Mt.9:22; Mc.6:56; At.3:7; At.14:8-10). Porém, é bom lembrar que nem toda pessoa de fé, consagrada a Deus, tem a saúde restaurada (ver com. de 2Co.12:7-10; cf. CBV, 230). Por isso, pode-se entender que Tiago disse: “A oração da fé salvará o enfermo se o Senhor entender que isso é o melhor para ele”. A restauração da saúde em resposta à oração pode ser imediata ou um processo gradual. Pode ocorrer por meio de um ato divino direto que transcende o conhecimento finito da lei natural ou pode acontecer de forma indireta, e mais gradual, mediante a direção divina, com o emprego dos remédios naturais. Este último processo é tanto uma resposta à oração quanto o primeiro, assim como uma verdadeira manifestação do amor, da sabedoria e do poder divinos. O cristão maduro reconhece que Deus não faz o que ele pode fazer por si mesmo ou o que outros podem fazer por ele. Reconhecerá também que o amor e a sabedoria de Deus não intervém, como regra, de forma sobrenatural em algo que pode ser alcançado por meio de meios naturais, mediante o emprego inteligente de princípios científicos conhecidos.

Pecados. Isto é, em particular, pecados que podem pelo menos em parte ter causado a doença (ver com. de Mc.2:5). Para ser sincera, a oração deve vir acompanhada de confissão de pecados conhecidos e pelo propósito consciente e sem reservas de harmonizar a vida com a vontade de Deus. Quando se faz isso, as transgressões anteriores dos princípios do viver saudável são perdoadas com base na misericórdia divina e na determinação do enfermo de, a partir de então, viver em harmonia com os princípios de saúde conhecidos (ver com. de 1Jo.1:9). Deus estaria encorajando o pecado se curasse fisicamente alguém que não estivesse disposto a abandonar práticas pecaminosas e prejudiciais (ver CBV, 227).

Tg.5:16 16. Confessai, pois, os vossos pecados uns aos outros e orai uns pelos outros, para serdes curados. Muito pode, por sua eficácia, a súplica do justo.

Confessai. O primeiro requisito da fé sincera na oração é a consciência limpa. As faltas cometidas em segredo devem ser confessadas a Deus. Pecados que envolvam outras pessoas devem ser confessados também aos que sofreram dano. Uma consciência culpada é uma barreira à fidelidade completa a Deus e um entrave à oração.

Pecados. Do gr. paraptomata, “equívocos”, “transgressões”. Porém, evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) o termo hamartiai “pecados” (ver com. de 1Jo.3:4). Alguns sugerem que paraptomata descreva faltas menos sérias que hamartiai, mas a diferença entre as duas palavras parece estar em essência no que representam: uma “queda” ou uma “falta”, em vez de no grau de maldade. Contudo, exceto por sua provável ocorrência nesta passagem, hamartiai é empregada no NT sempre para se referir a faltas que somente Deus pode perdoar (cf. Mc.2:7), ao passo que paraptomata é empregada tanto nesse sentido como também no de falhas que podem ser perdoadas pelo próximo (cf. Mc.6:15). Neste caso, são os doentes que devem confessar seus pecados; e alguns defendem que Tiago quer dizer que eles devem fazer isso na presença dos “presbíteros da igreja” (v. Tg.5:14) que foram chamados a orar por eles. A confissão deve ser um pré-requisito para a oração pela cura. As Escrituras ensinam claramente que devemos confessar nossos pecados somente a Deus (ver 1Jo.1:9) e que existe um só “mediador” de pecados entre Deus e o ser humano: Cristo Jesus (1Tm.2:5). Ele é nosso “Advogado junto ao Pai” (1Jo.2:1).

Orai. Além de ser fonte de encorajamento, orar uns pelos outros amplia nossa capacidade de receber as bênçãos divinas.

Para. Após o doente ter confessado todos os pecados e ter examinado seu coração para determinar a sinceridade de sua fé (ver com. de Tg.1:6), deve-se apresentar então a Deus os pedidos de cura. Deus não pode conceder o pedido, mesmo se este for Seu plano, antes que essas condições sejam satisfeitas.

Muito pode. Do gr. ischuo, “ser forte”, “ter poder para cumprir [um objetivo]”. A oração como um meio de cooperar com a vontade de Deus (ver com. de Lc.11:9) contribui em muito para fortalecer a paciência cristã e desenvolver o caráter quando brota de um coração fiel e puro.

Eficácia. Isto é, feita com fervor.

Súplica. Do gr. deesis, “petição”, “rogo”.

Justo. A oração não depende de talento, conhecimento, posição, riqueza nem de cargo, mas do caráter de quem ora. O suplicante não está livre de todos os erros, pois nem Elias (ver com. do v. Tg.5:17) era perfeito. Mas ele é “justo”, pois não se apega a um pecado conhecido (ver com. de SI.66:18). Ele é justo, pois mantém pleno companheirismo e comunhão ativa com Deus, assim como Elias.

Tg.5:17 17. Elias era homem semelhante a nós, sujeito aos mesmos sentimentos, e orou, com instância, para que não chovesse sobre a terra, e, por três anos e seis meses, não choveu.

Elias. Ver com. de 1Rs.17:1.

Homem. Isto é, um mero ser humano sem vantagem extra sobre nenhum dos ouvintes de Tiago. Embora Elias não tenha passado pela morte pela misericórdia de Deus, enfrentou a vida como qualquer ser humano.

Aos mesmos sentimentos. Do gr. homoiopatheis, “de sentimentos afins”. Paulo e Barnabé asseguraram ao povo de Listra que eles eram homoiopatheis, isto é, iguais a eles (ver At.14:15). Elias não estava imune às dificuldades que todos enfrentam e algumas vezes foi afetado pela fraqueza humana (ver com. de 1Rs.19:4). Portanto, o êxito da oração de Elias não foi resultado de nenhuma qualidade sobre-humana, mas da graça de Deus. Jesus foi tentado como todos os seres humanos (ver com. de Hb.4:15), e “Sua humanidade tornou-Lhe a oração uma necessidade e um privilégio” (CC, 94).

Orou com instância. Ver com. de 1Rs.17:1; 1Rs.18:42; cf. com. de Tg.5:16.

Para que não chovesse. Ver com. de 1Rs.17:1. Sua oração não foi motivada por nenhum ressentimento contra Acabe, mas se baseou no juízo de Deus contra toda a nação por causa do culto a Baal.

Terra. Isto é, o território governado por Acabe.

Três anos e seis meses. Sobre a duração da seca, ver com. de 1Rs.18:1 (cf. Lc.4:25).

Tg.5:18 18. E orou, de novo, e o céu deu chuva, e a terra fez germinar seus frutos.

Orou, de novo. Tanto esta quanto a oração anterior foram motivadas por um desejo fervoroso de resgatar seus compatriotas da terrível idolatria. Quando seu objetivo foi alcançado e eles reconheceram Yahweh como o verdadeiro Deus, Elias orou em favor deles (ver com. de 1Rs.18:42-44). Ele amava o povo tanto quanto odiava os pecados deles.

O céu deu chuva. Ver 1Rs.18:45.

Tg.5:19 19. Meus irmãos, se algum entre vós se desviar da verdade, e alguém o converter,

Meus irmãos, se algum. Tiago conclui sua epístola de advertência e instrução, demonstrando seu interesse solícito pela salvação de cada um dos leitores. A nota dominante da epístola de Tiago é a preocupação com o bem-estar eterno de seus amados irmãos (ver Tg.1:2; Tg.2:1; Tg.3:1; Tg.3:10; Tg.4:11; Tg.5:7; Tg.5:10; Tg.5:12).

Desviar. Do gr. planao, “vagar”. Os membros da igreja podem “se desviar” da doutrina aceitando o erro, ou abandonar os princípios da conduta cristã e cair em práticas pecaminosas, também podem se desviar, atraídos pelos característicos apetites humanos (ver com. de Tg.1:14-15).

Verdade. Isto é, a norma de vida e pensamento como revelada em Jesus Cristo (ver Jo.14:6; ver com. Jo.8:32).

Converter. Do gr. epistrepho, “fazer retornar”, “trazer de volta”. Atrair com amor aos que se desviaram e firmá-los na fé é responsabilidade não apenas do pastor, mas de todo cristão. Pelo exercício da misericórdia na confissão das faltas uns para com os outros e na oração “uns pelos outros” (ver com. do v. Tg.5:16), as sombras de fraqueza e dúvida podem ser dissipadas com esperança e fortalecimento. Ninguém vive para si, e às vezes todos precisamos da mão tranquilizadora de um irmão com quem possamos compartilhar os problemas e ser animados.

Tg.5:20 20. sabei que aquele que converte o pecador do seu caminho errado salvará da morte a alma dele e cobrirá multidão de pecados.

Sabei. Isto é, por experiência real. A alegria celestial é compartilhada com o ganhador de almas quando um pecador se arrepende (ver com. de Lc.15:7).

Converte. Ver com. do v. Tg.5:19. Só Deus converte, mas os seres humanos são Seus instrumentos nessa obra celestial. Muitas são as maneiras pelas quais o cristão pode dirigir a atenção das pessoas a Deus. O argumento mais forte para levar pecadores a se voltarem para Deus é a pureza e a paz do cristão.

Morte. Isto é, morte eterna. O juízo da morte eterna aguarda todos os que permanecem no pecado (ver Rm.6:23). Resgatar um pecador da morte eterna é incomparavelmente mais glorioso do que resgatar alguém da morte física presente (ver Dn.12:3). O desejo de resgatar pessoas que de outro modo pereceriam eternamente motivou Jesusa vir a esta Terra. A mesma preocupação por seu próximo motivará o cristão genuíno.

Cobrirá. Do gr. kalupto, “cobrir”, “velar” (ver com. de SI.32:1; comparar com 1Pe.4:8). Quando a pessoa se converte, é como se seus pecados fossem lançados “nas profundezas do mar” (ver com. de Mq.7:19). Tiago conclui sua majestosa exortação a seus irmãos de fé com a tônica do NT: o resgate do ser humano de seus pecados e sua restauração à estatura plena de Jesus Cristo.