"As coisas encobertas pertencem ao nosso Deus, mas as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que observemos todas as palavras desta lei."
Deuteronômio 29:29

Capítulo e Verso Comentário Adventista > Hebreus
Hb.1:1 1. Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas,

Deus. A epístola inicia diretamente uma discussão doutrinária sem as habituais saudações de abertura (ver abertura de outras epístolas do NT; ver p. 415). No grego, a palavra para Deus não ocorre primeiro, e sim a expressão traduzida como “muitas vezes”.

Outrora. Do gr. palai, “há muito tempo”, “antigamente”. A referência é a toda a revelação do AT.

Falado. O escritor enfatiza que foi Deus quem falou por meio dos profetas. Um livro pode conter o nome de Isaías, Amós ou Daniel, mas Deus é o verdadeiro autor (cf. Jo.5:46-47). O fato de Deus ter Se revelado por meio dos profetas nos tempos do AT não impede que, mais tarde, viesse a manifestar-Se mais vezes quando necessário. Era apropriado nos tempos do AT mostrar fé na vinda do Redentor, oferecendo um cordeiro sobre o altar. Mas, depois que Cristo veio, seria inapropriado continuar com tais sacrifícios: fazê-lo já não mostraria fé, mas incredulidade. Era preciso descartar os ritos e cerimônias que apontavam para o Cristo por vir, e substituí-los por outros que demonstrassem fé em um Cristo que havia chegado. Permitir que o crente em Deus fizesse isso exigiria novas revelações do Céu.

Muitas vezes. Do gr. polumeros, “em muitas porções”, “de muitas maneiras”. A plena luz do trono de Deus não explodiu para a humanidade em um grande clarão de glória. Ao contrário, ela veio devagar, pouco a pouco, à medida que as pessoas pudessem compreender.

De muitas maneiras. Do gr. polutropos, “de várias maneiras”. Deus falou por meio dos profetas usando mensagens faladas e escritas, parábolas e recursos visuais. Ele empregou diferentes formas para Se comunicar. Descontinuar antigas cerimônias e costumes santificados, como o cristianismo requeria de Israel, e adotar os novos que, na exposição externa, não se comparavam com as antigas, cortar a conexão com o imponente templo de adoração, tudo isso, sem dúvida, parecia a muitos não só um repúdio de todas as experiências e revelações do passado, mas o fim de toda a religião. Os judeus do primeiro século e seus antepassados ofereciam sacrifícios, e Deus havia aceitado a adoração deles.

Poderia haver algum mal em continuar com aquilo que o Céu tinha abençoado tão claramente? Os judeus se lembravam de como Deus havia instruído Moisés a construir o santuário, e como o próprio Deus havia honrado a dedicação do mesmo, enviando fogo do Céu para devorar a lenha sobre o altar. A religião que fora boa para Abraão, Moisés e Elias, devia continuar a ser boa para eles também. É tarefa difícil mudar costumes de séculos; e, em poucos anos, transformar os hábitos de uma nação é quase impossível. No caso da transição do judaísmo para o cristianismo, era particularmente difícil, porque a mudança tinha que ser feita pela liderança de homens que, na estimativa da maioria das pessoas, não se comparavam com aqueles que haviam instituído os tais costumes. Portanto, o período de transição foi um dos mais difíceis. Era necessária grande sabedoria.

Sem dúvida, uma pergunta seria repetida constantemente: se Deus não exige sacrifícios agora, se estes O estão desagradando, que dizer dos grandes e bons homens do passado que os haviam ensinado a Israel e tinham oferecido sacrifícios a Deus? Esses homens não haviam seguido instruções específicas de Deus? E quem eram Paulo e os outros apóstolos que achavam que deviam mudar as antigas práticas e instituições? Os judeus provavelmente perguntavam aos apóstolos se eles se consideravam maiores do que os profetas e patriarcas do passado (cf. Jo.4:12). Essas perguntas são respondidas nas primeiras palavras da epístola aos Hebreus. Os grandes líderes do passado não tinham sido enganados. Eles tinham sido guiados por Deus. Eram homens de Deus. Quando falaram, foi Deus que falou. Eles não tinham seguido fábulas artificialmente compostas. Ao assumir essa posição, o autor de Hebreus procura naturalmente ganhar a confiança das pessoas que criam que os grandes homens e profetas do passado tinham sido guiados por Deus.

Pais. Neste caso, significa “antepassados” ou “patriarcas”.

Profetas. Do gr. prophetai (ver com. de Mt.11:9).

Hb.1:2 2. nestes últimos dias, nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo.

Nestes últimos dias. Esta é uma expressão equivalente a “nossos dias”. Os autores bíblicos às vezes falam de eventos associados ao primeiro advento de Cristo como tendo ocorrido nos “últimos dias” (ver At.2:17; Hb.9:26; 1Pe.1:5).

Pelo Filho. A palavra “Seu” (NTLH) é acrescentada bem como o artigo definido. A ausência do artigo no grego deve ser considerada como ênfase na qualidade do substantivo (ver com. de Dn.7:13; Ap.1:13; Jo.1:1). O significado literal da frase então seria: “aquele que é um Filho”. O contraste é entre a revelação feita por um profeta e a revelação por um “Filho”.

Constituiu. É difícil atribuir esse evento a qualquer momento histórico específico, visto que os propósitos de Deus são eternos. No entanto, a nomeação aqui referida provavelmente entrou em vigor por ocasião da ascensão, quando Cristo Se assentou “à direita da Majestade, nas alturas” (v. Hb.1:3). O primeiro versículo apresenta o Pai; o segundo, o Filho. Ao apresentar o Filho, o autor de Hebreus trata do coração de seu tema. Se Cristo deve substituir o sacerdócio de Arão, instituído por Moisés, Ele deve ser superior a Moisés, ou não teria o poder de revogar o que Moisés tinha instituído. Portanto, Cristo é apresentado como Deus (ver com. de Hb.1:3; cf. com. de Jo.1:1).

Herdeiro de todas as coisas. Quando Jesus veio à Terra, Ele pôs “de lado Suas vestes reais e a coroa real” (T9, 68). Ele decidiu “entregar o cetro nas mãos de Seu Pai, e descer do trono do universo” (DTN, 22, 23). Na ascensão, Ele retomou a posição que tinha com o Pai antes da encarnação (ver AA, 38, 39; cf. T8, 268, 269). Era importante que os hebreus compreendessem a verdadeira posição do Filho. Os escritores do AT não distinguem claramente as pessoas na Divindade. Israel havia sido ensinado: “Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor” (Dt.6:4). Era necessário que eles compreendessem que o Messias dividia o trono do universo com o Pai (ver Nota Adicional a João 1; Jo.1:51; cf. com. de 1Co.15:24-27).

Pelo qual também fez. O Filho é revelado como estando associado ao Pai, sendo um agente ativo na criação (ver com. de Jo.1:3; Cl.1:16-17).

Universo. Do gr. aiones. O plural, no grego, deve incluir todo o sistema de coisas trazidas à existência por Cristo. Ele criou “todas as coisas” (Hb.1:3), as “visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades” (Cl.1:16-17). Por meio de Cristo, Deus fez o mundo. Deus estava com Cristo na criação do mundo, assim como na redenção. Aquele que é o redentor da humanidade foi seu criador. Por ser criador, Ele é capaz de fazer do ser humano uma “nova criatura” (2Co.5:17). Quando alguém considera a magnitude da criação de Deus, os incontáveis milhões de mundos que circundam o trono da Divindade, não só têm um conceito ampliado de Deus, mas é levado a dizer com o salmista: “Que é o homem, que dele Te lembres e o Filho do homem, que o visites?” (SI.8:4). Deus é maravilhoso em sabedoria, conhecimento e poder, e grandioso é o amor dAquele que criou e sustenta todas as coisas. Ele convida o ser humano a se tornar participante com Ele na glória.

Hb.1:3 3. Ele, que é o resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da Majestade, nas alturas,

É. Do gr. on, expressão que denota existência eterna, atemporal (ver com. de Ap.1:4). A forma verbal relacionada en ocorre nesse mesmo sentido na expressão de João 1:1: “No princípio era [ên] o Verbo” (ver com. ali). Cristo não veio à existência “no princípio”. Ele sempre existiu e, para vir a este mundo, Se fez carne. Antes, Ele não era carne (ver com. de Jo.1:14).

Resplendor. Do gr. apaugasma, “brilho”, “fulgor”, “reflexo”, “radiação”. O Pai e o Filho são inseparáveis. O Filho revela o Pai e é o resplendor do Pai. Quando se olha para o Sol, não se vê o Sol em si mesmo, mas seus raios. Da mesma forma, não se pode ver o Pai, senão o Filho; o próprio Pai é invisível, “habita em luz inacessível, a quem homem algum jamais viu, nem é capaz de ver” (1Tm.6:16).

Glória. Do gr. doxa (ver com. de Rm.3:23; 1Co.11:7). A glória de Deus é a soma total de todos os Seus atributos. Em certa ocasião, Moisés pediu a Deus: “Rogo-Te que me mostres a Tua glória” (Ex.33:18). Em resposta ao pedido, Deus disse; “Farei passar toda a Minha bondade diante de ti” (Ex.33:19; Ex.34:5-7). A glória de Deus é Seu caráter (ver DTN, 20; PR, 312, 313; OE, 417). Cristo não Se tornou o resplendor da glória de Deus. Ele já era e sempre foi (ver com. de Jo.1:1; ver vol. 5, p. 1013). Isso constitui o fundamento essencial e eterno de Sua personalidade.

Expressão exata. Do gr. charakter, originalmente, uma ferramenta utilizada para gravação ou marcação. Mais tarde, passou a significar a própria marcação. O mesmo ocorre com certas palavras em português. O termo “carimbo” pode significar a impressão feita sobre o suporte, bem como o instrumento utilizado. Assim como um selo ou carimbo imprime uma imagem exata de si mesmo em cima do papel, Cristo é o equivalente exato de Deus.

Ser. Do gr. hupostasis, literalmente, “aquilo que está por baixo”, portanto, “substância”, “essência”, “ser real”, “realidade”. Significa realidade, em contraste com a imaginação e a fantasia. O termo é usado para definir a essência das coisas, a natureza íntima. É também usado para denotar firmeza, permanência, segurança e confiança. Quando se diz que Cristo é a “expressa imagem” da hupostasis do Pai, isso significa mais que semelhança exterior. Ele é a expressão exata e verdadeira da natureza íntima de Deus. Assim como é o Pai, tal é o Filho: um em essência, um em caráter, um em mente e propósito. Tão semelhantes Eles são que Cristo pôde dizer: “Quem Me vê a Mim vê o Pai” (Jo.14:9); “Eu e o Pai somos um” (Jo.10:30). De fato, um dos grandes propósitos da vinda de Cristo a este mundo foi dar à humanidade a verdadeira imagem do Pai.

Sustentando. Do gr. phero, “suportar”, “levar”, “carregar consigo”, “aguentar”. Aqui pode haver o significado adicional de movimento, propósito, orientação; prosseguir com intenção definitiva. Cristo é o único que sustenta todas as coisas em todo o universo e que mantém os corpos celestes em suas órbitas designadas. “NEle, tudo subsiste” e se mantém unido (Cl.1:17). Phero é mais abrangente do que a palavra portuguesa “consistir”, uma vez que abrange o conceito de trabalho com propósito e planejamento. Essa definição muda o conceito de um mero poder que sustenta o universo físico para o de um Ser inteligente que tem um plano definido em processo de realização.

Palavra. Do gr. rhema, “enunciação”, “comando”, “palavra”. O universo foi formado pela rhema de Deus (Hb.11:3; comparar com Rm.10:8; Rm.10:17-18; Ef.6:17; 1Pe.1:25).

Seu. Isto é, de Cristo.

Poder. Do gr. dunamis, “poderio”, “força”, “capacidade de executar”.

Por Si mesmo (ARC). Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a omissão desta frase. A ideia está contida, no entanto, na forma da expressão grega traduzida como “ter feito a purificação”. Cristo pisou sozinho o lagar (Is.63:3).

Purificação. Pela expiação, Cristo realizou tanto a purificação do pecado em nível geral quanto individual. A expiação, possibilitada graças ao sacrifício na cruz, finalmente, vai produzir a purificação universal do pecado. Essa obra está em andamento e não será concluída antes de ser vindicado o caráter de Deus perante o universo. Na cruz, Cristo encerrou Sua obra como vítima e sacrifício. Ele derramou Seu sangue e, portanto, foi uma “uma fonte aberta para [...] remover o pecado e a impureza” (Zc.13:1). Mas Sua obra como intercessor continua. Ele é nosso advogado junto ao Pai (ver Hb.7:25). Cristo venceu todas as tentações. Embora os pecados do mundo tenham sido colocados sobre Seus ombros, Ele era imaculado. Jesus repeliu todas as sugestões para o mal. Satanás nunca obteve um único ponto de apoio em qualquer lugar. Fez mil ataques a Cristo, mas nenhum foi bem-sucedido.

Nossos (ARC). Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a omissão desta palavra. Assim, o sentido é de que Cristo “fez a purificação dos pecados” ou “tendo feito a purificação dos pecados”. É verdade que Cristo purificou “nossos” pecados, mas o autor aqui tem uma visão mais inclusiva.

Assentou-Se. O ato de Cristo Se assentar foi formal, uma posse no ofício, uma investidura ou coroação. Foi uma investidura em autoridade, o reconhecimento do Seu direito de exercer a jurisdição. Marcou o começo, não o fim, de Sua atividade como mediador. É equivalente ao selo de Deus sobre Sua obra mediadora. Quando Cristo Se assentou à direita da Majestade, Deus colocou Sua aprovação sobre a obra de Cristo executada na Terra e a aceitou. Deus Se dirigiu a Ele como sumo sacerdote e O autorizou, a partir de então, a atuar como mediador, segundo a ordem de Melquisedeque (Hb.7:17). O lugar à direita da Majestade foi concedido a Cristo devido a Ele ter feito a purificação dos pecados. Ele venceu onde Adão havia falhado.

Ele conquistou para Si o direito de falar e agir pela humanidade. Portanto, longe de Se assentar para descansar, Ele estava começando Sua nova atividade. Assim como um juiz na Terra “toma assento” para julgar, Cristo assumiu lugar à direita de Deus e, assim, recebeu reconhecimento oficial diante da multidão reunida para passar a atuar por nomeação divina e pela vontade de Deus. Os sacerdotes terrenos ofereciam o sangue das vítimas que as pessoas levavam para o santuário, o sangue dos animais sacrificados. Assim, era necessário que Cristo, como sumo sacerdote, “tivesse o que oferecer” (Hb.8:3). Isso era não “sangue de bodes e de bezerros, mas [...] Seu próprio sangue” (Hb.9:12). Ele não poderia oferecer esse sangue até que fosse derramado na cruz; mas, assim que foi derramado, pôde iniciar Seu ministério, e o fez imediatamente após ser empossado no ofício. Então, Cristo Se tornou sacerdote para sempre e intercede pela humanidade nos lugares santos.

À direita. Lugar de honra e autoridade. Sem dúvida, esta é uma alusão ao Sl.110:1.

Majestade. Do gr. megalosune, literalmente, “grandeza”. A palavra ocorre no NT só aqui, em Hb.8:1 e em Jd.1:25. Um atributo da Divindade é aqui usado no lugar do nome divino, sem dúvida, para fins literários.

Nas alturas. Isto é, o Céu (cf. SI.93:3).

Hb.1:4 4. tendo-se tornado tão superior aos anjos quanto herdou mais excelente nome do que eles.

Tendo-Se tornado. Na encarnação, Jesus foi feito “um pouco menor que os anjos“ (ver com. de Hb.2:9). Então, Ele foi exaltado (Hb.1:3).

Tão superior. O restante do capítulo contrasta Cristo e os anjos. O autor procura mostrar que, no sentido mais elevado, Cristo é Deus. Se Cristo devesse purificar as pessoas do pecado, Ele devia ser Deus, pois só Deus pode perdoar os pecados. Por maior que sejam os anjos, e por mais altamente que os judeus os considerassem, nenhum anjo jamais poderia salvar do pecado. Por isso, o autor passa a mostrar que Cristo é muito “superior” aos anjos. A divindade de Cristo era um grande obstáculo para a aceitação do cristianismo pelos judeus. Durante séculos, Israel se havia orgulhado da adoração a um único Deus, ao passo que os pagãos tinham muitos deuses. “O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor” (Dt.6:4) era um desafio aos vizinhos pagãos. Os judeus precisavam compreender a natureza da Trindade, que a frase “o único Senhor” envolvia Pai, Filho e Espírito Santo.

Herdou. Cristo foi constituído “herdeiro de todas as coisas” (ver com. do v. Hb.1:2). Com essa herança, também Lhe foi dado “o nome que está acima de todo nome” (ver com. de Fp.2:9).

Mais excelente nome. Alguns acreditam que o nome é Jesus. Esse foi o nome que Lhe foi dado no momento do nascimento, e foi concedido em reconhecimento ao fato de que Ele salvaria “Seu povo dos pecados deles” (Mt.1:21). Visto que o anjo que anunciou o nome só estava executando a ordem de Deus, foi, na realidade, Deus, o Pai, que Lhe deu esse nome. Outros pensam que o título “Filho” seja mencionado aqui. Acreditam que esse nome é realçado pelas citações do AT mencionadas (Hb.1:5-8). Foi por causa da encarnação que o título “Filho” veio a ser usado (ver com. de Lc.1:35). Os anjos eram meramente “espíritos ministradores” (Hb.1:13-14), mas Jesus é exclusivamente “o Filho”.

Hb.1:5 5. Pois a qual dos anjos disse jamais: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei? E outra vez: Eu lhe serei Pai, e ele me será Filho?

Qual dos anjos. O autor começa uma série de citações do AT para provar a superioridade de Cristo sobre os anjos. A resposta a cada pergunta retórica é: “Ele nunca disse isso a um anjo.”

Tu és o Meu Filho. Citação do SI.2:7 (ver com. ali; sobre o título “Filho” aplicado a Cristo, ver com. de Lc.1:35, cf. com. de Rm.1:4). Aqui, o autor descarta a alegação de que Cristo era um anjo elevado a uma posição superior. Se Cristo realmente fosse um anjo elevado à Sua situação atual, então Deus teria dito a um anjo: “Tu és o Meu Filho.” Mas Deus nunca disse isso a nenhum anjo. Alguns se referem a Jó.1:6; Jó.2:1; Jó.38:7 como prova de que as Escrituras chamam os anjos de filhos de Deus (ver com. ali). Deve-se notar que essas expressões estão no plural. Em nenhum outro texto anjo é chamado de filho de Deus e, evidentemente, os anjos são seres criados (Cl.1:16).

Eu hoje Te gerei. Sobre as várias interpretações desta passagem, ver com. de At.13:33; cf. com. de Rm.1:4.

Eu Lhe serei Pai. Citação de 2Sm.7:14 (ver com. ali). A profecia original tinha sua principal aplicação a Salomão. Mas, aqui, ela assume um significado messiânico. O objetivo da citação é destacar a filiação de Cristo e, assim, consolidar ainda mais Sua superioridade em relação aos anjos.

Hb.1:6 6. E, novamente, ao introduzir o Primogênito no mundo, diz: E todos os anjos de Deus o adorem.

Ao introduzir. Esta deve ser uma referência à encarnação, embora essa ordem não ocorra em nenhum outro texto bíblico. Alguns insistem em que o elemento temporal não deve ser levado em conta. Cristo era Deus antes da encarnação, Ele era Deus durante a encarnação e é Deus depois da encarnação. Em qualquer tempo, a adoração é apropriada. A ordem para adorá-Lo estabelece a supremacia do Filho.

Primogênito. Do gr. prototokos (ver com. de Rm.8:29).

E todos os anjos. Citação livre da LXX (de Dt.32:43), com elementos do Sl.97:7. A citação não é encontrada na Bíblia hebraica. As citações da LXX são características desta epístola (ver p. 415). A ordem para adorar a Cristo é uma confirmação de Sua divindade. Por mais elevada que seja a posição dos anjos, Cristo é tão mais elevado que eles são ordenados a adorá-Lo. Só Deus pode ser adorado (Ap.22:8-9). Portanto, Cristo é Deus.

Hb.1:7 7. Ainda, quanto aos anjos, diz: Aquele que a seus anjos faz ventos, e a seus ministros, labareda de fogo;

Ventos. Do gr. pneumata, “ventos”; uma citação do Sl.104:4 (ver com. ali). O objetivo do autor, ao citar esse texto, é mostrar que os anjos são servos, e que Deus os usa como Seus ministros, em contraste com o Filho, que é Deus.

Ministros. Do gr. leitourgoi (ver com. de Rm.13:6). Considerando que o Filho é Deus e deve ser adorado, os anjos sâo ministros, servos que se deleitam em fazer a vontade de Deus. Desde o início, eles tiveram uma parte definida no plano de Deus e têm atuado em diferentes funções. Depois que nossos primeiros pais pecaram, eles guardaram o caminho da árvore da vida (Gn.3:24). Quando os eventos finais tiverem lugar e Cristo voltar, eles virão com Ele (Mt.25:31); Cristo os enviará, e eles “reunirão os Seus escolhidos, dos quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus” (Mt.24:31). Ao longo de toda a história, os anjos foram guardiães e protetores das pessoas, “enviados para serviço a favor dos que hão de herdar a salvação” (Hb.1:14). Os anjos participaram frequentemente no ministério de Cristo na Terra, desde o primeiro anúncio do nascimento até o momento da ascensão. Embora nem sempre estejamos conscientes da presença constante dos anjos em nossa vida, podemos saber com certeza que estamos sempre sob seu vigilante e amoroso cuidado.

Labareda de fogo. Ver com. de Gn.3:24.

Hb.1:8 8. mas acerca do Filho: O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre; e: Cetro de equidade é o cetro do seu reino.

Acerca do Filho. Em contraste com “os anjos” (v. Hb.1:7).

O Teu trono, ó Deus. Citação do SI.45:6-7 (ver com. ali). Aqui, o Pai Se dirige ao Filho solenemente, chamando-O de Deus. Este pode ser considerado o clímax da argumentação sobre a posição e dignidade de Cristo. Não pode haver maior testemunho da divindade de Cristo do que esta apóstrofe do Pai para o Filho. Na forma mais solene, a divindade de Cristo é afirmada, e isso, pelo próprio Pai. A salvação da humanidade e todo o plano da redenção são baseados na divindade de Cristo. Se Cristo não fosse Deus, no sentido mais elevado e por Seu próprio direito, nossa fé seria vã e a salvação se tornaria impossível. Muitos dos judeus tinham visto Jesus pessoalmente. Provavelmente, era mais difícil para eles do que para as gerações posteriores crer em Cristo como um Ser divino. Quem não conhecia Seu pai terreno e Sua mãe, além de estarem ainda vivos alguns da família? Como esse homem podia ser Deus? O autor procurou remover esse tropeço.

Para isso, ele convocou o testemunho das Escrituras para confirmar Sua posição. Seria de pouco valor apresentar os assuntos vitais de que trata o livro de Hebreus antes que esse ponto fosse resolvido e totalmente aceito. Na história da igreja desde os apóstolos, percebe-se a ênfase sobre a divindade de Cristo. Muitos há que reverenciam Cristo à sua própria maneira e O estimam, mas que, no entanto, se recusam a reconhecer Sua devida autoridade. Não conseguem entender que a divindade de Cristo é o fato central no plano da redenção e que “não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos” (At.4:12).

Para todo o sempre. Comparar com. de Ap.11:15; Ap.14:11.

Equidade. Do gr. euthutes, “retidão”, “justiça”. A referência ao trono e ao cetro indica a posse do poder real e não apenas potencial. Apresenta o reino não como futuro, mas presente e em ativa operação. O trono e o reino são eternos; e o cetro, símbolo do exercício efetivo do poder, se caracteriza pela justiça.

Hb.1:9 9. Amaste a justiça e odiaste a iniquidade; por isso, Deus, o teu Deus, te ungiu com o óleo de alegria como a nenhum dos teus companheiros.

Justiça. Do gr. dikaiosune (ver com. de Mt.5:6). Isto se refere à vida terrena de Cristo. Esta é a base sobre a qual Ele foi ungido, como é mencionado na última parte do versículo. Amar a justiça é virtude maior do que simplesmente fazer justiça. Muitos cristãos sinceros tomam parte ativa em bons empreendimentos mais pelo senso do dever do que por qualquer amor inerente à justiça. Um missionário pode ir a um país carente, com elevado sentido do dever e da responsabilidade que repousam sobre ele, e realizar uma grande obra. No entanto, não terá atingido o padrão estabelecido por Deus até que entre no trabalho por amor e realmente comece a amar as pessoas com quem trabalha. Tendo o dever como motivo, o trabalho é louvável. Mas o trabalho motivado pelo amor é uma experiência ainda maior.

Alguns aceitam as doutrinas da igreja e prestam obediência aos mandamentos de Deus por causa da lógica irresistível da verdade e de seu poder de convencer. No entanto, a menos que também recebam “o amor da verdade para serem salvos” (2Ts.2:10), eles podem ser achados em falta. Foi o amor que levou Deus a agir. “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o Seu Filho unigênito” (Jo.3:16). “Cristo amou a igreja e a Si mesmo Se entregou por ela” (Ef.5:25). Paulo afirma que trabalhou “muito mais do que todos eles” (1Co.15:10), e testemunha: “o amor de Cristo nos constrange” (2Co.5:14).

Iniquidade. Do gr. anomia, “ilegalidade”, “violação da lei”. O amor é uma virtude cristã essencial. No entanto, é também necessário destacar a virtude de odiar o mal. Deus elogia Cristo por Seu amor à justiça, e também, por Seu ódio ao pecado. É possível resistir ao pecado sem realmente odiá-lo. Um pecado particular pode não tentar determinada pessoa, para quem outros pecados podem ser atrativos. Mas, sabendo que são pecados e que pode ser surpreendida em erro, essa pessoa se abstém de fazer o que realmente gostaria de fazer. Não sabemos que crédito será dado nos livros do Céu a alguém assim. No entanto, o medo de ter a reputação arruinada não é motivo suficiente para a abstinência do pecado. Só aquele que aprendeu a odiar o pecado está realmente seguro. Quem se abstém do pecado, mas anseia por ele e o acha atrativo está em terreno perigoso. Precisa aprender a odiá-lo. A igreja de Efeso foi elogiada por odiar as obras dos nicolaítas (Ap.2:6). No livro de Deus, são registrados não só os atos de amor, mas também o ódio ao mal.

Ungiu. A unção, aqui, é com o óleo da alegria, que é o símbolo das bênçãos (ver Dt.28:40; SI.23:5; Sl.92:10).

Companheiros. Na profecia original, estes eram personagens celestiais. Quando a passagem é aplicada a Cristo, alguns entendem que esses companheiros representam todos os outros seres; outros entendem que representam os auxiliares de Cristo no plano da salvação, ou seja, os salvos, que são Seus coerdeiros.

Hb.1:10 10. Ainda: No princípio, Senhor, lançaste os fundamentos da terra, e os céus são obra das tuas mãos;

No princípio, Senhor. Os v. 10 a 12 são uma citação do Sl.102:25-27. Diversas citações da LXX são feitas para demonstrar a divindade de Cristo. No v. Hb.1:8, Cristo é chamado de Deus. Aqui Ele é chamado de Senhor (cf. com. de At.2:36).

Os fundamentos da terra. Cristo é o agente da criação (ver com. do v. Hb.1:2). Aqui, uma citação do AT que os judeus consideravam referente a Deus é aplicada a Cristo.

Hb.1:11 11. eles perecerão; tu, porém, permaneces; sim, todos eles envelhecerão qual veste;

Eles perecerão. Ou seja, os céus atmosféricos e a terra passarão por mudanças fundamentais (ver com. de Mt.24:35; Ap.21:1).

Tu [...] permaneces. A virtude da eternidade é atribuída a Cristo. Como criador, Cristo existia antes de todas as coisas (Cl.1:17); e, quando as coisas perecíveis desaparecerem, Ele permanecerá.

Hb.1:12 12. também, qual manto, os enrolarás, e, como vestes, serão igualmente mudados; tu, porém, és o mesmo, e os teus anos jamais terão fim.

Qual manto. Uma imagem impressionante da decadência e da natureza temporária dos céus e da terra (ver com. do v. Hb.1:11).

Tu [...] és o mesmo. Esta declaração atesta a imutabilidade de Cristo. Todos os atributos de Deus são vitais, entre eles o amor, a bondade e a justiça. Mas a imutabilidade divina é igualmente importante, embora nem sempre seja apreciada. É essencial para a fé saber que Cristo é o “mesmo ontem, hoje e eternamente” (Hb.13:8). Eternidade e imutabilidade dão a ideia de estabilidade e permanência. São uma “âncora da alma, segura e firme” (Hb.6:19). Em tempos de incerteza, a estabilidade é desejável.

Hb.1:13 13. Ora, a qual dos anjos jamais disse: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos por estrado dos teus pés?

Anjos. A resposta esperada à pergunta (cf. com. do v. Hb.1:5) é: “Deus nunca chamou a um anjo de ‘Meu Filho’ nem convidou um a sentar-se à Sua direita para compartilhar a posição e as prerrogativas divinas”.

Assenta-Te à Minha direita. Citação do SI.110:1; ver com. de Hb.1:3.

Teus inimigos por estrado dos Teus pés. Referência a um costume oriental, em que o vencedor colocava o pé no pescoço de seus inimigos, como sinal da sujeição deles. Jesus fez referência a essa declaração do salmo (ver Lc.20:42-43).

Hb.1:14 14. Não são todos eles espíritos ministradores, enviados para serviço a favor dos que hão de herdar a salvação?

Ministradores. Do gr. leitourgikos, “prestação de serviço [público]”. Leitourgikos está relacionado a leitourgos, cujo plural é traduzido como “ministros” (v. Hb.1:7; sobre o verbo leitourgeo, ver com. de At.13:2).

Para serviço. Do gr. eis diakonian; sobre diakonia, ver com. de Rm.12:7. Ao falar da supremacia de Cristo em relação aos anjos, não é intenção do autor mostrar desprezo por esses mensageiros de Deus. Eles têm elevadas responsabilidades (ver com. do v. Hb.1:7). Os judeus tinham os anjos em alta estima.

Hb.2:1 1. Por esta razão, importa que nos apeguemos, com mais firmeza, às verdades ouvidas, para que delas jamais nos desviemos.

Por esta razão. Ou seja, por causa da supremacia do Filho sobre os anjos, o tema do cap. 1, e, consequentemente, devido à importância da mensagem do Filho “nestes últimos dias” (ver com. de Hb.1:2).

Importa que nos apeguemos, com mais firmeza. Ou, “prestemos mais atenção”. É o Filho, o próprio Deus, que tem falado.

Ouvidas. A forma em que a mensagem lhes foi pregada é descrita no v. Hb.2:3.

Jamais nos desviemos. A frase pode ser traduzida como: “para que não flutuemos para longe delas”, ou “para que não nos afastemos delas”. O autor teme que seus leitores ignorem a importância do que foi dito por Cristo. Os cristãos judeus tinham grande zelo pela revelação do AT, mas estavam em perigo de não perceber a importância da nova revelação que lhes fora dada. A flutuação à deriva é um dos meios mais fáceis e agradáveis de locomoção, mas também é um dos mais traiçoeiros e perigosos. Nenhum esforço é requerido e, conforme a pessoa flutua pelo rio em direção à morte certa, a sensação é de contentamento e bem-estar, até mesmo de sonolência. O movimento para baixo é quase imperceptível, pois o barco que se move rio abaixo parece imóvel.

Hb.2:2 2. Se, pois, se tornou firme a palavra falada por meio de anjos, e toda transgressão ou desobediência recebeu justo castigo,

Firme. Do gr. bebaios, “estável”, “fixa”, “certa”. A lei está em plena vigência e não pode ser ignorada impunemente.

Palavra falada por meio de anjos. Referência ao sistema de leis instituído no Sinai (ver com. de Gl.3:19).

Transgressão. Do gr. parabasis, literalmente, “afastar-se para o lado”, portanto, “avanço”, “transgressão”. A palavra sugere o avanço consciente sobre um limite, um ato deliberado em contraste com uma queda acidental. No escuro, a pessoa pode tropeçar em uma cerca que não vê nem sabe que está ali. Isso é diferente de chegar à mesma cerca em plena luz do dia, ver o sinal que proíbe o acesso e, em seguida, passar por cima dela. Esse avanço intencional é transgressão.

Desobediência. Do gr. parakoe (ver com. de Rm.5:19).

Justo castigo. A lei mosaica especificava penalidade para diferentes tipos de transgressão. Embora “falada por meio de anjos”, a lei era de origem divina e, portanto, como seu autor, era justa em todas as penalidades e exigências.

Hb.2:3 3. como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação? A qual, tendo sido anunciada inicialmente pelo Senhor, foi-nos depois confirmada pelos que a ouviram;

Como escaparemos nós [...]? A pergunta retórica exige a resposta: “Não escaparemos.” O pronome é enfático no grego. O “nós” é contrastado com aqueles que nos tempos do AT transgrediam o código de Moisés (v. Hb.2:2). Eles negligenciavam “a palavra falada por meio de anjos”; aqueles representados pelo “nós” estão em perigo de negligenciar a palavra falada por meio de Cristo.

Negligenciarmos. Do gr. ameleo, “ser descuidado”, “não se importar”. Muitos dos cristãos judeus se apegavam ao antigo sistema judaico e estavam inclinados a minimizar o evangelho. Era função da epístola mostrar que o antigo sistema tinha chegado ao fim e que a salvação só era possível em Cristo e no evangelho. A advertência se aplica em qualquer época. Não há escapatória para quem se descuida dos apelos do evangelho. Muitas vezes, pode não haver rejeição a Cristo, mas simplesmente atraso ou negligência. Essa atitude está repleta de perigo e, se a pessoa persistir, levará à perdição eterna.

Tão grande salvação. É grande, pelo fato de Deus ser o autor da mesma e porcausa do custo, a vida do Filho de Deus. A salvação é grande por sua realização: a renovação de corpo, alma e espírito, e a exaltação da humanidade a um lugar no Céu.

Anunciada [...] pelo Senhor. Em contraste com “a palavra falada por meio de anjos” (v. Hb.2:2). “Deus [...] nestes últimos dias, nos falou pelo Filho” (Hb.1:1-2). A referência é à mensagem proclamada por Cristo durante Seu ministério terrestre (sobre o título “Senhor” aplicado a Cristo, ver com. de Jo.13:13; Jo.20:28).

Foi-nos. O autor se identifica com os que tiveram a confirmação do evangelho por aqueles que o ouviram diretamente de Jesus. Isso exclui qualquer um dos doze apóstolos como autor de Hebreus. Muitos sustentam que também exclui Paulo, pois ele se gaba de não haver recebido o evangelho de qualquer ser humano, mas pela revelação de Jesus Cristo (Gl.1:12). No entanto, esse raciocínio não é conclusivo, pois o autor pode ter se colocado entre seus leitores. Além disso, muitas coisas acerca de Jesus foram confirmadas a Paulo por testemunhas oculares. Naturalmente, o mistério do evangelho, ele recebeu diretamente de Jesus Cristo. O problema da autoria deve ser estabelecido por outras considerações (ver p. 415-417).

Confirmada. Do gr. bebaioo, “comprovar”, “estabelecer”. O evangelho não lhes fora simplesmente proclamado, mas o fora com poder convincente.

Hb.2:4 4. dando Deus testemunho juntamente com eles, por sinais, prodígios e vários milagres e por distribuições do Espírito Santo, segundo a sua vontade.

Deus [...] juntamente. Deus também deu testemunho da veracidade do evangelho. A mensagem não poderia ter maior confirmação.

Sinais. Sobre sinais, prodígios e milagres, ver vol. 5, p. 204; ver com. de Rm.15:19.

Distribuições. Sobre esses dons, ver 1Co.12:8-10; 1Co.12:28; Ef.4:11-12.

Segundo a Sua vontade. Ver com. de 1Co.12:11.

Hb.2:5 5. Pois não foi a anjos que sujeitou o mundo que há de vir, sobre o qual estamos falando;

A anjos. A posição de Cristo em relação aos anjos já foi discutida (ver Hb.1). O pensamento que se segue destaca o lado positivo: o mundo que há de vir já foi submetido ao Filho.

O mundo que há de vir. Uma referência ao reino da glória que será inaugurado no segundo advento de Cristo (cf. com. de Mt.4:17; Mt.5:3; comparar com Ef.1:21; Hb.6:5).

Hb.2:6 6. antes, alguém, em certo lugar, deu pleno testemunho, dizendo: Que é o homem, que dele te lembres? Ou o filho do homem, que o visites?

Em certo lugar. Isto não implica incerteza quanto à fonte, mas é simplesmente um meio de introduzir uma declaração, quando se considera desnecessário citar a origem.

Que é o homem [...]? Os v. 6 a 8 são uma citação da LXX, do Sl.8:4-6 (ver com. ali). Sob a inspiração do Espírito, o autor de Hebreus amplifica o significado da passagem, aplicando-a a Cristo (Hb.2:9; sobre os princípios relacionados a essas aplicações, ver com. de Dt.18:15).

Hb.2:7 7. Fizeste-o, por um pouco, menor que os anjos, de glória e de honra o coroaste [e o constituíste sobre as obras das tuas mãos].

Um pouco. Ou, “por um tempo”. As duas idéias são corretas, mas a segunda é especialmente apropriada quando aplicada a Cristo (v. Hb.2:9), pois apenas brevemente, durante a encarnação, Ele foi menor.

Coroaste. Isto aponta para a experiência de Adão e Eva, registrada em Gn.1:28 (ver com. ali). Deus não criou a humanidade para ser serva ou escrava, mas para reinar, e a coroou de glória e de honra.

E o constituíste [...] mãos. As evidências textuais se dividem (cf. p. xvi) entre reter ou omitir esta frase. Ela pode ter sido acrescentada em alguns manuscritos para completar a citação do Sl.8:4-6.

Hb.2:8 8. Todas as coisas sujeitaste debaixo dos seus pés. Ora, desde que lhe sujeitou todas as coisas, nada deixou fora do seu domínio. Agora, porém, ainda não vemos todas as coisas a ele sujeitas;

Sujeitaste. Depois que criou Adão e Eva. Deus “os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a Terra e sujeitai-a” (Gn.1:28). Isso deu ao ser humano a posse incontestável da Terra e o domínio sobre todas as coisas aqui.

Nada. Os estudiosos divergem quanto à extensão desse domínio original. Alguns afirmam que incluía poder sobre a natureza e os elementos semelhante ao que Cristo possuía, quando esteve na Terra, enquanto outros afirmam que ao ser humano foi dado domínio sobre a criação, e que era superior à mesma. Posteriormente, a humanidade aprendeu a fazer uso dos elementos da natureza, da qual aprendeu seus segredos. Usou as cataratas para produzir eletricidade; conseguiu emitir sinais sonoros através de ondas e passou a extrair riquezas do solo. Dividiu o átomo e liberou sua energia.

Ainda não. Apesar das conquistas sobre a natureza, há forças contra as quais a humanidade é impotente. Pode adiar a morte, mas nunca escapa dela. Por causa do pecado, o ser humano se colocou sob o poder de Satanás e está muito longe da posição originalmente atribuída por Deus.

Hb.2:9 9. vemos, todavia, aquele que, por um pouco, tendo sido feito menor que os anjos, Jesus, por causa do sofrimento da morte, foi coroado de glória e de honra, para que, pela graça de Deus, provasse a morte por todo homem.

Vemos, todavia [...] Jesus. A adversativa denota contraste. A humanidade “ainda não” tem domínio (ver com. do v. Hb.2:8), mas Jesus, sim. Ele foi coroado de glória e honra, por isso tem toda autoridade (Mt.28:18).

Um pouco [...] menor. Ou, “por pouco tempo inferior” (ver com. do v. Hb.2:7). Cristo é um homem, tão verdadeiramente como, no primeiro capítulo, é dito ser verdadeiramente Deus. Sua humanidade O habilita a ser o tipo de sumo sacerdote de que os pecadores necessitam (v. Hb.2:17-18). Evidentemente, no Céu, Cristo é imensamente mais elevado do que os anjos. Quando Se tornou homem, voluntariamente tomou lugar entre os homens e não exigiu tratamento especial. Porém, mesmo nessas condições, Ele não renunciou à divindade. Ele sabia de onde viera (Jo.13:3), que tinha poder para perdoar pecados (Mt.9:6) e que a qualquer momento poderia pedir ajuda de cima (Mt.26:53). Embora tivesse esse poder, em nenhum momento Ele o usou para salvar a Si mesmo, a não ser quando orientado por Deus. Caso contrário, teria invalidado Sua obra (sobre a humilhação de Cristo, ver com. de Fp.2:5-8).

Por causa do sofrimento da morte. A ordem das palavras no grego sugere ligação desta frase com “coroado de glória e de honra”. Portanto, a passagem não estabelece o propósito da encarnação, mas o resultado da morte de Cristo, ou seja, Sua exaltação. Coroado de glória, isto ocorreu no momento da ascensão (ver com. de Hb.1:3; Fp.2:9).

Pela graça de Deus. Há evidências textuais (cf. p. xvi) para a variante “sem Deus”, implicando que Cristo, na cruz, ao morrer, sofreu sozinho, sem a presença sustentadora do Pai. Alguns estudiosos defendem que esta era a variante original. No entanto, o peso das evidências favorece a variante adotada pela ARA. A despeito disso, as duas variantes são factualmente verdadeiras: na morte, Cristo sofreu sozinho (ver Mt.27:46); mas o sofrimento em favor da humanidade também foi uma demonstração da graça de Deus.

Provasse. Do gr. geuomai, “comer”, “experimentar”. A passagem não significa que Cristo Se limitou a provar ligeiramente a morte sem sofrer sua plena medida. O Getsêmani mostra que Ele bebeu o cálice até a última gota e provou a morte como nenhum homem jamais havia feito.

Por todo homem. Ou, “em favor de todos os homens”. O sacrifício de Cristo foi por todos (ver com. de Rm.5:15). Todos que desejarem podem usufruir dos benefícios da morte de Cristo (ver Ap.22:17).

Hb.2:10 10. Porque convinha que aquele, por cuja causa e por quem todas as coisas existem, conduzindo muitos filhos à glória, aperfeiçoasse, por meio de sofrimentos, o Autor da salvação deles.

Convinha. Do gr. prepo, “adequado”, “manifesto”.

Aquele. Isto é, o Pai, como indica o restante do versículo.

Por cuja causa. Ou, “por causa de quem”. “Todas as coisas” existem porque Deus quis que existissem (cf. com. de 1Co.8:6).

Por quem. Ou, “por meio de quem”. Deus é o único por quem “todas as coisas” vieram à existência (comparar com Rm.11:36). As Escrituras também apresentam Cristo como aquele por meio de quem todas as coisas foram criadas (Cl.1:16; Hb.1:2). Foi o Pai “que criou todas as coisas [por meio de Cristo]” (Ef.3:9).

Conduzindo muitos filhos à glória. Assim como Cristo foi glorificado após a humilhação (Jo.17:5), Sua morte expiatória resulta na glorificação de todos os que creem (sobre glorificação, ver com. de Rm.8:30; sobre o título “filhos”, ver com. de Rm.8:14). O título é escolhido para mostrar a relação entre Cristo, o Filho, e Seus irmãos redimidos (ver Hb.2:11-18).

Aperfeiçoasse. Do gr. teleioo, “concluir”, “completar”, “consumar” (sobre o adjetivo teleios, ver com. de Mt.5:48). O autor não quis dizer que, anteriormente, Cristo não fosse perfeito. Cristo era perfeito como Deus. Na encarnação, Ele foi perfeito como homem. Mas, por Seus sofrimentos, Ele Se tornou perfeito como salvador (ver At.5:31). O sentido de teleioo é o de alcançar um objetivo predeterminado, concluir uma corrida ou um trajeto prescrito. Antes de Cristo vir à Terra, o caminho que Ele deveria pisar estava claro diante dEle; cada passo estava definido. Para alcançar o objetivo, Ele deveria percorrer todo o caminho. Não poderia parar antes do destino final, mas devia perseverar até o fim. O termo enfatiza o encerramento desse plano, e não qualquer aperfeiçoamento moral.

Sofrimentos. Cristo chegou à exaltação pela via do sofrimento. Foi Seu “sofrimento da morte” (v. Hb.2:9) que fez dEle o salvador e o autor que conduz muitos filhos à glória. Os sofrimentos da tentação Lhe permitiram ser “misericordioso e fiel sumo sacerdote”, “poderoso para socorrer os que são tentados”’ (ver com. dos v. Hb.2:17-18). Se Cristo tivesse vindo a este mundo e passado o tempo designado em paz e contentamento, guardado pelos anjos celestiais e protegido dos perigos e das tentações comuns ao ser humano, não teria Se qualificado para tal ofício.

Não teria tido a oportunidade de demonstrar o que faria sob pressão. Se não tivesse sido tentado em todos os aspectos, as pessoas indagariam sobre o que Ele faria se estivesse realmente com fome, cansado ou doente, o que faria se fosse insultado, amaldiçoado, cuspido, açoitado e, por fim, pendurado na cruz. Ele manteria a postura e oraria por Seus inimigos? Se fosse abandonado, negado e traído na hora suprema, Ele Se submeteria a Deus sem esmorecer? Essas perguntas seriam feitas caso Ele tivesse sido protegido das tentações e do sofrimento.

Autor. Do gr. archegos, “líder”, “chefe”, “fundador”, “príncipe”. A palavra archegos ocorre quatro vezes no NT e é traduzida uma vez como “príncipe” (At.5:31) e três vezes como “autor” (At.3:15; Hb.2:10; Hb.12:2). No grego clássico, archegos é usado para o cabeça ou progenitor de um clã, para os heróis e mesmo como um nome divino de Apolo. Neste texto de Hebreus, alguns sugerem o significado de “pioneiro”, o que não é inadequado, pois foi a encarnação e a morte de Cristo que tornaram possível que seres humanos fossem levados à glória. Ele abriu o caminho, mas a expressão é inadequada porque Cristo é mais do que um pioneiro; é o Salvador. Aqueles que O seguem são os remidos.

Hb.2:11 11. Pois, tanto o que santifica como os que são santificados, todos vêm de um só. Por isso, é que ele não se envergonha de lhes chamar irmãos,

O que santifica. Neste contexto, Cristo (cf. Hb.9:13-14).

Os que são santificados. Estes são os “muitos filhos”, conduzidos à glória (v. Hb.2:10).

De um só. Isto é, de Deus Pai. Cristo, o Filho, e os “muitos filhos” têm todos o mesmo Pai.

Não Se envergonha. Apesar da superioridade sobre os anjos (Hb.1:4; Lc.9:26).

Irmãos. Ver com. de Mt.12:49-50; Jo.20:17..

Hb.2:12 12. dizendo: A meus irmãos declararei o teu nome, cantar-te-ei louvores no meio da congregação.

Irmãos. A palavra importante pela qual a passagem é citada (ver v. Hb.2:11).

Declararei o Teu nome. Citação do SI.22:22. Esse é um salmo messiânico (ver introdução ao SI.22). Paulo o emprega para fundamentar sua observação de que os que são santificados (v. Hb.2:11) são irmãos de Cristo.

Hb.2:13 13. E outra vez: Eu porei nele a minha confiança. E ainda: Eis aqui estou eu e os filhos que Deus me deu.

E outra vez. Esta fórmula introduz uma nova citação.

Eu porei nEle a Minha confiança. Citação de 2Sm.22:3 ou de Is.8:17. Mais provavelmente a segunda, visto que a citação seguinte é de Is.8:18. A declaração é feita como prova da humanidade de Cristo. Implica Sua completa comunhão conosco. Ele próprio exerceu a mesma confiança e fé que exige de nós.

Eu e os filhos. Ver com. de Is.8:18. O autor de Hebreus faz uma aplicação messiânica da passagem. Ele considera Isaías como um tipo de Cristo, e seus filhos como representantes dos filhos espirituais de Cristo. A metáfora é alterada de “irmãos” para “filhos”, mas a mesma ideia básica é enfatizada: Cristo partilha a humanidade conosco, aqui ilustrada no fato de que pais e filhos participam da mesma natureza.

Que Deus Me deu. Em Sua oração antes da experiência do Getsêmani, Cristo Se referiu oito vezes aos discípulos como Lhe tendo sido dados por Deus (Jo.17:2; Jo.17:6; Jo.17:9; Jo.17:11-12; Jo.17:24). Ele não atribuiu honra a Si mesmo, mas deu glória a Deus pelo resultado de Sua obra.

Hb.2:14 14. Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo,

Os filhos. Isto é, os filhos mencionados no v. Hb.2:13.

Têm participação. Ou, “foram feitos participantes”. Os filhos compartilham uma natureza humana comum.

Também Ele. Isto é, Cristo.

Participou. A forma do verbo grego sugere a ideia de posse de algo que não se possuía antes. Isto foi verdade com Jesus: Ele era divino, mas tomou a nossa natureza humana, misteriosamente combinando as duas naturezas em uma (ver com. de Jo.1:14). A fim de passar por todas as experiências da humanidade, Cristo Se tornou homem.

Por Sua morte. Ou seja, a morte sacrificial (cf. v. Hb.2:9). Quando Jesus morreu na cruz, parecia que Satanás tinha triunfado, pois até mesmo o Filho de Deus Se tornara sujeito à morte. Mas a realidade era outra.

Destruísse. Do gr. katargeo, “tornar nula e sem efeito” (ver com. de Rm.3:3). O poder de Satanás sobre a morte já estava quebrado, pois, embora a morte natural ainda reine, a ressurreição está garantida (ver 1Co.15:20-22; 1Co.15:51-57). Por fim, o originador do pecado e autor da morte será aniquilado (ver com. de Ap.20:10).

Que tem o poder. Satanás tem o poder da morte porque é o originador do pecado, e a morte resulta do pecado (ver com. de Rm.5:12). Seu reino é um reino de morte. Uma vez que o pecado governa neste mundo, da mesma forma reina a morte. Cristo foi o único que entrou na casa do valente (Mc.3:27), prendeu o inimigo e libertou seus prisioneiros. Ele entrou no reino da morte, a fortaleza de Satanás, e arrancou dali os cativos. Quando o inimigo achava que tinha Cristo em seu poder, quando o túmulo foi selado tendo Cristo em seu interior, Satanás exultou. No entanto. Cristo rompeu as cadeias da morte e saiu da sepultura, “porquanto não era possível fosse Ele retido por ela” (At.2:24).

Não só o próprio Cristo ressuscitou, mas “abriram-se os sepulcros, e muitos corpos de santos, que dormiam, ressuscitaram e [saíram] dos sepulcros depois da ressurreição de Jesus” (Mt.27:52-53). E assim, embora o “valente, bem armado, guarda a sua própria casa [...] sobrevindo, porém, um mais valente do que ele, vence-o, tira-lhe a armadura em que confiava e lhe divide os despojos” (Lc.11:21-22). Cristo, o mais valente, entrou no reino da morte, venceu o que tinha o império da morte, tirou seus cativos e saqueou sua casa (Mt.12:29); “despojando os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz” (Cl.2:15). Daí em diante, para os crentes, a morte é apenas um sono, pois descansam em paz, até que Deus os chame. Para muitos, é mesmo um sono abençoado (Ap.14:13). Cristo “destruiu a morte” (2Tm.1:10). Ele tem “as chaves da morte e do inferno” (Ap.1:18; 1Co.15:51-57).

Diabo. Do gr. diabolos (ver com. de Mt.4:1).

Hb.2:15 15. e livrasse todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão por toda a vida.

Livrasse. Do gr. apallasso, “libertar”. Cristo veio para libertar as pessoas da escravidão do pecado e da morte.

O pavor da morte. Esta é a condição dos não redimidos. Milhões são escravos do pecado e anseiam por libertação. Temem o presente, o futuro, a vida e a morte. Existe esperança, conforto ou libertação? Sim, porque Cristo destruiu o poder de Satanás e aboliu a morte.

Escravidão. Ou, “servidão” (sobre o cativeiro do pecado, ver com. de Rm.8:15).

Toda a vida. O ser humano nasce em pecado e permanece em cativeiro até ser liberado por Cristo.

Hb.2:16 16. Pois ele, evidentemente, não socorre anjos, mas socorre a descendência de Abraão.

Evidentemente. Do gr. depou, “naturalmente”.

Socorre. Do gr. epilambanomai, “tomar posse de”, “agarrar”, “surpreender”, “ter interesse em”, “capturar”. A pergunta é: Qual desses significados se aplica ao texto em questão? O verbo está no tempo presente, o que indica que o sentido de “socorrer” é adequado ao contexto e à construção grega, isso sugere a tradução: “Não é a anjos que Cristo está socorrendo, mas aos membros da família humana.” São os seres humanos que têm necessidade da redenção e são possíveis de restauração, e é por eles que Cristo está interessado.

A descendência de Abraão. Aqui, provavelmente sinônimo de “ser humano”. Não há nenhuma tentativa de excluir os gentios. A descendência mencionada é a espiritual (Gl.3:29).

Hb.2:17 17. Por isso mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus e para fazer propiciação pelos pecados do povo.

Por isso mesmo. Isto é, porque Ele estava preocupado com o ser humano (ver com. do v. Hb.2:16).

Convinha. Do gr. opheilo, “dever”, “estar endividado”, “precisar” (ver Mt.18:30; Mt.18:34; Mt.18:23-16; Lc.16:6-7; Jo.13:14; 1Co.5:10; 2Ts.2:13).

Em todas as coisas. Cristo devia Se tornar homem tão completa e plenamente que nunca se pudesse dizer que Ele desconhecia qualquer tentação, tristeza, provação ou sofrimento pelos quais as pessoas passam.

Tornasse semelhante. Pelo motivo declarado em seguida, ou seja, para Se qualificar ao ofício de sumo sacerdote. As experiências de Cristo não precisavam ser idênticas às nossas em todos os aspectos, pois milhares de vidas não seriam suficientes para isso. Mas as Suas provações deviam ser representativas e incluir, em princípio, tudo o que as pessoas têm que sofrer, isso significa que a gravidade delas devia se comparar totalmente a tudo o que as pessoas têm de suportar.

Para ser. Ou, “para se tornar”.

Misericordioso e fiel. Estas duas características são necessárias a um ministério justo. A misericórdia pode ser muito branda e ignorar a justiça. A fidelidade proporciona equilíbrio à misericórdia, uma vez que considera os direitos e deveres tanto do ofensor como do ofendido. Como sumo sacerdote, Cristo devia ser bondoso e compreensivo para com o agressor, mas também fiel à justiça, não ignorando a lei. A fidelidade mantém o delicado equilíbrio entre a misericórdia incondicional e a justiça implacável. O sumo sacerdote deveria considerar o pecador, mas também deveria considerar Aquele contra quem pecou. Deveria ser fiel a seu legado, mas misericordioso para com o transgressor.

Sumo Sacerdote. O tema de Cristo como sumo sacerdote é introduzido aqui e detalhado mais à frente (ver Hb.3; Hb.5; Hb.7-10).

Nas coisas referentes a Deus. Isto é, questões do serviço divino. A frase grega assim traduzida ocorre na LXX, de Ex.4:16, com referência à relação de Moisés com Deus envolvendo Arão.

Para fazer propiciação. Do gr. hilaskomai (sobre o significado deste verbo e dos substantivos relacionados, ver com. de Rm.3:25). O verbo ocorre só aqui e em Lc.18:13, em que é traduzido como “sê propício”.

Hb.2:18 18. Pois, naquilo que ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é poderoso para socorrer os que são tentados.

Tendo sido tentado. Do gr. peirazo, “testar”, “provar”, “tentar” (ver com. de Hb.4:1). A natureza humana de Cristo sentiu a força da tentação. Caso contrário, Ele não teria entendido a luta terrível de um pobre pecador poderosamente tentado a ceder. Cristo foi tentado em todos os aspectos “à nossa semelhança” (Hb.4:15). Na verdade, Ele sofreu sob a tentação. O quanto Cristo sofreu para resistir à tentação é revelado no deserto, no Getsêmani e no Gólgota. Nos dois primeiros casos, a tentação foi tão grande que Ele poderia ter morrido sob o impacto, caso não fosse enviado um anjo para fortalecê-Lo (Mt.4:11; Lc.22:43). O cálice não foi removido, apesar de sua oração. Ele precisava bebê-lo. A essas experiências, o autor se refere quando diz: “Ainda não tendes resistido até ao sangue” (Hb.12:4). Cristo resistiu até o sangue.

Poderoso para socorrer. Ou, “capaz de ajudar”. Ao resistir com sucesso à tentação e suportar pacientemente o sofrimento, Cristo venceu o tentador. Agora, lutamos com um inimigo derrotado. A vitória de Cristo é a nossa vitória (ver com. de Mt.4:1). É fonte de conforto para o cristão saber que Cristo compreende suas dores e perplexidades e simpatiza com ele. Se Cristo não tivesse Se tornado homem, a insegurança persistiria: Como saber que Deus nos ama e cuida de nós, se nunca experimentou nossas provas, se não foi pobre ou abandonado, e se nunca soube o que é enfrentar um futuro desconhecido? Ele nos pede que sejamos fiéis até a morte, mas enfrentou os problemas que enfrentamos? Mas esse, de fato, não é o caso. Jesus foi e continua sendo pleno homem e Deus todo-poderoso.

Não por Sua própria causa, mas pela nossa, é que Cristo Se fez pobre, sofreu e morreu. Precisávamos da demonstração que Cristo veio prover, caso contrário, nunca teríamos conhecido o profundo amor de Deus pela humanidade sofredora. Além disso, nunca teríamos conhecido o sofrimento que o pecado trouxe ao coração de Deus.

Hb.3:1 1. Por isso, santos irmãos, que participais da vocação celestial, considerai atentamente o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão, Jesus,

Por isso. Ou seja, em vista de tudo o que foi dito em Hebreus 1 e 2 com relação à exaltada posição de Cristo como Deus e Sua infinita condescendência em assumir a natureza humana.

Santos irmãos. Todos os crentes são “irmãos” em Cristo. Considerando, porém, que Hebreus é dirigido principalmente aos judeus cristãos (ver p. 415), o termo “irmãos” aqui parece se referir a esse grupo mais restrito. O assunto dos capítulos seguintes, as lições da história do antigo Israel, seria particularmente significativo para os “irmãos” judeus em Cristo. Eles são chamados de “santos”, no sentido de que sua vida era dedicada a Deus, não no sentido de que eles não tinham falhas ou deficiências (ver com. de Mt.5:48; Rm.1:7).

Participais. Do gr. metochoi, “partilhais” (ver com. de Lc.5:7; Hb.3:14; Hb.6:4; Hb.12:8).

Vocação celestial. Ou seja, o chamado de Deus para obter a salvação por meio de Jesus Cristo (ver com. de Rm.8:28; Rm.8:30).

Considerai. Do gr. katanoeo, “fixar a mente em”, “contemplar”. Aqui, os “santos irmãos” são convidados a fixar a atenção no tema central da epístola: o ministério de Cristo como sumo sacerdote no Céu (ver p. 418).

Apóstolo. Do gr. apostolos, “embaixador”, “enviado”, “delegado”, “mensageiro” (ver com. de Mc.3:14; At.1:2). Cristo veio a este mundo como “apóstolo” do Pai, “enviado de Deus” (DTN, 475; cf. Jo.6:29). Ele veio para revelar Deus à humanidade (ver com. de Mt.1:23; Jo.1:14) e voltou ao Céu como sumo sacerdote ou representante do ser humano diante do Pai. Da mesma forma, nos tempos do AT, o sumo sacerdote do santuário terrestre representava Deus diante do povo, e o povo, diante de Deus (ver com. de Lv.16:4).

Sumo Sacerdote. Ver com. de Hb.2:17.

Confissão. Do gr. homologia, “confissão”, “reconhecimento”, “profissão” (ver com. de Rm.10:9; 1Tm.6:12).

Jesus. Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a omissão da palavra “Cristo” (ARC). Jesus é o nome do salvador como homem entre os homens. “Cristo” é Seu nome como o Messias do AT, o “enviado de Deus”, o Filho de Deus. Chamar Jesus de Cristo é reconhecer o filho de Maria como Aquele em quem se cumpriram as profecias do AT sobre o Messias, e que, como Filho do homem, Ele é verdadeiramente o Filho de Deus. Usados em conjunto, os dois nomes são afirmação da crença na natureza divino-humana do Senhor (ver com. de Mt.1:1).

Hb.3:2 2. o qual é fiel àquele que o constituiu, como também o era Moisés em toda a casa de Deus.

Fiel. A referência aqui é à fidelidade de Jesus a toda a Sua missão na Terra. Na encarnação, Ele Se humilhou, abriu mão das prerrogativas da Divindade. Tomando a natureza humana, suportou as privações e tentações que cercavam Sua vida na Terra e avançou com determinação e coragem para a cruz (ver Fp.2:5-8; Fp.2:14; Hb.2:17; Hb.12:2; vol. 5, p. 1013, 1014). Em todas as coisas, Ele foi fiel ao plano que tinha sido definido antes da criação do mundo (ver DTN, 147, 208).

Constituiu. Do gr. poieõ, “constituir”, “ordenar”, “designar”, “nomear” (ver com. de Mc.3:14). Cristo foi fiel ao Pai, vindo a este mundo como Seu representante (ver com. de Jo.1:14). No misterioso conselho de paz entre o Pai e o Filho (ver com. de Zc.6:13), quando o plano da salvação foi formulado, Cristo concordou em vir à Terra. No cumprimento desse plano, Ele voluntariamente deixou com o Pai Suas prerrogativas da Divindade. Subordinou-Se ao Pai ao longo de Sua vida na Terra, a fim de poder viver como homem entre os homens, a fim de que Sua vida perfeita lhes proporcionasse um exemplo da relação que se deve ter com o Pai celestial (ver com. de Mt.6:9; Jo.1:14; cf. vol. 5, p. 1014). Assim, o Pai “constituiu” Cristo para Sua missão terrena (ver com. de Jo.3:16) e, nesse papel subordinado, Cristo foi “fiel”.

Como também o era Moisés. Nos v. Hb.3:1-6, Cristo é comparado a Moisés, o grande legislador (Jo.1:17; Jo.7:19), em certo sentido, fundador da nação judaica. Paulo pretende provar que Cristo é infinitamente maior que Moisés (Hb.3:3). A estima que os judeus do tempo do NT tinham por Moisés é evidente em face do orgulho com que se consideravam como seus “discípulos” (Jo.9:28-29). Cristo já foi demonstrado ser igual ao Pai (Hb.1:8) e superior aos anjos (v. Hb.1:4). Então, Ele é mostrado como sendo superior a Moisés. Mais adiante, Ele será mostrado como superior a Abraão (Hb.7:2; Hb.7:4; Hb.7:15), o pai da nação (Jo.8:39; ver com. de Mt.1:1), a Levi (Hb.7:9-10) e a Arão (v. Hb.7:11). Seu sacerdócio é superior ao sacerdócio araônico. Moisés fez “segundo o Senhor lhe havia ordenado” (Ex.40:16), era um líder seguro e confiável. Da mesma forma, vivendo como homem entre os homens, Cristo representou fielmente o Pai, fazendo o que estava em harmonia com a vontade de Deus e eram agradáveis a Ele (Jo.4:34; Jo.6:38; Jo.8:28-29). No fim de Seu ministério na Terra, Ele relatou ao Pai: consumei “a obra que Me confiaste para fazer” (Jo.17:4).

Toda a casa de Deus. Moisés é comparado a um mordomo encarregado dos assuntos da casa de seu senhor (cf. Gn.15:2; Lc.12:42; Lc.16:1-2). José exerceu essa função na casa de Potifar (Gn.39:1-6). O mordomo era o guardião da propriedade de seu senhor e administrador da casa. A “casa” aqui mencionada é o povo escolhido de Deus, pelo qual Cristo Se dispôs a cumprir o plano da salvação. Antes essa casa era a nação judaica, mas agora é a igreja (ver vol. 4, p. 13, 21). No texto grego, usa-se o pronome “sua” (ARC) em vez de “de Deus”. Não está claro se a referência é a Moisés, seu antepassado natural, ou a Deus, como pode ser inferido a partir do v. Hb.3:4. Se “sua” se refere a Moisés, a “casa” sobre a qual foi nomeado mordomo é considerada do ponto de vista de ser sua para supervisionar. Se “sua” se refere a Deus, a casa é considerada propriedade de Deus. Para efeitos práticos, o significado é o mesmo. É provável que a última parte do v. 2 se baseie em Nm.12:7, em que Deus proclama que Moisés é “fiel” sobre sua “casa”.

Hb.3:3 3. Jesus, todavia, tem sido considerado digno de tanto maior glória do que Moisés, quanto maior honra do que a casa tem aquele que a estabeleceu.

Digno de tanto. Ou, “considerado merecedor”.

Glória. Do gr. doxa (ver com. de Jo.1:14; Rm.3:23; 1Co.11:7), aqui, significando “honra” ou “respeito”. Como o construtor da “casa”, Cristo merecia maior honra do que a “casa” ou Moisés, que foi seu mordomo por um tempo.

Quanto maior. A figura muda, mas o objetivo ainda é exaltar a Cristo. Este é visto em Sua função veterotestamentária de construtor da casa.

Maior honra. Uma estrutura magnífica desperta elogios nos que a contemplam. Mas ainda maior honra pertence ao arquiteto que a concebeu e ao construtor que a ergueu.

Aquele que a estabeleceu. Isto é, Cristo (comparar com Hb.11:10).

Hb.3:4 4. Pois toda casa é estabelecida por alguém, mas aquele que estabeleceu todas as coisas é Deus.

Deus. No v. Hb.3:3, o construtor da casa é Cristo, e aqui é dito ser Deus (cf. com. de Jo.1:1; Jo.1:14).

Hb.3:5 5. E Moisés era fiel, em toda a casa de Deus, como servo, para testemunho das coisas que haviam de ser anunciadas;

E. A primeira parte do v. 5 repete a última do v. Hb.3:2, a fim de reafirmar as figuras de Cristo e Moisés como mordomos, cada um sobre sua respectiva “casa”. Essa figura foi interrompida nos v. Hb.3:3-4, em que Cristo é mencionado em Sua função veterotestamentária de construtor da casa sobre a qual Moisés era mordomo. Cristo Se tornou, no NT, mordomo sobre a casa.

Era fiel. O propósito ao exaltar Cristo não é depreciar Moisés, que é louvado por ter sido “fiel”. No entanto, a superioridade de Cristo em relação a Moisés consiste no fato de que, embora Cristo mais tarde tenha Se tornado mordomo da “casa”, Ele realmente era seu construtor e proprietário, ao passo que Moisés atuava como mordomo sobre ela.

Servo. Do gr. therapon, “atendente [pessoal]”, “ajudante de ordens”. Therapon descreve um servo que presta um tipo de serviço mais elevado e mais pessoal do que o doulos (ver com. de Rm.1:1) ou o diakonos (ver com. de Mc.9:35). Aplicado a Moisés, therapon reflete a alta estima em que os judeus tinham o grande legislador. Embora fosse grande, no entanto, ele era apenas um “ajudante de ordens” de Cristo ao executar os propósitos de Deus na Terra. Porém, que honra maior o Céu poderia conceder a qualquer ser humano?

Para testemunho. A vida e o serviço fiel de Moisés antecipavam a fidelidade de Cristo quando viesse à Terra (ver com. dos v. Hb.3:1-3). Na verdade, todo o sistema cerimonial instituído por Moisés, sob a direção de Jesus, deveria servir “para testemunho das coisas que haviam de ser anunciadas”. Era um “testemunho” do ministério de Cristo como “o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão” (v. Hb.3:1; ver Dt.38:15).

Das coisas. Ou seja, a vida e a missão de Cristo na Terra e Seu ministério como sumo sacerdote no Céu.

Hb.3:6 6. Cristo, porém, como Filho, em sua casa; a qual casa somos nós, se guardarmos firme, até ao fim, a ousadia e a exultação da esperança.

Cristo [...] como Filho. Cristo é maior do que Moisés, assim como um “filho” é maior do que um “servo” (Hb.3:5; Gl.4:1). Moisés provou ser “fiel” como “servo”, e Cristo, como “Filho” (ver Mt.21:34-37; Gn.15:2-4; ver com. de Hb.1:5; Hb.5:8; sobre Cristo como Filho de Deus, ver com. de Lc.1:35; Jo.1:14).

Em Sua casa. Ver com. do v. Hb.3:2; Hb.10:21.

A qual casa somos nós. A “casa” sobre que Moisés exercia supervisão era a “casa de Israel” (cf. Hb.8:8). A “casa” sobre a qual Cristo preside é a igreja (Ef.2:19-22; 1Pe.2:5).

Guardarmos firme. Ver com. de Mt.24:13; Hb.10:35-36; Ap.3:11.

Firme, até ao fim. As evidências textuais (cf. p. xvi) se dividem entre a omissão e a manutenção destas palavras. A mesma expressão é confirmada no v. Hb.3:14 (ver com. de Mt.24:13; Ap.2:10).

Ousadia. Do gr. parresia, “confiança”, “intrepidez”, “segurança” (ver com. de At.4:13; Hb.10:19; Hb.10:35). Essa “ousadia” consiste na convicção do cristão acerca das coisas que aprendeu a respeito de Cristo. É privilégio desfrutar a segurança da aceitação por parte de Deus (ver com. de 1Jo.5:10-12). O fiel conserva no coração o “penhor do Espírito” (ver com. de 2Co.1:22) e tem “certeza” das coisas que espera (ver com. de Hb.11:1).

Exultação. Do gr. kauchema, “jactância”, “júbilo”, “orgulho”. O verbo relacionado, kauchaomai, é traduzido como “regozijar”, “gloriar” ou “vangloriar” (ver com. de Rm.5:2). Paulo dizia ter kauchaomai, “glória”, na cruz de Cristo (Gl.6:14). O cristão deve ter orgulho na esperança e nela se alegrar.

Esperança. Ver com. de Rm.5:2-5; Rm.8:24; Ef.1:18. A esperança cristã está ancorada no “Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão”, na “manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus”, na “ressurreição dentre os mortos” e na vida eterna (Hb.3:1; Tt.2:13; Tt.3:7; Fp.3:11; 1Co.15:12-23). Os filhos de Deus têm motivos para ser as pessoas mais alegres, esperançosas e otimistas sobre a Terra.

Hb.3:7 7. Assim, pois, como diz o Espírito Santo: Hoje, se ouvirdes a sua voz,

Assim. Ou seja, tendo em vista o que foi dito nos v. Hb.3:1-6 a respeito de Cristo como “Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão” (v. Hb.3:1), e da “ousadia” e “esperança” nEIe (v. Hb.3:6).

Diz o Espírito Santo. Ele é reconhecido como o agente de comunicação entre Deus e o ser humano (ver com. de 2Pe.1:21), especialmente no que diz respeito ao Salmo 95 (do qual vem a citação em Hb.3:7-11) e a Davi, por ter sido inspirado ao escrever o salmo (cf. Hb.4:7).

Hoje. Ver com. do SI.95:7. O “hoje” a que Davi se refere era seu próprio tempo. Mas, guiado pelo Espírito, o escritor de Hebreus declara que a verdade aqui afirmada se aplica com igual força ao tempo do NT (ver vol. 4, p. 23, 24; ver com. de Dt.18:15). O Espírito Santo tem essa mesma mensagem para nós hoje (ver com. de Hb.4:7-9). De geração em geração, o mesmo apelo misericordioso tem sido feito, chamando as pessoas a buscar o “descanso” em Cristo. Logo, a misericórdia deixará de pleitear, e o dia da salvação será encerrado. A mensagem de Hb.3:7-11 é repetida ao longo dos cap. 3 e 4, sendo a base do argumento aqui exposto.

A conclusão é de que, “portanto, resta um repouso para o povo de Deus” (Hb.4:9), e que devemos achegar-nos, “confiadamente, junto ao trono da graça, a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (v. Hb.4:16). Deve-se notar que a mensagem de Hebreus 3 e 4 é introduzida com a apresentação de Cristo como “o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão” (Hb.3:1), e se encerra com um apelo para ir a Ele com fé, na plena certeza de que Ele pode prover o que precisamos, e irá fazê-lo (Hb.4:14-16). As expressões “guardarmos firme [...] a ousadia” (Hb.3:6), “conservemos firmes a nossa confissão” (Hb.4:14) e “acheguemo-nos [...] confiadamente, junto ao trono da graça” (v. Hb.4:16) preservam a conexão do argumento.

Se. Do gr. ean, “se”, “quando”, “sempre que”. A livre escolha humana em aceitar ou rejeitar o chamado misericordioso de Deus é definida aqui em linguagem clara e inconfundível. Deus não predestinou alguns para aceitar, e outros, para rejeitar Sua misericórdia (ver com. de Jo.3:17-20; Ef.1:4-6).

Ouvirdes a Sua voz. Obviamente, aqui está implícito mais do que ouvir com os ouvidos; é o ouvir que resulta em ação apropriada (comparar com. de Mt.7:24-27; Ap.1:3).

Hb.3:8 8. não endureçais o vosso coração como foi na provocação, no dia da tentação no deserto,

Não endureçais o vosso coração. Ou seja, não rejeiteis nem negligencieis o apelo misericordioso da voz de Deus (v. Hb.3:7; sobre o endurecimento do coração, ver com. de Hb.4:21; Rm.9:18).

Provocação. Literalmente, “revolta”, “rebelião”. A referência é à rebelião em Cades-Barneia (ver Nm.14:1-35), embora também se possa aplicar de forma geral às várias ocasiões em que o povo se rebelou antes da crise em Cades (Hb.3:9; Nm.14:22). Ali, o povo se recusou a entrar no “descanso” de Canaã (ver com. de Hb.4:11) e, como resultado, quase toda a geração adulta foi impedida de entrar na terra prometida (Nm.14:22-35).

Tentação. Literalmente, “provação”, e não “tentação”, no sentido em que a palavra é comumente usada hoje (ver com. do v. Hb.3:9). O “dia da tentação” se refere ao mesmo evento da palavra “rebelião” e explica a natureza da rebelião. Israel colocou Deus à prova em muitas ocasiões (ver Ex.17:2; Ex.17:7; Nm.14:22).

No deserto. Cades está situada no deserto de Zim (Nm.20:1; Nm.27:14).

Hb.3:9 9. onde os vossos pais me tentaram, pondo-me à prova, e viram as minhas obras por quarenta anos.

Vossos pais Me tentaram. Ou, “vossos pais Me testaram”. Por incessantes reclamações e atos de rebeldia, Israel testou ao máximo a paciência de Deus. A paciência divina para com o antigo Israel é fonte de esperança para quem se extravia, mas nunca é desculpa para se exigir a misericórdia e longanimidade de Deus (ver Rm.6:1; Rm.6:15). “As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos” (Lm.3:22; Ex.34:6-7). Os repetidos casos de rebelião contra a autoridade e a liderança do Senhor eram produto inevitável de “incredulidade” e do “perverso coração” de Israel (ver com. de Hb.3:12; Hb.3:19).

Por meio das pragas no Egito, a travessia do Mar Vermelho, o maná, a água tirada da rocha, a libertação das serpentes abrasadoras e de muitas outras maneiras, Deus demonstrou ao povo Sua grande sabedoria e Seu poder. Vez após outra, Deus permitiu que as circunstâncias ensinassem o povo a confiar nEle e seguir Suas instruções. Porém, Israel provou ser “povo de dura cerviz” (Ex.32:9) e lento para aprender. Esse espírito perverso continuou quase até o fim dos 40 anos de peregrinação no deserto (ver Nm.20:5). Não nos cabe condenar o povo judeu por seus erros. Em vez disso, devemos aprender com as experiências pelas quais passaram por causa da perversidade de seu coração e evitar cometer os mesmos erros (1Co.10:5-12).

Viram as Minhas obras. Ou seja, os israelitas testemunharam múltiplos casos da providência divina, que deveriam ter sido suficientes para levá-los a uma experiência de plena confiança na sabedoria e no poder de Deus. Houve repetidas ocasiões em que Deus poderia tê-los abandonado para seguir seus próprios caminhos perversos. Mas, misericordiosamente, Ele continuou pacientemente a suportá-los.

Quarenta anos. Exatamente 40 anos haviam se passado entre a Páscoa celebrada no êxodo do Egito e a celebrada alguns dias após a travessia do Jordão (ver vol. 1, p. 166).

Hb.3:10 10. Por isso, me indignei contra essa geração e disse: Estes sempre erram no coração; eles também não conheceram os meus caminhos.

Indignei. Ou, “aborreci”, “sentir-se provocado”, “irritado”. Em linguagem humana (v. Hb.3:9-11), Deus declara a inutilidade das tentativas de conquistar a confiança e a cooperação da geração de escravos que libertara do Egito. Como grupo, embora não necessariamente como indivíduos, o tempo de graça se encerrou para eles em Cades-Barneia. Os eventos haviam provado amplamente que o caráter deles, como nação, estava além da possibilidade de mudança, e não haveria vantagem em lhes conceder mais tempo.

Essa geração. Ou seja, a população adulta, acima de 20 anos, que havia saído do Egito (Nm.14:29; Nm.14:35).

Sempre. Repetidamente, quando postos à prova, os israelitas eram incapazes de exercer fé na providência divina (ver Nm.14:22).

Erram. Do gr. planao, “vagar”, “errar” (cf. com. de Mt.18:12).

No coração. Israel se recusou a compreender a vontade e a providência de Deus e seguir Sua direção. A recusa foi intencional, deliberada e persistente, apesar de todas as evidências que Deus havia provido (comparar com Os.4:6).

Não conheceram os Meus caminhos. Eles consideravam as providências divinas no deserto como algo obrigatório, que lhes era devido, e deixaram de apreciar o propósito sublime de Deus em tirá-los do Egito e torná-los uma nação (ver vol. 4, p. 12-17). Não percebiam que Deus planejara suas experiências no deserto para o bem deles, para ensinar-lhes a confiar e cooperar com Ele e, assim, prepará-los para a ocupação da terra prometida.

Hb.3:11 11. Assim, jurei na minha ira: Não entrarão no meu descanso.

Ira. Do gr. orge (ver com. de Rm.1:18; Rm.2:8; sobre a “ira” de Deus, ver com. de 2Rs.13:3).

Não entrarão. Deus havia prometido a Abraão que seus descendentes retornariam a Canaã “na quarta geração” (Gn.15:16). O objetivo de tirar o povo hebreu do Egito era levá-los para a terra que lhes havia prometido. Porém, eles se recusaram de forma obstinada a aprender o que Deus quis lhes ensinar antes que pudesse levá-los para Canaã. Assim, Deus finalmente não teve alternativa senão abandoná-los aos seus próprios caminhos. Teria sido inútil dar-lhes a posse da terra prometida, pois, com base em seu desempenho no deserto, eles teriam frustrado o propósito divino. Deus teve muita paciência com o povo, e não havia mais nada que pudesse fazer por eles. Deus prometeu dar-lhes “descanso” (Ex.33:14), mas eles quebraram essa “promessa” em Cades (Nm.14:34).

Descanso. Do gr. katapausis, “[estado] tranquilo”, “[lugar] de descanso”. O conceito fundamental de katapausis é a cessação do trabalho ou de outra atividade, juntamente com o estado de inatividade que se segue. Katapausis ocorre ao todo oito vezes em Hebreus 3 e 4 (Hb.3:11; Hb.3:18; Hb.4:1; Hb.4:3; Hb.4:5; Hb.4:10-11), e o verbo relacionado katapauo, três vezes (Hb.4:4; Hb.4:8; Hb.4:10). Em cada caso, katapausis indica um descanso determinado, o descanso de Deus. Quando katapausis ocorre na LXX, é geralmente a tradução do heb. menuchah, “lugar de descanso”, “descanso”, e vem de nuach, “estabelecer-se”, “permanecer [em um lugar]”, “descansar”, isto é, após a atividade anterior. Ainda na LXX, katapausis é usado para a morada permanente da arca em Canaã, depois da peregrinação no deserto (Nm.10:36), e para a herança de Israel em Canaã, após os 430 anos de peregrinação (Dt.12:9). O verbo relacionado katapauo geralmente traduz o heb. nuach ou shabath, ambos significando “descansar”. Katapauo é usado cinco vezes para o descanso do sábado (Gn.2:2-3; Ex.34:21; Ex.31:17).

Assim como katapausis, katapauo representa a cessação de qualquer atividade e pode também incluir o descanso que se segue à cessação (ver com. de Hb.4:9). Para se compreender a discussão em Hebreus 3 e 4, é essencial atentar para quatro aplicações diferentes das palavras katapausis e katapauo: 1. Em Hb.3:11; Hb.3:18; Hb.4:3; Hb.4:5, a referência é à ocupação literal da terra prometida de Canaã pela geração de israelitas libertados do Egito. A promessa não se cumpriu por causa da rebelião em Cades-Barneia (ver com. de Hb.3:7-11). A geração seguinte entrou nesse aspecto do “descanso” (ver Dt.3:18; Dt.3:20; Js.21:44; Js.23:1). 2. É evidente, porém, que a entrada de Israel em Canaã é apenas um aspecto do “descanso” que Deus havia reservado para Seu povo. Uma vez que eles estavam estabelecidos na terra prometida, Ele propôs qualificá-los, como nação, para serem os mensageiros da salvação para o mundo (ver vol. 4, p. 12-17). Mas, séculos mais tarde, no tempo de Davi, eles ainda não tinham entrado nesse aspecto do “descanso” de Deus (Hb.4:7-8). Na verdade, eles nunca entraram nele (ver vol. 4, p. 17-21). Ao longo da história, os israelitas cometeram, essencialmente, o mesmo erro da geração cujo tempo de graça se encerrou em Cades.

Assim, finalmente, Deus os impediu, como nação, de entrar em Seu “descanso” espiritual, da mesma forma como anteriormente havia impedido a geração de Cades de entrar na Canaã literal (vol. 4, p. 19, 20). Assim, eles perderam o papel de povo escolhido (ver com. de Mt.21:43). O renovado convite de Deus, no tempo de Davi, para celebrar esse aspecto espiritual do “descanso” é evidência de que o fracasso de Israel em fazê-lo na época de Josué e depois, no tempo de Davi, ainda não tinha cancelado Seu propósito para Israel como nação. Além disso, a renovação do convite na época de Davi evidencia que Josué não tinha dado a Israel o repouso espiritual (Hb.4:8). 3. Em Hb.4:4 (ver com. ali), o descanso de Deus no sétimo dia da semana da criação é utilizado, em sentido ilustrativo, como o descanso no qual Deus deseja que os cristãos entrem. 4. Em Hb.4:1; Hb.4:3; Hb.4:10-11, katapauo e katapausis se referem ao descanso do cristão em relação às obras de pecado e às tentativas de se obter a salvação pelos próprios méritos. Cristo convida: “Vinde a Mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei” (ver com. de Mt.11:28).

A linha de raciocínio em Hebreus 3 e 4, centralizada na palavra “descanso”, é essencialmente a seguinte: 1. Originalmente, Deus pretendia que Moisés levasse Israel ao “descanso” em Canaã, mas nem Moisés nem a geração que saiu do Egito entraram em Canaã. 2. No entanto, Josué levou a geração seguinte a Canaã. Mas, por causa da incredulidade deles, ele não pôde levá-los ao descanso espiritual de Deus. 3. Nos dias de Davi, Deus renovou o convite para entrar em Seu descanso espiritual (ver vol. 4, p. 17, 18). Entretanto, é óbvio, no NT, que Israel como nação ainda não havia entrado no descanso de Deus. 4. No entanto, o convite de Deus e a promessa não haviam simplesmente sido cancelados, pois quando Deus decide determinado objetivo, Ele certamente o alcança, apesar das falhas humanas (ver com. de Hb.4:3-4). 5. Assim, visto que o povo de Deus ainda não entrou em Seu descanso, o certo é que “resta um repouso para o povo de Deus” (Hb.4:9). 6. Se como cristãos nos achegarmos “confiadamente, junto ao trono da graça” (Hb.4:16), onde Cristo ministra como “Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão” (Hb.3:1; Hb.4:14-15), encontraremos Aquele que pode “compadecer-Se das nossas fraquezas” (Hb.4:15) e, também, a “misericórdia e [...] graça para socorro em ocasião oportuna” (v. Hb.4:16).

Ao fazê-lo, entraremos no descanso espiritual de Deus, que Ele providenciou para os pecadores arrependidos. Assim, explica o escritor, a experiência na qual Israel não tinha conseguido entrar em séculos passados, torna-se o privilégio do cristão sincero (Hb.3:13; Hb.3:15). 7. “Temamos, portanto, que, sendo-nos deixada a promessa de entrar no descanso de Deus, suceda parecer que algum de vós tenha falhado |...| Esforcemo-nos, pois, por entrar naquele descanso, a fim de que ninguém caia, segundo o mesmo exemplo de desobediência” (Hb.4:1; Hb.4:11). A fé é a chave para entrar no descanso de Deus (Hb.4:2; Hb.3:18-19; Hb.4:6; Hb.4:11), e “jamais aconteça haver em qualquer de [nós] perverso coração de incredulidade” (Hb.3:12). Sob o sacerdócio levítico, as pessoas deveriam realizar certas obras, designadas para ajudá-las a compreender e apreciar o plano da salvação em Cristo. Mas, sob o ministério de Cristo como sumo sacerdote, as pessoas devem ir diretamente a Ele sem a mediação de um sacerdote humano. Devem encontrar descanso em Cristo, sem as obras requeridas pelo sistema cerimonial ou qualquer outro sistema. Em Hebreus 3 e 4, o autor insiste com seus irmãos cristãos judeus para que cessem essas obras inúteis e entrem no descanso da simples fé nos méritos expiatórios e no ministério de nosso sumo sacerdote no Céu (comparar com Is.30:15; Je.6:16; Mt.11:29).”

Hb.3:12 12. Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em qualquer de vós perverso coração de incredulidade que vos afaste do Deus vivo;

Tende cuidado. Ou, “discernir”, “entender”, literalmente, “ver”, “olhar”. Aqueles a quem a carta foi dirigida, e todos os cristãos que a leem, devem atentar com a maior diligência para a experiência do antigo Israel, a fim de evitar o erro que eles cometeram.

Irmãos. Ver com. do v. Hb.3:1.

Perverso coração de incredulidade. Esta sempre foi a raiz da dificuldade na relação da humanidade com Deus. Assim foi com Israel no deserto e, mais tarde, na terra de Canaã. Essa mesma dificuldade impede que os cristãos nominais entrem na experiência do “descanso” que é possível por uma verdadeira fé em Cristo. A falta de fé de Israel está em contraste com a fidelidade de Moisés e de Cristo (v. Hb.3:1-2).

Afaste. Do gr. aphistemi, “ir embora”, “retirar-se”, “partir”, literalmente, “ficar fora de”. A palavra “apostasia” é derivada da forma substantiva relacionada apostasia, que se traduz como “apostatar” (At.21:21) e “apostasia” (2Ts.2:3; ver com. ali). Aqui, os cristãos são admoestados a ter cuidado para não apostatar em seu coração “do Deus vivo”, mantendo só as formas da religião. As experiências pelas quais os antigos israelitas passaram são “exemplos” e “advertência”, e “foram escritas para advertência nossa” (1Co.10:11). Os cristãos que, ao rever a obstinação do antigo Israel, se consideram superiores, fazem bem em atender à admoestação: “Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia” 1Co.10:12; 1Co.10:1-10.

Deus vivo. Separar-se da Fonte da vida é morrer.

Hb.3:13 13. pelo contrário, exortai-vos mutuamente cada dia, durante o tempo que se chama Hoje, a fim de que nenhum de vós seja endurecido pelo engano do pecado.

Exortai-vos mutuamente cada dia. Ou, “continuai exortando [ou ‘encorajando’] uns aos outros a cada dia” (comparar com At.16:15; 1Co.1:10).

Durante o tempo que se chama Hoje. Ou seja, enquanto existe o dia da graça e o convite misericordioso para entrar no “descanso” de Deus ainda está vigente.

Endurecido. Ver com. de Ex.4:21; cf. Hb.3:8.

Engano. Ou, “ilusão”, “fraude”. As pessoas são atraídas para o pecado porque este parece desejável. Quando Eva viu que o que Deus tinha advertido a não comer parecia “bom”, “agradável” e “desejável” (ver com. de Gn.3:6), ela cruzou a linha que separa a justiça e o pecado. O cristão sincero deve cuidar quando qualquer coisa contra o que Deus advertiu começa a parecer atraente e desejável. Quando o que Deus disse ser errado começa a parecer bom, o cristão pode saber que está no terreno encantado de Satanás, em que as coisas parecem ser opostas ao que realmente são.

Hb.3:14 14. Porque nos temos tornado participantes de Cristo, se, de fato, guardarmos firme, até ao fim, a confiança que, desde o princípio, tivemos.

Participantes de Cristo. Ou, “participantes em Cristo”. O cristão tem parte na vitória e no caráter do bendito Senhor. Participa dos benefícios e das bênçãos que a Jesus cabe desfrutar, como resultado do grande sacrifício na cruz e de Seu ministério como sumo sacerdote nas cortes celestiais. A união com Cristo, aqui e agora, é uma experiência preciosa (ver com. de Gl.2:20). Este é o “descanso” em que devemos entrar.

Se [...] guardarmos. Ver com. de Mt.24:13; Hb.10:35-36.

Firme. Do gr. bebaios, palavra traduzida como “firme” no v. Hb.3:6.

Até ao fim. Ver com. de Mt.24:13; Ap.2:10. As admoestações de Hebreus foram originalmente dirigidas aos crentes judeus da igreja apostólica (ver p. 415-417). Geralmente, na igreja apostólica, acreditava-se que o prometido retorno do Senhor não seria demorado (ver Nota Adicional a Romanos 13; Rm.13:14). No entanto, cerca de 30 anos ou mais haviam se passado desde que Cristo havia subido ao Céu (ver vol. 6, p. 94), e ainda não havia nenhum sinal de Sua vinda. O que, naquele tempo, parecia um longo e inesperado atraso pode ter levado a fé de alguns ao declínio e, talvez, a admoestação para ser “fiel até ao fim” foi dirigida a esse grupo vacilante. Uma concepção clara da obra de Cristo como o grande sumo sacerdote nas cortes celestiais proveria uma base sólida para a fé desses crentes, tornando possível que eles fossem “participantes de Cristo” (Hb.3:14). Eles deviam entender que uma grande obra ainda havia para ser feita, tanto para eles quanto para outros. Podia haver atraso no retorno de Jesus, mas era privilégio deles entrar logo no “descanso” de Deus pela fé (ver com. dos v. Hb.3:7-11; Hb.3:12). A advertência dada à igreja apostólica é apropriada para a igreja atual.

Confiança. Do gr. hupostasis (ver com. de Hb.1:3), palavra diferente daquela traduzida como “confiança” (ver com. de Hb.3:6). Manter firme a confiança até o fim é o contrário de endurecer o coração (cf. v. Hb.3:8; Hb.3:15).

Desde o princípio. Depois de um tempo, a fé envolvente que acompanha a conversão pode se arrefecer, e o coração cálido pode esfriar. Feliz o cristão que preserva sua primeira fé ao longo da vida (ver com. do v. Hb.3:6).

Hb.3:15 15. Enquanto se diz: Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais o vosso coração, como foi na provocação.

Enquanto se diz. O cristão deve permanecer “firme” ao longo do grande dia da salvação, “enquanto se diz: hoje”.

Hoje. Sobre o v. 15, ver com. dos v. Hb.3:7-8. Por motivo de ênfase, a citação do Sl.95:1 é repetida em parte aqui.

Hb.3:16 16. Ora, quais os que, tendo ouvido, se rebelaram? Não foram, de fato, todos os que saíram do Egito por intermédio de Moisés?

Quais. Ou seja, os que se rebelaram em Cades-Barneia (ver com. dos v. Hb.3:8-11). Este é um eufemismo, pois quase todos os libertados do Egito estavam envolvidos na rebelião e pereceram no deserto.

Tendo ouvido. Ou, “embora tenham ouvido”, ou seja, mesmo sabendo.

Rebelaram. Ver com. do v. Hb.3:8.

Não foram, de fato, todos. Ou, “na verdade, não foram todos?” A primeira pergunta retórica é respondida por uma segunda. A pergunta sugere que todos que saíram do Egito se rebelaram, embora houvesse algumas exceções (ver Nm.26:65; Js.17:4; Js.22:13; Js.22:31-32; Nm.25:7).

Por intermédio de Moisés. Ou seja, sob a liderança de Moisés.

Hb.3:17 17. E contra quem se indignou por quarenta anos? Não foi contra os que pecaram, cujos cadáveres caíram no deserto?

Indignou. Ver com. do v. Hb.3:10.

Quarenta anos. Ver com. do v. Hb.3:9.

Os que pecaram. Ou seja, aqueles que habitualmente se rebelavam (ver com. dos v. Hb.3:8-10).

Cadáveres. Ou, “corpos”.

No deserto. Ver com. do v. Hb.3:8.

Hb.3:18 18. E contra quem jurou que não entrariam no seu descanso, senão contra os que foram desobedientes?

Jurou. Ver Nm.14:22-35.

Não entrariam no Seu descanso. Ver com. do v. Hb.3:11.

Hb.3:19 19. Vemos, pois, que não puderam entrar por causa da incredulidade.

Vemos, pois. O autor conclui a linha de pensamento introduzida pela citação iniciada no v. Hb.3:7.

Não puderam entrar. A geração de israelitas cuja rebelião atingiu o clímax em Cades-Barneia foi impedida de entrar na terra prometida por causa desse problema fundamental, e não por um ato arbitrário da parte de Deus ou porque Moisés houvesse falhado em prover liderança eficaz. Moisés foi “fiel em toda a casa de Deus” (v. Hb.3:2; Hb.3:5) e, por isso, não pode ser acusado dessa falha. A falta de fé daquela geração, demonstrada pela desobediência, tornou impossível que entrasse na terra.

Incredulidade. A “falta de fé” do povo contrasta com a fidelidade de Moisés. Se o povo tivesse sido mais semelhante a ele, poderia ter entrado na terra. Assim como Moisés, Cristo também é “fiel” e não pode ser responsabilizado pela falha de alguns cristãos em entrar no “descanso” espiritual prometido (ver com. do v. Hb.3:11). Esta é a lição extraída pelo autor da experiência do antigo Israel (ver com. de Hb.4:1).

Hb.4:1 1. Temamos, portanto, que, sendo-nos deixada a promessa de entrar no descanso de Deus, suceda parecer que algum de vós tenha falhado.

Temamos, portanto. A mesma advertência é feita em 1Co.10:1-12. Alheios ao perigo, os cristãos podem criticar a geração de judeus que não conseguiu entrar em Canaã, e as gerações posteriores, que não conseguiram entrar no descanso espiritual que Deus havia planejado para Israel como nação (ver com. de Hb.3:11). Começando com Hb.4:1, o autor passa a aplicar a lição da história de Israel no deserto à experiência da igreja apostólica. Em princípio, os cristãos de hoje correm o mesmo perigo e necessitam da mesma advertência à fidelidade.

Sendo-nos deixada a promessa. A promessa de entrar no “descanso” de Deus não foi retirada como resultado dos repetidos erros de Israel. A promessa continua válida e se repete a cada geração.

Descanso de Deus. Ver com. de Hb.3:11.

Vós. Especificamente, os cristãos judeus a quem a carta fora dirigida. Na verdade, a mesma se aplica a todos os cristãos.

Tenha falhado. Ou seja, assim como o antigo Israel não havia conseguido entrar no prometido descanso de Deus.

Hb.4:2 2. Porque também a nós foram anunciadas as boas-novas, como se deu com eles; mas a palavra que ouviram não lhes aproveitou, visto não ter sido acompanhada pela fé naqueles que a ouviram.

Boas-novas. Literalmente, “boa notícia” (ver com. de Mc.1:1). A declaração pode ser traduzida como: “fomos evangelizados, assim como eles também”. Nos tempos do AT, o evangelho era “pregado” por meio de tipos e cerimônias, em sacrifícios e rituais, mas era o mesmo evangelho que, mais tarde, foi proclamado por Cristo (ver com. de Hb.1:1-2).

A palavra que ouviram. Literalmente, “aquilo que é ouvido”, ou “a palavra ouvida”.

Não lhes aproveitou. A não ser que “a palavra que ouviram” encontre fé por parte do ouvinte, ela não pode beneficiá-lo (ver com. de Hb.7:24-27). A eficácia da mensagem de Cristo, quando esteve na Terra, também estava limitada pela receptividade dos ouvintes. É dito que em Nazaré Ele “não fez [...] muitos milagres, por causa da incredulidade deles” (Mt.13:58). O desenrolar desse princípio é ilustrado na parábola do semeador (ver com. de Mt.13:3).

Fé. Ver com. de Hb.3:12; Hb.11:1.

Hb.4:3 3. Nós, porém, que cremos, entramos no descanso, conforme Deus tem dito: Assim, jurei na minha ira: Não entrarão no meu descanso. Embora, certamente, as obras estivessem concluídas desde a fundação do mundo.

Nós [...] que cremos. Ou seja, os cristãos judeus da igreja apostólica.

Entramos. Ou, “estamos entrando”. O convite ainda é válido; além disso, alguns estão aceitando o convite e entram no descanso de Deus, pela fé.

Descanso. Literalmente, “o descanso”, ou seja, o mesmo descanso referido em Hb.3:11; Hb.3:18; Hb.4:1 (ver com. de Hb.3:11). O descanso em que os cristãos, incluindo os de origem judaica, entram é o mesmo ao qual Deus tinha convidado o antigo Israel a entrar. É um descanso de alma que resulta da entrega total a Cristo e da integração da vida ao propósito eterno de Deus (cf. Is.30:15; Je.6:16; Mt.11:29).

Conforme Deus tem dito. O escritor de Hebreus afirma que, individualmente, os cristãos estão entrando no mesmo descanso proposto por Deus ao antigo Israel. Deste versículo até o 8, o autor expõe as provas em que baseia sua conclusão chocante para os judeus não cristãos e, talvez, um enigma para muitos, se não para a maioria, dos judeus cristãos. No v. Hb.4:9, ele conclui essa linha de raciocínio reafirmando a validade de sua premissa principal, de que, agora, a entrada no descanso de Deus é por meio da fé em Cristo, assim como anteriormente era por meio do judaísmo. A argumentação dos v. 3 a 8 pode ser resumida como segue: 1. Deus havia jurado que o Israel literal não entraria em Seu descanso. 2. No entanto, as obras de Deus, ou seja, o propósito para a humanidade, estavam “concluídas desde a fundação do mundo”. No princípio, Deus havia determinado que as pessoas deveriam entrar em Seu descanso. Assim, o juramento de Deus, barrando o antigo Israel de entrar no descanso prometido, à primeira vista, podia contradizer Seu propósito original. No entanto, Deus não desiste de Seus objetivos.

3. Para provar que Deus alcança Seus propósitos, o autor aponta as obras da criação (v. Hb.4:4). Deus Se propôs a criar este mundo, e completou essas obras de criação; Seu descanso no sétimo dia testemunha de uma criação concluída. As palavras “acabados” e “terminado” (Gn.2:1-3) enfatizam a conclusão do projeto divino. 4. Em Hb.4:5, o juramento de Deus de que o antigo Israel não entraria em Seu descanso é repetido e colocado em paralelo com o pensamento do v. Hb.4:4, de que Deus cumpre o que Se propõe a fazer, como é ilustrado pela conclusão da criação. 5. Uma criação concluída, como revela o descanso de Deus no sétimo dia da semana da criação, é evidência da imutabilidade dos propósitos divinos. Essa é a principal premissa de Paulo. Sua premissa secundária é que Deus havia proposto que o povo escolhido deveria entrar no Seu descanso, mas que “por causa da desobediência, não entraram aqueles aos quais anteriormente foram anunciadas as boas-novas”. Isso o leva à conclusão de que “resta entrarem alguns nele” (v. Hb.4:6).

6. Como prova adicional da validade de sua conclusão, o autor menciona novamente (v. Hb.4:7) o Sl.95, para mostrar que o fracasso das gerações anteriores não havia alterado o propósito original de Deus nem retirado o convite inicial (comparar com os repetidos convites para o grande banquete, em Lc.14:16-24). 7. Ele chega à conclusão adicional, no v. Hb.4:8, a partir da observação do v. Hb.4:7, de que a menção da parte de Deus de “um outro dia”, na época de Davi, é evidência de que, embora Josué houvesse realmente dado a Israel o descanso na terra de Canaã (ver com. de Hb.3:11), ele não os havia levado ao descanso espiritual que Deus pretendia que desfrutassem. 8. A partir de toda a linha de argumentação dos v. 3 a 8, o autor conclui que é certo que, “portanto, resta um repouso para o povo de Deus” (v. Hb.4:9).

Assim, jurei. A construção grega aqui é idêntica à de Hb.3:11.

Ira [...] descanso. Ver com. de Hb.3:11.

Embora. As duas declarações conectadas desta maneira podem ser traduzidas livremente da seguinte forma: “Apesar de Seus planos para este mundo estarem fixados desde o início dos tempos, Deus revogou Sua promessa solene a Israel de um 'descanso' na terra prometida.” Fica estabelecido que Deus não muda e que levará Seus planos à conclusão (ver vol. 4, p. 20, 21; Ml.3:6). No entanto, aparentemente, a imutabilidade de Deus e a reversão de Sua promessa a Israel parecem estar em conflito. A primeira, indica o autor, parece incompatível com a segunda. A solução do aparente dilema é dada em Hb.4:4-8. O caso é que a imutabilidade do propósito de Deus não foi afetada pela reversão de Sua promessa a Israel. A conclusão é afirmada no v. Hb.4:6: “Portanto [...] resta entrarem alguns nele”; e no v. Hb.4:9: “Portanto, resta um repouso para o povo de Deus.” A solução do dilema prova o que já foi dito (v. Hb.4:1-3), que Deus “deixou” a “promessa |...| de entrarmos no Seu descanso”, mencionada no v. Hb.4:2 como “as boas-novas”, para os cristãos, assim como no passado Ele havia dado ao Israel literal. Na verdade, os cristãos devem entrar no “descanso” espiritual de Deus.

Obras. Aqui se refere não às “obras” do mundo natural, mas ao propósito de Deus para a humanidade, que se tornou realidade no momento da criação. Em outras palavras, o autor indica que as “obras” da criação incluem o propósito de Deus na criação da Terra e Seu plano de alcançar esse fim. De fato, as obras da criação dependiam do propósito infinito para o qual foram concebidas. No v. Hb.4:4, as “obras” da semana da criação são referidas especificamente.

Concluídas. Literalmente, “vindas à existência”, “acontecidas”, o que significa que foram “concluídas” ou “terminadas”, naquela época. Portanto, não estavam sujeitas a modificações posteriores. O mundo, saído das mãos do Criador, era completo e perfeito (Gn.1:31). Da mesma forma, as leis físicas e biológicas que governam o mundo natural também foram “acabadas”, ou seja, não estavam sujeitas a modificações ou mudanças. Por exemplo, a gravidade ainda funciona como funcionava no início. A lei da genética pela qual cada planta e cada animal se reproduz segundo a sua espécie (ver com. de Gn.1:12) nunca foi revogada nem alterada. O argumento, em Hb.4:3-4, é que o propósito original de Deus de que este mundo fosse o “descanso” ou “morada” (ver com. de Hb.3:11) de uma comunidade de seres íntegros e felizes era parte do trabalho da semana da criação. A entrada do pecado no mundo não anula o efeito benéfico, no sentido de que o plano da salvação proveu um meio pelo qual o objetivo original ainda pode ser alcançado, apesar do pecado. Sendo assim, o fato de o antigo Israel não ter “aproveitado” as “boas-novas” (v. Hb.4:2), e, como resultado, Deus haver revogado Sua promessa ao povo, não poderia alterar o propósito divino fundamental de “alguns entrarem” no descanso (v. Hb.4:6).

Fundação do mundo. Ou seja, a criação.

Hb.4:4 4. Porque, em certo lugar, assim disse, no tocante ao sétimo dia: E descansou Deus, no sétimo dia, de todas as obras que fizera.

Em certo lugar. Citação de Gn.2:2.

Descansou. Do gr. katapauo, “parou”, “fez cessar”. Assim como o substantivo katapausis, o verbo katapauo denota a cessação do trabalho ou de uma atividade, juntamente com o estado ou condição de inatividade que se segue à cessação (ver com. de Hb.3:11). A palavra hebraica equivalente, shabath, traduzida como “descansou” (ver com. de Gn.2:2), significa literalmente “cessação” do trabalho ou da atividade. Katapauo e shabath incluem, assim, tanto a cessação da atividade anterior como o estado de inatividade que se segue. Os dois aspectos são verdadeiros porque Deus descansou no primeiro sábado. Ele parou de criar e continuou em estado de inatividade no que se refere a uma criação posterior. As “obras” da criação estavam completas em todos os aspectos; e, naquele primeiro sábado transformado em memorial da criação, Deus começou Seu descanso da atividade de criar a Terra. No que se refere a este mundo, Deus não retomou o trabalho de criar, encerrado naquele tempo, nem revogou ou alterou as leis então criadas para governar o mundo natural. O escritor de Hebreus concentra a atenção na criação como um ato completo, não sujeito a revisão posterior. Isso inclui o mundo material, as leis que o regem, o ser humano e o propósito de Deus para ele e para o mundo. A ênfase, portanto, aqui, é sobre a cessação de Deus em relação a outras atividades criativas.

O sábado da semana da criação também foi o primeiro dia completo de vida de Adão. Suas experiências naquele dia foram um prenuncio do descanso eterno reservado para Adão se ele permanecesse fiel a Deus. A observância do sétimo dia da semana como sábado de descanso testemunha da fé no verdadeiro Deus criador de todas as coisas, e é uma expressão visível dessa fé. Testemunha também do desejo de viver em harmonia com Seu eterno propósito, implícito na criação deste mundo e da humanidade para viver sobre ele. É um sinal de aceitação do propósito divino para cada indivíduo (ver com. de Ex.20:8; Ez.20:12; Ez.20:20; Is.58:13). Assim como o propósito original de Deus para este mundo, ou seja, Seu “descanso”, mantém-se inalterado, também permanece o sábado do sétimo dia, o memorial da criação. Portanto, a observância do sábado do sétimo dia testemunha da fé em Deus como criador de todas as coisas, bem como da fé em Seu poder de transformar a vida e preparar pessoas para aquele descanso eterno inicialmente planejado para os habitantes deste mundo. O sábado é sinal do poder criador e santificador de Deus, e sua observância é um reconhecimento de Seu poder de criar e recriar.

O sétimo dia. Ver com. de Gn.2:1-3.

Todas as obras que fizera. Em Gn.2:2, a referência é às “obras” criadas do mundo natural, como descrito no capítulo anterior.

Hb.4:5 5. E novamente, no mesmo lugar: Não entrarão no meu descanso.

Novamente. A declaração é citada aqui pela terceira vez (cf. Hb.3:11; Hb.4:3). Todo o argumento de Hb.3:7-4:10 trata da retirada por parte de Deus de Seu convite para entrar no descanso. Aqui, a citação do Sl.95:11 é colocada em paralelo com a de Gn.2:2 (ver Hb.4:4), a fim de explicar o “descanso” de Deus no sétimo dia da semana da criação, referido nos v. Hb.4:3-4. O autor faz essa referência às “obras” de Deus sendo “concluídas” (ver com. do v. Hb.4:3) e ao fato de que Ele “descansou” (v. Hb.4:4), para provar que a retirada de Sua promessa ao antigo Israel não era absoluta. Em outras palavras, a promessa não foi retirada completamente de todos, mas apenas daqueles que “não entraram por causa da incredulidade” (v. Hb.4:6).

No mesmo lugar. Isto é, no Sl.95:11.

Descanso. Ver com. de Hb.3:11; cf. com. de Hb.4:4.

Hb.4:6 6. Visto, portanto, que resta entrarem alguns nele e que, por causa da desobediência, não entraram aqueles aos quais anteriormente foram anunciadas as boas-novas,

Visto, portanto. O v. 6 conclui os argumentos dos v. Hb.4:3-5.

Resta. A promessa de entrar no descanso de Deus permanece válida mesmo depois de ter sido retirada do antigo Israel.

Entrarem alguns. Apesar daqueles que “não puderam entrar [no descanso] por causa da incredulidade” (Hb.3:19), o plano original de Deus de que este mundo seja habitado por uma comunidade justa e feliz será, em última análise, bem-sucedido. Mas esses devem, primeiramente, entrar, pela fé, no descanso espiritual do pecado e de seus próprios esforços para a salvação. É ao “descanso” espiritual que se faz referência aqui (ver com. de Hb.3:11).

Nele. Ou seja, ao “descanso” espiritual.

Aqueles aos quais. Ver com. do v. Hb.4:2.

Por causa da desobediência. Ver com. de Hb.3:19.

Não entraram. A geração de israelitas que deixou o Egito “não entrou” na terra da promessa, e os que entraram em Canaã, como nação, nunca entraram no descanso espiritual que Deus lhes propôs (ver com. de Hb.3:11; ver vol. 4, p. 17-21).

Anteriormente foram anunciadas. Ou seja, o primeiro anúncio do convite do evangelho, mencionado no v. Hb.4:2.

Hb.4:7 7. de novo, determina certo dia, Hoje, falando por Davi, muito tempo depois, segundo antes fora declarado: Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais o vosso coração.

De novo. Nos v. 7 e 8, o autor acrescenta outro ponto para provar sua afirmação de que resta um descanso para o povo de Deus.

Determina. Literalmente, “define”, “designa”.

Certo dia. Isto é, Deus designou o reinado de Davi como outro momento adequado e apropriado em que Israel podia entrar em Seu “descanso” (ver vol. 4, p. 17, 18). No texto grego, é claro que “hoje” é este “certo dia”.

Falando. Isto é, Deus, falou a Israel por meio de Seu servo Davi.

Por Davi. Ou seja, em um dos salmos de Davi, o Sl.95:11 (ver com. de Hb.3:7-8; comparar com. de Rm.11:2).

Muito tempo depois. Isto se refere à palavra “falando”. Não é parte da citação do Sl.95:7-8. A época de Davi foi “muito tempo” após a de Josué, cerca de três séculos.

Segundo antes fora declarado. Ou, “como já foi dito” (em Hb.3:7; Hb.3:15).

Hoje. Ver com. de Hb.3:7. A promessa de entrar no “descanso” espiritual de Deus foi feita originalmente a Israel quando saiu do Egito e continuou válida séculos após ser feita pela primeira vez. Embora tenha sido negligenciada ou rejeitada por sucessivas gerações desde então, ainda continuava válida nos dias de Davi. Além disso, o convite de Deus para a nação de Israel nos dias de Davi mostra (Hb.4:8) que Josué não levou Israel ao “descanso” espiritual (ver com. de Hb.3:7). O “dia” da salvação tem sido longo. Tudo começou quando Adão caiu e terminará com o fim do tempo da graça. Os pecadores já deram abundantes motivos para Deus encerrar o “dia” de graça (cf. PP, 92; DTN, 37), mas Deus é “compassivo, clemente e longânimo e grande em misericórdia” (Ex.34:6); “não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento” (2Pe.3:9).

Hb.4:8 8. Ora, se Josué lhes houvesse dado descanso, não falaria, posteriormente, a respeito de outro dia.

Ora, se. A referência no v. Hb.4:7, à renovação do convite para entrar no “descanso” de Deus, no tempo de Davi, indica que Josué não havia dado descanso a Israel. Do contrário, Ele não teria repetido o convite nos dias de Davi, séculos mais tarde.

Houvesse dado descanso. Josué tinha dado o “descanso” de Canaã a Israel. Ele liderou o povo na conquista bem-sucedida de considerável porção da terra (ver vol. 2, p. 25, 26), mas não os levou ao descanso espiritual, pois eles não creram o suficiente (ver com. de Hb.3:11).

Falaria. Isto é, as palavras do SI.95:7-11.

Posteriormente. Ou seja, após os dias de Josué, nos dias de Davi.

Outro dia. Ou seja, o “dia” de Davi, como o v. Hb.4:7 torna evidente (ver com. ali).

Hb.4:9 9. Portanto, resta um repouso para o povo de Deus.

Portanto, resta. O v. 9 repete a conclusão do v. Hb.4:6, elaborada a partir da linha de argumentação iniciada no v. Hb.4:3 para provar as afirmações dos v. Hb.4:1; Hb.4:3 (ver com. do v. Hb.4:6). Essa argumentação pode ser resumida como segue: 1. Como originalmente planejado para o antigo Israel, o “descanso” incluía: o estabelecimento permanente na terra de Canaã, uma transformação de vida que qualificasse os israelitas como representantes dos princípios do reino de Deus e o ministério do povo escolhido para a salvação do mundo (ver vol. 4, p. 13-17; ver com. de Hb.3:11). 2. A primeira geração a receber a promessa do “descanso” não entrou na terra de Canaã por causa da incredulidade (ver com. de Hb.3:19). 3. Josué liderou a geração seguinte para a terra prometida (ver com. de Hb.3:11). Mas, por causa da dureza de coração do povo, ele não pôde levá-lo ao descanso espiritual que podia ter ali (ver com. de Hb.4:7-8). 4. A mesma promessa foi repetida nos dias de Davi (v. Hb.4:7), o que indica que, naquela época, Israel não tinha entrado no “descanso” espiritual.

Além disso, a incapacidade deles de fazê-lo nos dias de Moisés e Josué não havia invalidado a promessa original. 5. O cumprimento final dos propósitos de Deus é certo, apesar do fracasso de sucessivas gerações (ver com. dos v. Hb.4:3-4). 6. O apelo sincero do autor para que o povo de Deus do tempo apostólico “entrasse naquele repouso” (v. Hb.4:11; Hb.4:16) é mais uma prova de que o convite permanecia válido e de que o povo de Deus, coletivamente, não tinha entrado no descanso, mesmo no tempo da igreja apostólica. 7. Assim, a promessa de entrar no descanso espiritual de Deus e o convite para entrar nele permanecem válidos (v. Hb.4:6; Hb.4:9), e os cristãos devem “entrar naquele descanso” (v. Hb.4:11). O descanso que permanecia no tempo dos cristãos era o descanso espiritual prometido originalmente ao Israel literal (ver com. do v. Hb.4:3). Obviamente, o que “resta” já estava lá originalmente.

Repouso. Do gr. sabbatismos, “descanso”, “cessação [de atividade anterior]”; mais tarde, “observar o sábado”, a partir do verbo sabbatizo, “descansar”, “fazer cessar”, “guardar o sábado”. Sabbatismos não ocorre em outro texto nem na Bíblia nem na literatura antiga até o 2° e 3° séculos, com a possível exceção de uma única ocorrência em Plutarco (Moralia, 166.a). Consequentemente, alguns concluíram que o autor de Hebreus cunhou a palavra ao escrever esta passagem (ver Moulton e Milligan, Vocabulary of the Greek New Testament). Sabbatismos e sabbatizo são traduções gregas do substantivo heb. shabbath e do verbo relacionado, shabath, respectivamente, e pode-se esperar que o último lance luz sobre o significado do primeiro. Shabbath ocorre 101 vezes no AT. O verbo shabath ocorre 70 vezes, sete vezes com referência ao descanso do sábado e 63 vezes em relação a outros tipos de descanso (ver Gn.8:22; Js.5:12; Ne.6:3; Lm.5:14; Is.14:4; Is.24:8; Is.33:8). O significado da raiz do verbo shabath é “fazer cessar” ou “descansar”.

Enquanto o verbo, às vezes, denota o descanso sabático semanal, o substantivo shabbath, derivado de shabath, geralmente denota o descanso do sábado semanal, e também o espaço de tempo marcado por sucessivos sábados, a semana (Lv.23:15) e os anos sabáticos (Lv.25:6; Lv.26:34-35; Lv.26:43; 2Cr.36:21). Nota-se também que shabbathon, que é simplesmente shabbath com a desinência on, é usado para o Dia da Expiação (Lv.16:31; Lv.23:32), o ano sabático (Lv.25:4-5), a Festa das Trombetas (Lv.23:24) e os primeiros e últimos dias da Festa dos Tabernáculos (Lv.23:39), bem como para o sábado do sétimo dia. Sabbatizo é usado sete vezes na LXX, uma vez para o sábado literal do sétimo dia (Ex.16:30), uma vez para outros sábados (Lv.23:32) e cinco vezes para o descanso da terra no ano sabático (Lv.26:34-35; 2Cr.36:21). Na LXX (de Ex.16:30; Lv.23:32; Lv.26:34-35), sabbatizo é proveniente do heb. shabbath. Assim, a ideia fundamental expressa por sabbatizo, na LXX, é a de descansar ou cessar o trabalho ou outra atividade. A partir disso, conclui-se que o uso das palavras gregas e hebraicas relacionadas implica que o substantivo sabbatismos pode denotar tanto o descanso literal do sábado como simplesmente “descanso” ou “cessação” em sentido geral.

Assim, um estudo linguístico da palavra sabbatismos em Hb.4:9 não deixa claro se o autor tem em mente o descanso do sábado semanal ou se indica simplesmente “descanso” ou “cessação” em sentido geral. O contexto, porém, pode elucidar a questão. O autor de Hebreus parece usar katapausis e sabbatismos mais ou menos como sinônimos: 1. Pelo fato de que Josué não pôde levar o Israel espiritual ao “descanso” (katapausis, v. Hb.4:8), resta um sabbatismos (v. Hb.4:9) para os cristãos. O que resta deve ser o mesmo que havia no início. 2. Nos v. Hb.4:1; Hb.4:6, o que resta para o povo de Deus no tempo do NT é um katapausis; no v. Hb.4:9, se diz que resta um sabbatismos. Assim, dizer que o que resta para “o povo de Deus” é o sábado semanal implicaria que Josué não conseguiu levar Israel ao sábado semanal. 3. O fato de, na LXX, a Bíblia comum da igreja do NT, katapauo (Gn.2:2-3; Ex.20:11) e sabbatizo (Ex.16:30; Lv.23:32) serem usados intercambiavelmente para o sábado do sétimo dia tende a negar a ideia de que o autor de Hebreus tivesse a intenção de fazer uma distinção entre essas palavras em Hebreus 3 e 4.

Os judeus do tempo de Paulo, sendo cristãos ou não, eram criteriosos na observância do quarto mandamento. Portanto, escrevendo aos judeus, o autor de Hebreus não considera necessário provar-lhes que a guarda do sábado “permanece”. Se o objetivo do argumento, iniciado em Hb.3:7, fosse provar que a guarda do sábado permanecia para o povo de Deus, o autor não estaria sendo lógico em seu raciocínio. Não haveria nenhuma vantagem em um esforço tão grande para convencer os judeus a fazer algo que eles já estavam fazendo: observar o sábado do sétimo dia. Além disso, no contexto apostólico, o sábado do sétimo dia era observado por todos os cristãos, judeus e gentios, e qualquer argumento para provar a validade do sábado naquele contexto do cristianismo seria desnecessário. Deve-se observar ainda que a seção que compreende os cap. 3 e 4 de Hebreus é aberta com um convite: “Considerai atentamente o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão, Jesus” (Hb.3:1), e termina com um apelo fervoroso: “Acheguemo-nos [...] confiadamente” diante dEle, a fim de “recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hb.4:16). Assim, uma argumentação prolongada a fim de provar a obrigação de observar o sábado, para quem já guardava o sábado, não teria uma relação direta com o tema dominante de Hebreus 3 e 4: o ministério de Cristo como o grande sumo sacerdote no santuário celestial.

“O descanso que se fala aqui é o descanso da graça” (Ellen G. White, Material Suplementar sobre Hb.4:9; cf. GC, 253). Trata-se do “verdadeiro repouso da fé” (MDC, 1). Os cristãos entram no “descanso” de Deus quando “consideram” Jesus (Hb.3:1), ouvem Sua voz (Hb.3:7; Hb.3:15; Hb.4:7), exercem fé nEle (Hb.4:2-3), abandonam os próprios esforços para obter a salvação (v. Hb.4:10), conservam firmes a “confissão” (v. Hb.4:14) e se aproximam do trono da graça a fim de “receber misericórdia e achar graça para socorro em ocasião oportuna” (v. Hb.4:16). Aqueles que entram nessa experiência devem tomar cuidado com o “perverso coração de incredulidade” (Hb.3:12), evitando endurecer o coração (Hb.3:8; Hb.3:15; Hb.4:7). Devem se esforçar para entrar no “descanso” de Deus (Hb.4:11).

Povo de Deus. Ou seja, os cristãos, que agora são o povo escolhido de Deus tão verdadeiramente quanto os israelitas o foram no passado (Ex.19:5-6; 1Pe.2:9-10; ver vol. 4, p. 21-23).

Hb.4:10 10. Porque aquele que entrou no descanso de Deus, também ele mesmo descansou de suas obras, como Deus das suas.

Aquele que entrou. Isto é, qualquer pessoa do “povo de Deus” (v. Hb.4:9). A construção grega deixa claro que alguns já entraram no “descanso” de Deus.

Descanso. Do gr. katapausis (ver com. de Hb.3:11). Embora a palavra para “descanso” aqui seja diferente da do v. Hb.4:9 (sabbatismos), o contexto mostra que ambas se referem à mesma coisa (ver com. do v. Hb.4:9). O “descanso” que permanece (v. Hb.4:9) é, obviamente, o “descanso” no qual entra o cristão do v. Hb.4:10. A palavra “porque”, do v. Hb.4:10, torna-o uma conclusão do v. Hb.4:9.

Também ele. Isto é, da mesma maneira pela qual Deus.

Descansou. Do gr. katapauo, a mesma palavra traduzida como “descansou” (v. Hb.4:4) e “dado descanso” (v. Hb.4:8; ver com. de Hb.3:11). Embora a tradução “já cessou” (KJV) obscureça a relação da declaração aqui feita a outras ocorrências de katapauo e katapausis em Hebreus 3 e 4, é, no entanto, mais adequada ao pensamento do v. Hb.4:10. Essa tradução enfatiza a ideia de cessação das “obras” em vez do estado contínuo de “descanso” após a cessação.

De suas obras. Ao entrar no descanso de Deus, que consiste em confiar na graça salvífica de Jesus Cristo, o cristão precisa já ter deixado de buscar a justiça nas próprias obras. É possível também que o autor de Hebreus tenha em mente o descanso em relação às obras do pecado, as quais impediram a geração de israelitas libertados do Egito de entrar na terra prometida, e as gerações posteriores de entrar no repouso espiritual de Deus (ver com. de Hb.3:8-9; Hb.4:8).

Hb.4:11 11. Esforcemo-nos, pois, por entrar naquele descanso, a fim de que ninguém caia, segundo o mesmo exemplo de desobediência.

Esforcemo-nos. Ou, “sejamos zelosos”, “façamos todo o esforço”. É necessário esforço diligente e determinado a fim de entrar no “descanso” de Deus.

Pois. Os v. 11 a 16 fazem uma aplicação prática do princípio estabelecido em Hb.3:7-4:10, de que resta um “repouso” para o “povo de Deus” (v. Hb.4:9). Essa aplicação prática à experiência cristã consiste em um tríplice apelo: esforçar-nos para entrar no descanso de Deus (Hb.4:11); “conservar firmes a nossa confissão” (v. Hb.4:14); e “achegar-nos confiadamente junto ao trono da graça” (v. Hb.4:16). Aquele que segue esse conselho desfrutará o descanso que Deus oferece a cada cristão sincero.

Descanso. Do gr. katapausis (ver com. de Hb.3:11).

A fim de que ninguém. Aquele que se esforça para “entrar naquele descanso” se desvia da armadilha da descrença em que o antigo Israel caiu.

Caia. O oposto de entrar. O fato de que os antigos israelitas “caíram no deserto” (Hb.3:17) indica que eles deixaram o Egito com a intenção de entrar na terra prometida. Quando se diz que uma pessoa ficou aquém do “descanso” de Deus, fica implícito que havia se proposto a entrar nele. Os cristãos indiferentes são aqueles que, hoje, caem, “segundo o mesmo exemplo de desobediência”. Com relação a esse problema, o conselho é apresentado na parábola do semeador (ver com. de Mt.13:5-7).

O mesmo exemplo. Ou seja, o exemplo da escolha e do destino do antigo Israel, em Cades-Barneia e, depois, quando estabelecidos na terra prometida.

Desobediência. Ver com. de Hb.3:19.

Hb.4:12 12. Porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração.

Porque. A primeira vista, pode parecer que os v. 12 e 13 não têm conexão direta com o tema de Hebreus 3 e 4. No entanto, como indica a palavra “porque”, há uma relação lógica. Os v. 12 e 13 explicam como evitar cair na desobediência (v. Hb.4:11) e descansar das próprias “obras” (v. Hb.4:10), usufruindo os meios providenciados por Deus para que Seus filhos entrem em Seu “descanso”.

Palavra. Do gr. logos (ver com. de Jo.1:1). No presente contexto, esta é a “palavra” que foi “pregada” tanto ao antigo Israel como aos cristãos (Hb.4:2), especialmente o convite para entrar no “descanso” de Deus. Como o v. Hb.4:2 deixa claro, esta palavra é equiparada com o evangelho. Em sentido mais amplo, tal palavra também pode incluir todos os escritos do cânon sagrado, na medida em que toda a Bíblia é a palavra de Deus e apresenta o evangelho de Jesus Cristo.

Viva. É necessária uma força viva para criar um coração novo e renovar um espírito reto (cf. SI.51:10). A “palavra” de Deus é viva e dá vida. Assim foi na obra da criação (SI.33:6; Sl.33:9) e assim é na recriação da imagem de Deus no ser humano. Cristo, o Verbo encarnado, igualmente tem vida em Si mesmo (Jo.1:4; Jo.1:12; Jo.5:26). A “Palavra de Deus” é a força operante na conversão. O cristão “nasce de novo [...] pela palavra de Deus, que vive e permanece para sempre” (1Pe.1:23).

Eficaz. Do gr. energes, “ativa”, “poderosa” (cf. com. de 1Co.12:6). A palavra “energia” é derivada de energes. Há poder na “palavra” de Deus para transformar pecadores.

Mais cortante. A natureza deste gume afiado é explicada no restante do v. 12. A “palavra” de Deus é viva, poderosa e afiada, plenamente capaz de cumprir Seus propósitos para a humanidade (ver Is.46:10; Is.55:10-11).

Espada de dois gumes. Ver Ef.6:17; ver com. de Ap.1:16.

Dividir. Do gr. merismos, “repartir”, “separar”.

Alma e espírito. Do gr. psuche kai pneuma, aqui, “vida e respiração” (sobre psuche, ver com. de Mt.10:28; sobre pneuma, ver com. de Lc.8:55). Esta expressão e “juntas e medulas” são usadas figurativamente. A ideia de dividir entre “alma e espírito” e entre “juntas e medulas” descreve o poder cortante da “palavra” de Deus. O valor da figura se baseia no fato de que “vida” e “respiração”, para efeitos práticos, são inseparáveis.

Juntas e medulas. Também se presume, na metafora que são coisas inseparáveis.

Discernir. Do gr. kritikos, ser capaz de “discernir, “julgar”, “dscriminar”, ou seja, possuir a qualidade de discernimento ou discriminação. A palavra “crítico” é derivada de kritikos. Mediante uma resposta favorável à impressão feita sobre a consciência pela palavra de Deus, o cristão evita cair na incredulidade, abandona as próprias obras e entra no “descanso” de Deus (v. Hb.4:6; Hb.4:10-11; Hb.3:10; Hb.3:12).

Pensamentos e propósitos. Ou, “pensamentos e motivos”, “pensamentos e intenções”. Como uma lâmina afiada que separa “juntas” de “medulas”, os claros princípios da “palavra de Deus” discernem entre o bem e o mal, entre os pensamentos e motivos certos e errados.

Coração. Isto é, a mente.

Hb.4:13 13. E não há criatura que não seja manifesta na sua presença; pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de prestar contas.

Criatura. Do gr. ktisis, qualquer “coisa criada”, isto é, que constitui uma entidade em si (ver com. de Rm.8:19). Esta é a pessoa do v. Hb.4:12 cujos pensamentos e motivos foram julgados pela “palavra de Deus”. Os seres humanos são capazes de julgar apenas com base nas palavras e nos atos, mas a palavra de Deus conecta as palavras e ações da pessoa ao lugar de onde se originam, e as julga com base no que se passa na mente. “O homem vê o exterior, porém o Senhor, o coração” (1Sm.16:7).

Não seja manifesta na Sua presença. Ou, “se esconda diante dEle”. Ninguém pode esconder de Deus seus pensamentos e motivos. Por mais que tente, ninguém pode fugir de Deus (cf. SI.139:7-10).

Todas as coisas. Ou seja, os pensamentos e motivos de cada pessoa.

Descobertas e patentes. Ou, “descobertas e expostas”. Nada pode ser escondido de Deus.

A quem temos de prestar contas. Ou seja, diante de quem devemos dar conta de nós mesmos. A consciência de que prestará contas das palavras e ações diante de um juiz tão arguto pode tornar sóbrio o mais insensível dos pecadores, isso deve levar o cristão a considerar diligentemente seus pensamentos e motivos (comparar com Rm.14:10-12; 2Co.5:10).

Hb.4:14 14. Tendo, pois, a Jesus, o Filho de Deus, como grande sumo sacerdote que penetrou os céus, conservemos firmes a nossa confissão.

Pois. Ou seja, sendo que “a palavra de Deus” discerne a natureza dos pensamentos e as motivações da pessoa, e que nada está oculto a Deus (v. Hb.4:12-13); e, particularmente, porque temos um Sumo Sacerdote compreensivo que enfrentou os mesmos problemas que os nossos (Hb.2:17; Hb.4:15).

Jesus. Ver com. de Mt.1:1.

Filho de Deus. Ver com. de Lc.1:35; Jo.1:14; Jo.3:16.

Sumo sacerdote. Ver com. de Hb.2:17. Cristo, como o grande sumo sacerdote, é o tema de Hebreus (ver p. 417). Tendo apresentado Cristo nessa função (Hb.3:1), nos cap. 3 e 4, o autor enfatiza a necessidade do cristão do ministério de Cristo nas cortes celestiais e da experiência do “descanso” espiritual obtido pela fé nEle. Os cap. 5 a 10 tratam dos vários aspectos desse ministério em nosso favor. O plano da salvação, mediante a fé, está centralizado na pessoa de Cristo como o grande sumo sacerdote.

Penetrou. Literalmente, “passou através de”, ou seja, através dos céus atmosféricos e estelares (ver At.1:9, cf. com. de Gn.1:8).

Conservemos firmes. Do gr. krateo, “ter a posse de”, “reter”, como a própria vida. Cristo é digno de nossa plena fé e confiança, e nada deve ser permitido entre nós e Ele (ver com. de Rm.8:38-39; ver com. de Mt.24:13; Hb.10:35-36).

Nossa confissão. Ver com. de Hb.3:1.

Hb.4:15 15. Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado.

Compadecer-Se. Do gr. sumpatheo, “simpatizar”, literalmente, “experimentar juntamente com”. Cristo é inteiramente solidário com os problemas e dificuldades de Seus filhos, pois, em Sua condição humana, experimentou as deficiências comuns ao ser humano, embora sem a menor mácula de pecado. De fato, um dos propósitos da encarnação era que a Divindade chegasse tão perto da humanidade que experimentasse os mesmos problemas e enfermidades comuns aos seres humanos. Assim fazendo, Cristo Se qualificou para ser o sumo sacerdote e nos representar diante do Pai.

Fraquezas. A forma negativa em que a declaração é expressa se torna ainda mais impressionante do que teria sido uma declaração positiva.

Todas as coisas. Ou seja, todos os tipos de tentação (ver com. de Mt.4:1-11; cf. DTN, 687-694). De alguma maneira que não podemos entender, o Senhor experimentou o peso de toda tentação possível que o “príncipe deste mundo” (Jo.12:31) pôde impor a Ele, sem, no mínimo grau, nem mesmo por um pensamento, atender a qualquer delas (ver Jo.14:30). Satanás não encontrou nada em Jesus que respondesse a seus ardis astutos (ver DTN, 123; ver com. de Hb.2:18).

À nossa semelhança. Em todos os aspectos, a não ser pelo pecado, Ele Se tornou um conosco (ver vol. 5, p. 1013-1015; ver com. de Fp.2:6-8).

Sem pecado. Aqui reside o valor supremo da vida humana do Salvador. Ele foi um ser humano sem pecado. Pela primeira vez, a natureza humana foi levada à vitória sobre toda tentação e, por causa da vitória de Cristo sobre o pecado, nós também podemos triunfar sobre ele (ver com. de Rm.8:1-4). Em Cristo, podemos ser “mais que vencedores” (Rm.8:37), pois Deus “nos dá a vitória por intermédio de nosso Senhor Jesus Cristo” (1Co.15:57), tanto sobre o pecado como sobre seu salário, a morte (ver com. de Cl.2:20).

Hb.4:16 16. Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça, a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna.

Acheguemo-nos, portanto. O v. 16 apresenta a conclusão prática de toda a linha de pensamento de Hebreus 3 e 4. O descanso da graça de Deus permanece disponível ao povo de Deus (v. Hb.4:9): “Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça.”

Confiadamente. Do gr. parresia, traduzido como “confiança” (Hb.3:6; ver com. ali; cf. Hb.10:35). Vamos com ousadia, não porque Deus está em dívida conosco, mas porque Ele oferece Sua graça livremente a todos os que creem.

Trono da graça. Ou seja, um trono caracterizado pela virtude da graça (ver com. de Rm.3:24; 1Co.1:3). Em vez das laboriosas e vãs tentativas de se obter a salvação por meio de rigoroso cumprimento do sistema legal do judaísmo, ou de qualquer outro sistema de justiça pelas obras, o cristão tem o privilégio do acesso livre à graça de um Pai amoroso.

Recebermos misericórdia. Ou seja, obter o perdão dos pecados (ver com. de 1Jo.1:9). No trono do juízo, todos estarão diante da estrita justiça, sem a intervenção da misericórdia. A única esperança do pecador é a misericórdia de Deus, oferecida enquanto persistir o tempo de graça.

Graça. Do gr. charis (ver com. de Jo.1:14; Rm.1:7; Rm.3:24; 1Co.1:3).

Para socorro em ocasião oportuna. Isto é, em tempos de tentação. Precisamos da graça para suportar as dificuldades e o sofrimento, bem como para vencer a tentação. Aquele que vai diariamente ao trono da graça para novos suprimentos de misericórdia e graça entra no “descanso” que Deus provê a todo crente sincero.

Hb.5:1 1. Porque todo sumo sacerdote, sendo tomado dentre os homens, é constituído nas coisas concernentes a Deus, a favor dos homens, para oferecer tanto dons como sacrifícios pelos pecados,

Sumo Sacerdote. As qualificações essenciais do sumo sacerdote são aqui apresentadas (v. 1-4) para mostrar que Cristo as tem (v. Hb.5:5-10).

Tomado dentre os homens. Esta frase qualifica o termo “sumo sacerdote”. Aqui, o autor está discutindo os sumos sacerdotes humanos. Depois (v. Hb.5:5-10), ele discute Cristo como sumo sacerdote.

Constituído. Do gr. kathistemi, “nomear”, “colocar no comando”. A nomeação é de Deus (v. Hb.5:4).

Nas coisas concernentes a Deus. Ver com. de Hb.2:17.

A favor dos homens. Ou, “em favor dos homens”. O serviço dos sacerdotes era em favor dos homens, como mediador entre eles e Deus.

Para oferecer. Esta era a função mais importante do ofício sumo-sacerdotal.

Dons. Do gr. dora, na LXX denotando especificamente as “ofertas de carne” (do heb. minchoth, singular minchah, ver com. de Lv.2:1), embora em Gn.4:4 a palavra seja usada para a oferta de Abel.

Sacrifícios. Do gr. thusiai, que na LXX geralmente indica sacrifícios de sangue, embora não sem exceção. O termo thusiai é usado para a oferta sem sangue, de Caim (Gn.4:5). É incerto que haja distinção entre dora e thusiai. Provavelmente, os dois termos sejam usados em conjunto como uma frase genérica, indicando todo o conjunto de ofertas e sacrifícios do sistema cerimonial judaico.

Pelos pecados. Os dons e sacrifícios eram pelos pecados do povo. O sistema cerimonial foi projetado para ensinar a aversão de Deus ao pecado e o plano para eliminá-lo.

Hb.5:2 2. e é capaz de condoer-se dos ignorantes e dos que erram, pois também ele mesmo está rodeado de fraquezas.

É capaz. Literalmente, “sendo capaz”. A capacidade do sumo sacerdote estava baseada em sua própria fragilidade humana.

Condoer-Se. Do gr. metriopatheo, “moderar os sentimentos de alguém”, “tratar gentilmente”.

Ignorantes. Do gr. agnoeo, “que não sabem”, “não entendem”, “não conhecem”, “praticam o mal”, “pecam por ignorância”. Aqui, o último significado parece ser mais apropriado. Quem peca por ignorância precisa ser tratado com cuidado, visto que o delito não é intencional. Essas pessoas precisam de esclarecimento e incentivo. São infratores involuntários e não devem ser classificados como aqueles que cometem os mesmos crimes com pleno conhecimento do mal.

Dos que erram. Ou, “os que estão sendo enganados”.

Rodeado de fraqueza. O sumo sacerdote estava sujeito às mesmas paixões que seu povo. Seu conhecimento pessoal e prático das fraquezas e tentações da carne o levava a ter uma compreensão simpática das fraquezas e falhas dos outros, e o qualificava a dar conselhos e ajuda aos que eram tentados (comparar com. de Hb.2:17; Hb.4:15).

Hb.5:3 3. E, por esta razão, deve oferecer sacrifícios pelos pecados, tanto do povo como de si mesmo.

Por esta razão. Isto é, devido ao fato de que ele próprio estava cercado de fraquezas. Ele tinha as mesmas tendências para o pecado que tinha seu povo, e o antigo sistema cerimonial exigia que ele oferecesse sacrifícios pelos seus pecados pessoais.

Deve. Do gr. opheilo, “é obrigado”. A obrigação estava baseada nas exigências da lei cerimonial (ver Lv.16:6; Hb.4:3). O fato de o sumo sacerdote oferecer sacrifícios pelos próprios pecados o levaria a ter compaixão pelas pessoas. Como poderia culpar os outros, se ele mesmo cometia os mesmos erros? Ele precisava manter uma atitude humilde e respeitosa, com profunda compaixão pelos que falhavam. A pessoa que enxerga as próprias fraquezas não condena os outros sem piedade (comparar com Gl.6:1).

Do povo. Provavelmente, a referência é ao Dia da Expiação, quando o sumo sacerdote fazia “expiação pelos filhos de Israel” (Lv.16:34).

Hb.5:4 4. Ninguém, pois, toma esta honra para si mesmo, senão quando chamado por Deus, como aconteceu com Arão.

Honra. Do gr. time, “honra”, “respeito”, “lugar de honra”, “ofício”. Aqui, “ofício” ou “lugar de honra” seria um significado adequado. O ofício do sumo sacerdote era uma função de honra.

Chamado por Deus. O ofício de sumo sacerdote era por determinação divina. Foi Deus que escolheu Arão para a função (Ex.28:1). A sucessão na família de Arão também era ordenada por Deus, como está implícito no texto em consideração. No decorrer da história, muitos sacerdotes de Israel que exerceram a função eram indignos da mesma, mas, aqui, o autor não está preocupado com isso. É seu propósito expor a nomeação divina como a qualificação essencial do verdadeiro sumo sacerdote, a fim de mostrar que Cristo preencheu esse requisito, bem como outros (Hb.5:5-10).

Hb.5:5 5. Assim, também Cristo a si mesmo não se glorificou para se tornar sumo sacerdote, mas o glorificou aquele que lhe disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei;

Assim, também Cristo. Os v. Hb.5:5-10 mostram que Cristo preencheu as qualificações para o sumo sacerdócio estabelecidas nos v. Hb.5:1-4: o sumo sacerdote devia compartilhar a humanidade (v. Hb.5:1-3) e ser designado por Deus (v. Hb.5:4).

A Si mesmo não Se glorificou. Cristo não assumiu a honra do ofício do sumo sacerdócio sem ser convidado. Foi Deus que O constituiu (comparar com Jo.8:54).

Tu és Meu Filho. Ver com. de Hb.1:5. A citação tem o objetivo de provar que a posição exaltada de Cristo foi dada por indicação do Pai (ver com. de At.13:32-33).

Hb.5:6 6. como em outro lugar também diz: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.

Diz. Ou seja, Deus, o que fala no v. Hb.5:5.

Tu és sacerdote. Citação do SI.110:4, como evidência de que Deus havia designado Seu Filho para o ofício sacerdotal. O sacerdócio de Cristo é discutido nos capítulos seguintes (Hb.7-10).

Para sempre. Em contraste com os sumos sacerdotes terrenos, que, por serem mortais, realizavam o ofício por períodos limitados.

Ordem. Do gr. taxis, “sucessão fixa”, “posição”, “natureza”, “qualidade”, “posto”. Aqui, as definições de “sucessão fixa” e “ordem” não parecem adequadas, pois Melquisedeque não teve uma linhagem de sucessores. São preferíveis as definições “qualidade”, “natureza” e “maneira”. A passagem pode ser traduzida como: “de acordo com a natureza de Melquisedeque”. No Sl.110:4, a palavra hebraica para “ordem” é dibrah, que significa “forma”. Isso apoia a ideia de que a sucessão não é o ponto de comparação aqui pretendido.

Melquisedeque. Transliteração do gr. Melchisedek, que, por sua vez, provém do heb. Malki-tsedeq. A grafia “Melquisedeque” (Gn.14:18) é uma transliteração do hebraico (sobre a identidade de Melquisedeque, ver com. de Hb.7:2).

Hb.5:7 7. Ele, Jesus, nos dias da sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia livrar da morte e tendo sido ouvido por causa da sua piedade,

Ele. Ou seja, Cristo (ver com. do v. Hb.5:5). A construção gramatical não é clara. O verbo principal da frase é “aprendeu” (v. Hb.5:8), e a ideia básica é que Cristo aprendeu a obediência.

Dias da Sua carne. Ou seja, o período de Sua vida terrena (ver com. de Jo.1:14). Tendo oferecido. Isto é, oferecendo, ou, tendo a oferecer. A ideia da passagem é que, ao fazer Suas orações e súplicas, e sendo ouvido, Jesus aprendeu a obediência. A obediência foi aprendida através dessas experiências, e não em seguida a elas.

Forte clamor e lágrimas. Isso parece se referir especialmente à experiência no Getsêmani. Embora os autores dos evangelhos não mencionem as lágrimas em conexão com a agonia ali experimentada, pode-se imaginar sua ocorrência. Alguns creem que o autor também se refira à experiência na cruz (ver Mt.26:36-44; Mt.27:46; Mc.14:32-41; Mc.15:34; Lc.22:39-44; Lc.23:46).

Orações. Do gr. deeseis, “petições”, “súplicas”, “orações”, a partir do verbo deomai, “pedir”, “pedir um favor”.

Súplicas. Do gr. hiketeriai, usado para os ramos de oliveira, mantidos nas mãos dos suplicantes, costume do qual a palavra passou a designar as súplicas fervorosas.

Quem O podia livrar. O fato de o Pai ser capaz de salvar o Filho da morte tornava a provação ainda mais intensa. A humanidade do Filho de Deus recuou de horror pela separação do Pai. Embora estivesse disposto a percorrer sozinho as águas profundas, Ele orou fervorosamente para ser dispensado de beber o cálice, caso houvesse outra maneira. Mas não havia e, por isso, Ele o bebeu.

Da morte. Literalmente, “fora da morte”, o que pode sugerir que Cristo estava disposto a experimentar a morte, mas que Deus O salvaria dela, ou seja, haveria de ressuscitá-Lo.

Tendo sido ouvido. Esta afirmação causa alguma dificuldade devido ao fato de Cristo não ter sido salvo da morte; mas permanece a afirmação de que Cristo “foi ouvido”. Se a frase “da morte” puder ser entendida como foi explicado acima, a passagem não apresenta dificuldade. Se a expressão “da morte” for entendida como significando que Cristo não experimentaria a morte, a seguinte explicação é pertinente: O texto não diz que Cristo pediu para ser salvo da morte, mas que orou Aquele que era capaz de salvá-Lo da morte, e os evangelhos sinóticos indicam que Cristo orou para que, “se possível, Lhe fosse poupada aquela hora” (Mc.14:35). Em Mateus, Ele é citado em oração: “Meu Pai, se não é possível passar de Mim este cálice sem que Eu o beba, faça-se a Tua vontade” (Mt.26:42).

Essas declarações só podem ser entendidas à luz do desejo de Cristo de ser poupado da morte, caso fosse possível, mas de acordo com a vontade de Deus. Tivesse Cristo, em Sua oração, exigido ser salvo da morte, deve-se admitir que seu pedido teria sido negado, nesse caso. Mas Cristo não exigiu isso. Quando acrescentou as palavras de submissão: “faça-se a Tua vontade”, Ele abriu o caminho para que o Pai fizesse o que considerava ser o melhor, e comprometeu-Se a aceitar Sua decisão. Como a vontade de Cristo era também a vontade do Pai, no que quer que Ele decidisse, também seria a decisão de Cristo. Dessa forma, Cristo foi ouvido; e, da mesma maneira, é ouvida cada oração que ascende a Deus em submissão à Sua vontade. Que nenhum cristão pense que sua oração não é ouvida. Toda oração sincera é ouvida, mesmo que não seja respondida positivamente. O “não” é tão definido como o “sim”, embora, muitas vezes, a resposta seja nem “sim” nem “não”, mas “espere”. A submissão à vontade de Deus é o grande segredo da oração eficaz.

Quanto ao que temia (ARC). Do gr. apo tes eulabeias, literalmente, “por causa da Sua piedade” (ARA). Os comentaristas estão divididos quanto a se eulabeia deve ser considerado como um temor reverente (piedade) ou como medo e ansiedade normais. Se for o medo tão comum, a passagem significaria: “Ele foi ouvido [isto é, libertado] de Sua ansiedade”. No entanto, o uso bíblico de eulabeia e suas formas afins favorecem a definição “piedade” ou “temor reverente”. Por exemplo, eulabeia é traduzido por “santo temor” (Hb.12:28); comparar com o uso do adjetivo eulabes, em Lc.2:25; At.2:5; At.8:2; e do verbo eulabeomai, em At.23:10; Hb.11:7).

Hb.5:8 8. embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu

Embora sendo Filho. Uma referência à divindade de Cristo. Embora houvesse assumido a humanidade, mesmo assim, Cristo era divino. As duas naturezas estavam misteriosamente unidas nEle (ver com. de Jo.1:14). A ressurreição provou ser Ele o Filho de Deus (ver com. de Rm.1:4), mas, antes desse evento, Ele já era o Filho (ver com. de Lc.1:35). A ideia da passagem é que, sendo divino, Ele aprendeu “a obediência pelas coisas que sofreu”.

Aprendeu. Do gr. manthano, “estar informado”, “vir a conhecer”, “vir a compreender”. Cristo veio para entender o que significa obedecer. Para Ele, isso implicou sofrimento e morte; foi “obediente até à morte e morte de cruz” (Fp.2:8). Ele veio a este mundo para fazer a vontade de Deus (Hb.10:9) e, desse caminho, não Se desviou. O cumprimento da vontade do Pai envolveu Jesus em constante conflito, mas nenhuma vez Ele cedeu à tentação. Sabendo por experiência própria o que está envolvido na obediência à vontade divina, Ele é capaz de “socorrer” os que são tentados a desobedecer (Hb.2:18). Às vezes, é levantada a pergunta: como se poderia dizer que Cristo, que é perfeito e, em cada momento, foi perfeito, precisou aprender a obediência? Duas observações ajudam a responder a questão; (1) No que diz respeito a Sua vida terrena, Cristo Se desenvolveu como os outros seres humanos.

Ele “crescia [...] em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens” (ver com. de Lc.2:52). Como os demais, Ele aprendeu pela observação e pela experiência. (2) Embora, como Deus antes da encarnação, Cristo fosse onisciente, Ele não conhecia por experiência própria os problemas que confrontam as pessoas que tentam obedecer a Deus. Ao Se tornar homem e enfrentar as tentações da vida humana, Cristo adquiriu esse conhecimento. Assim, Ele conheceu uma das qualificações essenciais ao sumo sacerdócio, ou seja, que o indicado pertença à família humana (ver com. de Hb.5:1-3).

Hb.5:9 9. e, tendo sido aperfeiçoado, tornou-se o Autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem,

Tendo sido aperfeiçoado. Do gr. teleioo (ver com. de Hb.2:10). A forma verbal pode ser traduzida também como “tendo sido concluído”. O pensamento é ter atingido uma meta ou terminado uma tarefa. Cristo alcançou o que pretendia realizar por meio da humanidade. Ele demonstrou obediência a ponto de morrer, e foi aperfeiçoado. A partir disso, Ele estava qualificado para a função de sumo sacerdote (ver com. de Hb.5:1-3).

Autor. Do gr. aitios, “causa”, “fonte”. Foi o cumprimento do plano estabelecido antes da fundação do mundo em relação à encarnação, vida, morte, ressurreição e glorificação que fez de Cristo o meio de salvação (ver At.4:12).

Todos os que Lhe obedecem. A obediência está diretamente envolvida no plano da salvação, não no sentido de que seja conquistada pela obediência, mas de que a fé salvífica leva ã obediência (sobre a relação fé e obras, ver com. de Rm.3:31).

Hb.5:10 10. tendo sido nomeado por Deus sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque.

Nomeado. Do gr. prosagoreuo, “cumprimentar”, “saudar”, “nomear”, “designar. A palavra ocorre somente aqui, no NT. A palavra usual para “chamar” é kaleo, usada no v. Hb.5:4. Prosagoreuo se refere ao fato de Cristo ser formalmente designado por Deus como sumo sacerdote.

Sumo Sacerdote. O mundo cristão, em geral, está familiarizado com Cristo como o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo.1:29). Está familiarizado com Cristo como o crucificado, que Se entregou por nós para que fôssemos salvos. Porém, nem todos os cristãos estão familiarizados com Cristo como sumo sacerdote que ministra Seu sangue em nosso favor no santuário celestial. No entanto, sem esse ministério, o plano da salvação seria ineficaz. Na instituição da Páscoa, no Egito, Deus não ordenou simplesmente que os israelitas sacrificassem o cordeiro, mas que aplicassem o sangue nas ombreiras das portas (ver Ex.12:7-13). Assim, no antítipo, o sangue de Cristo, nossa Páscoa (1Co.5:7), não é simplesmente derramado, mas é ministrado por nós no Céu por nosso grande sumo sacerdote, como parte vital do plano de Deus para nos salvar.

Ordem de Melquisedeque. Ver com. do v. Hb.5:6.

Hb.5:11 11. A esse respeito temos muitas coisas que dizer e difíceis de explicar, porquanto vos tendes tornado tardios em ouvir.

A esse respeito. Ou, “sobre isso”. O texto grego pode ser entendido de duas maneiras. “A esse respeito” se aplicaria a Melquisedeque, sobre quem o autor diz muitas coisas (ver Hb.7), ou seria aplicável ao sumo sacerdócio de Cristo, à maneira de Melquisedeque.

Difíceis de explicar. O autor estava ciente da dificuldade desse tema, e que era necessário haver a mesma percepção espiritual por parte da igreja. É evidente que ele estava bem familiarizado com seus leitores, caso contrário, não se atreveria a falar deles dessa maneira.

Tardios em ouvir. Ou, “lentos para ouvir”. Essa condição fazia com que fosse difícil para o autor apresentar o assunto. Sua dificuldade era dupla: um assunto difícil e ouvintes morosos. A limitação do aluno é a limitação do professor.

Hb.5:12 12. Pois, com efeito, quando devíeis ser mestres, atendendo ao tempo decorrido, tendes, novamente, necessidade de alguém que vos ensine, de novo, quais são os princípios elementares dos oráculos de Deus; assim, vos tornastes como necessitados de leite e não de alimento sólido.

Quando. Ou, “devido ao tempo [decorrido]”.

Devíeis ser mestres. Estes não eram novos conversos, do contrário, essa afirmação não faria sentido. Aparentemente, eles não haviam progredido tanto quanto poderiam.

Ensine, de novo. Eles haviam aprendido, mas tinham esquecido as lições e precisavam ser ensinados novamente. A mesma situação ocorre hoje. Os cristãos perdem tempo naquilo que não é essencial, não aproveitam suas oportunidades e precisam aprender novamente os primeiros rudimentos da fé.

Princípios. Do gr. stoicheia, “elementos [de aprendizagem]”, “princípios fundamentais” (ver com. de GI.4:3; Cl.2:8).

Oráculos. Do gr.

logia (ver com. de At.7:38; Rm.3:2).

Leite e [...] alimento sólido. Estas figuras representam os avançados e fundamentais princípios do evangelho (ver com. de 1Co.3:1-2). Deus quer que todos cresçam à plena estatura da maturidade em Cristo e que “não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina” (ver com. de Ef.4:14).

Hb.5:13 13. Ora, todo aquele que se alimenta de leite é inexperiente na palavra da justiça, porque é criança.

Inexperiente. Do gr. apeiros, “que desconhecem”, “trabalhadores não qualificados”. O apeiros não desconhece por completo a Palavra da justiça, mas seu conhecimento é limitado, e o crescimento espiritual fica retardado. Assim como as pessoas se tornam hábeis em um ofício ou profissão, do mesmo modo, Deus quer que nos tornemos mais hábeis e experientes no uso da Palavra.

Palavra da justiça. Aqui, um termo geral sinônimo de “evangelho”.

Criança. Uma metáfora do subdesenvolvimento (cf. com. de Ef.4:14).

Hb.5:14 14. Mas o alimento sólido é para os adultos, para aqueles que, pela prática, têm as suas faculdades exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal.

Alimento sólido. Ver com. do v. Hb.5:12. O autor está preparando seus leitores para instrução avançada acerca da verdadeira posição de Cristo. Deseja estimular os leitores a alcançar um grau de interesse mais elevado no que está prestes a transmitir. Ele entende que era chegado o tempo para que eles dessem um passo à frente, abandonassem os hábitos infantis e se tornassem adultos.

Adultos. Do gr. teleioi, “maduros” (ver com. de Mt.5:48).

Prática. Do gr. hexis, “exercício”, “poder adquirido pelo hábito”.

Faculdades. Do gr. aistheteria, literalmente, “órgãos do sentido”, em sentido figurado, “os sentidos”; aqui, designa as faculdades para a tomada de decisões morais apropriadas. A passagem pode ser traduzida como: “tendo as faculdades treinadas para distinguir entre o bem e o mal”.

Exercitadas. Do gr. gumnazo, “treinar”, “exercitar”. A palavra “ginásio” é derivada dessa raiz (cf. com. de 2Pe.2:14).

Hb.6:1 1. Por isso, pondo de parte os princípios elementares da doutrina de Cristo, deixemo-nos levar para o que é perfeito, não lançando, de novo, a base do arrependimento de obras mortas e da fé em Deus,

Por isso. O autor continua a exortação iniciada no cap. 5. Seus leitores estavam sobrevivendo com leite, quando deveriam ter alimento mais forte. Eles ainda eram crianças e estavam satisfeitos em continuar assim. Ele quer que prossigam para as coisas mais profundas de Deus e que não se acomodem com as realizações presentes.

Princípios. Literalmente, “o começo”, denotando os princípios elementares da doutrina de Cristo, os quais são definidos na última parte do v. 1 e no v. Hb.6:2.

Perfeito. Ou, “maduro”.

Base. É bom estabelecer uma boa base, mas quem não constrói sobre ela nunca terá uma estrutura acabada. O autor propõe deixar os primeiros princípios, tendo como certo que os leitores estão bem fundamentados neles. Ele não os ignora, mas os deixa no mesmo sentido em que um construtor deixa o fundamento quando prossegue com a estrutura em si. O autor enumera seis princípios fundamentais sobre os quais o cristianismo é edificado. Ele apenas os menciona e não os discute, pois sente que isso já foi bem feito.

Arrependimento. Do gr. metanoia, “mudança de mente” (ver com. de 2Co.7:9). Este é o primeiro da lista de princípios fundamentais. Aquele que se arrepende verdadeiramente avalia suas ações passadas, pesa-as na balança moral, repudia todos os motivos e atos indignos e, pela graça de Deus, troca a antiga mente carnal pela mente de Cristo. Ele é transformado pela renovação da mente (Rm.12:2). O arrependimento não é primariamente uma experiência emocional, mas um processo profundo que afeta a mente e a vida, fazendo surgir uma “nova criatura” para quem “as coisas antigas já passaram; e eis que se fizeram novas” (2Co.5:17).

Obras mortas. Provavelmente, “mortas” no sentido de serem pecaminosas. O pecador está morto nos seus “delitos e pecados” (Ef.2:1). Essas são as obras que ele sabe que terá que abandonar antes que se torne cristão (comparar com Hb.9:14).

Fé em Deus. Este é o segundo na lista dos princípios fundamentais. O arrependimento é das obras mortas, e a fé é em direção a Deus. O arrependimento apresenta o aspecto negativo; a fé, o positivo, o lado da mente cristã. A antiga vida deve ser abandonada, a nova deve ser cultivada. O arrependimento das obras mortas expressa uma completa mudança da mente, uma nova atitude espiritual que leva o crente a abandonar as obras mortas e a se voltar para Deus. Estes dois, arrependimento e fé, estão no topo da lista dos princípios fundamentais do evangelho. Se a pessoa está convertida, se abandonou a vida passada e renunciou às obras mortas, se aceitou a fé em Deus, ela tem uma base sólida que não falhará quando vierem os dias maus.

Hb.6:2 2. o ensino de batismos e da imposição de mãos, da ressurreição dos mortos e do juízo eterno.

Batismos. Do gr. baptismoi (singular, baptimos). Esta não é a palavra usual para o batismo cristão, que é baptisma (cf. com. de Mt.3:6; baptismos ocorre apenas aqui e em Mc.7:4; Mc.7:8; Hb.9:10). Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam esta variante em Cl.2:12. A palavra tem conexão com os muitos atos de purificação no ritual judaico (ver Mc.7:4; Mc.7:8; Hb.9:10). No entanto, esse pode não ser seu significado primário aqui, uma vez que os regulamentos relativos a essas purificações não seriam considerados uma doutrina fundamental do cristianismo. É possível, no entanto, que o autor esteja pensando no batismo cristão, mas emprega o termo baptismoi como representação do rito em seus aspectos mais elementares. Alguns veem em baptismoi uma referência aos dois batismos na igreja cristã: o batismo pela água e o batismo pelo Espírito.

Em relação aos dois, João Batista disse: “Eu vos tenho batizado com água; Ele, porém, vos batizará com o Espírito Santo” (Mc.1:8). Depois da ressurreição, Jesus disse: “João, na verdade, batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias” (At.1:5; Jo.3:5; At.11:16; 1Co.12:13). No entanto, se essas duas formas de batismo cristão estavam principalmente na mente do autor, seria de esperar que ele usasse a forma baptismata, em lugar de baptismoi. Curiosamente, este último termo ocorre mais tarde na epístola com uma clara referência às purificações cerimoniais (Hb.9:10). Portanto, a explicação de que baptismoi representa o batismo cristão em seus aspectos mais elementares parece preferível.

Imposição de mãos. Esta é a quarta doutrina fundamental. O gesto da imposição de mãos, nos tempos do AT, simbolizava a transferência de bênção e de ofício (cf. Gn.48:9-14; Nm.8:10-11; Dt.34:9). No NT, o mesmo costume era seguido. Particularmente era significativa a imposição de mãos pelos apóstolos após o batismo, um ato pelo qual os crentes recebiam o Espírito Santo (ver At.8:17-18; At.19:6). Visto que o autor havia mencionado “batismos”, ele provavelmente tinha em mente essa função particular (sobre o gesto na ordenação, ver At.6:6; 1Tm.4:14).

Ressurreição dos mortos. Sobre a importância desta doutrina, ver com. de 1Co.15.

Juízo eterno. A doutrina do juízo ocupa um lugar de destaque, tanto no AT (cf. SI.9:3-8; Sl.9:15-16; Dn.7:9-10; Jd.1:14-15) quanto no NT (ver Mt.12:41-42; Mt.25:31-46; Lc.11:31-32; 2Co.5:10). Com esses seis princípios, os cristãos judeus não teriam dificuldades, pois todos estão bem claros no AT. O perigo que esses cristãos enfrentavam era a acomodação com o que haviam herdado do judaísmo e a relutância em aceitar plenamente os princípios cristãos.

Hb.6:3 3. Isso faremos, se Deus permitir.

Isso faremos. Evidências textuais (cf. p. xvi) favorecem a variante “façamos”. O autor encoraja seus leitores a ir além (v. Hb.6:1) dos presentes princípios elementares do evangelho, esperando e crendo que eles estivessem bem compreendidos. Ele quer deixar esses fundamentos assim como a criança deixa a primeira cartilha quando avança para o primeiro livro de leitura. Mas, na realidade, nenhuma criança, nem o cientista mais entendido, abandonaria o alfabeto. Todas as suas letras serão sempre necessárias. O mesmo se dá com esses princípios fundamentais; eles não são descartados, mas são a base da construção. O autor deseja avançar das verdades primárias para as mais elevadas.

Se Deus permitir. Comparar com. de At.18:21; 1Co.4:19; 1Co.16:7.

Hb.6:4 4. É impossível, pois, que aqueles que uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se tornaram participantes do Espírito Santo,

É impossível. Os v. 4 a 6 tratam do destino dos que se afastam de Deus. A questão é acerca da possibilidade de restaurar aqueles que tiveram uma experiência cristã verdadeira, mas que se afastaram. Eles podem ser restaurados à comunhão cristã e novamente receber misericórdia? Essa passagem tem sido fonte de grande perplexidade e desânimo para muitos. Ela parece ensinar que os que se desviam da fé estão irremediavelmente perdidos. Entre os vários pontos de vista que têm sido mantidos, dois são dignos de consideração. (1) A apostasia mencionada aqui é a prática de um pecado imperdoável (ver com. de Mt.12:31-32), uma vez que essa é a única forma de apostasia para a qual não há esperança. (2) A passagem não prega a falta de esperança para quem se apostatou, mas adverte acerca de uma desesperança condicionai (ver com. de Hb.6:6). A maioria dos comentaristas aceita a primeira visão, embora a última possa ser defendida com base no texto grego. A idéia de que o arrependimento seria impossível sob certas circunstâncias era corrente entre os judeus.

Eles ensinavam, por exemplo, que esse era o caso daquele que pecou deliberadamente, confiando no futuro arrependimento: “Se alguém disser: eu peco e me arrependo, peco e me arrependo, nenhuma oportunidade lhe será dada para se arrepender. [Se alguém disser]: eu peco e, no Dia da Expiação, haverá expiação para mim, o Dia da Expiação não adquire para ele nenhuma expiação” (Mishnah, Yoma, 8.9, ed. Soncino, Talmude, p. 423). Eles também ensinavam que o arrependimento era impossível para aquele que levava uma multidão ao pecado: “Quem leva muitos a serem justos, o pecado não ocorre por meio dele, e quem leva muitos ao pecado, não lhe será dada a faculdade de se arrepender” (Mishnah, Aboth, 5.18, ed. Soncino, Talmude, p. 71). Uma passagem do livro de Eclesiástico diz: “Não digas: ‘Pequei, mas o que me aconteceu?’ Porque Yahweh é longânimo, mas não conte com o perdão, pois isso acrescentaria pecado a pecado. E não diga: ‘Suas misericórdias são grandes, Ele perdoará a multidão de minhas iniquidades’; pois misericórdia e ira estão com Ele, e Sua indignação permanece sobre os ímpios. Não se demore em ir a Ele, não acrescente dia a dia, para se arrepender. Pois Sua ira sobrevirá inesperadamente e, no tempo da vingança, você perecerá” (cap. 5:4-7; RH Charles, The Apocryfha and Pseudepigrapha of the Old Testament, vol. 1, p. 332).

Iluminados. Ou, “esclarecidos” (ver com. de Ef.1:18).

Provaram. Do gr. geuomai (ver com. de Hb.2:9). O significado de “provar” parece aplicar-se aqui (comparar com SI.34:8).

Dom celestial. Ou seja, o dom da salvação ou, talvez, um dom especial do Espírito (Rm.5:15; 1Co.12).

Participantes do Espírito Santo. Ou seja, os que receberam o derramamento do Espírito, quer como o poder divino na conversão (Jo.3:5), quer pela comunicação de algum dom especial (1Co.12).

Hb.6:5 5. e provaram a boa palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro,

Provaram. Do gr. geuomai (ver com. do v. Hb.6:4). A palavra sugere mais do que um conhecimento superficial. Sugere estudo, meditação e aceitação.

Poderes. Do gr. dunameis (ver com. de At.1:8), aqui provavelmente significando “milagres” (como em Hb.2:4). Na era apostólica, muitos milagres foram operados, livramentos efetuados, doentes curados e até mesmo alguns mortos ressuscitados (At.3:6-9; At.5:15-16; At.6:8; At.8:6; At.12:7; At.20:9-12). Provar esse poder é ter parte nele, seja como objeto da cura ou de algum outro milagre, por tê-los operado ou tendo-os testemunhado. Aqueles aqui mencionados tinham visto o poder de Deus fazer o que não era possível ao ser humano.

Mundo vindouro. Ou, “era vindoura”; aqui, provavelmente, seja uma referência ao tempo futuro, do qual a era do evangelho com seus milagres foi uma antecipação ou penhor. Essas diferentes qualificações são enumeradas para mostrar que tais pessoas tiveram uma experiência genuína. Elas haviam testemunhado o grande poder de Deus na própria vida e na vida de outros. Muito lhes tinha sido confiado e muito se esperava delas.

Hb.6:6 6. e caíram, sim, é impossível outra vez renová-los para arrependimento, visto que, de novo, estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia.

E caíram. Ou, “depois de ter caído”. A extensão da queda pode ser julgada pelos privilégios desfrutados. O contexto sugere uma grande apostasia.

Renová-los para arrependimento. Ou seja, despertar o desejo por arrependimento. O caso não é de alguém que busca voltar para Deus e acha o arrependimento impossível, mas de alguém que não tem o desejo de voltar à experiência da qual caiu (sobre o arrependimento, ver com. do v. Hb.6:1).

Visto que. A interpretação da passagem depende muito da tradução. O texto grego tem simplesmente o particípio grego para “crucificando”. A expressão “visto que” é acrescentada pela ARA no esforço de mostrar a relação entre o particípio grego e o restante da frase. Contudo, é possível acrescentar outras palavras. A construção participial grega pode expressar tempo, causa, condição ou propósito. Alguns comentaristas sugerem que o sentido aqui é temporal, e que a passagem deve ser traduzida como: “É impossível renová-los enquanto continuam a crucificar o Filho de Deus.” Esse uso temporal do particípio é comum. Se for este o caso, a passagem indicaria que aqueles que se desviam não podem ser restaurados enquanto continuam impenitentes.

Se for adotado o uso causal do particípio (“visto que”, “desde então”, “porque”, etc.), a passagem deve ser tratada como se referindo ao pecado imperdoável, pois só os culpados desse pecado não podem ser renovados para o arrependimento. Esse pecado se manifesta normalmente na contínua resistência ao chamado de Deus e aos apelos do Espírito. Consiste no endurecimento do coração, até que já não exista qualquer resposta à voz de Deus. Assim, a pessoa que peca contra o Espírito não tem remorso, não tem tristeza pelo pecado nem desejo de se afastar dele, e a consciência não a acusa. Se alguém tem o desejo sincero de fazer o que é certo, pode confiantemente crer que ainda há esperança para si. Essa deve ser uma fonte de conforto para quem está desanimado, mas de forma alguma deve ser um incentivo ao pecado. Deus deseja consolar os inconsoláveis, mas também deseja avisar Seu povo sobre o perigo de chegar a um ponto sem retorno.

De novo, estão crucificando. Do gr. anastauroo, “crucificar de novo”. Nos escritos não bíblicos, anastauroo significa simplesmente “crucificar”, mas, na presente passagem, o contexto favorece o sentido figurado “crucificar novamente”. Esse significado é relevante visto que os leitores são cristãos judeus, cujos pais crucificaram o Filho de Deus (At.3:14-15). Então, se os cristãos rejeitassem o Salvador e retornassem aos antigos caminhos, seria como se O crucificassem novamente.

Expondo-O à ignomínia. Ou, “trazendo-Lhe infâmia”. Esta frase pode ser traduzida como: “Enquanto continuam mantendo Cristo no desprezo”.

Hb.6:7 7. Porque a terra que absorve a chuva que frequentemente cai sobre ela e produz erva útil para aqueles por quem é também cultivada recebe bênção da parte de Deus;

Absorve a chuva. O quadro aqui é da terra que recebe a chuva do céu e, em troca, produz ervas e alimentos. Essa é uma ilustração do coração humano, que recebe a abençoada chuva e o orvalho do céu e, em troca, deve produzir frutos para a glória de Deus.

Bênção da parte de Deus. Isto é, na produtividade.

Hb.6:8 8. mas, se produz espinhos e abrolhos, é rejeitada e perto está da maldição; e o seu fim é ser queimada.

Espinhos e abrolhos. Deus havia abençoado os cristãos judeus, e esperava que dessem fruto. Se, com todas as bênçãos que tiveram e com toda a luz que iluminava o caminho, eles ainda se recusassem a dar frutos e se afastassem, haveria apenas um fim para eles: a separação de Deus e o esquecimento.

Perto está da maldição. Comparar com Gn.3:17-18. O autor não sugere que os cristãos judeus já estavam no estado desesperador (ver v. Hb.6:4-6). Mas, sem fecundidade, esse estado está “perto”. Eles são advertidos contra a atitude que resulta em rejeição (cf. Hb.2:1-3; Hb.10:26-29).

Queimada. Comparar com Dt.29:23.

Hb.6:9 9. Quanto a vós outros, todavia, ó amados, estamos persuadidos das coisas que são melhores e pertencentes à salvação, ainda que falamos desta maneira.

Amados. Esta é a única ocorrência deste termo carinhoso em Hebreus.

Coisas que são melhores. O autor falou bruscamente aos leitores por meio de advertência e repreensão. Então, ele os acalma. Está convencido de que eles não têm a intenção de rejeitar o chamado de Deus; mas, ainda assim, precisam de admoestação. Eles correm o risco de desgarrar-se e não dar atenção às coisas que ouviram (Hb.2:1-3). Eles correm o risco de repetir o erro de Israel e de não entrar na terra prometida (Hb.4:1). Não progrediram nem cresceram de forma satisfatória, e ainda são crianças, quando deveriam ser adultos (Hb.5:11-14). O autor afirma que há um perigo real de se perder. Mas suaviza isso, ao dizer que está certo de melhores coisas a respeito deles. No entanto, ainda assim, sugere que a condição dos leitores é grave e que eles devem cuidar para não perder a vida eterna.

Pertencentes à salvação. O autor não afirma quais são essas coisas, mas, pelo que já escreveu, os leitores não poderiam deixar de saber.

Hb.6:10 10. Porque Deus não é injusto para ficar esquecido do vosso trabalho e do amor que evidenciastes para com o seu nome, pois servistes e ainda servis aos santos.

Deus não é injusto. Um apelo para a justiça e equidade de Deus.

Para ficar esquecido. Deus não Se esquece de qualquer ato de bondade, ainda que pequeno. Tudo é registrado e será levado em consideração no juízo. Um copo de água fria não é esquecido (Mt.10:42), a lágrima de tristeza ou simpatia é lembrada e gravada (cf. SI.56:8).

Trabalho. Evidências textuais apoiam (cf. p. xvi) a omissão desta palavra.

Para com o Seu nome. Ou seja, para com Ele. “Nome” aqui, como muitas vezes, significa pessoa (cf. com. de SI.7:17).

Servis aos santos. Pode parecer uma pequena questão, quando há tantos assuntos mais importantes que exigem a atenção. Ajuda no tempo de angústia, acomodação para uma noite, comida e bebida para o viajante, hospitalidade e amabilidade, são todos registrados no livro de Deus. Ele não esquece esses atos de bondade (cf. Mt.10.42; Mt.25:31-40).

Hb.6:11 11. Desejamos, porém, continue cada um de vós mostrando, até ao fim, a mesma diligência para a plena certeza da esperança;

Desejamos. Do gr. epithumeo, “ansiar seriamente”.

Até ao fim. É bom começar; melhor é terminar. Por melhor que seja um começo, será inútil a menos que seja continuado até o fim. A promessa de Deus é que “Aquele que começou boa obra em vós há de completá-la” (Fp.1:6). Muitos que começam não terminam.

Diligência. Do gr. spoude (ver com. de Rm.12:8).

Plena certeza da esperança. Comparar com Cl.2:2. Os crentes a quem a carta foi dirigida tinham sido zelosos em abrigar os santos. Eles precisavam continuar seu ministério, mas deviam ser igualmente diligentes em outros assuntos relacionados com a salvação.

Hb.6:12 12. para que não vos torneis indolentes, mas imitadores daqueles que, pela fé e pela longanimidade, herdam as promessas.

Indolentes. Do gr. nothroi, “preguiçosos”, “lentos”. Conectado à audição, nothroi é traduzido como “tardios” (Hb.5:11). A preguiça ou indolência é o oposto da diligência. Para muitos, a religião é uma questão casual. Não está em primeiro lugar nas prioridades, mas no final da lista. Para eles, tudo mais deve ser feito em primeiro lugar, e a religião pode esperar. Isso precisa ser revertido.

Fé. Esta qualificação essencial é tratada em detalhes em Hb.11 (ver com. ali).

Longanimidade. Do gr. makrothumia, “firmeza”, “resistência”, “paciência”.

Herdam as promessas. Comparar com Hb.4:1.

Hb.6:13 13. Pois, quando Deus fez a promessa a Abraão, visto que não tinha ninguém superior por quem jurar, jurou por si mesmo,

Deus fez a promessa a Abraão. Ele é apresentado como exemplo de alguém que, pela perseverança, “alcançou a promessa” (v. Hb.6:15).

Ninguém superior por quem jurar. Ver com. do v. Hb.6:16.

Jurou por Si mesmo. Referência a Gn.22:16-17.

Hb.6:14 14. dizendo: Certamente, te abençoarei e te multiplicarei.

Abençoarei. Ou, “certamente te abençoarei”. Esta frase traduz literalmente uma expressão hebraica que enfatiza a ação do verbo.

Multiplicarei. Ou, “certamente te multiplicarei”.

Hb.6:15 15. E assim, depois de esperar com paciência, obteve Abraão a promessa.

Com paciência. Ver com. do v. Hb.6:12. Abraão é apresentado como exemplo.

Obteve [...] a promessa. Ou seja, no nascimento de Isaque. Esse filho da promessa era um penhor da multidão de descendentes por meio dos quais, e particularmente por meio de “Cristo” (Gl.3:16), viria uma bênção a todas as nações.

Hb.6:16 16. Pois os homens juram pelo que lhes é superior, e o juramento, servindo de garantia, para eles, é o fim de toda contenda.

Pelo que lhes é superior. As pessoas costumam jurar por Deus. Entretanto, Deus, não tendo alguém maior pelo qual jurar, jurou por Si mesmo (v. Hb.6:13).

Garantia. Do gr. bebaiosis, aqui usado como um termo legal que significa “garantia legal” ou “fiança”. Um juramento tem efeito positivo, proporciona garantia; e um efeito negativo, termina em controvérsia.

Hb.6:17 17. Por isso, Deus, quando quis mostrar mais firmemente aos herdeiros da promessa a imutabilidade do seu propósito, se interpôs com juramento,

Quando quis mostrar. Não era necessário que Deus jurasse. Sua palavra é tão eficaz quanto um juramento. Por isso, foi impressionante que Ele tenha Se colocado no nível do ser humano, consentindo em jurar pela veracidade da promessa.

Aos herdeiros. Não somente Abraão, mas todos os herdeiros, incluindo os descendentes espirituais de Abraão (Gl.3:29).

Interpôs. Do gr. mesiteuo, “mediar”, “atuar como fiador”, “garantir”. A confirmação da palavra de Deus por um juramento é registrada em Gn.22:16-18.

Hb.6:18 18. para que, mediante duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, forte alento tenhamos nós que já corremos para o refúgio, a fim de lançar mão da esperança proposta;

Duas coisas imutáveis. Ou seja, a promessa de Deus e Seu juramento. A palavra de Deus, em si mesma é imutável. Nenhum juramento pode acrescentar nada ao que Deus disse, nem torná-la mais segura. Contudo, Deus confirmou a promessa com juramento por nossa causa. As pessoas usam um juramento para confirmação; então, Deus condescende em fazer o mesmo, para nos ajudar em nossa fé. Esse juramento era, sem dúvida, uma garantia para as pessoas que viveram antes de Cristo. Se alguma dúvida restasse, elas poderiam descansar no fato de Deus não só haver prometido, mas também confirmado a promessa com juramento. Portanto, Ele certamente manteria Sua palavra. Assim, o juramento ajudaria a fortalecer a fé.

Forte alento. Ou, “forte encorajamento”.

Corremos para o refúgio. A ilustração pode ser tirada da antiga prática de uma pessoa que, julgando-se em perigo, fugia para o tabernáculo como um lugar de refúgio (ver Ex.21:13-14; 1Rs.2:28-34).

A fim de lançar mão. Ou, “apoderar- se”. A frase deve ser conectada com “alento” ou encorajamento.

Esperança. Ver com. de Rm.5:4; Rm.8:24; Rm.12:12.

Proposta. Ou, “lançada diante de nós”. A esperança da salvação é definida antes de tudo e pode ser recebida por todos.

Hb.6:19 19. a qual temos por âncora da alma, segura e firme e que penetra além do véu,

Âncora. Uma mudança na metáfora. Uma âncora mantém o navio durante a tempestade e o impede de ir à deriva contra as rochas. Há momentos em que as âncoras deslizam. Mas não é assim com a âncora da “esperança”. A metáfora da âncora ocorre apenas aqui nas Escrituras.

Que penetra. Ou seja, a esperança está fincada.

Além. Do gr. esoteros, “interior”, “atrás”. A palavra ocorre no NT só aqui e em At.16:24, em que descreve o interior da prisão em que Paulo e Silas foram lançados. Esoteros é mais frequente na LXX (ver Ex.26:33; Ex.16:2; Lv.12; Lv.15).

Véu. Do gr. katapetasma, “cortina”, “véu”. A palavra ocorre seis vezes no NT. Por três vezes, ela é usada para o véu do templo que se rasgou no momento da crucifixão (Mt.27:51; Mc.15:38; Lc.23:45). As outras ocorrências são em Hebreus (Hb.6:19; Hb.9:3; Hb.10:20). Nas referências ao santuário, na LXX, katapetasma é usada para descrever a cortina que separava os lugares santo e santíssimo (Ex.26:31; Ex.26:33), a cortina na porta do tabernáculo (Ex.26:37; Ex.36:37; Nm.3:26) e a cortina da porta do átrio (Ex.38:18). O fato de a cortina na porta da tenda e a cortina interna que separava o santo do santíssimo serem ambas chamadas de katapetasma provê uma explicação simples para o uso do termo “segundo véu [katapetasma]” (Hb.9:3) para descrever a cortina interior. A pergunta é: A que cortina o autor se referia (Hb.6:19) como aquela além da qual a esperança adentra? Comentaristas não adventistas ensinam que Cristo, imediatamente após a ascensão, entrou em Sua obra no lugar santíssimo do santuário celestial. Para eles, a palavra katapetasma aqui se refere à cortina que separa o lugar santo do santíssimo. Eles observam que “dentro do véu” é uma tradução da frase grega esoteron tou katapetasmatos, que, em suas quatro ocorrências na LXX (Ex.26:33; Lv.16:2; Lv.16:12; Lv.16:15), sempre descreve o lugar santíssimo.

No entanto, isso não significa necessariamente que, se “o véu” aqui é o que dividia o lugar santo do santíssimo, Cristo teria, já na ascensão, começado a obra mediadora no lugar santíssimo. Seguem-se três possíveis explicações para a expressão “além do véu”, todas em consonância com a visão adventista do sétimo dia do santuário. 1. “O véu” significa a cortina divisória entre os dois compartimentos. Mas Paulo fala aqui da entrada de Cristo no lugar santíssimo do santuário celestial, a fim de dedicá-lo, juntamente com o restante do santuário, ao assumir o ofício sacerdotal. Essa dedicação é mencionada em Dn.9:24 (ver com. ali) e tipificada na unção do santuário terrestre após sua edificação (Ex.40; Ex.30:26-29). 2. Em Hb.6:19, Paulo deixa a palavra “véu” indefinida. Ele quer chamar a atenção, não para o véu, mas para o que está “dentro [ou ‘por trás’] do véu”, ou seja, o lugar em que Cristo ministra como nosso sumo sacerdote. Em outras palavras, Paulo usa a palavra “véu” (katapetasma), não em termos de uma discussão técnica sobre a estrutura do santuário celestial, mas como uma figura de linguagem para descrever o que divide o visível do invisível, o terreno do celestial. Assim, “dentro do véu” significa simplesmente estar na presença de Deus.

De acordo com esse ponto de vista, a esperança é representada como estando na presença de Deus, à qual o próprio Cristo foi (Hb.6:20; Hb.9:24). 3. Em outra passagem, Paulo descreve especificamente o véu que separa o lugar santo do santíssimo, como “o segundo véu” (Hb.9:3). Assim, quando fala simplesmente do “Véu” (Hb 6:19), ele deve se referir ao véu na porta do tabernáculo. Além disso, como o santuário celestial e a sequência dos seus serviços foram prefigurados pelo tabernáculo terreno, quando Cristo subiu ao Céu, Ele “entrou” no lugar santo, o primeiro compartimento, para começar a primeira fase do Seu ministério celestial (ver GC, 420).

Hb.6:20 20. onde Jesus, como precursor, entrou por nós, tendo-se tornado sumo sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.

Precursor. Do gr. prodromos, “indo [ou ‘correndo’] antes”. A palavra ocorre somente aqui no NT; ocorre duas vezes na LXX (Nm.13:20; Is.28:4) para os primeiros (prodromoi) figos maduros. Aplicada a Jesus, parece indicar que Ele foi antes para estar na presença de Deus, então O seguimos. A ideia é semelhante à que o termo archegos expressa (ver com. de Hb.2:10).

Sumo sacerdote para sempre. Ver com. de Hb.5:6. O autor volta, habilmente, ao tema do sumo sacerdócio, pois fez uma digressão em Hb.5:11-6:19, e discute isso em detalhes no cap. 7.

Hb.7:1 1. Porque este Melquisedeque, rei de Salém, sacerdote do Deus Altíssimo, que saiu ao encontro de Abraão, quando voltava da matança dos reis, e o abençoou,

Melquisedeque. Sobre os fatos históricos mencionados neste versículo, ver com. de Gn.14:18-20.

Hb.7:2 2. para o qual também Abraão separou o dízimo de tudo (primeiramente se interpreta rei de justiça, depois também é rei de Salém, ou seja, rei de paz;

Abraão separou o dízimo. Ver com. de Gn.14:20. Abraão não teria dado a Melquisedeque o dízimo de tudo se não o tivesse reconhecido como sacerdote e, portanto, com o direito de receber o dízimo. Tem havido muita discussão a respeito de quem foi Melquisedeque. As informações sobre ele são escassas (ver Gn.14:18-20; SI.110:4). Alguns acreditam que era o próprio Cristo, o Espírito Santo ou Sem; outros ainda pensam tratar-se de um ser sobrenatural de outro mundo. Na ausência de evidências para qualquer dessas posições, este Comentário aceita que Melquisedeque devia ser contemporâneo de Abraão, rei de um dos pequenos principados da época (ver com. de Gn.14:18). Ele é apresentado em Hebreus como um tipo de Cristo, com base na previsão messiânica do Sl.110:4.

Rei de justiça. A atenção é chamada para o nome por causa de seu significado, quando aplicado ao Messias (ver com. do Sl.72:3; Sl.85:10).

Rei de Salem. Ver com. de Gn.14:18.

Paz. Um termo aplicado de forma adequada ao Messias (ver Is.9:5-6; Zc.9:10). Justiça e paz são mencionadas como características do reino messiânico (ver Sl.72:3; Sl.85:10).

Hb.7:3 3. sem pai, sem mãe, sem genealogia; que não teve princípio de dias, nem fim de existência, entretanto, feito semelhante ao Filho de Deus), permanece sacerdote perpetuamente.

Sem pai, sem mãe. Estas palavras deram origem à especulação de que Melquisedeque era um ser sobrenatural, uma vez que era sem pais, sem princípio e sem fim. Essa afirmação só poderia ser literalmente verdadeira a respeito das pessoas da Divindade. No entanto, o autor pode simplesmente querer dizer que não havia registro acerca do pai e da mãe de Melquisedeque.

Sem genealogia. Do gr. agenealogetos. Os judeus eram muito cuidadosos em registrar e preservar a genealogia, especialmente no caso dos sacerdotes (ver Ed.2:61-63). Ninguém podia servir como sacerdote a menos que pertencesse à família de Arão, da tribo de Levi; e isso devia ser comprovado sem qualquer dúvida. Se houvesse uma ruptura na linhagem em algum lugar, o indivíduo seria rejeitado e, assim, perderia os privilégios concedidos aos sacerdotes. Por essa razão, os judeus e, especialmente, os sacerdotes, preservavam cuidadosamente seus registros genealógicos. Por sua vez, não existe uma genealogia de Melquisedeque.

Princípio de dias. Ou seja, não há registro de seu nascimento nem de sua morte, como indica a frase “nem fim de existência”.

Feito semelhante. Ou, “semelhante a”. Melquisedeque era um tipo de Cristo. Nada se sabe de seu nascimento ou morte. Tudo isso se encaixa na pessoa de Cristo, que não tem princípio nem fim (ver com. de Jo.1:1-3).

Permanece sacerdote. Não há registro do término de seu ofício sacerdotal.

Hb.7:4 4. Considerai, pois, como era grande esse a quem Abraão, o patriarca, pagou o dízimo tirado dos melhores despojos.

Como era grande. Os judeus tinham Abraão em alta estima (ver Jo.8:52). O autor de Hebreus passa então a mostrar que Melquisedeque era ainda maior. E, se ele era maior, então, o sacerdócio de Cristo, que é segundo a ordem de Melquisedeque (ver com. de Hb.5:6), é maior do que o de Arão.

Até (ACF). As evidências textuais se dividem (cf. p. xvi) entre manter e omitir esta palavra.

Patriarca. Do gr. patriarches, “pai da nação”. Abraão é chamado de “patriarca” a fim de enfatizar sua posição. Melquisedeque era tão grande que “até o patriarca” lhe pagou o dízimo. Assim fazendo, Abraão reconheceu a autoridade sacerdotal superior de Melquisedeque.

Dízimo. Ver v. Hb.7:2.

Despojos. Os despojos da batalha recente (Gn.14:14-16).

Hb.7:5 5. Ora, os que dentre os filhos de Levi recebem o sacerdócio têm mandamento de recolher, de acordo com a lei, os dízimos do povo, ou seja, dos seus irmãos, embora tenham estes descendido de Abraão;

Mandamento de recolher [...] os dízimos. Os levitas tinham o direito de receber os dízimos em virtude de uma ordem divina (ver Nm.18:21). No entanto, eles não foram os primeiros a fazê-lo. Melquisedeque fez isso antes deles. Se eles foram divinamente ordenados, assim também foi com Melquisedeque. O fato de que “até o patriarca Abraão” (ACF) entregou o dízimo a Melquisedeque mostra, portanto, que este era superior. Se os levitas estavam autorizados por Deus a receber os dízimos, Melquisedeque, ainda mais.

Hb.7:6 6. entretanto, aquele cuja genealogia não se inclui entre eles recebeu dízimos de Abraão e abençoou o que tinha as promessas.

Genealogia não se inclui entre eles. Ver com. do v. Hb.7:3. Somente os levitas podiam receber o dízimo. Melquisedeque não era levita, mas recebeu o dízimo de Abraão. O patriarca encontrou alguém maior do que ele e reconheceu isso por meio desse gesto.

Abençoou. Ver Gn.14:19.

Tinha as promessas. Ver com. de Hb.6:13; Hb.6:15.

Hb.7:7 7. Evidentemente, é fora de qualquer dúvida que o inferior é abençoado pelo superior.

Fora de qualquer dúvida. Ou, “além de qualquer disputa”.

O inferior [...] pelo superior. A superioridade é definida pelo fato de Abraão entregar o dízimo e receber uma bênção de Melquisedeque.

Hb.7:8 8. Aliás, aqui são homens mortais os que recebem dízimos, porém ali, aquele de quem se testifica que vive.

Aqui. Isto é, no sistema levítico.

Ali. Isto é, com referência ao sacerdócio de Melquisedeque.

Vive. Naturalmente, esta não é uma verdade literal a respeito de Melquisedeque, e a ausência de registro bíblico sobre sua morte não implica que ainda estivesse vivo. Estas palavras parecem ultrapassar Melquisedeque, alcançando Alguém maior do que ele mesmo. O autor afirma que Cristo “vive sempre” (v. Hb.7:25). O sacerdócio de Melquisedeque permanece no sacerdócio de Cristo.

Hb.7:9 9. E, por assim dizer, também Levi, que recebe dízimos, pagou-os na pessoa de Abraão.

Levi [...] pagou [o dízimo]. Esta observação enfatiza que o sacerdócio de Melquisedeque era superior ao levítico. A maneira como Levi pagou o dízimo a Melquisedeque é indicada no v. Hb.7:10.

Hb.7:10 10. Porque aquele ainda não tinha sido gerado por seu pai, quando Melquisedeque saiu ao encontro deste.

Não tinha sido gerado. Independentemente do que o patriarca Abraão tenha feito, sua posteridade também o fez, incluindo a entrega do dízimo. Para o autor de Hebreus, esta era mais uma prova da grandeza de Melquisedeque.

Hb.7:11 11. Se, portanto, a perfeição houvera sido mediante o sacerdócio levítico (pois nele baseado o povo recebeu a lei), que necessidade haveria ainda de que se levantasse outro sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque, e que não fosse contado segundo a ordem de Arão?

Perfeição. O sacerdócio levítico e a lei cerimonial eram provisórios e representativos, apontando para a futura obra que Cristo executaria. A perfeição não veio por meio da lei, mas por meio de Cristo a quem esta apontava (ver Hb.9; Hb.10).

Que necessidade haveria. O sistema levítico não se destinava a ser um fim em si mesmo. Existia para revelar Cristo à humanidade, o único em quem há salvação. Se o sistema pudesse prover salvação independentemente da obra de Cristo, Seu ministério não seria necessário.

Hb.7:12 12. Pois, quando se muda o sacerdócio, necessariamente há também mudança de lei.

Quando se muda o sacerdócio. Isto é, do sacerdócio levítico para o de Melquisedeque.

Há também mudança de lei. A lei previa que só os levitas podiam servir no tabernáculo e que apenas os filhos de Arão podiam ser sacerdotes. Além disso, regulamentava os serviços dos sacerdotes com referência à dispensação em que serviam. Seria necessário mudar a lei, caso um sacerdote fosse selecionado de outra tribo (v. Hb.7:13) e uma nova ordem de coisas fosse introduzida (Hb.8:13).

Hb.7:13 13. Porque aquele de quem são ditas estas coisas pertence a outra tribo, da qual ninguém prestou serviço ao altar;

Aquele. Ou seja, Cristo (v. Hb.7:14).

Outra tribo. Ver com. do v. Hb.7:14.

Prestou serviço. Ou, “oficiou”.

Hb.7:14 14. pois é evidente que nosso Senhor procedeu de Judá, tribo à qual Moisés nunca atribuiu sacerdotes.

Judá. Ver Mq.5:2; Mt.1:1; Mc.10:47-48; Lc.3:33; Rm.1:3; Ap.5:5.

Moisés nunca atribuiu. As leis que regulavam o sacerdócio foram dadas por meio de Moisés (Nm.3-4).

Hb.7:15 15. E isto é ainda muito mais evidente, quando, à semelhança de Melquisedeque, se levanta outro sacerdote,

Mais evidente. Esta expressão parece se referir ao que é proposto no v. Hb.7:12, ou seja, que era necessária uma mudança na lei. Alguns entendem que se refere ao caráter temporário do sacerdócio levítico. A profecia referida no v. Hb.7:17, prevendo que o novo sacerdócio seria de uma ordem diferente, torna mais evidente que era necessário haver mudança na lei do sacerdócio, ou que o sacerdócio levítico era provisório.

Hb.7:16 16. constituído não conforme a lei de mandamento carnal, mas segundo o poder de vida indissolúvel.

Mandamento carnal. A lei do sacerdócio especificava sucessão por descendência física (Ex.29:29-30; Nm.20:26; Nm.20:28).

Poder. Esta palavra está em contraste com “Lei”.

Indissolúvel. Do gr. akatalutos, “indestrutível”.

Hb.7:17 17. Porquanto se testifica: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.

Sacerdote para sempre. O autor volta a esta declaração do Sl.110:4 vez após outra (ver Hb.5:6; Hb.5:10; Hb.6:20; Hb.7:21), pois nesta afirmação repousa seu argumento. Ninguém poderia ser sacerdote para sempre. Os sacerdotes levíticos serviam por apenas alguns anos. Se, portanto, estava por vir alguém que serviria para sempre, ele deveria ser mais do que um ser humano, mais do que um levita. Por isso, é “muito mais evidente” (v. Hb.7:15) que deveria haver uma mudança na lei sacerdotal para que esse sacerdote pudesse oficiar.

Hb.7:18 18. Portanto, por um lado, se revoga a anterior ordenança, por causa de sua fraqueza e inutilidade

Portanto. De acordo com o texto grego, a ligação entre os v. 18 e 19 é de que se, “por um lado, há uma revogação da ordem [...], por outro, há a interposição de uma esperança superior.”

Revoga. Um termo mais forte do que “mudança” (v. Hb.7:12). A lei do sacerdócio levítico foi concebida para valer apenas até que Jesus Cristo, o grande sumo sacerdote, assumisse Seu ofício. Em seguida, deveria ser revogada.

Anterior. Ou, “antiga”.

Fraqueza e inutilidade. Não era assim intrinsecamente, pois o próprio Deus a instituiu; mas assim estava por causa da atitude das pessoas para com ela. Os judeus fizeram da lei um fim em si mesma e acreditavam que a obediência lhes traria a salvação. Eles tinham o evangelho, mas isso não lhes era efetivo porque não mantiveram uma atitude de fé (Hb.4:2).

Hb.7:19 19. (pois a lei nunca aperfeiçoou coisa alguma), e, por outro lado, se introduz esperança superior, pela qual nos chegamos a Deus.

A lei nunca aperfeiçoou. Ou seja, a lei por si mesma. Não quer dizer que a salvação fosse impossível nos tempos do AT. A perfeição era possível, mas pelo mesmo meio empregado no NT: a fé em Jesus Cristo. “A lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo. [...] Mas, tendo vindo a fé, já não permanecemos subordinados ao aio” (Gl.3:24-25; ver com. ali).

Introduz esperança superior. Sobre o contexto desta frase, ver com. do v. Hb.7:18. A esperança superior está fundamentada em Cristo. Ele assume o lugar do sacerdócio levítico. Esta é a esperança “proposta”, nossa “âncora”, “que penetra além do véu” (Hb.6:18-20).

Pela qual nos chegamos a Deus. Este tinha sido o propósito do sacerdócio levítico. Mas, devido a instrução e administração deficientes, as pessoas sentiam que Deus estava longe delas. Jesus Cristo, o sumo sacerdote, entrou “além do véu” (Hb.6:19). Ele está assentado “à direita da Majestade, nas alturas” (Hb.1:3), por isso, todos podem ir “confiadamente, junto ao trono da graça” (Hb.4:16) e, em plena certeza, achegar-se a Deus.

Hb.7:20 20. E, visto que não é sem prestar juramento (porque aqueles, sem juramento, são feitos sacerdotes,

Não é sem prestar juramento. Ver com. de Hb.6:17.

Hb.7:21 21. mas este, com juramento, por aquele que lhe disse: O Senhor jurou e não se arrependerá: Tu és sacerdote para sempre );

Com juramento. O contraste mostra a superioridade do sacerdócio de Melquisedeque (sobre a importância do juramento, ver com. de Hb.6:17).

Arrependerá. Do gr. metamelomai, “mudar de ideia”, “arrepender-se” (ver com. de 2Co.7:8-9).

Segundo a ordem de Melquisedeque (ARC). As evidências textuais se dividem (cf. p. xvi) quanto a manter ou omitir esta frase. Mas isso é atestado no v. Hb.7:17.

Hb.7:22 22. por isso mesmo, Jesus se tem tornado fiador de superior aliança.

Por isso mesmo. Ou seja, a nova aliança foi confirmada por juramento, enquanto o sacerdócio levítico estava fundamentado sobre ordem temporária.

Jesus. Este nome enfatiza a natureza humana de Cristo (ver com. de Mt.1:1).

Fiador. Do gr. egguos, “promessa”, “garantia”. A palavra aqui tem o sentido de uma pessoa que se responsabiliza ou garante o cumprimento de um acordo, no caso, a “superior aliança”.

Aliança. Do gr. diatheke (ver com. de Gl.3:15). A palavra é traduzida por “testamento” duas vezes (Hb.9:16-17) e nas outras 31 vezes por “aliança”, tema que o autor desenvolve em Hb.8:6-13.

Hb.7:23 23. Ora, aqueles são feitos sacerdotes em maior número, porque são impedidos pela morte de continuar;

Sacerdotes em maior número. O contraste aqui é entre os muitos sacerdotes segundo o sistema levítico e o único sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque.

Hb.7:24 24. este, no entanto, porque continua para sempre, tem o seu sacerdócio imutável.

Imutável. Do gr. aparabatos, “permanente”. Os sacerdotes levíticos não poderiam continuar pelo motivo da morte. Cristo, porém, “vive sempre para interceder” (Hb.7:25; Ap.1:18).

Hb.7:25 25. Por isso, também pode salvar totalmente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles.

Totalmente. Do gr. panteles, “completamente”, “perfeitamente”, “para todo o sempre”. Os comentaristas se dividem quanto ao significado mais apropriado aqui. Os dois são verdadeiros, pois Cristo salva tanto completamente como para sempre.

Por Ele se chegam a Deus. Ver com. do v. Hb.7:19.

Vivendo sempre. Ver com. do v. Hb.7:24.

Interceder. Do gr. entugchano (ver com. de Rm.8:34).

Hb.7:26 26. Com efeito, nos convinha um sumo sacerdote como este, santo, inculpável, sem mácula, separado dos pecadores e feito mais alto do que os céus,

Convinha. Do gr. prepo, “manifesto”, “apropriado” (ver uso de prepo em Hb.2:10). Convinha que tivéssemos um sumo sacerdote da natureza de Cristo.

Santo. Do gr. hosios, “puro”, “piedoso” (ver com. de At.2:27).

Inculpável. Do gr. akakos, “inocente”, “não vingativo”.

Sem mácula. Do gr. amiantos, “puro”, em sentido religioso e moral (ver o uso da palavra em Hb.13:4; Tg.1:27; 1Pe.1:4).

Separado dos pecadores. Ou, “tendo sido separado dos pecadores”. Alguns creem que isto se refira ao fato de Cristo Se aproximar dos pecadores, mas permanecendo separado deles, na encarnação. Outros creem que a descrição é de Cristo, não na encarnação, mas em Seu papel como sumo sacerdote. Assim, “separado dos pecadores” se referiria à conclusão de Sua obra por eles, mediante a morte sacrificial (ver Hb.9:28). Acreditam que a frase deve ser interpretada à luz da declaração seguinte, que fala da retirada de Cristo deste mundo, afastando-Se do contato literal com os pecadores, para estar na presença de Deus. Ambos os grupos creem que Cristo foi sempre santo, inocente e imaculado.

Feito mais alto do que os céus. Tendo sido exaltado, Cristo está à direita do Pai. É este tipo de sumo sacerdote que é apropriado aos pecadores.

Hb.7:27 27. que não tem necessidade, como os sumos sacerdotes, de oferecer todos os dias sacrifícios, primeiro, por seus próprios pecados, depois, pelos do povo; porque fez isto uma vez por todas, quando a si mesmo se ofereceu.

Que não tem necessidade. Não há registro do sumo sacerdote oferecendo oferta diária pelo pecado. Havia uma oferta ordenada para ser oferecida diariamente por Arão e seus sucessores, mas esta parece ser uma oferta de cereais, e não pelo pecado (Lv.6:20-22). Portanto, a dificuldade é com a afirmação de que o sumo sacerdote do passado apresentava todos os dias uma oferta pelo pecado, e que Cristo não precisa fazer isso. Isso pode ser explicado com o fato de que os sacerdotes realizavam todos os seus serviços como representantes do sumo sacerdote. Eles oficiavam em seu lugar, e o que faziam era considerado como se o próprio sumo sacerdote houvesse feito. Eles eram apenas ajudantes e, como ofereciam sacrifícios diários pelo pecado, pode-se dizer que o sumo sacerdote os oferecia diariamente.

Por seus próprios pecados. No Dia da Expiação, o sumo sacerdote oferecia sacrifícios primeiramente pelos próprios pecados e, depois, pelos pecados do povo (Lv.16:11; Lv.16:15). Isso era necessário. Sendo pecador, ele não poderia comparecer perante Deus no lugar santíssimo, até que apresentasse uma oferta por si mesmo. Cristo não precisou fazer isso, pois foi sem pecado.

Fez isto uma vez por todas. Há uma discussão sobre a que se refere “isto”. Cristo teria Se oferecido pelos próprios pecados uma vez, assim como o sumo sacerdote e, em seguida, pelo povo? Cristo não tinha pecados, e os únicos que levou foram os que assumiu em nosso lugar. Ele foi feito pecado (2Co.5:21), por isso, quando ofereceu a Si mesmo uma vez, Ele o fez por todos os pecados que levava. Esses pecados são os nossos, que Ele levou em Seu corpo sobre o madeiro. Esses pecados eram dEle apenas por haver tomado sobre Si a responsabilidade pelos mesmos.

A Si mesmo Se ofereceu. Cristo foi ao mesmo tempo sacerdote e oferta.

Hb.7:28 28. Porque a lei constitui sumos sacerdotes a homens sujeitos à fraqueza, mas a palavra do juramento, que foi posterior à lei, constitui o Filho, perfeito para sempre.

A lei. Ver v. Hb.7:11-12; Hb.7:16.

Constituí [...] a homens. Ou, “nomeia homens”.

Fraqueza. Ver Hb.5:2.

Juramento. Ver v. Hb.7:20-21.

Posterior à lei. O sistema cerimonial expirou na cruz (ver com. de Rm.6:14; Ef.2:15; Cl.2:14). Cristo assumiu Seu ofício sacerdotal após ter expirado a lei que regulamentava o sacerdócio levítico.

Constitui o Filho. Ou, “aponta Aquele que é Filho”. O artigo não está presente no grego. No entanto, traduzir “um filho” em lugar de “o Filho” não comunica corretamente o sentido do texto. A ausência do artigo enfatiza a qualidade, daí a tradução preferida: “Aquele que é o Filho” (cf. com. de Dn.7:9; Dn.7:13).

Perfeito. Do gr. teleioo, “aperfeiçoar” (ver com. de Hb.2:10).

Para sempre. Em contraste com o sacerdócio temporário dos levitas.

Hb.8:1 1. Ora, o essencial das coisas que temos dito é que possuímos tal sumo sacerdote, que se assentou à destra do trono da Majestade nos céus,

Essencial. Do gr. kephalaion, “ponto principal”, “soma”, “essência da questão”. O autor enfatiza o ponto principal do que escreveu até aqui.

Tal sumo sacerdote. Cristo não é um sumo sacerdote comum, como os do sacerdócio araônico. Eles serviam na Terra (v. Hb.8:4); Ele atua ao lado do trono de Deus.

Destra. Ver com. de Hb.1:3.

Hb.8:2 2. como ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo que o Senhor erigiu, não o homem.

Ministro. Do gr. leitourgos, “servo”, “ministro” (cf. com. de Rm.13:6; Fp.2:25; Hb.1:7).

Santuário. Do gr. tu hagia, literalmente, “os santos”, ou “os lugares santos”. É muito improvável que aqui houvesse o feminino hagiai hai (ver com. de Hb.9:2). Os eruditos sustentam de maneira quase uniforme que a forma grega é um plural neutro. Existem diferenças de opinião quanto à força e função do plural, neste caso. Alguns acreditam que o plural designa dois compartimentos no santuário celestial, correspondentes aos dois compartimentos do santuário terreno. Outros acreditam que a forma plural é um plural intensivo, denotando simplesmente a concentração das coisas sagradas no santuário. A incerteza decorre do fato de que, no cap. Hb.9:2-3, as evidências textuais favorecem (cf. p. xvi) uma forma plural para os termos gregos que descrevem tanto o primeiro como o segundo compartimento (ver o com. ali).

Em vista disso, o fato de ta hagia ser um plural não prova por si mesmo que existem dois compartimentos no santuário celestial. No entanto, que a obra de Cristo no santuário celestial é realizada em dois compartimentos, ou “duas grandes divisões”, é evidente pela comparação do santuário terrestre com o celestial, pois o terrestre era “a cópia do verdadeiro” no Céu (Hb.9:24, NTLH; ver também com. de Ex.25:9; Dn.8:14; cf. Nota Adicional a Hebreus 10; Hb.10:39).

E do. Ou, “que é”.

Verdadeiro. Do gr. alethinos, “genuíno”, “real”. O santuário terrestre era apenas um tipo do celestial.

Tabernáculo. Do gr. skene, “tenda”. A terminologia do santuário terrestre é aplicada ao celestial.

Erigiu. Expressão é figurativa, pois o santuário é descrito como um “tabernáculo”, ou “tenda”. Não se deve pensar em uma tenda literal no Céu, literalmente armada por Deus (comparar com Ex.33:7). A ideia de um santuário celestial não era novidade para os judeus, como demonstram as seguintes citações de sua literatura por volta do primeiro século a.C.: “O anjo abriu-me as portas do Céu, e vi o templo sagrado e, sobre um trono, a glória do Altíssimo” (Testamento de Levi 5.1; R. H. Charles, The Apocrypha and Pseudepigrapha of the Old Testament, v. 2, p. 307). “Deste a ordem para construir um santuário em Teu santo monte, e um altar na cidade de Tua habitação, cópia do santo tabernáculo que preparaste anteriormente desde o princípio” (Sabedoria de Salomão 9:8; ibid, p. 549).

Hb.8:3 3. Pois todo sumo sacerdote é constituído para oferecer tanto dons como sacrifícios; por isso, era necessário que também esse sumo sacerdote tivesse o que oferecer.

Constituído para oferecer. O trabalho dos sacerdotes no tabernáculo consistia principalmente em oferecer “dons e sacrifícios”. Eles foram constituídos para esse fim. De manhã e à noite, ofereciam pela nação, e durante o dia, eles ofereciam pelos indivíduos.

Tivesse o que oferecer. Comparar com Hb.5:1; Hb.9:25.

Hb.8:4 4. Ora, se ele estivesse na terra, nem mesmo sacerdote seria, visto existirem aqueles que oferecem os dons segundo a lei,

Estivesse na Terra. O foco temporal é do momento da escrita, quando, presumivelmente, o templo ainda estava erguido (ver p. 417).

Nem mesmo sacerdote seria. As regras do sacerdócio levítico eram aplicadas rigorosamente, e, se Cristo estivesse na Terra, Ele não Se qualificaria. Somente os da tribo de Levi eram elegíveis, e Cristo pertencia à tribo de Judá. Seu sacerdócio era independente e celestial, segundo a ordem de Melquisedeque.

Aqueles que oferecem. Esta declaração é um argumento a favor da datação da escrita deste livro para antes da destruição de Jerusalém e do templo, em 70 d.C. (ver p. 417).

Segundo a lei. Ou seja, o sistema legal instituído no Sinai.

Hb.8:5 5. os quais ministram em figura e sombra das coisas celestes, assim como foi Moisés divinamente instruído, quando estava para construir o tabernáculo; pois diz ele: Vê que faças todas as coisas de acordo com o modelo que te foi mostrado no monte.

Figura. Do gr. hupodeigma, “cópia”, “imitação”, “rascunho”, “traçado”, “representação”. No entanto, é necessário lembrar que uma “cópia” terrestre nunca pode representar, em cada detalhe, a celestial e original. Por exemplo, os diversos sacrifícios pelo pecado oferecidos no santuário terrestre encontraram seu cumprimento no único sacrifício de Cristo.

Sombra. Ou, “prenúncio”. A expressão “figura e sombra” pode ser entendida como uma figura de linguagem que significa “um exemplo representativo”.

Instruído. Do gr. chrematizo, “dar uma revelação”, sendo Deus o agente.

Faças todas as coisas. Ver Ex.25:40; Nm.8:4; At.7:44.

Hb.8:6 6. Agora, com efeito, obteve Jesus ministério tanto mais excelente, quanto é ele também Mediador de superior aliança instituída com base em superiores promessas.

Ministério tanto mais excelente. Com este versículo, o autor começa a discussão de Cristo como “Mediador de superior aliança”. O argumento para o ministério superior de Cristo é baseado no fato de Ele ser mediador de uma aliança superior estabelecida sobre superiores promessas.

Mediador. Do gr. mesites, “árbitro”, “mediador”, aquele que faz a mediação entre duas partes, a fim de remover um desacordo ou alcançar um objetivo comum (cf. com. de Gl.3:19). A palavra ocorre seis vezes no NT, quatro delas com referência a Cristo. Ele é o mediador entre Deus e os seres humanos (1Tm.2:5) e pode estender as mãos sobre ambos. Como Deus, Ele entende a Deus e pode falar por Ele. Como homem, Ele entende o ser humano e pode ministrar compassivamente por ele diante do Pai.

Superior. A superioridade do ministério de Cristo é discutida nos v. Hb.8:8-12.

Aliança. Do gr. diatheke (ver com. de Hb.7:22).

Superiores promessas. Ver com. dos v. Hb.8:10-12.

Hb.8:7 7. Porque, se aquela primeira aliança tivesse sido sem defeito, de maneira alguma estaria sendo buscado lugar para uma segunda.

Primeira aliança. Por esta expressão, o autor designa o sistema em vigência nos tempos do AT, desde o Sinai, do qual o sacerdócio levítico era parte (sobre a relação desse sistema com a aliança feita no Sinai, ver com. de Ez.16:60; sobre aliança, diatheke, ver com. de Hb.7:22). Esse sistema, com suas leis, chegou ao fim quando Jesus Se tornou sumo sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque (ver com. de Hb.7:12; Hb.7:18-19).

Sem defeito. A implicação é que a antiga aliança continha defeitos. No entanto, a culpa disso estava com as pessoas que a aplicavam mal (ver com. de Ez.16:60; Ef.2:15). A lei, por si só, não aperfeiçoava ninguém (ver com. de Hb.7:22). Mas, se corretamente empregada, teria apontado o Salvador e a salvação a todos. Os repetidos apelos dos profetas ao povo para que aceitasse as disposições da aliança eterna não foram atendidos.

Para uma segunda. Ou seja, a nova (v. Hb.8:8).

Hb.8:8 8. E, de fato, repreendendo-os, diz: Eis aí vêm dias, diz o Senhor, e firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá,

Repreendendo-os, diz. Ou, “censurando-os, diz”. A limitação da primeira aliança não estava nela mesma, nem a culpa estava em Deus. Era o povo que estava em falta (ver com. de Hb.8:7; Rm.9:30-10:3; Hb.3:18-4:2).

Vêm dias. Os v. Hb.8:8-12 são uma citação de Je.31:31-34, mais de acordo com a LXX do que com o texto hebraico, embora as diferenças sejam mínimas (ver com. em Je.31:31-34). Em sua configuração original, essas palavras constituíam uma predição do que Deus estava disposto a fazer por Israel e Judá, se eles aprendessem as lições do cativeiro iminente e realmente se voltassem a Deus. Desde o Sinai, Ele tentou conduzir o povo a uma experiência espiritual mais elevada, como é representada na nova aliança. Porém, eles se recusavam a avançar além de seus conceitos restritos do que constituía a verdadeira religião. Eles se apegaram à crença de que a salvação poderia ser alcançada pela adesão estrita à lei, em particular, às leis sobre os atos cerimoniais e ofertas. A ocasião era propícia. Talvez o que haviam se recusado a aprender na própria terra, eles aprenderiam com a rigorosa disciplina do cativeiro.

Contudo, mesmo no cativeiro, eles não conseguiram alcançar um verdadeiro avivamento. A grande maioria dos exilados continuou sob os termos da antiga aliança. As bênçãos espirituais da nova aliança já estavam disponíveis nos tempos do AT, e teriam ocorrido se o povo estivesse preparado. Mas, como nação, os judeus se recusaram a isso. No NT, embora os ensinos de Cristo e dos apóstolos deixassem claro o “evangelho” que os judeus poderiam ter aceitado anteriormente (Hb.4:2), eles achavam difícil abandonar o antigo sistema de formas e cerimônias. A carta aos Hebreus se destinava a ajudá-los a fazer a transição. O autor de Hebreus faz uso da profecia de Jeremias a fim de apoiar sua tese do sumo sacerdócio de Cristo e da introdução de uma nova ordem. Jeremias havia predito a nova aliança; em Cristo, ela se tornou uma realidade.

Nova. Era nova em relação à “primeira aliança” (v. Hb.8:7). A vinda de Cristo e o cumprimento dos tipos da lei cerimonial puseram fim ao sistema levítico (ver com. de Ef.2:15). O derramamento de Seu sangue ratificou a aliança feita havia muito tempo com Adão e confirmada a Abraão (ver com. de Ez.16:60).

Aliança. Do gr. diatheke (ver com. de Hb.7:22).

Com a casa de Israel. A nova aliança foi feita com a casa de Israel e com a casa de Judá, visto que foi oferecida primeiramente a essas duas casas (Je.31:31-34). Quando os judeus perderam seus privilégios religiosos, “o reino de Deus” foi tirado deles (ver com. de Mt.21:33-43). A igreja cristã é a herdeira da aliança que pertenceu ao Israel literal (ver vol. 4, p. 21-23).

Hb.8:9 9. não segundo a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os conduzir até fora da terra do Egito; pois eles não continuaram na minha aliança, e eu não atentei para eles, diz o Senhor.

Não segundo. Sobre a antiga aliança, ver com. de Ez.16:60.

Eles não continuaram. Este é um resumo superficial da história dos israelitas, registrada no AT. As pessoas “zombavam dos mensageiros, desprezavam as palavras de Deus [...] e não houve remédio algum” (2Cr.36:16). Assim, Deus as rejeitou.

Hb.8:10 10. Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor: na sua mente imprimirei as minhas leis, também sobre o seu coração as inscreverei; e eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo.

Imprimirei as Minhas leis. No monte Sinai, o Senhor escreveu Suas leis em tábuas de pedra (Dt.4:13) e em um livro (Dt.31:24; Dt.31:26). Ele espera que estas leis também sejam escritas no coração das pessoas. Porém, os israelitas estavam satisfeitos em considerar esses estatutos simplesmente como um código exterior, e sua observância, uma questão de conformidade aparente. Deus não pretendia que Suas leis fossem consideradas assim. Ele ofereceu a Seu povo a experiência de um novo coração (ver com. de Ez.36:26), mas eles se contentaram com uma religião exterior.

Sob a nova aliança, o coração e a mente são transformados (ver com. de Rm.12:2; 2Co.5:17). As pessoas agem corretamente não pela própria força, mas porque Cristo habita em seu coração, vivendo no crente (ver com. de Gl.2:20). Elas nascem do Espírito e colhem o fruto do Espírito (Gl.5:22-23). A mudança pode ser feita apenas pelo poder divino. Só Deus pode “imprimir” a lei no coração de Seus seguidores, embora, é claro, não sem consentimento e cooperação (Ap.22:17; cf. MDC, 142).

Eu serei o seu Deus. Este é o objetivo da aliança de Deus (cf. Ex.6:7). Deus é reconhecido como tal, e os fiéis se tornam Seus filhos.

Hb.8:11 11. E não ensinará jamais cada um ao seu próximo, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao Senhor; porque todos me conhecerão, desde o menor deles até ao maior.

Não ensinará jamais. Não haveria necessidade de admoestação e conselho contínuos, pois as pessoas teriam uma experiência religiosa pessoal. Em Cristo, os cristãos poderiam ter acesso direto a Deus, sem o sacerdócio levítico. Eles seriam “guiados pelo Espírito de Deus” (Rm.8:34), sendo “por Deus instruídos” (1Ts.4:9), e teriam a “unção que vem do Santo”, assim como o “conhecimento” (1Jo.2:20). Desde os tempos apostólicos, os cristãos têm tido todo o cânon das Escrituras para lhes ensinar sobre o caminho de Deus. No entanto, isso não exclui a necessidade de instrutores. Por isso, Deus deu à igreja “pastores” e “mestres” (Ef.4:11; comparar com GC, 485).

Todos Me conhecerão. Ou seja, todos os cristãos terão um conhecimento pessoal de Deus, não importando a idade, posição social ou qualificação intelectual.

Hb.8:12 12. Pois, para com as suas iniquidades, usarei de misericórdia e dos seus pecados jamais me lembrarei.

Usarei de misericórdia. Quando Jeremias disse estas palavras, na véspera do cativeiro, elas eram uma promessa do que Deus estava disposto a fazer se o povo rebelde se voltasse para Ele. Para o cristão, elas são uma promessa de perdão completo e gratuito por meio do sangue de Jesus, sem o derramamento de sangue de animais sob o sistema levítico.

Jamais Me lembrarei. Isto é, Deus não vai mais exibir esses pecados contra o transgressor (cf. com. de Is.65:17). Deus lança todos os pecados confessados para trás (Is.38:17). Ele os lança nas profundezas do mar (Mq.7:19).

Hb.8:13 13. Quando ele diz Nova, torna antiquada a primeira. Ora, aquilo que se torna antiquado e envelhecido está prestes a desaparecer.

Nova. A ARC acrescenta corretamente o substantivo “concerto”, ou aliança, pois a expressão “Ele diz” se refere à citação incluída nos v. Hb.8:8-12 (de Je.31:31-33), que emprega o termo “nova aliança”. O adjetivo traduzido como “Nova” está no mesmo gênero e número de diatheke, aliança.

Torna antiquada a primeira. A citação de Jeremias (nos v. Hb.8:8-12) mostra que a nova aliança deveria substituir a antiga, e não ser um acréscimo a ela. Este foi um ponto difícil para os cristãos hebreus entenderem.

Torna antiquado. Ou, “envelhece”. Questiona-se por que a expressão está no presente, se a antiga aliança perdeu o efeito na cruz. Alguns comentaristas acham que a referência seja ao momento em que Jeremias pronunciou sua profecia sobre a nova aliança (Je.31:31-33). No entanto, é possível que a referência seja ao tempo em que a epístola aos Hebreus foi escrita. É verdade que o sistema cerimonial se cumpriu quando Jesus morreu na cruz (ver com. de Ef.2:15). No entanto, mesmo para os cristãos piedosos, a transição do antigo para o novo sistema foi gradual (ver com. de Hb.9:9; Rm.14:1).

Prestes a desaparecer. Os leitores da epístola estavam sendo preparados para o momento em que o antigo sistema seria abandonado completamente (ver com. de Hb.9:9).

Hb.9:1 1. Ora, a primeira aliança também tinha preceitos de serviço sagrado e o seu santuário terrestre.

A primeira aliança. A palavra “aliança” é um acréscimo, mas correto, assim como em Hb.8:13 (ver com. ali). A referência é à aliança feita com Israel no Sinai (ver com. de Hb.8:7; Ez.16:60).

Também tinha. O fato de a primeira aliança ter preceitos é evidência de que a nova também os tem. O autor introduziu o serviço de Cristo como sumo sacerdote (Hb.5:5-6; Hb.6:19-20; Hb.7:22-25; Hb.8:1-2) e, então, amplia as considerações sobre esse serviço.

Preceitos. Do gr. dikaiomata, “regulamentos”, “requisitos”, “mandamentos”.

Serviço sagrado. Do gr. latreia (ver com. de Rm.9:4; Rm.12:1).

Santuário terrestre. Ou seja, o santuário adaptado para a Terra, o qual está em contraste com o santuário da nova aliança, o “verdadeiro tabernáculo que o Senhor erigiu, não o homem” (Hb.8:2).

Hb.9:2 2. Com efeito, foi preparado o tabernáculo, cuja parte anterior, onde estavam o candeeiro, e a mesa, e a exposição dos pães, se chama o Santo Lugar;

Tabernáculo. Do gr. skene, “tenda”, “alojamento”, “barraca”, “habitação”.

Parte anterior. Ou seja, a “primeira tenda” ou o “primeiro tabernáculo”. O primeiro e o segundo compartimento são referidos como tendas (v. Hb.9:3). Ao longo do ano, o primeiro compartimento era a única parte do santuário à qual se tinha acesso. No segundo, o santíssimo, apenas o sumo sacerdote entrava, e só no Dia da Expiação.

O candeeiro. Os móveis são descritos conforme o antigo tabernáculo, não no templo então existente (cf. com. do v. Hb.9:3; sobre o candelabro, ver Ex.25:31-40).

A mesa. Ver Ex.25:23-30.

A exposição dos pães. Ver Lv.24:5-9.

Santo Lugar. Do gr. hagia. Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a variante ta hagia (ver com. de Ex.8:2) e também hagia hagion (ver com. de Hb.9:3). Mas os estudiosos em geral concordam que se deve preferir hagia. Há um problema gramatical a ser esclarecido em relação a hagia. Tomada por si só, a expressão, sem acento, pode indicar: (1) a forma singular feminina que a tornaria um adjetivo, modificando skene, “tabernáculo”; e, assim, a frase diria: “o que é chamado de santo [tabernáculo]”; ou (2) o plural neutro que significaria “santos” ou “[lugares] santos”. A ortografia de ambas as formas é a mesma. Contudo, quando a palavra é acentuada, a forma singular feminina tem o acento na segunda sílaba, enquanto o plural neutro tem o acento na primeira sílaba. Sendo que os primeiros manuscritos não são acentuados, não fica clara qual fórmula pode ter sido pretendida aqui.

Os manuscritos mais tardios, que têm os acentos, em sua grande maioria, favorecem a forma plural neutra. O Textus Receptus, texto grego usado pela KJV, acentua a primeira sílaba, portanto, traduz hagia como um plural neutro. O mesmo ocorre com o texto grego de Nestle. De fato, há pouco apoio textual para se ler o texto no singular. A Vulgata e alguns dos manuscritos gregos posteriores são quase as únicas testemunhas inequívocas. Mas isso não é prova conclusiva contra a leitura no singular, pois os copistas que acrescentaram os acentos não faziam seu trabalho sob inspiração. Eles colocavam acento onde entendiam ser necessário. Para eles, a forma do plural neutra pode ter sido a mais natural. Assim, hagia como plural pode designar o primeiro compartimento. No v. Hb.9:3, o segundo compartimento também parece ser designado dessa forma (ver com. de Hb.8:2).

Hb.9:3 3. por trás do segundo véu, se encontrava o tabernáculo que se chama o Santo dos Santos,

Por trás. Do gr. meta, “para trás”, “além”, “do outro lado”.

Segundo véu. Ou seja, o véu que separa o lugar santo do santíssimo, chamado de “segundo”, porque a palavra aqui usada para “véu” (katapetasma) também é usada para o véu na entrada do santuário (ver com. de Hb.6:19).

Tabernáculo. Comparar com o v. Hb.9:2.

Santo dos Santos. Do gr. hagia hagion. A mesma questão referente a hagia (no v. Hb.9:2) ocorre aqui, ou seja, se é um singular ou plural (ver com. ali). Devido a isso, a frase pode ser traduzida como “[tenda] santa dos [lugares] santos”, ou “[lugar] santo dos [lugares] santos”. A expressão também pode ser traduzida como “santos dos santos”.

Hb.9:4 4. ao qual pertencia um altar de ouro para o incenso e a arca da aliança totalmente coberta de ouro, na qual estava uma urna de ouro contendo o maná, o bordão de Arão, que floresceu, e as tábuas da aliança;

Altar de ouro para o incenso. Do gr. thumiaterion, literalmente, “lugar [ou recipiente] para a queima de incenso”, portanto, incensário ou altar de incenso (ver exemplos deste último significado em Josefo, Guerra dos Judeus, v.5.5 [216]; Antiguidades, iii.6.8, 8.3 [147; 198], cf. Heródoto, 2.162). O altar de incenso era o objeto mais importante do lugar santo. É improvável que o autor tenha se esquecido de mencioná-lo, principalmente porque está enumerando os artigos de cada compartimento. No entanto, a tradução “altar de incenso” gera um problema, visto que esse altar parece representado como parte do lugar santíssimo, ao passo que, no antigo tabernáculo, ele ficava no primeiro compartimento (Ex.30:6). No entanto, o autor não diz que o altar do incenso ficava no segundo compartimento, mas que o altar “pertencia” ao santíssimo. A palavra traduzida como “pertencia” pode ser traduzida por “conter”, mas este não é seu significado único. A conexão entre o altar e o lugar santíssimo, indicada aqui, pode ser atribuída ao fato de que sua função estava ligada ao lugar santíssimo.

O incenso oferecido nesse altar era direcionado para o propiciatório no santíssimo. Ali, Deus manifestava Sua presença entre os querubins; e, ao subir o incenso com as orações dos adoradores, ele enchia o lugar santíssimo, bem como o santo. O véu que separava os dois compartimentos não se estendia até o teto. Assim, o incenso podia ser oferecido no lugar santo, o único lugar em que os sacerdotes comuns podiam entrar, e ainda alcançar o segundo compartimento, para o qual era indicado. O altar de incenso do templo de Salomão é descrito como “o altar todo que pertencia ao oráculo” (1Rs.6:22, TB; a NTLH diz: “o altar do lugar santíssimo”; a ARA, “o altar que estava diante do santo dos santos”), isto é, relacionado ao lugar santíssimo ou pertencente ao lugar santíssimo.

Arca. Ver Ex.25:10-16.

Da aliança. A arca é assim designada porque continha “as tábuas da aliança”, as duas tábuas de pedra sobre as quais Deus escreveu os dez mandamentos, a aliança prescrita a Israel (Dt.4:13).

Uma de ouro. Ver Ex.16:33-34. A palavra “ouro” vem da LXX, que diz “urna de ouro” (Ex.16:33). O hebraico diz simplesmente “urna”.

Bordão de Arão. Ver Nm.17:1-11. Aqui se declara que a urna e o bordão de Arão estavam na arca. No AT, é dito que estavam “diante do Senhor” ou “diante do testemunho” (Ex.16:33-34; Nm.17:10). Não há aqui necessariamente uma discrepância, pois essas últimas expressões também podem designar uma posição dentro da arca. A declaração de 1Rs.8:9, de que “nada havia na arca senão as duas tábuas de pedra, que Moisés ali pusera”, pode sugerir que anteriormente teria havido outros artigos na arca, como os mencionados aqui (ver com. de 1Rs.8:9). Alguns propõem que a expressão “na qual” se refere ao “tabernáculo que se chama o Santo dos Santos” (Hb.9:3). Embora seja gramaticalmente possível, essa construção em geral é contrária a essa relação. Além disso, o fato de as tábuas da aliança serem incluídas na lista que segue a expressão “na qual” indica que a menção é à arca, e não ao lugar santíssimo.

Tábuas da aliança. Ver Ex.25:16; Ex.32:15-16; Dt.9:9.

Hb.9:5 5. e sobre ela, os querubins de glória, que, com a sua sombra, cobriam o propiciatório. Dessas coisas, todavia, não falaremos, agora, pormenorizadamente.

Querubins. A palavra é uma transliteração da forma plural heb. kerubim (sobre os querubins, ver Ex.25:18-20).

De glória. Provavelmente, os querubins são designados assim em referência à glória de Deus, que se manifestava entre os querubins (ver Ex.25:22; Nm.7:89; 1Sm.4:4; Sl.80:1).

Propiciatório. Do gr. hilasterion (ver com. de Rm.3:25).

Não falaremos agora. O autor não quer se demorar em detalhes, visto que uma discussão desses assuntos não era seu propósito.

Hb.9:6 6. Ora, depois de tudo isto assim preparado, continuamente entram no primeiro tabernáculo os sacerdotes, para realizar os serviços sagrados;

Preparado. Ou, “equipado”, “guarnecido”. A ideia é de que o tabernáculo tinha sido erguido e mobiliado (cf. com. do v. Hb.9:9).

Primeiro tabernáculo. Ou, o primeiro compartimento (ver com. do v. Hb.9:2).

Realizar os serviços. Parte do serviço era a oferta diária de incenso no lugar santo e o espevitamento das lâmpadas (Ex.27:20-21; Ex.30:7-8). Semanalmente os pães da proposição eram colocados em ordem sobre a mesa (Lv.24:5-9). Além disso, sempre que um sacerdote ungido, ou toda a congregação, pecava, um novilho era sacrificado, e o sacerdote tomava desse sangue e o levava até o primeiro compartimento. Ali, ele molhava o dedo no sangue e o aspergia sete vezes diante do véu e também aplicava um pouco do sangue nos chifres do altar do incenso diante do Senhor (Lv.4:5-7; Lv.4:16-18).

Hb.9:7 7. mas, no segundo, o sumo sacerdote, ele sozinho, uma vez por ano, não sem sangue, que oferece por si e pelos pecados de ignorância do povo,

Mas, no segundo. O sumo sacerdote era o único com permissão para entrar no segundo compartimento, e podia fazer isso apenas uma vez por ano, no Dia da Expiação (Lv.16:2; Lv.16:24; Lv.23:27).

Não sem sangue. O sumo sacerdote entrava no lugar santíssimo, primeiramente, com o sangue de um novilho como oferta pelo pecado por si mesmo e por sua casa (Lv.16:3-4; Lv.16:11-14). Quando entrava pela segunda vez, ele levava o sangue do bode do Senhor, pelo qual o santuário e o povo eram purificados (Lv.16:15-17).

Por. Do gr. huper, “em benefício de”, “para segurança de”, “com referência a”. Neste contexto, huper pode ser traduzido como “fazer expiação por” (ver Lv.16:30).

Pecados. Do gr. agnoemata, “pecados cometidos por ignorância” (cf. Lv.4:2; Lv.4:13). Não há justificativa para a ideia de que não havia provisão para o perdão dos pecados no Dia da Expiação.

Hb.9:8 8. querendo com isto dar a entender o Espírito Santo que ainda o caminho do Santo Lugar não se manifestou, enquanto o primeiro tabernáculo continua erguido.

Dar a entender. Comparar com 1Pe.1:11.

Espírito Santo. O Espírito é o intérprete divino da verdade (ver com. de Jo.14:26).

Santo Lugar. Do gr. ta hagia, “os santos” ou “os [lugares] santos” (ver com. de Hb.8:2; Hb.9:24-25), expressão que designa todo o santuário ou partes dele. O contexto deixa claro que, aqui, ta hagia (nominativo de ton hagion) se refere ao “maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos” (Hb.9:11), ou seja, o santuário celestial (cf. v. Hb.9:24-25). A NTLH traduz ta hagia aqui como “lugar santíssimo”, e a NVI, por “santo dos santos”. As versões ARC, ACF e AA traduzem por “santuário” e estão mais em conformidade com a sintaxe grega neste versículo. Porém, pode ser que todas elas estejam simplesmente nomeando o “próprio Céu”, para onde Jesus foi (v. Hb.9:24), como o lugar mais santo de todos, que corresponderia ao lugar santíssimo do santuário terrestre.

Primeiro tabernáculo. Alguns sustentam que esta expressão se refere ao primeiro compartimento do santuário terrestre. Essa opinião se baseia no fato de isso ocorrer nos v. Hb.9:2; Hb.9:6 (ver ARC). Visto que os v. Hb.9:6-8 estão intimamente ligados, os defensores desse ponto de vista sustentam que a coerência da passagem seria menor se não fosse dado o mesmo significado de “primeiro tabernáculo” no v. Hb.9:8, como se faz no v. Hb.9:6. Outros sustentam que “primeiro tabernáculo” aqui se refere a todo o tabernáculo mosaico, em contraste com o celestial (Hb.8:2). Eles declaram que o propósito de Paulo é contrastar os santuários das duas alianças (Hb.9:1), e que o v. Hb.9:8 ensina que o serviço no Céu não poderia ter início até que o serviço terrestre fosse encerrado. As duas visões são coerentes com a tese de que o ministério sacerdotal de Cristo no “mais perfeito tabernáculo” (v. Hb.9:11) não poderia ter início até que se encerrasse o serviço no tabernáculo terrestre.

Continua erguido. Ou, “ainda está em pé”. O texto grego não denota necessariamente a situação do edifício em si, e pode se referir à validade das funções nele executadas (ver com. do v. Hb.9:9). A frase “continua erguido” pode significar “está preenchendo seu lugar designado” ou “está mantendo seu status designado”.

Hb.9:9 9. É isto uma parábola para a época presente; e, segundo esta, se oferecem tanto dons como sacrifícios, embora estes, no tocante à consciência, sejam ineficazes para aperfeiçoar aquele que presta culto,

É. Esta palavra foi acrescentada, tendo em vista que os tempos verbais gregos, no restante dos v. 9 e 10 estão no presente, a palavra “é” deve ser acrescentada neste tempo.

Isto. No texto grego, está claro que o antecedente desta palavra é “o primeiro tabernáculo”. Por isso, a interpretação do v. 9 depende da definição dada a “primeiro tabernáculo” (ver com. do v. Hb.9:8).

Parábola. Do gr. parabole (ver vol. 5, p. 199, 200, cf. vol. 3, p. 1257).

Época presente. Possivelmente, por diplomacia, Paulo diz que o serviço do santuário terrestre ainda está operando, embora Cristo, como mediador de uma aliança superior (Hb.8:6), na verdade, já estivesse assentado à destra da Majestade no Céu (Hb.1:3; Hb.9:11-12). Os serviços ainda eram exercidos no templo (Hb.8:4), dos quais muitos dos judeus cristãos ainda participavam (ver AA, 189). Só aos poucos foi que esses judeus convertidos vieram a compreender que os tipos do sistema cerimonial tinham sido cumpridos em Cristo e que esse sistema tinha chegado ao fim. O concílio de Jerusalém havia decidido que os gentios não deveriam ser obrigados a ser circuncidados nem a observar a lei de Moisés (cf. At.15; cf. AA, 188-200), mas não há registro de que esse concílio tenha tomado alguma decisão relativa aos cristãos judeus. Possivelmente, eles foram deixados para resolver a questão do cumprimento de alguns ritos da lei cerimonial, com base na consciência (cf. com. de Rm.14:1; Rm.14:5). Assim, como os serviços no templo ainda ocorriam, e muitos cristãos judeus mostravam deferência para com os ritos e cerimônias da lei mosaica, o autor sentiu-se livre para falar do sistema como se ainda estivesse em vigor. Seu objetivo era mostrar que algo superior tinha sido inaugurado.

Oferecem. Literalmente, “estão sendo oferecidos”.

Tanto dons como sacrifícios. Expressão geral para as várias ofertas levíticas.

Consciência. Do gr. suneidesis (ver com. de Rm.2:15). O adorador poderia cumprir as exigências exteriores e ainda não ter paz nem a certeza da aceitação divina. Só mediante a fé pessoal em Cristo ele poderia encontrar essa paz. Mas poucos alcançavam essa experiência superior. A maioria dos judeus dependia do desempenho meticuloso de uma miríade de regulamentos para se sentirem aceitos diante de Deus.

Ineficazes para aperfeiçoar. O autor já havia afirmado a inadequação do antigo sistema (ver com. de Hb.7:18-19).

Hb.9:10 10. os quais não passam de ordenanças da carne, baseadas somente em comidas, e bebidas, e diversas abluções, impostas até ao tempo oportuno de reforma.

Consistindo (ARC). Esta palavra é acrescentada e, em harmonia com os tempos verbais do v. Hb.9:9, significa: “que se colocam” ou “que lidam com”.

Não passam de. A natureza exterior do sistema levítico é realçada.

Ordenanças da carne. As “ordenanças da carne” devem estar ligadas a “dons” e “sacrifícios” (v. Hb.9:9) ou às “comidas”, “bebidas” e “abluções” (v. Hb.9:10). “Ordenanças” são, literalmente, “regulamentos” (cf com. do v. Hb.9:1). Aqui, a expressão “da carne” deve ser contrastada com “espirituais”. As ordenanças da carne não produziam satisfação espiritual. Seu cumprimento não aperfeiçoava as pessoas no tocante à consciência (v. Hb.9:9).

Comidas, e bebidas. A referência é a carnes, cereais e libações da lei cerimonial judaica (Ex.29:40-41; Lv.2:1-15; Lv.28:13; Lv.28:18; Lv.28:37; Nm.6:15).

Abluções. Ver Mc.7:3-4; Mc.7:8; Ex.29:4; Lv.11:25; Nm.8:7. Algumas das abluções tinham valor para ensino de saneamento e higiene pessoal, além de possíveis implicações espirituais. Mas, aos decretos originais, os judeus haviam acrescentado muitos outros que Deus nunca ordenou. Assim, as “abluções” passaram a assumir um papel importante na religião.

Impostas. Do gr. epikeimai, literalmente, “basear-se sobre”, “estar em cima”, “estar colocado sobre”.

Tempo [...] de reforma. Literalmente, “tempo de endireitar”. O sistema levítico era temporário. Suas ordenanças apontavam para a obra do Messias e tinham a intenção de vigorar até que o Messias viesse. A transição do antigo sistema para o novo é chamada de “reforma” por causa da decadência do sistema antigo (ver com. de Ef.2:15).

Hb.9:11 11. Quando, porém, veio Cristo como sumo sacerdote dos bens já realizados, mediante o maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, quer dizer, não desta criação,

Porém, [...] Cristo. A obra sumo-sacerdotal de Cristo é então enfocada e se mostra muito superior à dos serviços prestados pelos sumos sacerdotes terrenos.

Veio. Do gr. paraginomai, “chegar”, “estar presente”, “aparecer”. A forma verbal é traduzida preferencialmente como “tendo chegado” ou “tendo aparecido”. Cristo é apresentado aqui no momento em que é empossado como sumo sacerdote do santuário celestial.

Bens já realizados. As evidências textuais se dividem (cf. p. xvi) entre esta variante e “bens futuros” (ARC), mas ambas podem ser adequadas ao contexto. A expressão “bens futuros” implicaria que a epístola foi escrita no período de transição, e que o novo ainda não tinha substituído completamente o antigo. Isso era especialmente verdade no que diz respeito aos cristãos judeus (ver com. do v. Hb.9:9). A tradução “bens já realizados” destacaria o fato de que, quando Jesus foi empossado como sumo sacerdote no Céu, os bens da nova aliança já haviam chegado.

Mediante. Do gr. dia, “através de”, “por meio de”, “com”. A preposição também tem muitos outros significados. O contexto deve determinar o sentido preciso. Aqui o contexto não favorece a ideia de passar através de algo. Alguns comentaristas que adotam essa ideia interpretam “tabernáculo” aqui como os céus inferiores, por meio dos quais Jesus passou a caminho do Céu. Porém, há razões suficientes para se adotar um sentido diferente para “tabernáculo” aqui em relação ao que lhe é dado em Hb.8:2 (ver com. ali). Além disso, os céus inferiores são “desta criação”. No entanto, a ideia de passar “através de” é apenas um dos muitos significados de dia. A ideia instrumental é muito comum, e aqui teria o sentido de “empregar”, o que se encaixa no contexto. A passagem poderia ser traduzida como: “Mas Cristo, tendo aparecido como sumo sacerdote dos bens futuros, empregando o maior e mais perfeito tabernáculo, [...] entrou uma vez por todas no santuário.” Para executar seus serviços, os sacerdotes terrestres empregavam uma tenda artesanal; Cristo, por sua vez, emprega um tabernáculo maior e mais perfeito. Outro ponto de vista pode ser mencionado. A maioria dos pais da igreja, tanto gregos como latinos, consideravam que a palavra “tabernáculo” aqui se refere ao corpo de Cristo, ou a Sua humanidade. Eles atribuíam a dia uma força instrumental e ensinavam que foi por meio da encarnação que Cristo foi preparado para Seu ministério sumo-sacerdotal. Este é um fato que o autor já havia enfatizado (ver com. de Hb.5:7-9).

Os defensores desse ponto de vista lembram que Jesus falou do templo de Seu corpo (Jo.2:21), e que a palavra “habitou” (Jo.1:14) é, literalmente, “tenda” (do gr. skenao, cuja forma substantiva skene, é traduzida como “tenda”, em Hb.9:11). Outros textos também são citados para mostrar que o corpo humano é mencionado como “tabernáculo” (2Co.5:1; 2Co.5:4) ou “templo” (1Co.6:19). No entanto, esse ponto de vista não parece se ajustar ao contexto. Ele introduz uma definição de “tabernáculo” que interrompe o uso constante que o autor faz da palavra até este versículo. Por isso, o mais seguro é dar a “tenda” uma definição já indicada pelo contexto, especialmente porque nenhuma dificuldade é encontrada na interpretação da passagem desta forma.

Maior e mais perfeito. Nenhuma estrutura terrestre pode representar a vastidão e a glória do templo celestial em que Deus habita (ver PP, 357).

Tabernáculo. Ver com. de Hb.8:2; Hb.9:24.

Não feito por mãos. Ou seja, não feito por seres humanos. Os sumos sacerdotes terrestres atuavam em templos feitos por mãos. Cristo, o grande sumo sacerdote, atua em tabernáculo muito superior, “armado” pelo Senhor (Hb.8:2).

Criação. Provavelmente, a criação visível (cf. com. de Rm.8:19).

Hb.9:12 12. não por meio de sangue de bodes e de bezerros, mas pelo seu próprio sangue, entrou no Santo dos Santos, uma vez por todas, tendo obtido eterna redenção.

Sangue de bodes e bezerros. Ou, “sangue de bodes e touros jovens” (sobre bodes e touros como ofertas pelo pecado no Dia da Expiação, ver Lv.16:5-9; Lv.16:11-16).

Seu próprio sangue. A superioridade do ministério de Cristo é ainda mais enfatizada. Depois de afirmar que essa superioridade se destaca por ser realizada num “maior e mais perfeito tabernáculo” (v. Hb.9:11), o autor diz que ela se evidencia mediante o sangue envolvido: o do próprio Filho de Deus, em contraste com o sangue de meros animais (sobre o significado do sangue de Cristo, ver com. de Rm.3:25).

Uma vez por todas. Do gr. efhapax, “de uma vez por todas” (cf. com. de Rm.6:10). Cristo não precisava fazer sacrifícios repetidos, a fim de levar avante Sua obra como sumo sacerdote no santuário celestial (Hb.9:24-26).

Santo dos Santos. Do gr. ta hagia (ver com. de Hb.8:2; Hb.9:8). Depois que Cristo ofereceu “Seu próprio sangue” na cruz e ascendeu ao Céu, Ele entrou “além do véu” (ver com. de Hb.6:19; cf. Nota Adicional a Hebreus 10; Hb.10:39).

Tendo obtido. Uma referência ao resgate obtido na cruz, como indicado nos v. Hb.9:13-17.

Eterna. Em contraste com as disposições temporárias do sistema levítico.

Redenção. Do gr. lutrosis, “resgate”, “libertação”, “livramento”. A palavra ocorre no NT só aqui e em Lc.1:68; Lc.2:38. O termo relacionado lutron, “resgate”, ocorre em Mt.20:28 (ver com. ali); lutrotes, “libertador” ou “redentor”, ocorre em At.7:35 (ver com. ali); e apolutrosis, que também significa “redenção”, é empregado em Rm.3:24 (ver com. ali).

Hb.9:13 13. Portanto, se o sangue de bodes e de touros e a cinza de uma novilha, aspergidos sobre os contaminados, os santificam, quanto à purificação da carne,

Sangue de bodes. Ver com. do v. Hb.9:12.

Cinza de uma novilha. Certa purificação era efetuada pelas cinzas da novilha (ver com. de Nm.19).

Aspergidos sobre os contaminados. Ver Nm.19:18.

Santificam. Do gr. hagiazo, “consagrar”, “dedicar”, “purificar”. Aqui, parece ter o significado de “purificar” (como na LXX, de Nm.6:11, em que a ARA usa “consagrará”).

Purificação da carne. Esta é contrastada com a purificação da consciência (v. Hb.9:14). Os ritos levíticos eram limitados, pois se tratavam de atos exteriores e proviam pureza cerimonial, mas não o verdadeiro descanso espiritual (ver com. de Hb.3:11; Hb.7:11; Hb.7:19).

Hb.9:14 14. muito mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito eterno, a si mesmo se ofereceu sem mácula a Deus, purificará a nossa consciência de obras mortas, para servirmos ao Deus vivo!

Muito mais. Aqui, é enfatizada a superioridade da oferta de Cristo.

Sangue de Cristo. Em contraste com o sangue de animais (cf. com. do v. Hb.9:12).

Pelo Espírito eterno. No grego, não há o artigo definido, o que sugere que não é ao Espírito Santo que se refere aqui, mas à própria natureza divina de Cristo, que é eterna. Enquanto Ele estava em Seu estado preexistente e eterno, Cristo Se ofereceu para dar a vida pela humanidade (Ap.13:8).

Sí mesmo. Cristo deu a vida em sacrifício voluntário. Ele tinha o poder de dar a própria vida e de tomá-la novamente (Jo.10:18).

Purificará. Do gr. katharizo, “tornar limpo”, “limpar” (ver At.10:15; At.15:9; 2Co.7:1; Ef.5:26; Tt.2:14; Tg.4:8; 1Jo.1:7; 1Jo.1;9). O verbo está no futuro, visto que aqueles a quem a epístola era destinada não tinham entrado completamente na experiência que os aguardava sob a nova aliança (Hb.8:10-12; ver com. de Hb.9:9). No antigo sistema, eles tinham encontrado apenas purificação cerimonial, mas então poderiam encontrar a paz em Cristo.

Consciência. Ver com. do v. Hb.9:9.

Obras mortas. Ver com. de Hb.6:1.

Para servirmos. O objetivo da purificação é o serviço. Homens e mulheres são redimidos para servir. A purificação não é um fim em si mesma, mas um meio de preparo para o serviço aceitável a Deus (ver com. de Rm.12:1).

Deus vivo. Um título comum tanto no AT como no NT (ver Dt.5:26; Js.3:10; Hb.3:12). Aqui, o título contrasta com as obras mortas. Aqueles que servem ao Deus vivo produzem frutos de vida para a justiça.

Hb.9:15 15. Por isso mesmo, ele é o Mediador da nova aliança, a fim de que, intervindo a morte para remissão das transgressões que havia sob a primeira aliança, recebam a promessa da eterna herança aqueles que têm sido chamados.

Por isso mesmo. Ou seja, por causa da eficácia do sangue de Cristo para purificar a consciência.

Mediador da nova aliança. Ou, “de uma nova aliança”. O autor já mencionou Cristo como “mediador de superior aliança” (ver com. de Hb.8:6; sobre a nova aliança, ver com. de Hb.8:8-12; Hb.9:16).

Intervindo a morte. Literalmente, “tendo ocorrido a morte”. A referência é à morte na cruz (cf. com. de Hb.2:14).

Remissão. Do gr. apolutrosis (ver com. de Rm.3:24).

Sob a primeira aliança. Ver com. de Hb.7:22; Hb.9:16. Sob o sistema de sacrifícios, o perdão pelos pecados era concedido com base no sangue do Cordeiro de Deus que ainda estava por ser derramado. O sangue dos animais era impotente para perdoar os pecados. Era apenas um símbolo da morte de Cristo pelos pecados do mundo. Se Jesus não tivesse dado Sua vida, o perdão oferecido sob a primeira aliança jamais teria sido validado.

Recebam. O recebimento da herança dependia do sacrifício de Cristo. Se Cristo não oferecesse a vida, aqueles que estavam sob a antiga aliança teriam esperado em vão.

Herança. Ver com. de Gl.3:18.

Chamados. Ver com. de Rm.8:28; Rm.8:30.

Hb.9:16 16. Porque, onde há testamento, é necessário que intervenha a morte do testador;

Testamento. Do gr. diatheke. Esta palavra pode significar tanto “aliança” como “testamento” (ver com. de Hb.7:22; Gl.3:15). Em Hb.9:15-18, há um jogo com os dois significados da palavra. A palavra “herança” (v. Hb.9:15) sugere um testamento, e a frase “intervindo a morte”, literalmente, “tendo ocorrido a morte”, chama a atenção para o fato de que Cristo morreu, deixando-nos uma herança por meio de testamento.

É necessário. O testamento não tem força alguma, enquanto o testador ainda vive. Para que se torne eficaz, o testador precisa morrer.

Hb.9:17 17. pois um testamento só é confirmado no caso de mortos; visto que de maneira nenhuma tem força de lei enquanto vive o testador.

Testamento. Ou, “vontade” (ver com. do v. Hb.9:16).

Visto que. Enfatiza-se aqui o fato de que o testamento não entra em vigor até que o testador morra.

Hb.9:18 18. Pelo que nem a primeira aliança foi sancionada sem sangue;

Primeira aliança. Ver com. do v. Hb.9:16. O autor trata da aliança feita com Israel no Sinai (ver com. de Hb.8:7).

Sancionada. Do gr. egkainizo, “inaugurar”, “dedicar”. A palavra ocorre no NT só aqui e em Hb.10:20, em que o autor fala de um novo e vivo caminho sendo aberto.

Hb.9:19 19. porque, havendo Moisés proclamado todos os mandamentos segundo a lei a todo o povo, tomou o sangue dos bezerros e dos bodes, com água, e lã tinta de escarlate, e hissopo e aspergiu não só o próprio livro, como também sobre todo o povo,

Havendo Moisés. Ver com. de Ex.24:3-8.

Bodes. Estes não são mencionados em Ex.24:3-8, que identifica apenas os animais das ofertas de paz (ver Ex.24:5).

Água, e lã tinta de escarlate, e hissopo. Estes itens não são mencionados em Ex.24:3-8, mas o são em Lv.14; e Nm.19. Não há inconsistência entre o relato de Êxodo e os detalhes adicionados pelo autor de Hebreus.

Livro. A aspersão do livro não é mencionada em Ex.24:3-8, mas não é incoerente com as cerimônias ali descritas.

Hb.9:20 20. dizendo: Este é o sangue da aliança, a qual Deus prescreveu para vós outros.

Dizendo. Aqui, o texto é um pouco diferente do de Ex.24:8, mas a ideia geral é a mesma (ver Nota Adicional 2 a Mateus 3; Mt.3:17). Há uma notável semelhança entre a linguagem de Hebreus e a de Cristo, ao servir o vinho na instituição da Ceia (Mt.26:28).

Hb.9:21 21. Igualmente também aspergiu com sangue o tabernáculo e todos os utensílios do serviço sagrado.

Aspergiu com sangue. Este item não é mencionado no relato do AT, que se refere apenas à unção com óleo (Ex.40:9-11). Josefo, descrevendo a consagração do tabernáculo, fala de sangue a ser aspergido sobre o tabernáculo e os vasos ali contidos (Antiguidades, iii.8.6 [206]). Essa tradição é confirmada pelo escritor de Hebreus.

Hb.9:22 22. Com efeito, quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e, sem derramamento de sangue, não há remissão.

Quase todas as coisas. Havia algumas exceções. Algumas coisas eram purificadas com fogo ou água, sem uso de sangue (Nm.19; Nm.31:23-24).

Segundo a lei. Ou seja, a lei de Moisés (cf. com. de Hb.7:12; Hb.7:19).

Purificam. Do gr. katharizo (ver com. do v. Hb.9:14).

Sem derramamento de sangue. Ver Lv.17:11. No entanto, em circunstâncias especiais, os pecados poderiam ser expiados com farinha, em lugar de sangue (Lv.5:11-13). Mas, como regra geral, o ritual levítico requeria o derramamento de sangue para a expiação.

Remissão. Do gr. aphesis, “perdão” (ver com. de Mt.26:28). Em quase todas as ocorrências desta palavra no NT, o termo “pecados” vem em seguida. Aphesis fica sem o objeto somente aqui e em Mc.3:29. Todavia, parece que a palavra “pecados” está subentendida. A grande verdade ensinada pela afirmação de que o derramamento de sangue era necessário para o perdão era que a salvação da humanidade exigiria, um dia, a morte do Filho de Deus (cf. com Mt.26:28). Todo sacrifício animal apontava para o sacrifício supremo do “Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo.1:29).

Hb.9:23 23. Era necessário, portanto, que as figuras das coisas que se acham nos céus se purificassem com tais sacrifícios, mas as próprias coisas celestiais, com sacrifícios a eles superiores.

Portanto. Isto é, por causa dos princípios gerais apresentados no v. Hb.9:22.

Figuras. Do gr. hupodeigmata (ver com. de Hb.8:5). O tabernáculo do deserto e seus móveis eram representações de realidades celestiais, prenunciando o trabalho que o grande sumo sacerdote realizaria.

Purificassem. Do gr. katharizo (ver com. do v. Hb.9:14).

Com tais. Ou seja, as coisas mencionadas nos v. Hb.9:18-22.

As próprias coisas celestiais. A palavra “coisas” é acrescentada. O texto grego tem apenas um artigo plural com o adjetivo plural. No entanto, o gênero neutro indica que a expressão foi acrescentada corretamente. O autor contrasta as coisas celestiais com os vários itens terrestres que mencionou. O termo é muito geral e pode se referir a qualquer coisa relacionada com o serviço celestial de Cristo. A ênfase da passagem não está no ato de se purificar, mas na necessidade de purificação por um sacrifício melhor, ou seja, pelo sangue de Cristo. Há grande discussão entre os estudiosos a respeito de que alguma coisa no Céu, que é um lugar de pureza, necessite de purificação, e sobre o que teria sido purificado pelo sangue de Cristo. Alguns afirmam que é quase impossível entender a intenção do autor. Outros sugerem que a purificação teve como objetivo pacificar a ira de Deus. Essa visão deve ser rejeitada, pois revela um mal entendido sobre a natureza de Deus e da expiação (ver com. de Rm.5:10). Talvez, a dificuldade se deva ao fato de se levar a comparação do autor longe demais. Seu objetivo principal é claro: ele argumenta que o sacrifício de Cristo é muito superior ao de animais.

O sangue de bezerros e bodes purificava as “coisas” (Hb.9:22) relativas ao tabernáculo terrestre, o santuário da antiga aliança (v. Hb.9:1). Por sua vez, o sangue de Cristo está relacionado com o serviço no “verdadeiro tabernáculo” (Hb.8:2), o santuário do novo concerto (Hb.9:11; Hb.9:15). O primeiro provia a purificação cerimonial, o segundo, a moral (ver com. dos v. Hb.9:13-14). Cristo compareceu “por nós, diante de Deus” (v. Hb.9:24) e vive “sempre para interceder” pelos pecadores (Hb.7:25). A razão pela qual o ser humano precisa de alguém para interceder por ele na presença de Deus é que ele pecou. Cristo “Se manifestou [...] para aniquilar, pelo sacrifício de Si mesmo, o pecado” (Hb.9:26). Agora, Ele está ministrando os benefícios de Sua expiação em favor do pecador. Como resultado disso, a consciência do cristão é purificada (v. Hb.9:14). A palavra traduzida aqui como “purificar” é katharizo, que no v. 23 é vertida como “purificassem”. Em 1Jo.1:9, katharizo é traduzida por “purificar” (ver com. ali).

Assim, Jesus, como ministro do verdadeiro tabernáculo, comparecendo à presença de Deus e intercedendo por nós, realiza um trabalho de purificação e de limpeza pelos pecados confessados. No entanto, Cristo também realiza uma obra especial de purificação do santuário celestial, que era prefigurada pelo serviço do sumo sacerdote no santuário terrestre, no Dia da Expiação (ver com. de Lv.16). Desse trabalho especial de Cristo, o profeta Daniel fala: “Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; e o santuário será purificado [katharizo, LXX]” (Dn.8:14). Quando o princípio dia-ano é aplicado a essa profecia, o tempo de seu término é 1.844 d.C. (ver com. de Dn.8:14). Nessa época, o templo terrestre, modelo das coisas que estão no Céu, há muito havia desaparecido. Portanto, a referência (Dn.8:14) deve ser ao santuário da nova aliança, “o verdadeiro tabernáculo que o Senhor erigiu, não o homem” (Hb.8:2; ver com. de Dn.8:14).

Sacrifícios [...] superiores. O plural é usado aqui em relação ao único sacrifício de Cristo, provavelmente porque esse sacrifício substituiu os melhores sacrifícios do antigo sistema.

Hb.9:24 24. Porque Cristo não entrou em santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém no mesmo céu, para comparecer, agora, por nós, diante de Deus;

Santuário. Do gr. hagia (ver com. de Hb.8:2; Hb.9:8; Hb.9:25).

Feito por mãos. Ver com. do v. Hb.9:11.

Figura. Do gr. antitupa, “cópia”, “representação”. A palavra “protótipo” vem desta palavra grega, embora geralmente “protótipo” indique aquilo que é prenunciado pelo tipo. A palavra grega pode se referir tanto ao original como à cópia. Ela ocorre somente mais uma vez no NT (1Pe.3:21).

No mesmo Céu. Aqui, o “maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos” (v. Hb.9:11) é equiparado ao “próprio Céu”.“Do templo celestial, morada do Rei dos reis, onde ‘milhares de milhares O serviam, e miríades de miríades estavam diante dEle’ (Dn.7:10), templo repleto da glória do trono eterno, onde serafins, Seus guardas resplandecentes, velam o rosto em adoração; sim, desse templo, nenhuma estrutura terrestre poderia representar a vastidão e glória” (PP, 357).

Agora. O autor enfatiza que Cristo já está atuando como sumo sacerdote. Ele apela para que seus leitores deixem de lado qualquer dependência do antigo sistema levítico e tirem o máximo proveito dos gloriosos privilégios oferecidos pela nova aliança (cf. com. do v. Hb.9:9).

Por nós. Ou, “em favor de nós”. Ele intercede por nós (Hb.7:25). Se “alguém pecar, temos Advogado junto ao Pai” (ver com. de 1Jo.2:1).

Diante de Deus. O sumo sacerdote do santuário terrestre (ver com. do v. Hb.9:8) só poderia comparecer à presença divina manifesta na shekinah (ver com. de Gn.3:24), e isso, apenas uma vez por ano.

Hb.9:25 25. nem ainda para se oferecer a si mesmo muitas vezes, como o sumo sacerdote cada ano entra no Santo dos Santos com sangue alheio.

Oferecer a Sí mesmo. Ver com. do v. Hb.9:12.

Muitas vezes. A oferta de Cristo de Si mesmo e Sua entrada no “mesmo Céu” (v. Hb.9:24) foram atos únicos e definitivos.

Como o sumo sacerdote. Ver com. do v. Hb.9:7.

Santo dos Santos. Do gr. ta hagia (ver com. de Hb.8:2; Hb.9:8). Neste contexto, ta hagia é uma referência particular ao lugar santíssimo, ou, em sentido mais geral, ao santuário como um todo, como em Hb.8:2.

Sangue alheio. Ou seja, sangue que não era o próprio. A entrada do sumo sacerdote é contrastada com a de Jesus, que ali entrou “pelo Seu próprio sangue” (v. Hb.9:12).

Hb.9:26 26. Ora, neste caso, seria necessário que ele tivesse sofrido muitas vezes desde a fundação do mundo; agora, porém, ao se cumprirem os tempos, se manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo, o pecado.

Ora. Ou seja, se a oferta de Jesus tivesse uma eficácia apenas temporária, como era a do sumo sacerdote terreno.

Sofrido muitas vezes. Sua encarnação e morte teriam que ser repetidas muitas vezes.

Ao se cumprirem os tempos. Ou, “na consumação dos séculos” (ARC). Esta expressão é usada aqui como sinônimo de “nestes últimos dias” (Hb.1:2), e deve ser entendida à luz do comentário daquele versículo.

Manifestou. Isto é, na primeira vinda de Cristo.

Uma vez. Do gr. hapax, “uma vez por todas”.

Para aniquilar [...] o pecado. Cristo veio para “[salvar] o Seu povo dos pecados deles” (Mt.1:21). Ele é “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo.1:29; Is.53:6; 1Pe.2:24; Dn.9:24; Hb.9:23).

Sacrifício de Sí mesmo. Ver com. do v. Hb.9:14.

Hb.9:27 27. E, assim como aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo,

Assim como. Os v. 27 e 28 são um parêntese. O raciocínio do v. Hb.9:26 é continuado em Hb.10:1.

Ordenado. Do gr. apokeimai, “ser guardado”, “colocado à parte”, “ser reservado”, “estar à espera de” (comparar com Lc.19:20; Cl.1:5; 2Tm.4:8). A menção ao fato de Cristo morrer uma vez sugere que também as pessoas morrem uma só vez nesta terra. Por causa do pecado de Adão, a morte passou a todos os homens (Rm.5:12).

Morrerem uma só vez. Está ordenado que as pessoas morram uma só vez antes do juízo. Isso não contradiz a ideia de que, se forem condenadas, elas morram novamente (Ap.20:15).

Depois disto, o juízo. A morte não é o fim. Um dia, todos devem comparecer perante o tribunal de Cristo (ver com. de 2Co.5:10). Isto é mencionado para mostrar um paralelo com a obra de Cristo, cuja primeira vinda não foi Sua última vinda.

Hb.9:28 28. assim também Cristo, tendo-se oferecido uma vez para sempre para tirar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o aguardam para a salvação.

Tendo-Se oferecido uma vez. Segundo a Bíblia, Cristo ofereceu a Si mesmo (Gl.1:4; Hb.9:14), e o Pai deu Seu Filho (Jo.3:16). Por outro lado, também de acordo com ela, Cristo foi tomado, crucificado e morto por mãos injustas (At.2:23).

Tirar os pecados. Ver com. de Hb.9:26; cf. com. de 2Co.5:21.

De muitos. Literalmente, “dos muitos”, equivalente a “todos” (ver com. de Rm.5:15).

Aparecerá. Do gr. horao, na forma aqui encontrada, “tornar-se visível”, “aparecer” (comparar com Lc.24:34; At.7:2; 1Tm.3:16).

Segunda vez. A encarnação foi a “primeira” vez. Este é o único texto no NT que qualifica o retorno de Cristo em poder e glória com o adjetivo “segunda”.

Sem pecado. Isto está em contraste com a frase “para tirar os pecados de muitos”. No primeiro advento, Cristo tomou sobre Si os pecados do mundo (cf. 1Jo.2:2). Ele foi feito “pecado por nós, [...] para que, nEle, fôssemos feitos justiça de Deus” (2Co.5:21). Mas a obra que Ele veio fazer pelo pecado estará concluída antes que venha pela segunda vez.

Aguardam. Do gr. apekdechomai, “aguardar ansiosamente” (ver com. de Rm.8:19).

Para a salvação. Isto é, com o propósito de salvação.

Hb.10:1 1. Ora, visto que a lei tem sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas, nunca jamais pode tornar perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios que, ano após ano, perpetuamente, eles oferecem.

A lei. A palavra descreve aqui o sistema judaico de leis instituídas no Sinai (como em Hb.7:11). O termo é quase equivalente à expressão “primeira aliança” (ver com. de Hb.8:7). “Lei”, ou “primeira aliança”, indica o sistema em vigor nos tempos do AT, desde o Sinai.

Sombra. Uma sombra mostra apenas as linhas gerais do original. Assim, não se deve esperar completa semelhança entre a sombra e o objeto que a molda. A palavra é aqui contrastada com “imagem” (eikon), que indica uma representação mais próxima (ver com. de 2Co.4:4; Ap.3:14).

Bens vindouros. Isto é, o que se concretizaria no futuro.

A imagem real. Ou, “a própria imagem”.

Nunca. A insuficiência da “lei” em aperfeiçoar é sempre enfatizada.

Perfeitos. Ver com. de Hb.7:18-19; Hb.9:9; Hb.10:14.

Os mesmos sacrifícios. A referência é aos sacrifícios do Dia da Expiação, embora também seja verdadeira quanto aos sacrifícios diários. Os sacrifícios anuais são aqui mencionados provavelmente porque eram realizados pelo sumo sacerdote, e Jesus é apresentado no livro de Hebreus como o grande sumo sacerdote da nova e superior afiança (Hb.8:1; Hb.9:11). Cristo é colocado em contraste com os sumos sacerdotes terrestres, em relação ao Dia da Expiação (ver Hb.9:25-26).

Perpetuamente. Do gr. eis to dienekes, “sempre”, “para sempre”, “continuamente”. Os comentaristas estão divididos quanto se esta frase adverbial deve se relacionar a “oferecem” ou a “tornar |...j perfeitos”. Ambas as conexões fazem sentido, mas a segunda parece mais lógica à luz do v. Hb.10:14, em que se diz que a oferta de Cristo aperfeiçoa “para sempre” (eis to dienekes) os que são santificados. Os sacrifícios antigos eram de valor instrutivo temporário e não foram ordenados para aperfeiçoar o adorador. Eles precisavam ser repetidos até o tempo do sacrifício único de Cristo, uma vez por todas.

Oferecem. Ou seja, os que participam dos serviços no Dia da Expiação.

Hb.10:2 2. Doutra sorte, não teriam cessado de ser oferecidos, porquanto os que prestam culto, tendo sido purificados uma vez por todas, não mais teriam consciência de pecados?

Teriam cessado de ser oferecidos. Ou seja, teriam cessado se pudessem ter cumprido o que o sacrifício de Cristo fez em aperfeiçoar perpetuamente (v. Hb.10:14). Cristo resolveu o problema do pecado uma vez por todas. Não havia necessidade de repetir Seu sacrifício (cf. Hb.9:25-26).

Tendo sido purificados. Ou, “uma vez purificados”. Esta purificação não ocorreu até que Cristo “Se ofereceu” (Hb.9:14). Só então houve remissão das transgressões que estavam sob a primeira aliança (Hb.9:15).

Não mais teriam consciência. Ver com. de Hb.9:9. Na melhor das hipóteses, o adorador do AT podia, pela fé, ansiar pelo momento em que fosse feito o verdadeiro sacrifício pelo pecado. Se faltasse a fé, sua adoração seria sem vida e formal.

Hb.10:3 3. Entretanto, nesses sacrifícios faz-se recordação de pecados todos os anos,

Recordação. Os sacrifícios que ocorriam ano após ano eram um lembrete constante de que o verdadeiro sacrifício pelo pecado ainda não havia sido feito.

Hb.10:4 4. porque é impossível que o sangue de touros e de bodes remova pecados.

É impossível. É reiterada a insuficiência do sangue de animais em purificar pecados (ver Hb.9:9-14).

Hb.10:5 5. Por isso, ao entrar no mundo, diz: Sacrifício e oferta não quiseste; antes, um corpo me formaste;

Ao entrar no mundo. Ou seja, no momento da encarnação. Cristo é representado como proferindo as palavras do Sl.40:6-8, no momento em que entrava no mundo. Sua preexistência fica implícita.

Sacrifício e oferta. A afirmação de que Deus não desejava isso é referente ao oferecimento desses sacrifícios apenas como cumprimento de um ritual, sem a verdadeira devoção. Foi Cristo que instituiu o sistema sacrificial. Usado corretamente, era uma bênção ao adorador. Mas Deus não tinha prazer nos sacrifícios do adorador formal (ver 1Sm.15:22; Os.6:6).

Corpo Me formaste. Esta é a variante da LXX (sobre a redação do hebraico e seu significado, ver com. do SI.40:6). Sem dúvida, o escritor de Hebreus conhecia as duas variantes, e, entre elas, ele escolheu a da LXX. O texto da LXX ensina uma verdade significativa, e o uso que o escritor faz desta variante recomenda esta verdade, embora não seja necessariamente uma recomendação da tradução como uma representação fiel do hebraico (sobre o significado que o autor dá a “corpo” aqui, ver com. do v. Hb.10:10).

Hb.10:6 6. não te deleitaste com holocaustos e ofertas pelo pecado.

Não Te deleitaste. Ver com. do v. Hb.10:5. O adorador formal cria que Deus estava satisfeito com seus sacrifícios rituais.

Hb.10:7 7. Então, eu disse: Eis aqui estou (no rolo do livro está escrito a meu respeito), para fazer, ó Deus, a tua vontade.

Eis aqui estou. Ou, “eu vim”. A palavra expressa uma resposta imediata a uma situação que exigia solução.

Rolo. Ver com. do SI.40:7.

Para fazer [...] a Tua vontade. No contexto original, esta frase descrevia a obediência moral à vontade de Deus. O autor de Hebreus usa a frase para mostrar que o sacrifício de Cristo cumpriu a vontade de Deus em prover uma expiação aceitável, coisa que os sacrifícios de animais não podiam prover.

Hb.10:8 8. Depois de dizer, como acima: Sacrifícios e ofertas não quiseste, nem holocaustos e oblações pelo pecado, nem com isto te deleitaste (coisas que se oferecem segundo a lei),

Acima. Literalmente, “para cima”. A referência é aos v. Hb.10:5-6, citados anteriormente. A maior parte desses versículos é repetida nos v. 8 e 9.

Sacrifícios e ofertas. Ver com. dos v. Hb.10:5-6.

Segundo a lei. Ou, “de acordo com a lei” (sobre a lei aqui referida, ver com. do v. Hb.10:1).

Hb.10:9 9. então, acrescentou: Eis aqui estou para fazer, ó Deus, a tua vontade. Remove o primeiro para estabelecer o segundo.

Para fazer [...] a Tua vontade. Ver com. do v. Hb.10:7.

Remove o primeiro. Primeiramente, o autor cita a passagem dos Salmos (v. Hb.10:5-7); então, ele repete as porções significativas para seu propósito presente (v. Hb.10:8-9); e, finalmente, ele faz a aplicação. A passagem é usada para provar que o antigo sistema foi encerrado quando Cristo veio para cumprir a vontade de Deus, isto é, para proporcionar um sacrifício eficaz. O desaparecimento do antigo é indicado pela declaração de que Deus não tinha prazer nos sacrifícios oferecidos pela lei. A criação do novo é indicada pela declaração de que Cristo cumpriu a vontade de Deus, provendo o verdadeiro sacrifício (ver com. de Hb.8:18). O fato de o antigo sistema ter ficado obsoleto era difícil para os cristãos hebreus entenderem. O autor de Hebreus tenta provar que isso estava previsto no AT, escritos considerados sagrados por aqueles que viviam sob o antigo sistema.

Hb.10:10 10. Nessa vontade é que temos sido santificados, mediante a oferta do corpo de Jesus Cristo, uma vez por todas.

Nessa vontade. Ou seja, somos santificados pelo cumprimento dessa vontade no sacrifício perfeito de Cristo. Na vontade divina, segundo a qual Jesus Se ofereceu como sacrifício em favor da humanidade, está incluída nossa santificação (cf. 1Ts.4:3).

Temos sido santificados. A construção grega enfatiza que os crentes têm sido santificados e permanecem em estado de santificação. Aqui, a santificação é vista não como um processo contínuo (ver com. de Rm.6:19), mas como a mudança original do pecado para a santidade, e como a continuação nesse estado. Outros textos retratam esse mesmo significado. Dirigindo-se aos crentes de Corinto, Paulo fala dos que são “santificados em Cristo Jesus” (ver com. de 1Co.1:2). Ele também os faz lembrar de que “são santificados”, literalmente, “foram santificados” (1Co.6:11).

Oferta do corpo. Aqui o autor faz a aplicação da passagem “antes, um corpo Me formaste” (ver com. do v. Hb.10:5). Cristo assumiu um corpo humano, que foi oferecido a Ele (cf. com. de Hb.2:14). Pela oferta desse corpo, a humanidade obteve santificação. Jesus Cristo “Se nos tornou [...| sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção” (1Co.1:30).

Uma vez por todas. Não há necessidade de repetir o sacrifício. Ele realizou a necessária purificação do pecado (Hb.9:14). Esse sacrifício não era, como os sacrifícios da lei, uma mera sombra.

Hb.10:11 11. Ora, todo sacerdote se apresenta, dia após dia, a exercer o serviço sagrado e a oferecer muitas vezes os mesmos sacrifícios, que nunca jamais podem remover pecados;

Apresenta. Há uma ênfase nesta palavra. Significa uma tarefa inacabada. Em contraste, Cristo “assentou-Se” (v. Hb.10:12), significando que Sua obra, no que se refere ao Seu sacrifício, estava completa. A natureza contínua dos sacrifícios sacerdotais é ainda enfatizada pelas palavras “dia” e “muitas vezes”.

Remover pecados. Ver com. do v. Hb.10:4.

Hb.10:12 12. Jesus, porém, tendo oferecido, para sempre, um único sacrifício pelos pecados, assentou-se à destra de Deus,

Este (ARC). Ou, “este um”. Não há aqui uma palavra para “homem” no texto grego. A humanidade de Jesus não é negada, ela simplesmente não é expressa.

Para sempre. Do gr. eis to dienekes (ver com. do v. Hb.10:1). A tradução “para sempre” parece ser a mais apropriada. Os benefícios desse sacrifício têm valor permanente.

Um único. Em contraste com os muitos oferecidos pelos sacerdotes terrestres (v. Hb.10:11).

Assentou-Se. Indicando uma tarefa concluída (ver com. do v. Hb.10:11).

A destra de Deus. Ver com. de Hb.1:3.

Hb.10:13 13. aguardando, daí em diante, até que os seus inimigos sejam postos por estrado dos seus pés.

Aguardando. Cristo é representado como à espera do momento do triunfo final sobre todos os inimigos.

Daí em diante. Do gr. to loipon, “a partir de então”, “doravante”, “no futuro”.

Até que os Seus inimigos. Uma referência ao Sl.110:1 (ver com. de Hb.1:13; 1Co.15:24-28).

Hb.10:14 14. Porque, com uma única oferta, aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados.

Uma única oferta. Esta ideia é repetida muitas vezes (ver com. dos v. Hb.10:10; Hb.10:12).

Aperfeiçoou. O sacrifício único de Cristo realizou o que os sacrifícios contínuos dos sacerdotes não podiam realizar, pois estes não poderiam purificar a consciência (ver com. de Hb.9:9; Hb.9:14; Hb.10:2). Quando o pecador aceita pela fé os benefícios desse único sacrifício, ele é aceito no Amado, sendo considerado perfeito, porque Cristo, o substituto, assume seu lugar (ver com. de Rm.5:1; cf. CC, 62).

Para sempre. Do gr. eis to dienekes (ver com. do v. Hb.10:1). O sentido não é que, uma vez salva, a pessoa não pode cair da graça, pois o autor de Hebreus já negou isso (ver com. de Hb.6:4-6). A ênfase é sobre a eficácia contínua do sacrifício único de Cristo (cf. com. de Hb.10:10; Hb.10:12).

Estão sendo santificados. A forma verbal grega usada aqui é diferente da forma traduzida como “são santificados” no v. Hb.10:10 (ver com. ali). Aqui, o significado é “estão sendo santificados”. No entanto, essa forma não implica necessariamente que o autor esteja falando aqui de santificação como um processo contínuo. É improvável que ele usasse a mesma palavra com significados tão diferentes no mesmo contexto. A frase “estão sendo santificados”, provavelmente, descreve aqui o fluxo contínuo de novos crentes na igreja cristã.

Hb.10:15 15. E disto nos dá testemunho também o Espírito Santo; porquanto, após ter dito:

Espírito Santo. O testemunho das Escrituras é apresentado como o testemunho do Espírito Santo (ver com. de 2Pe.1:21).

Após ter dito. Os v. 15 a 17 despertam questões de sintaxe. A explicação mais simples parece ser que o v. Hb.10:16 é a declaração referida pela frase “após ter dito”; e o v. Hb.10:17 seria a conclusão da sentença. Com o verbo “acrescenta”, provido pela ARA, para introduzir o v. Hb.10:17, a relação sugerida se torna clara. A ênfase da passagem é sobre o perdão dos pecados (v. Hb.10:17-18). O v. Hb.10:16 mostra que é a nova aliança que oferece esse benefício.

Hb.10:16 16. Esta é a aliança que farei com eles, depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei no seu coração as minhas leis e sobre a sua mente as inscreverei,

Esta é a aliança. Ver com. de Hb.8:10, em que a citação apresenta pequenas diferenças. O autor pode ter citado de memória, ou simplesmente selecionado os pontos mais importantes da profecia de Jeremias, para seu propósito em cada caso.

Hb.10:17 17. acrescenta: Também de nenhum modo me lembrarei dos seus pecados e das suas iniquidades, para sempre.

De nenhum modo Me lembrarei. Ver com. de Hb.8:12. Os pecados podem ser esquecidos, pois o sacrifício por eles já foi feito, o que não tinha ainda ocorrido sob a antiga aliança (ver com. de Hb.10:2).

Hb.10:18 18. Ora, onde há remissão destes, já não há oferta pelo pecado.

Remissão. Do gr. aphesis (ver com. de Hb.9:22).

Já não há oferta. Ver com. dos v. Hb.10:1-2.

Hb.10:19 19. Tendo, pois, irmãos, intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus,

Tendo, pois. Aqui, começa uma nova seção, que continua até o final da epístola. O escritor resume brevemente o que estabeleceu, ou seja, que, por meio de Jesus Cristo, temos acesso direto a Deus. Então, passa a uma série de lições práticas para os cristãos hebreus.

Irmãos. Ver Hb.3:1. Esta é a primeira vez que este vocativo ocorre desde Hb.3:12.

Intrepidez. Do gr. parresia, “ousadia”, “franqueza”, “audácia”, “coragem”, “confiança”, “segurança”.

Para entrar. Na antiga aliança, este era o privilégio unicamente do sumo sacerdote, e isso, só uma vez por ano (Hb.9:7; Hb.9:25). Então, todo crente tem livre acesso a Deus.

Santo dos Santos. Do gr. ta hagia (ver com. de Hb.8:2; Hb.9:8).

Pelo sangue de Jesus. Não como o sumo sacerdote terreno, com o sangue de animais, que não podia expiar pecados (v. Hb.10:4), mas pelo sangue do sacrifício de Cristo, eficaz, de uma vez por todas.

Hb.10:20 20. pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou pelo véu, isto é, pela sua carne,

Novo. É novo no sentido de que não existia antes. A antiga aliança não tinha provido este caminho. Também é novo no sentido de eficaz.

Vivo. Cristo vive sempre para interceder por nós (Hb.7:25). O novo caminho está centrado numa pessoa viva para sempre. Ele é o “caminho, e a verdade, e a vida” (Jo.14:6). Tudo isso está em contraste com os sacrifícios mortos oferecidos sob a antiga aliança.

Consagrou. Do gr. egkainizo, “inaugurar”, “dedicar”. O caminho foi inaugurado pela morte de Cristo.

Véu. Do gr. katapetasma (ver com. de Hb.6:19). Antigos comentaristas entendiam que o véu aqui representava o meio de entrada, ou seja, a porta pela qual a pessoa pode se aproximar da presença divina. No entanto, “véu” parece ser aqui algo que oculta a presença divina. Essa interpretação se harmoniza melhor com o simbolismo do véu (ver Hb.6:19) e com o fato de o véu ter sido rasgado no momento da crucifixão de Cristo (ver com. de Mt.27:51). O fato de o véu se rasgar significou não só que o sistema sacrifical estava no fim, mas também que “um novo e vivo caminho está preparado” (DTN, 757).

Isto é, pela Sua carne. “Carne”, aqui, designa a humanidade de Jesus (cf. Hb.5:7). O termo compreende tudo o que estava envolvido na primeira vinda de Cristo a este mundo, incluindo Sua morte sacrificial. Uma questão que se levanta aqui é: A palavra “carne” está em conexão com “véu” ou com “caminho”? No grego, ambas as ligações são possíveis gramaticalmente, embora a segunda pareça mais natural. Se “carne” está em conexão com “caminho”, então, a encarnação, vida e morte de Cristo são representadas como o caminho através do véu para a presença de Deus. Então, o v. 20 seria simplesmente uma ampliação do v. Hb.10:19, em que o “sangue de Jesus” é representado como o meio pelo qual temos entrada para o “santo dos santos”. Se “carne” está em conexão com “véu”, então, o fato de Cristo ter passado pela experiência da encarnação tornou possível a entrada no “santo dos santos” (v. Hb.10:19). Não há nenhum problema com essa interpretação, se não for levada longe demais. Outros pontos de comparação entre “carne” e “véu” devem ser evitados, como a sugestão de que Cristo, tendo passado pela experiência da humanidade, já não possui mais a natureza humana (ver com. de Jo.1:14), ou que a humanidade de Cristo em qualquer sentido tenha funcionado como uma barreira que separa as pessoas do acesso a Deus.

Qualquer que seja o significado específico desse texto, o objetivo geral é claro. A maioria das dificuldades nesta passagem resulta da tentativa de enxergar nela mais do que o escritor pretendia dizer. Esta é uma das várias passagens de Hebreus que dão ênfase à ideia de que, por meio de Cristo Jesus, a pessoa tem acesso direto a Deus. Isso parece ser o pensamento central de toda a mensagem de Hebreus. Por causa do sacrifício de Cristo em nosso favor, já não existe um véu entre nós e Deus. Nossa esperança entra “além do véu, onde Jesus, como precursor, entrou por nós” (Hb.6:19-20). “Cristo não entrou em santuário feito por mãos, [...] porém no mesmo Céu, para comparecer, agora, por nós, diante de Deus” (Hb.9:24). O escritor de Hebreus procura estabelecer a superioridade do ministério celestial do Senhor sobre o ofício dos sacerdotes terrenos. Como prova disso, ele enfatiza que já não há mais um véu, uma barreira entre nós e Deus (ver Nota Adicional a Hebreus 10; Hb.10:39; ver com. de Ex.25:9; Dn.8:14).

Hb.10:21 21. e tendo grande sacerdote sobre a casa de Deus,

Grande Sacerdote. Aqui, o escritor reafirma o tema de Hebreus: o sacerdócio de Cristo no santuário celestial (ver p. 418; ver com. de Hb.2:17; Hb.4:14).

Casa de Deus. Ou seja, a igreja (ver com. de Hb.3:3-6).

Hb.10:22 22. aproximemo-nos, com sincero coração, em plena certeza de fé, tendo o coração purificado de má consciência e lavado o corpo com água pura.

Aproximemo-nos. Não é suficiente crer em Cristo e em Seu ministério sacerdotal nas cortes celestiais. O crente deve aproveitar as facilidades que o Céu provê graciosamente, pelas quais pode receber misericórdia e achar graça “para socorro em ocasião oportuna” (ver com. de Hb.4:16). Aproximar-se implica comunhão íntima e companheirismo.

Sincero coração. Esta é a primeira das quatro qualificações dos que desejam ser beneficiados com a salvação provida pelo grande Sumo Sacerdote do santuário celestial. Aquele que se aproxima com “sincero coração” faz isso com toda sinceridade, sem hipocrisia nem reservas (ver Is.38:3).

Plena certeza. Aqueles que “se aproximam” devem fazê-lo com fé no poder de Cristo em purificar do pecado e conceder graça para viver acima do pecado. A dúvida e a incredulidade restringem a capacidade de se apropriar dos méritos do Salvador. A importância da fé para uma experiência de vida cristã constitui o tema de Hb.10:38-11:40.

Fé. Do gr. pistis (ver com. de Hb.11:1).

Coração purificado. O ato de aspergir sobre as pessoas e as roupas que usavam era sinal de consagração a um serviço sagrado (ver Lv.8:30). A antiga aliança era ratificada, ou confirmada, pela aspersão do sangue (Hb.9:19). De maneira semelhante, aquele que se aproxima de Cristo deve aceitar de coração as disposições da nova aliança e se dedicar à nova forma de vida proporcionada por essa aliança.

Má consciência. Aqui, equivalente ao “velho homem” (Rm.6:6; Ef.4:22; Cl.3:9). Um novo coração substituiu o antigo, e os desejos terrenos que anteriormente motivavam a vida foram abandonados. A mente e o amor de Cristo estão no controle da vida do cristão (ver com. de 2Co.5:14; Fp.2:5).

Lavado o corpo. Evidências exteriores devem testemunhar da transformação interior. O rito do batismo evidencia a intenção de agarrar os privilégios e aceitar as responsabilidades que seguem a conversão (sobre o rito do batismo, ver com. de Rm.6:3-6).

Água pura. No mundo físico, a água é um importante e valioso agente de limpeza, e é um símbolo apropriado de purificação do pecado.

Hb.10:23 23. Guardemos firme a confissão da esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel.

Guardemos firme. Vez após outra, Cristo e os escritores do NT salientam a importância da resistência e da perseverança (ver Mt.10:22; Mt.24:13; Cl.1:23). Há o perigo de que os que entraram para a nova vida em Cristo se cansem de fazer o bem (Gl.6:9) e descuidem das verdades eternas da Palavra de Deus (ver com. de Hb.3:6).

Confissão. Ver com. de Hb.3:1.

Esperança. Literalmente, “nossa esperança”, isto é, a esperança da salvação por meio de Cristo (ver com. de Tt.2:13; Hb.3:6; Hb.6:11; Hb.6:18-19).

Sem vacilar. “Vacilar” é o oposto de apegar-se (ver com. de Mt.24:13; Hb.4:14; Hb.10:35-36). Como resultado da hesitação em Cades-Barneia, a geração de israelitas que deixaram o Egito não pôde entrar na terra da promessa. Sua hesitação foi resultado de falta de fé (ver com. de Hb.3:12; Hb.3:18-19; Hb.11:1).

Quem fez [...] é fiel. Ou seja, Deus foi fiel em manter as promessas da libertação do Egito e da entrada em Canaã, bem como da libertação do pecado e entrada para as bênçãos da salvação em Cristo. Uma vez que Deus é fiel e não vacila no cumprimento de Suas promessas, devemos ser fiéis e não vacilar em aceitá-las. A fidelidade de Cristo como nosso grande sumo sacerdote é reiterada (Hb.3:2; Hb.3:5-6).

A promessa. O escritor focaliza o passado, as promessas a Abraão e seus descendentes, acerca da terra de Canaã (ver com. de Gn.15:18; Hb.4:1). Mas a promessa de salvação em Jesus Cristo está em primeiro lugar em sua mente (cf. Jo.3:16; ver com. de Mt.1:21).

Hb.10:24 24. Consideremo-nos também uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras.

Consideremo-nos. Este versículo pode ser traduzido como: “Estudemos a forma de encorajar uns aos outros ao amor e às boas obras.” Em vez de fazer coisas que tornem mais difícil aos outros ficar firmes sem vacilar (v. Hb.10:23), o verdadeiro cristão pensa no que pode fazer para incentivá-los a fazer isso. Esta é uma aplicação do princípio do amor ao próximo, que se reflete na segunda tábua do decálogo (ver com. de Mt.5:43-44; Mt.22:39). A genuína preocupação pelo bem-estar temporal e eterno dos outros é a medida pela qual o Céu determina a sinceridade do amor a Deus professado pelo ser humano (ver com. de 1Jo.2:9-11; 1Jo.3:10; 1Jo.3:14).

Amor. Ver com. de Mt.5:43-44.

Boas obras. Ou seja, o amor em ação, em atos de bondade e misericórdia. Encorajamos os outros a ser gentis e atenciosos quando nós mesmos agimos assim. O exemplo é irresistível (ver com. de Tg.1:27; Tg.2:18).

Hb.10:25 25. Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima.

Não deixemos. Ou, “não negligenciemos”.

De congregar-nos. O escritor se refere às reuniões cristãs para adoração e encorajamento mútuo, que nos tempos do NT eram comumente realizadas nos lares (ver vol. 6, p. 33, 34).

Costume de alguns. Alguns deviam negligenciar a comunhão com seus irmãos nos momentos de culto e devoção, em prejuízo próprio. Fazendo assim, eles viviam contrariamente ao conselho do v. Hb.10:24, que incentiva o amor e as boas obras. Em vista da situação política que prevalecia na época em que Hebreus foi escrita, alguns podem ter se ausentado, por medo de incorrer no desagrado governamental e, possivelmente, de sanções civis. Outros permaneciam ausentes dos cultos, por negligência e indiferença (v. Hb.10:26-27).

Admoestações. Ou, “exortações”. As palavras de exortação encorajariam outros a se “apegarem” à fé “sem vacilar” (v. Hb.10:23). Os que estão firmes na fé nunca devem esquecer que alguns de seus companheiros, cuja oportunidade para o desenvolvimento do caráter cristão foram menos favorável, podem estar passando por dúvidas e desânimo. Uma “boa palavra ao cansado” (Is.50:4) pode ser o meio, na providência de Deus, para conversão de um “pecador do seu caminho errado”, de salvar “da morte a alma dele” e de esconder “uma multidão de pecados” (Tg.5:20).

Tanto mais. Conforme aumentassem os problemas, dificuldades e perseguições, a exortação e o encorajamento mútuos seriam benefício ainda maior. O perigo para a segurança pessoal, resultante da ausência aos cultos, seria eliminado pela coragem e força que decorrem da comunhão cristã.

O Dia. A referência é ao dia de “juízo e fogo vingador” (v. Hb.10:27), o dia em que “Aquele que vem virá” (v. Hb.10:37). A expressão “vedes que o dia se aproxima” aponta para a antiga admoestação do Senhor, em resposta à indagação dos discípulos: “Dize-nos quando sucederão estas coisas e que sinal haverá da Tua vinda e da consumação do século” (Mt.24:3). A indagação e a resposta abrangem igualmente tanto a destruição de Jerusalém, no ano 70 d.C., quanto o fim do mundo (ver com. de Mt.24:3). Sendo que a epístola aos Hebreus deve ter sido escrita pouco antes do ano 70 d.C. (ver p. 417), é provável que o escritor estivesse também ansioso em relação aos acontecimentos fatídicos desse ano. No entanto, como o contexto indica (ver Hb.10:27; Hb.10:37), ele pensa principalmente na segunda vinda de Cristo (ver Nota Adicional a Romanos 13; Rm.13:14).

Hb.10:26 26. Porque, se vivermos deliberadamente em pecado, depois de termos recebido o pleno conhecimento da verdade, já não resta sacrifício pelos pecados;

Porque. Nos v. 26 a 31, o autor explica mais detalhadamente a natureza da hesitação a que se refere no v. Hb.10:23 e o estado de espírito das pessoas mencionadas no v. Hb.10:25, que estavam deixando de frequentar as reuniões dos crentes.

Deliberadamente em pecado. A forma do verbo grego implica continuar voluntariamente a pecar. O contexto indica (ver v. Hb.10:29) que a referência não é aos atos individuais de pecado cometidos no pleno conhecimento de seu caráter hediondo, mas a atitude de espírito que prevalece quando uma pessoa renuncia a Cristo, recusa a salvação e rejeita o Espírito Santo. Este é um pecado deliberado, persistente e desafiador. É uma inversão da decisão anterior de aceitar a salvação e render a Cristo o coração e a vida. A apostasia premeditada leva ao pecado imperdoável (ver com. de Mt.12:31-32). É um estado contínuo de revolta contra Deus. Depois, todos os pecadores estão em revolta contra Deus (ver com. de Rm.8:7). Mas, como Paulo explicou aos atenienses, até que os pecadores tenham conhecimento da verdade, Deus tolera sua ignorância (At.17:30).

Antes de a luz da verdade brilhar no coração, Deus não responsabiliza as pessoas pela escuridão em que vivem (ver Jo.15:22; Ez.3:18-21; Ez.18:2-32; Ez.33:12-20; Lc.23:34; 1Tm.1:13). Deus ama os pecadores, e, de fato, enviou Seu Filho para salvá-los (ver com. de Jo.1:4-5; Jo.1:9-12; Jo.3:16; Mt.9:13). Mas, quando a luz vem e as pessoas preferem as trevas à luz, elas condenam a si mesmas diante de Deus (Jo.3:19), e “já não resta sacrifício pelos [seus] pecados” (Hb.10:26; Tg.4:17).

Conhecimento. Do gr. epignosis, “conhecimento completo”. As pessoas mencionadas estão plenamente cientes dos resultados do curso de ação que escolheram.

Verdade. Ou seja, a “verdade” sobre o amor de Deus pelos pecadores, como é revelado no plano da salvação e no dom de Seu Filho (ver Hb.2:1-3).

Já não resta sacrifício. A lei mosaica prescrevia a morte, não sacrifícios, para os apóstatas obstinados (ver com. do v. Hb.10:28). Foi assim com Nadabe e Abiú (ver Lv.10:1-5), Coré, Datã, Abirão e seus 250 apoiadores (ver Nm.16:1-35). Sacrifícios por essas pessoas teriam sido inaceitáveis ao Senhor, pois tinham valor apenas como representação de corações arrependidos.

Hb.10:27 27. pelo contrário, certa expectação horrível de juízo e fogo vingador prestes a consumir os adversários.

Expectação horrível. Ou, “expectativa medonha” (RSV).

Juízo. Do gr. krisis, o ato de executar o julgamento ou juízo final, como torna evidente a expressão adicional “fogo vingador” (ver com. de At.17:31; Hb.9:27).

Fogo vingador. Ou, “intensidade de fogo”; o fogo do último dia (ver 2Pe.3:7; 2Pe.3:10-12; Ap.20:9-15). Trata-se da intensidade do fogo, e não da atitude divina, que encontra expressão no fogo (ver com. de Rm.1:18).

Os adversários. Ou seja, os pecadores deliberados (ver v. Hb.10:26).

Hb.10:28 28. Sem misericórdia morre pelo depoimento de duas ou três testemunhas quem tiver rejeitado a lei de Moisés.

Sem misericórdia morre. Não havia recurso, não havia instância superior para apelar à misericórdia. Não havia como escapar da penalidade da lei prescrita. Os apóstatas declarados deviam morrer para que sua influência não contaminasse os outros.

Pelo. Literalmente, “no [testemunho de]”.

Duas ou três testemunhas. No caso dos crimes graves, como assassinato, Moisés determinou que pelo menos duas testemunhas deviam estar em acordo sobre os detalhes essenciais antes que um veredito de culpa fosse pronunciado (Dt.17:6; cf. com. de Mt.26:60; ver vol. 5, p. 580, 581). Essa disposição misericordiosa e sábia tendia a desencorajar as acusações falsas e assegurar a justiça. O mesmo princípio é válido hoje.

Rejeitado. Do gr. atheteo, “recusar-se a reconhecer”, “anular”. Aqueles que tinham “rejeitado a lei de Moisés” violaram abertamente seus preceitos. Desrespeitaram a autoridade da lei e desafiaram sua jurisdição sobre eles.

A lei de Moisés. Uma referência a todo o código legal promulgado por Moisés sob direção divina, particularmente como se encontra registrado no livro de Deuteronômio (ver Dt.31:24-26).

Hb.10:29 29. De quanto mais severo castigo julgais vós será considerado digno aquele que calcou aos pés o Filho de Deus, e profanou o sangue da aliança com o qual foi santificado, e ultrajou o Espírito da graça?

Mais severo castigo. Ou, “retribuição mais grave”. A pena mais severa possível sob a lei de Moisés era a morte, nesta vida. Mas o “fogo vingador prestes a consumir os adversários” do Senhor (v. Hb.10:27), no último dia, privará as pessoas da vida eterna. Existe uma ressurreição da primeira morte, mas não da segunda. Portanto, a segunda morte é um “mais severo castigo”.

Julgais vós [...]? Sob a forma de uma pergunta, a verdade aqui declarada é muito mais enfática do que poderia ser de outro modo.

Considerado digno. Ou seja, pelo grande Juiz do universo.

Calcou. Isto é, como um ato deliberado de desobediência (cf. Mt.7:6). As pessoas aqui referidas não só rejeitam a oferta da misericórdia de Cristo, mas não poupam esforços para tornar conhecido que desprezam essa oferta.

Filho de Deus. Ver com. de Lc.1:35.

Profanou. Literalmente, “tornou comum”. Quem rejeita o amor de Deus não aprecia o valor supremo desse dom. A atitude dessa pessoa contrasta com a do comerciante de pérolas (ver Mt.13:45-46) e a do homem que descobriu o tesouro escondido no campo (v. Mt.13:44).

Sangue da aliança. Ou seja, o sangue de Cristo, pelo qual estão em vigência as disposições da nova aliança (ver Hb.9:11-26).

Foi santificado. O apóstata aqui mencionado havia professado aceitar a salvação pela graça expiatória de Cristo. Havia professado apreciar o que então desprezava e, assim, evidenciava que sua atitude não se baseava em ignorância.

Ultrajou. Do gr. enubrizo, “insultar”, “indignar”. A persistente recusa em ouvir os apelos do Espírito Santo reflete o desprezo por eles. Por diversas maneiras as pessoas podem ofender o Espírito Santo e cometer o pecado imperdoável (ver com. de Mt.12:31-32; Ef.4:30).

Espírito da graça. Ou seja, o Espírito por cuja atuação a graça de Cristo é apresentada a cada pecador arrependido.

Hb.10:30 30. Ora, nós conhecemos aquele que disse: A mim pertence a vingança; eu retribuirei. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo.

Vingança. Uma citação de Dt.32:35; ver com. de Rm.12:19.

Eu retribuirei. Deus “retribuirá a cada um segundo o seu procedimento” (Rm.2:5-10; Ap.22:12). No grande dia do juízo final, quem desprezou a misericórdia de Deus e insultou o Espírito não precisa esperar nenhuma misericórdia. Suas dívidas serão pagas na totalidade.

Julgará. Uma citação de Dt.32:36, que repete a ideia do v. Dt.32:35.

Hb.10:31 31. Horrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo.

Horrível coisa. O temor que toma conta dos pecadores quando levados à presença do Deus justo é terrível de se imaginar (cf. Ap.6:14-17). Quanto pior será passar por essa experiência.

Cair nas mãos. Muitos se esquecem de que, embora Deus seja, de fato, “misericordioso e piedoso”, Ele “não inocenta o culpado” (Ex.34:6-7). Os que desprezam a misericórdia de Deus nunca devem esquecer que “aquilo que o homem semear, isso também ceifará” (Gl.6:7).

Deus vivo. As advertências de retribuição do Deus vivo não devem ser tomadas como ameaças vazias, como as que são feitas em nome de uma divindade pagã, que é apenas madeira ou pedra (ver Is.37:19).

Hb.10:32 32. Lembrai-vos, porém, dos dias anteriores, em que, depois de iluminados, sustentastes grande luta e sofrimentos;

Lembrai-vos. O autor se dirige novamente de forma direta a seus leitores. Eles poderiam entender o que ele dizia, ao refletirem em sua própria experiência como cristãos.

Dias anteriores. Ou seja, as experiências que lhes sobrevieram logo após a conversão. Os primeiros destinatários da epístola eram cristãos judeus (ver p. 417). Como revela o livro de Atos, os judeus, desde o início, perseguiram seus irmãos que aceitaram o cristianismo.

Depois de iluminados. Ou seja, com a luz do evangelho.

Sustentastes. Aqueles a quem o escritor se dirigia tinham suportado pacientemente perseguições e dificuldades; por que deveriam desanimar, então?

Luta. Do gr. athlesis, “competição”, “conflito”. Tendo sofrido “grande luta”, eles deviam estar preparados para as aflições. A natureza desse “combate de aflições” é explicada nos v. Hb.10:33-34.

Hb.10:33 33. ora expostos como em espetáculo, tanto de opróbrio quanto de tribulações, ora tornando-vos coparticipantes com aqueles que desse modo foram tratados.

Ora. Ou, “algumas vezes”.

Espetáculo. Do gr. theatrizo, “expor publicamente [como em um teatro]”, “envergonhar”. Antigamente, criminosos eram frequentemente expostos ao ridículo público e, em seguida, executados em um teatro ou arena.

Opróbrio. Do gr. oneidismoi, “insultos”, “abusos”, “vergonha”.

Tribulações. Ou, “sofrimentos”, incluindo, talvez, experiências como ser deserdado, ostracismo social e privação de meios para ganhar a vida.

Coparticipantes. Os cristãos estavam prontos a compartilhar as “injúrias e aflições” a que seus irmãos eram submetidos. O versículo seguinte cita um exemplo dessa participação no sofrimento.

Hb.10:34 34. Porque não somente vos compadecestes dos encarcerados, como também aceitastes com alegria o espólio dos vossos bens, tendo ciência de possuirdes vós mesmos patrimônio superior e durável.

Compadecestes. Literalmente, “sofrestes com”.

Das minhas prisões (ARC). As evidências textuais (cf. p. xvi) se dividem entre esta e a variante “dos encarcerados” (ARA). Há também evidências textuais para a variante “sobre as algemas”. Por causa dessas variantes no texto grego, há dúvida se o escritor se refere especificamente a uma antiga experiência pessoal ou se ele se inclui entre os vários prisioneiros mencionados coletivamente como “eles” no v. Hb.10:33. O contexto tende a favorecer a variante “encarcerados” (comparar com Ef.3:1; 2Tm.1:8).

Aceitastes com alegria. Ver com. de Mt.5:12; Tg.1:2; 1Pe.4:13.

Espólio. Ou, “apreensão”. Alguns tinham experimentado o confisco de bens e pertences pessoais.

Tendo ciência de possuirdes. Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a variante “sabendo que possuís”, isto é, sabendo que tendes.

Nos céus (ARC). Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a omissão destas palavras, mas, sem dúvida, o “patrimônio durável” do cristão está “nos céus” (cf. Mt.6:19-21).

Patrimônio. Ou, “propriedades”, “possessão”.

Superior. Ou, “preferível”, “mais útil”, “mais vantajoso”.

Hb.10:35 35. Não abandoneis, portanto, a vossa confiança; ela tem grande galardão.

Não abandoneis. Como alguns deviam estar fazendo (v. Hb.10:25). “Não abandonar” é o mesmo que “guardar firme” (v. Hb.10:23; ver com. de Mt.24:13; Hb.3:14).

Confiança. Do gr. parresia (ver com. de Hb.3:6).

Galardão. A recompensa da fidelidade é a vida eterna (ver com. de Rm.2:6-7).

Hb.10:36 36. Com efeito, tendes necessidade de perseverança, para que, havendo feito a vontade de Deus, alcanceis a promessa.

Perseverança. Esta é uma virtude positiva. Exige constância, persistência e ação, mesmo quando cansaço, desânimo e obstáculos possam bloquear o caminho.

Feito a vontade de Deus. Sobre a importância de fazer a vontade de Deus, ver com. de Mt.7:21-27.

A promessa. Ou seja, a recompensa prometida, a vida eterna. O atleta recebe o prêmio depois de um desempenho bem-sucedido, e o cristão recebe o cumprimento da “promessa” quando, pela fé, segue “a vontade de Deus”. Em Hebreus, “a promessa” se refere particularmente ao “descanso” de Deus e à “herança eterna” (Hb.4:1; Hb.9:15; Hb.11:13).

Hb.10:37 37. Porque, ainda dentro de pouco tempo, aquele que vem virá e não tardará;

Dentro de pouco tempo. Literalmente, “um pouco [tempo]”. Ver Nota Adicional a Romanos 13; Rm.13:14.

Aquele que vem. Ou seja, aquele que prometeu voltar (Jo.14:1-3; comparar com Lc.21:27; Tg.5:8).

Tardará. Do gr. chronizo, “passar o tempo”, “atrasar” (comparar com Hc.2:3, em que a LXX usa a mesma palavra grega). As promessas de Deus podem parecer demoradas, mas, a seu tempo, se cumprirão.

Hb.10:38 38. todavia, o meu justo viverá pela fé; e: Se retroceder, nele não se compraz a minha alma.

Meu justo. A primeira parte do versículo é uma citação de Hc.2:4 (ver com. ali e em Rm.1:17; Gl.3:11). Aqui, “o justo” deve “viver pela fé”, enquanto aguarda a prometida vinda de Cristo. Pela fé, ele suporta pacientemente os tempos de angústia que precedem Sua vinda.

Retroceder. Ou seja, abandonar a confiança (v. Hb.10:35).

Não se compraz. Aqueles que “retrocedem” do caminho da fé nunca podem esperar ouvir as palavras: “Muito bem, servo bom e fiel [...] entra no gozo do teu Senhor” (Mt.25:21).

Minha alma. Expressão bíblica comum que significa “eu” (ver com. de SI.16:10).

Hb.10:39 39. Nós, porém, não somos dos que retrocedem para a perdição; somos, entretanto, da fé, para a conservação da alma.

Somos dos que. Diplomaticamente, o autor inclui todos os leitores no grupo que “viverá pela fé” (v. Hb.10:38). A admoestação dos v. Hb.10:23-36 sugere que alguns deles estavam em perigo de retornar “para a perdição”. Mas o escritor afasta o pensamento de que qualquer deles pudesse fazê-lo.

Perdição. Ou seja, a destruição final (ver com. de Jo.17:12).

Conservação. Do gr. peripoiesis, “preservação”, “aquisição”; traduzido como “resgate da sua propriedade”, em Ef.1:14 (ver com. ali).

NOTA ADICIONAL A HEBREUS 10 A Bíblia contém várias declarações a respeito do plano de Deus para a salvação da humanidade, o qual está centralizado no sacrifício de Cristo no Calvário e em Seu ministério no Céu. Quando Deus chamou para Si um povo escolhido, uma de Suas primeiras revelações a esse povo foi o plano da salvação. Deus instruiu Moisés a construir um santuário para que Ele pudesse habitar no meio deles (ver com. de Ex.25:8). Esse santuário foi dividido em dois compartimentos (ver com. Ex.26:31-37), em cada um dos quais foram colocados certos móveis. No primeiro compartimento, que continha a mesa dos pães da proposição, o candelabro de sete braços e o altar do incenso, alguns serviços eram realizados diariamente. No segundo, contendo a arca da aliança, um serviço era realizado apenas no dia culminante do ciclo anual, o Dia da Expiação. Em conexão com os serviços dos dois compartimentos, eram oferecidos sacrifícios de animais; era derramado sangue (ver vol. 1, p. 752-765).

Esse santuário foi construído de acordo com um “modelo” mostrado a Moisés “no monte” (Ex.25:40; ver com. de Ex.25:9; At.7:44). No Céu, encontra-se o original do qual o santuário terrestre é uma “sombra” (ver com. de Hb.8:5; Hb.9:23). João, o revelador, a quem foram dadas diversas visões proféticas do Céu, fala do “santuário do tabernáculo do Testemunho” (ver com. de Ap.15:5). Nesse “templo”, ele viu a “arca” (Ex.11:19). Ele também teve uma visão celestial do altar do incenso (ver com. de Ex.8:3). O escritor de Hebreus fala do “Sumo Sacerdote” no Céu (ver Hb.3:1; Hb.9:24), que ofereceu uma vez por todas, o sacrifício de Si mesmo, derramando Seu sangue em favor dos pecadores (ver com. de Hb.9:24-26; Hb.10:12). A partir dessas e de outras passagens que poderiam ser citadas, é evidente que o santuário terrestre, com seus dois compartimentos e seu ciclo de serviços, era uma “sombra”, ou esboço, da obra de Cristo pelos pecadores na cruz e no templo celestial. Na verdade, provavelmente seja mais fácil falar com mais certeza a respeito do serviço do santuário do que sobre quase qualquer outro aspecto do relacionamento de Deus com a humanidade. De fato, esse tema está revelado diante de nós de forma clara e por meio de diversos textos.

Daquilo que pode ser conhecido a partir do santuário terrestre, podem-se tirar algumas conclusões a respeito do santuário celestial. O ritual terrestre não podia começar até que o sacerdote tivesse uma oferta para sacrificar. Da mesma forma, Cristo começou Sua obra como sumo sacerdote no santuário celestial só após a oferta de Si mesmo na cruz. O serviço do santuário terrestre tinha duas fases, executadas nos dois compartimentos; assim também o celestial tem duas fases. Em sua primeira fase, o serviço do santuário terrestre se desenrolava diariamente até que chegasse a segunda fase: o Dia da Expiação. Igualmente, a primeira fase do ofício no templo celestial estaria relacionada à primeira fase do santuário terrestre até o momento, perto do fim da história terrestre, quando o grande Sumo Sacerdote entraria na segunda fase de Seu ministério sacerdotal. A profecia de Dn.8:14 (ver com. ali), juntamente com Dn.9:25, mostra que essa segunda fase teve início em 1.844.

No entanto, como foi observado no comentário de Ex.25:9, é improdutivo especular quanto às dimensões, aparência exata, ou arranjos precisos do santuário celestial, pois “nenhuma estrutura terrestre poderia representar a vastidão e glória” desse templo (PP, 357). Os seres humanos são criados “à imagem de Deus” (Gn.1:27), mas só Cristo é “a expressão exata do Seu Ser” (Hb.1:3). O santuário terrestre seguiu o modelo daquele no Céu, na medida em que era uma representação viva dos vários aspectos do ministério de Cristo em favor da humanidade caída (PP, 357). Podemos falar do “lugar santo” e do “santo dos santos” do santuário celestial, ao empregar a linguagem e os símbolos do santuário terrestre (Ex.26:33-34) e, assim, entendermos o possível acerca do santuário celestial. Porém, não se deve permitir que a ansiedade em visualizar um santuário celestial a partir do terreno empalideça as grandes verdades essenciais ensinadas por aquela “sombra” terrestre, uma das quais é que o ministério de Cristo por nós é feito em duas fases, ou “duas grandes divisões”, para usar as palavras de Ellen G. White (PP, 357).

Essa verdade é vital para a compreensão adequada da obra de Cristo como o grande sumo sacerdote. A epístola aos Hebreus discute essa obra de Cristo como sumo sacerdote. Em certos casos, por exemplo, em Hb.9, Paulo fala dos dois compartimentos do tabernáculo terrestre e faz uma aplicação ao ministério de Cristo no Céu. Assim, esse livro tem sido crucial na discussão teológica quanto às palavras de Paulo sobre o assunto, notadamente se ele ensina que há dois compartimentos no santuário celestial, ou “duas grandes divisões” para o ministério sacerdotal de Cristo. Este Comentário defende que o ministério celestial de Cristo é realizado em “duas grandes divisões”, ou, para usar as palavras das Escrituras, no “santo” e, depois, no “santíssimo” do santuário celestial (ver com. de Ex.25:9; Dn.8:14). No entanto, entende que os temas de Hebreus podem não ser a base para uma definição final de questões relacionadas ao santuário celestial, embora sejam úteis para tanto.

Nos tempos do NT, os cristãos hebreus estavam perturbados acerca de como se relacionar com o serviço do santuário terrestre que eles e seus pais antes deles, por 1.500 anos, haviam considerado o centro da vida espiritual (ver vol. 6, p. 16-21). Paulo procura mostrar, com uma série de paralelos e contrastes, que o santuário terrestre não devia ser objeto de sua lealdade e devoção. Deus tinha estabelecido que o templo terrestre nunca seria mais do que uma “sombra” (ver Introdução a Hebreus, p. 418-422). Por exemplo, o autor de Hebreus fala do Sacerdote imortal no Céu, em comparação com os sacerdotes que morrem, na Terra (ver com. de Hb.7:23-24; Hb.7:28); do sacrifício de valor inestimável do próprio Cristo, em contraste com o sacrifício de animais (ver com. de Hb.9:11-14; Hb.9:23-26; Hb.10:11-14); e chega à grande conclusão de que agora há um “ministério tanto mais excelente” (ver com. de Hb.8:6) disponível aos filhos de Deus.

Já não precisamos apelar aos sacerdotes terrenos a fim buscar o perdão de Deus. Nós mesmos, agora, podemos ir diretamente e com ousadia ao trono da graça no Céu, em nome de nosso grande Sumo Sacerdote (ver com. de Hb.4:14-16; Hb.10:19-22). Paulo estabeleceu essa verdade da grande superioridade do santuário celestial a fim de persuadir os cristãos judeus a definitivamente voltar os olhos dos sacerdotes terrestres e do santuário terrestre para o santuário e o Sacerdote celestiais. Nesse ponto, Paulo concentra sua discussão sobre o santuário. Se as declarações de Paulo em Hebreus forem colocadas ao lado de outras passagens bíblicas sobre as “duas grandes divisões” do serviço do santuário, é possível obter uma visão equilibrada tanto da natureza quanto da preeminência do ministério sumo sacerdotal de Cristo por nós.

Hb.11:1 1. Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem.

Fé. Do gr. pistis, “confiança”, “lealdade”, “convicção”, também “fidelidade”, “confiabilidade”. A palavra pistis pode denotar tanto atitude mental como padrão de conduta, sendo a conduta fiel o produto da atitude de fé. Os dois significados estão intimamente entrelaçados ao longo do capítulo, pois, em cada caso de fé citado, a atitude de fé levou aos atos fiéis. A ênfase está nas obras fiéis. Hebreus 11 ilustra abundantemente o princípio declarado de forma mais sucinta no capítulo Hb.10, especialmente os v. Hb.10:35-39, de que fé e fidelidade são a necessidade suprema dos que aguardam a vinda do Senhor. Há o perigo de que alguns abandonem a confiança porque o Senhor parece adiar Sua vinda. Todos “necessitam de paciência”, a fim de “viver pela fé”. Sob a visão humana, os notáveis aqui mencionados “não obtiveram a promessa” (Hb.11:39), mas a contemplaram “de longe” (v. Hb.11:13). No entanto, “os antigos, [pela fé,] obtiveram bom testemunho”. Mas agora, “dentro de pouco tempo, aquele que vem virá e não tardará” (Hb.10:37). Se os notáveis dos séculos passados estavam tão plenamente “persuadidos” (Hb.11:13, KJV) das promessas, embora estivessem distantes de seu cumprimento, não devemos nós, que as vemos a se cumprir em “breve”, ser também pacientes e fiéis?

Certeza. Do gr. hupostasis, “natureza substancial”, “essência”, “ser real”, “realidade” e, em sentido mais amplo, como aqui, “certeza confiante” (comparar com arrabon, “penhor”, no com. de 2Co.1:22). Não existe algo como fé cega. A fé genuína sempre descansa sobre a firme certeza, circundada de provas suficientes, para justificar a confiança naquilo que ainda não é visto. Hupostasis é usado nos antigos papiros para documentos legais em que uma pessoa provava seu direito de propriedade. Os documentos não eram a propriedade, mas forneciam evidências de sua existência e do direito a ela. Assim, hupostasis pode ser traduzida aqui como “título de domínio”; “a fé é um título de domínio”. Pela fé, o cristão se considera já na posse do que lhe foi prometido. Sua confiança absoluta nAquele que a fez não deixa dúvidas quanto a seu cumprimento no tempo devido. A fé permite, assim, que o cristão não só reivindique as bênçãos prometidas, mas que as receba e aprecie já agora. Assim, a herança prometida se torna uma possessão presente. Os bens que estão no porvir não são apenas sonhos a serem cumpridos no futuro, mas vivas realidades presentes. Para os olhos da fé, o que é invisível se torna visível de outra maneira.

Coisas que se esperam. Ou seja, a herança prometida em que os santos haverão de entrar na vinda de Cristo.

Convicção. Do gr. elegchos, aqui significando “prova”, “verificação”. A fé não é uma crença abstrata de que existe evidência, mas uma certeza constante, baseada na confiança de que Deus cumprirá Suas promessas. Podemos nunca ter visto a turbina que produz a eletricidade doméstica, mas consideramos a presença da eletricidade como prova suficiente da existência da turbina. Da mesma forma, acreditamos que nossas energias física, mental e espiritual testemunham da existência de uma fonte sobrenatural de vida e poder. Por outro lado, a fé não deve ser confundida com credulidade, pois a fé é reforçada, até certo ponto, pela evidência (ver com. de Hb.12:1).

Fatos que se não veem. Estas são as “coisas que se esperam”, a herança prometida.

Hb.11:2 2. Pois, pela fé, os antigos obtiveram bom testemunho.

Antigos. Do gr. presbuteroi, aqui significando “os antigos”, “pessoas de antigamente”, não necessariamente idosas.

Obtiveram bom testemunho. Literalmente, “foram testemunhados para”, “foram aprovados”, “foram atestados”. A fé dos “antigos” levou á conduta fiel, que, por sua vez, deu testemunho da realidade de sua fé. Foi sua fé que lhes conquistou a aprovação divina. Podemos nos perguntar como alguns dos mencionados neste capítulo poderiam ter obtido “bom testemunho”. Mas, se aqui fossem mencionados apenas heróis sem falhas de fé, o registro traria pouco incentivo para a pessoa comum. Se as pessoas sujeitas aos “mesmos sentimentos” que nós (Tg.5:17) puderam obter “bom testemunho”, temos todas as razões para crer que mesmo o mais fraco dos filhos de Deus pode fazer o mesmo.

Hb.11:3 3. Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem.

Universo. Do gr. aiones, literalmente, “eras”, mas, aqui, significando este mundo, considerado do ponto de vista de tempo. A referência não é necessariamente aos outros mundos, mas ao nosso.

Pela palavra de Deus. Ver com. de Gn.1:3; SI.33:6; Sl.33:9; (sobre a criação pela Palavra de Deus, ao contrário da evolução, ver vol. 1, p. 22-41).

O visível. Ou seja, o mundo natural de terra, mar e céu, juntamente com suas variadas formas de vida.

Veio a existir. Deus não dependeu da matéria preexistente. Por Seu grande poder, Deus chamou a matéria à existência e, em seguida, por esse mesmo poder, transmitiu vida às criaturas formadas a partir dela. Antes do alvorecer da chamada era atômica, um dos princípios primordiais da ciência era que a matéria seria eterna, que não poderia ser criada nem destruída. Mas, agora, os cientistas declaram que matéria e energia são intercambiáveis. Então, por que se deveria considerar estranho que um Deus todo-poderoso possa criar a matéria que não existia anteriormente?

Que não aparecem. O mundo e tudo que nele existe foi feito a partir do nada, pelo exercício do poder infinito.

Hb.11:4 4. Pela fé, Abel ofereceu a Deus mais excelente sacrifício do que Caim; pelo qual obteve testemunho de ser justo, tendo a aprovação de Deus quanto às suas ofertas. Por meio dela, também mesmo depois de morto, ainda fala.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Abel. Ver Gn.4:3-10.

Obteve testemunho. Literalmente, “foi testemunhado”. A frase pode ser traduzida como: “pelo qual ele foi aprovado como justo” (ver com. do v. Hb.11:2). Pela fé, Abel compreendeu a promessa de um Redentor. Sua oferta não tinha valor expiatório em si, mas a fé na promessa o levou a oferecer o sacrifício que Deus havia prescrito. Deus aceitou sua oferta, como prova de sua fé.

Aprovação de Deus. Deus aceitou a oferta de Abel e recusou a de Caim. A diferença não foi simplesmente pelo caráter das ofertas em si, mas também pelo caráter e pela atitude dos ofertantes, refletidos nas ofertas que apresentaram (ver PP, 71, 72).

Ainda fala. A fé demonstrada por Abel tem dado um testemunho vivo ao longo dos séculos. Na fé exercida por Abel havia um poder que o levou a estar de acordo com a ação que Deus tinha prescrito, e a poderosa influência de sua fé continua viva hoje; “ainda fala”.

Hb.11:5 5. Pela fé, Enoque foi trasladado para não ver a morte; não foi achado, porque Deus o trasladara. Pois, antes da sua trasladação, obteve testemunho de haver agradado a Deus.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Enoque. Ver com. de Gn.5:22.

Trasladado. O escritor não quer dizer que Enoque tinha fé em que Deus o iria trasladar, mas que foi trasladado como resultado de sua fé e fidelidade e “obteve testemunho de haver agradado a Deus”. As Escrituras informam que apenas Enoque e Elias foram trasladados para o Céu sem ver a morte. A genealogia de Gn.5, se estiver completa, situa a trasladação de Enoque relativamente poucos anos após a morte de Adão (ver vol. 1, p. 164). A morte de Adão deve ter lançado uma sombra sobre os fiéis, pois, apesar de sua vida de arrependimento e piedade, ele morrera, assim como todo pecador. Se assim for, talvez não seja irrazoável conjecturar que, a fim de dar a seus descendentes piedosos a certeza de que uma vida de fé seria recompensada, Deus trasladou Enoque, o sétimo depois de Adão.

Da mesma forma que, em Adão, Deus demonstrou que “o salário do pecado é a morte”, em Enoque, Ele demonstrou que “o dom gratuito de Deus é a vida eterna” (Rm.6:23). A trasladação de Enoque mostrou que, embora o pecado separe as pessoas de Deus, foi aberto um caminho pelo qual essa separação pode ter fim, e as pessoas podem voltar para Deus. Esse é o caminho da fé. Enoque é um tipo daqueles que serão trasladados da última geração, dentre os vivos. Ele se tornou amigo de Deus, andava com Ele e, finalmente, foi para casa com Ele. Portanto, todos podem ter coragem. Quem serve a Deus com o coração cheio de fé e caminha com Ele dia a dia nas diversas experiências da vida terá entrada franca no paraíso de Deus.

Não ver a morte. Ou seja, não experimentar a morte.

Não foi achado. Estas palavras sugerem uma tentativa de encontrar Enoque depois de seu desaparecimento. Isso também ocorreu mais tarde, após a trasladação de Elias (ver 2Rs.2:16-18).

Antes da sua trasladação. O modo piedoso de vida de Enoque era bem conhecido entre seus contemporâneos.

Obteve testemunho. Literalmente, “foi testemunhado”. Por Enoque, Deus deu ao mundo uma demonstração do tipo de caráter que vai obter Sua aprovação. Não havia nenhuma possibilidade de que as pessoas se perguntassem, depois da trasladação de um santo tão piedoso: “Como Deus pode aceitar um homem como esse?”

Agradado a Deus. A fé demonstrada por Enoque e sua fidelidade tiveram aprovação de Deus. Sua vida e seu caráter foram uma demonstração do que Deus deseja que todos sejam.

Hb.11:6 6. De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador dos que o buscam.

Sem fé. Ou, “à parte da fé”, ou, “além da fidelidade” (ver com. do v. Hb.11:1). Considerando que o Criador é infinito, Suas criaturas são irrevogavelmente finitas, havendo, portanto, coisas que devem aceitar pela fé. Na verdade, o ato de tomar a Deus por Sua palavra é o exercício mais exaltado de que a mente humana é capaz. De fato, é necessário tomar a Deus pela palavra a fim de ocupar perfeitamente o lugar planejado por Ele em um universo perfeito, pois a percepção do amor de Deus culmina em fé. Na pessoa divino-humana do Salvador, o amor divino e a fé humana se uniram pela primeira vez.

Impossível agradar a Deus. Ou seja, impossível equiparar-se com Seus requisitos. Em um universo perfeito, não há espaço para uma criatura que não tenha fé no governante do universo. A única alternativa para a fé em Deus é medo, ressentimento e, finalmente, desespero.

Aquele que se aproxima de Deus. Ou seja, que professa lealdade a Ele.

Creia que Ele existe. A crença de que Deus realmente existe é o fundamento máximo da fé cristã. Pela natureza, por Sua Palavra e por meio de Sua direção providencial, Deus proveu todas as evidências de Sua existência de que os seres inteligentes precisam e podem fazer uso (cf. Rm.1:20). O escritor aqui exclui os conceitos distorcidos de Deus como defendidos pelos panteístas.

Galardoador. Aqui, o escritor exclui conceitos como deísmo e universalismo. Faz toda diferença se as pessoas respondem ao amor de Deus e cumprem Sua vontade revelada. Ele “estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo” (At.17:31), um dia em que “retribuirá a cada um segundo o seu procedimento” (Rm.2:6). A terrível perspectiva de um dia comparecer diante do grande Juiz do universo é, inegavelmente, uma poderosa motivação para uma vida correta. Na verdade, o temor do lago de fogo nunca salvará alguém, mas pode ser um fator poderoso para sacudi-lo de sua letargia. O infinito amor de Deus, revelado em Cristo Jesus, provê às pessoas o incentivo final, único e eficaz para a salvação.

Buscam. Ou, “procuram”. “Buscar” a Deus é esforçar-se para compreender melhor Seu caráter infinito e Sua vontade para os seres humanos. O escritor não quer dizer que Deus tenha deliberadamente dificultado para que as pessoas O encontrem, mas salienta a necessidade de um desejo sincero de compreender a Deus e de se tornar semelhante a Ele, tanto na mente como no caráter.

Hb.11:7 7. Pela fé, Noé, divinamente instruído acerca de acontecimentos que ainda não se viam e sendo temente a Deus, aparelhou uma arca para a salvação de sua casa; pela qual condenou o mundo e se tornou herdeiro da justiça que vem da fé.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Noé. Ver Gn.6:13-22. Acontecimentos que ainda não se viam. Não havia nenhuma evidência de que uma catástrofe tal como o dilúvio haveria de acontecer, nem que isso jamais pudesse acontecer. O preparo para o evento foi um ato de fé por parte de Noé.

Sendo temente a Deus. Noé estava profundamente impressionado com a revelação de que Deus planejava destruir a Terra por um dilúvio, e atendeu às instruções recebidas. No entanto, não foi tanto o medo do dilúvio vindouro que levou Noé a construir a arca, mas a fé no que Deus lhe havia revelado sobre a catástrofe.

Condenou o mundo. A construção da arca testemunhou da decisão de Noé contra “o mundo”, aqui significando os ímpios e seu modo de vida. Sua renúncia ao mundo de então deu testemunho de sua fé em Deus.

Herdeiro da justiça. A fé de Noé, refletida em sua fidelidade em agir de acordo com essa fé, capacitou-o, pela graça de Deus, a ser considerado justo (sobre a justificação pela fé, ver com. de Rm.1:17).

Hb.11:8 8. Pela fé, Abraão, quando chamado, obedeceu, a fim de ir para um lugar que devia receber por herança; e partiu sem saber aonde ia.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Abraão. Ver com. de Gn.12:1-5.

Obedeceu. Ele creu no que Deus lhe disse e agiu em conformidade com isso. Sua fé encontrou expressão na obediência fiel.

Sem saber aonde ia. Abraão e sua família “partiram para a terra de Canaã” (Gn.12:5). Isso não significa, necessariamente, que ele soubesse, no momento da partida, qual seria seu destino. Ele simplesmente “saiu para ir para [o que acabou por ser] a terra de Canaã”.

Obviamente. Deus o instruiu quanto à direção e a rota que deveria seguir.

Hb.11:9 9. Pela fé, peregrinou na terra da promessa como em terra alheia, habitando em tendas com Isaque e Jacó, herdeiros com ele da mesma promessa;

Peregrinou. Por cerca de 215 anos (ver vol. 1, p. 164). Os eventos que ocorreram durante a permanência de Abraão “na terra da promessa” são registrados em Gn.12-25.

Terra da promessa. Ou seja, a terra que Deus prometeu a Abraão.

Terra alheia. Ou, “país estrangeiro”. Abraão, Isaque e Jacó viveram como estrangeiros na terra que Deus lhes havia prometido. Deus não deu a Abraão nenhuma herança em Canaã, “nem sequer o espaço de um pé” (At.7:5).

Herdeiros com ele. A promessa original incluía os descendentes de Abraão, mas Deus repetiu as promessas da aliança a Isaque e, posteriormente, a Jacó.

Hb.11:10 10. porque aguardava a cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e edificador.

A cidade. Aparentemente, não qualquer cidade da terra de Canaã. O objetivo final de Abraão era a herança eterna que Deus providenciara para aqueles que O amam e O servem (comparar com Hb.12:22; Hb.13:14).

Fundamentos. Implicam permanência. Tendas (v. Hb.11:9) não têm fundamentos.

Hb.11:11 11. Pela fé, também, a própria Sara recebeu poder para ser mãe, não obstante o avançado de sua idade, pois teve por fiel aquele que lhe havia feito a promessa.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Sara. Ver Gn.17:15-21; Gn.18:9-15; Gn.21:1-5.

Recebeu poder. Sara tinha 90 anos de idade por ocasião do nascimento de Isaque. Sua situação sem filhos até aquele tempo fez da concepção um milagre demasiado impressionante.

Teve por fiel. Do ponto de vista humano, não havia base para se crer na promessa de Deus de que ela daria à luz um filho. A única maneira de aceitar a promessa era pela fé. Sara a aceitou apenas porque creu em Deus, e o fato de haver aceitado a promessa testemunhou de sua fé.

Hb.11:12 12. Por isso, também de um, aliás já amortecido, saiu uma posteridade tão numerosa como as estrelas do céu e inumerável como a areia que está na praia do mar.

Por isso [...] saiu. Sobre o nascimento de Isaque, ver Gn.21:1-5.

Aliás já amortecido. Abraão tinha cem anos de idade por ocasião do nascimento de Isaque. Ninguém pode ler o registro dos eventos que levaram ao nascimento do filho sem se impressionar com a falta de fé apresentada por Abraão (Gn.15:2-4; Gn.16:1-3; Gn.17:16-17) e Sara (Gn.18:9-15). Mas, finalmente, ambos superaram suas dúvidas naturais, e Isaque foi, pelos dois lados da família, um filho da fé.

Como as estrelas. Ver Gn.15:5; Gn.22:17.

Hb.11:13 13. Todos estes morreram na fé, sem ter obtido as promessas; vendo-as, porém, de longe, e saudando-as, e confessando que eram estrangeiros e peregrinos sobre a terra.

Todos estes. Isto é, os fiéis desde Abel (v. Hb.11:4) até Abraão (v. Hb.11:8-12). Sem dúvida, muitos outros durante esse longo período obtiveram a aprovação de Deus, mas os notáveis aqui nomeados são apontados como exemplos brilhantes do princípio de que a fé é o fator decisivo na vida piedosa.

Morreram na fé. Eles viam as promessas de longe, pela fé. Estavam convencidos da realidade da herança prometida. Com base nessas promessas, eles renunciaram ao presente e viveram exclusivamente para o futuro. Eles nunca entraram na posse da herança, nem da prometida Canaã terrestre nem do reino eterno.

Estavam persuadidos (KJV). Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a omissão destas palavras. Obviamente, no entanto, eles “estavam persuadidos” da realidade substancial da herança prometida, caso contrário, não teriam “abraçado” as promessas.

Saudando-as. Ou, “cumprimentando”, “dando as boas-vindas”, “recebendo” (comparar com Jo.8:56).

Confessando. Ou, “reconhecendo”.

Peregrinos sobre a terra. Embora estivessem no mundo, eles sabiam que não lhe pertenciam. Tinham outro objetivo em vista, mais grandioso. Percebiam a qualidade transitória das coisas na vida presente, e a permanência das coisas que, por um pouco, viam apenas “de longe”, pela fé. Viviam para o futuro, não para o presente.

Hb.11:14 14. Porque os que falam desse modo manifestam estar procurando uma pátria.

Falam desse modo. Ou seja, se declaram “estrangeiros e peregrinos na terra”.

Pátria. Ao declararem-se “estrangeiros e peregrinos sobre a terra”, os notáveis antigos deixaram claro que não consideravam que este mundo atual fosse seu lar. Eles sabiam que há mais para se desfrutar viver do que o mundo atual tem a oferecer.

Hb.11:15 15. E, se, na verdade, se lembrassem daquela de onde saíram, teriam oportunidade de voltar.

Lembrassem. Literalmente, “tivessem em mente”, “estivessem pensando [intensamente] em”.

Oportunidade de voltar. Abraão, sem dúvida, tinha uma boa casa em Harã, como antes, em Ur dos Caldeus. Quando a fome chegou à terra de Canaã (ver Gn.12:10), ele poderia ter razoavelmente pensado em voltar para Harã, onde tinha amigos e parentes próximos. Contudo, Abraão não era alguém que retornaria a uma terra de onde o Senhor o havia instruído a sair.

Hb.11:16 16. Mas, agora, aspiram a uma pátria superior, isto é, celestial. Por isso, Deus não se envergonha deles, de ser chamado o seu Deus, porquanto lhes preparou uma cidade.

Aspiram. Do gr. oregomai, “desejar”, “esforçar-se para”, “aspirar a”. As pessoas de fé vivem com os olhos fixos em algo melhor do que este mundo tem a oferecer. Para elas, só as coisas eternas são dignas de esforços. Elas veem as coisas do tempo e da eternidade em sua verdadeira perspectiva (ver com. de Mt.6:24-34).

Deus não Se envergonha. Ele não Se “envergonha” de ser conhecido como o Deus deles, porque eles refletem Seu caráter. Cristo advertiu que no último grande dia, Ele Se “envergonhará” de cada um que fez a tentativa de “salvar” a própria vida, ganhando o que o mundo tem a oferecer (ver Mc.8:34-38). Por outro lado, aquele que está disposto a “perder” ou arruinar a própria vida por amor a Cristo estará realmente salvando-a.

Preparou. Comparar com Jo.14:1-3; Ap.21:2.

Uma cidade. A Jerusalém celestial (ver Hb.12:22; Hb.13:14).

Hb.11:17 17. Pela fé, Abraão, quando posto à prova, ofereceu Isaque; estava mesmo para sacrificar o seu unigênito aquele que acolheu alegremente as promessas,

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Abraão. Ver Gn.22:1-9.

Posto à prova. Ou, “provado”. O relato desta experiência em Gênesis começa com a afirmação de que “Deus pôs Abraão à prova” (Gn.22:1). Na verdade, Deus sabia previamente o que Abraão faria, e a prova não era necessária no que se refere às informações que Deus queria ter a respeito de Abraão. Mas Abraão precisava passar por essa experiência de prova a fim de que sua fé atingisse a maturidade. Foi a experiência culminante de sua vida.

Ofereceu Isaque. Ver Gn.22:1-19.

Unigênito. Do gr. monogenes, literalmente, “único”, “exclusivo” (ver com. de Jo.1:14). Numericamente falando, Isaque não foi o “unigênito” de Abraão, nem mesmo seu primogênito. Isaque era “unigênito” no sentido de que era o único dos filhos de Abraão qualificado para ser o herdeiro da aliança (ver com. do v. Hb.11:18).

Hb.11:18 18. a quem se tinha dito: Em Isaque será chamada a tua descendência;

Em Isaque. Tendo em vista as repetidas e enfáticas declarações divinas, de que Isaque deveria ser o único meio para o cumprimento das promessas da aliança, foi uma demonstração extraordinária de fé por parte de Abraão dispor-se a cumprir as instruções de oferecer Isaque como vítima sacrificial. Deve ter parecido a Abraão que Deus estava a ponto de tornar o cumprimento de Suas promessas absolutamente impossível. A inserção dessa citação (Gn.21:12) neste ponto do comentário do autor sobre a fé demonstrada por Abraão explica o sentido em que ele se refere a Isaque como “unigênito” de Abraão (Hb.11:17). Isaque era o único filho de Abraão que poderia se qualificar como sucessor das promessas da aliança feitas ao patriarca.

Hb.11:19 19. porque considerou que Deus era poderoso até para ressuscitá-lo dentre os mortos, de onde também, figuradamente, o recobrou.

Considerou. Ou, “calculou”. Foi a fé no poder de Deus para ressuscitar Isaque que deu a Abraão a coragem de partir para o sacrifício de seu filho. Só assim poderia o idoso patriarca conciliar a promessa de Deus de que Isaque deveria ser seu herdeiro, com a ordem de tirar a vida do rapaz, ter fé na integridade de uma pessoa que faz uma promessa e que requer algo que pareça ser tão mutuamente exclusivo é o máximo de perfeição da fé. Abraão deve ter percebido que Deus estava testando-o, e concluiu que, se necessário, Ele ressuscitaria Isaque. Tendo em vista que, até aquele momento, nenhum ser humano havia ressuscitado, essa foi uma fé da mais alta ordem.

De onde também [...] o recobrou. No que se refere a Abraão, seu filho Isaque estava morto. Quando Deus deteve a prova e restaurou Isaque a seu pai, isso foi como se o filho tivesse realmente voltado da morte.

Figuradamente. Ou, “falando figurativamente”.

Hb.11:20 20. Pela fé, igualmente Isaque abençoou a Jacó e a Esaú, acerca de coisas que ainda estavam para vir.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Isaque abençoou a Jacó. Ver Gn.27:1-40.

Coisas que ainda estavam para vir. Ao perceber o engano que havia sido praticado contra ele, o futuro de sua família, para Isaque, deve ter parecido sombrio. Seus planos para Esaú tinham sido quebrados. Ele estava fisicamente cego, mas ergueu os olhos da fé e discerniu a forma das “coisas [...] por vir”, a maneira pela qual o propósito infinito de Deus deveria ser realizado.

Hb.11:21 21. Pela fé, Jacó, quando estava para morrer, abençoou cada um dos filhos de José e, apoiado sobre a extremidade do seu bordão, adorou.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Jacó. Ver Gn.48:1-22. Jacó peregrinou e acabou morrendo em uma terra de exílio. Assim, ele revelou fé nas promessas divinas quando pronunciou bênçãos sobre seus filhos.

Hb.11:22 22. Pela fé, José, próximo do seu fim, fez menção do êxodo dos filhos de Israel, bem como deu ordens quanto aos seus próprios ossos.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

José. Ver Gn.50:24-25; Ex.13:19. José não tinha nenhuma prova concreta sobre a qual basear sua expectativa de que a família retornaria e ocuparia a terra de Canaã. Seu pedido para ser sepultado na terra prometida, quando a família voltasse a residir ali, expressava fé nas promessas de Deus.

Hb.11:23 23. Pela fé, Moisés, apenas nascido, foi ocultado por seus pais, durante três meses, porque viram que a criança era formosa; também não ficaram amedrontados pelo decreto do rei.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Moisés. Ver Ex.2:1-10. Durante a infância de Moisés, foi a fé de seus pais que triunfou sobre o “decreto do rei”. Foi a fé em um destino mais elevado que a servidão no Egito que levou Anrão e Joquebede a agir em contravenção ao decreto real. Quando atingiu a maturidade, Moisés exibiu o mesmo tipo de fé, como o escritor de Hebreus passa a relatar (ver Hb.11:24-29).

Hb.11:24 24. Pela fé, Moisés, quando já homem feito, recusou ser chamado filho da filha de Faraó,

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Moisés. Sobre os incidentes referidos nos v. Hb.11:24-29, ver Ex.2:11-25; Ex.12:18-36; Ex.14:10-31.

Recusou. Moisés recusou a honra, a posição e o poder, por causa de sua confiança no elevado destino que Deus havia assinalado para ele e seu povo. Ao que tudo indica, nada poderia ser mais inútil do que a esperança em uma coisa dessas, visto que o povo hebreu estava em abjeta servidão à nação mais poderosa da Terra. Só a fé nas promessas de Deus poderia levá-lo a recusar o trono do Egito.

Filho da filha de Faraó. Ver com. de Ex.2:5; Ex.2:10; Ex.2:15; cf. vol. 1, p. 171.

Hb.11:25 25. preferindo ser maltratado junto com o povo de Deus a usufruir prazeres transitórios do pecado;

Preferindo. Sua escolha estava entre o trono do maior império do mundo e a associação a uma nação de escravos.

Maltratado. Mesmo como líder do povo hebreu, ele estava sujeito a ser “maltratado”. O povo era irremediavelmente obstinado, rebelde e murmurador. Sob qualquer ponto de vista, o destino que ele escolheu tinha pouco a oferecer em termos de poder mundano e renome.

Prazeres transitórios do pecado. Moisés poderia ter raciocinado que, como rei do Egito, ele estaria em posição ideal para libertar seu povo. Mas o governante do Egito também era um sacerdote em seu sistema religioso idólatra. Além disso, ele sempre teria estado sujeito às influências corruptoras da vida na corte (ver com. de Ex.2:11).

Hb.11:26 26. porquanto considerou o opróbrio de Cristo por maiores riquezas do que os tesouros do Egito, porque contemplava o galardão.

Opróbrio de Cristo. Isto é, “opróbrio” sofrido por Cristo ou por causa de Cristo. Moisés compreendeu a promessa do Messias e percebeu que havia mais coisas envolvidas na libertação dos hebreus do Egito do que ele ou os egípcios percebiam na época. De longe, o olho da fé contemplou a vinda do descendente prometido a Abraão por meio de quem todas as nações seriam abençoadas (ver Gn.22:18; Gl.3:8; Gl.3:16).

Tesouros do Egito. Estes incluíam a terra com toda a sua riqueza, o serviço de todo o povo, o esplendor da corte e o poder do trono e seus exércitos.

Contemplava. Literalmente, “olhava atentamente”. Seus olhos se fixavam nas promessas e nos privilégios da aliança. Como Paulo, quinze séculos mais tarde (ver Fp.3:7-8), Moisés voluntariamente trocou a impressionante e pomposa glória e o poder do presente, pelos menos óbvios, até mesmo invisíveis privilégios e promessas da aliança.

Galardão. Do gr. misthapodosia, simplesmente, “recompensa”. O galardão mais remoto, que só poderia ser visto com os olhos da fé, apelou mais fortemente a Moisés do que as recompensas mais imediatas e materiais que acompanhavam o trono do Egito.

Hb.11:27 27. Pela fé, ele abandonou o Egito, não ficando amedrontado com a cólera do rei; antes, permaneceu firme como quem vê aquele que é invisível.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Abandonou o Egito. Ver Ex.2:15.

Não ficando amedrontado. Observando as circunstâncias da fuga de Moisés, do Egito para Midiã, com 40 anos de idade, alguns atribuíram a saída mencionada no v. Hb.11:27 para o êxodo, à idade de 80 anos. É verdade que a palavra kataleipõ, “abandonou”, pode significar simplesmente “ir embora”, sem que isso implique mais do que uma simples partida. Também é verdade que Moisés enfrentou corajosamente um governante colérico durante todo o tempo das pragas, e que, por si só, o v. 27 pode ser considerado aplicável ao êxodo. No entanto, nesse breve resumo dos incidentes da vida de Moisés, que refletem sua fé, parece que os v. Hb.11:28-29; foram destinados a cobrir o êxodo. A repetição da expressão “pela fé” no v. 27 parece indicar que o escritor estava considerando que a ocasião ali referida é realmente distinta dos outros incidentes na sequência sobre a fé demonstrada por Moisés (cf. v. Hb.11:23-24; Hb.11:28-29; comparar com Ed, 63, 64). A partir da narrativa de Ex.2:11-15 (cf. Ex.4:19), parece que o medo de Moisés pela segurança pessoal desempenhou um papel na decisão de fugir da terra do Egito.

No entanto, em primeiro lugar, em sua mente, estava o destino de seu povo e o papel previsto para este, na promessa feita a Abraão. Na verdade, sua fuga foi precipitada, quando tentou desencadear um processo de libertação (ver At.7:25). Apesar de seu erro, aparentemente, ele tinha fé em que, de alguma forma, Deus ainda o usaria para realizar a libertação. Assim, ele buscou um refúgio temporário onde pudesse aguardar novos acontecimentos. Mesmo antes do incidente com o feitor egípcio, era necessária muita fé para crer que as promessas da aliança seriam cumpridas, independentemente das circunstâncias. Uma vez que um erro de julgamento o havia banido do Egito por completo, Moisés deve ter necessitado ainda mais fé para crerem seu cumprimento. Como poderia um desamparado exilado em Midiã, cuja morte tinha sido decretada por um edito imperial, esperar levar a libertação aos escravos do monarca que procurava sua morte? Nada poderia parecer mais impossível! Aqui, mais do que nunca, havia a oportunidade para o exercício da fé.

Hb.11:28 28. Pela fé, celebrou a Páscoa e o derramamento do sangue, para que o exterminador não tocasse nos primogênitos dos israelitas.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Celebrou a Páscoa. Ver Ex.12:1-36.

Após a nona praga, o faraó colocou Moisés sob a ameaça de morte caso comparecesse novamente à presença real (ver Ex.10:28). Deve ter requerido muita fé por parte de Moisés baixar as instruções em relação à décima praga, a Páscoa e o êxodo. Durante as primeiras nove pragas, o faraó se recusou a deixar os israelitas saírem. Não havia nenhuma razão humana para acreditar que ele o faria sob a décima praga.

Hb.11:29 29. Pela fé, atravessaram o mar Vermelho como por terra seca; tentando-o os egípcios, foram tragados de todo.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Atravessaram o Mar Vermelho. Ver Ex.14:10-31. A libertação do povo escolhido de Deus, pelo Mar Vermelho, é referida com mais frequência em todo o AT do que qualquer outra manifestação da providência divina em toda a história israelita. A grandeza da libertação reflete a magnitude da crise, e a magnitude da crise é uma medida do grau de fé requerido de Moisés, como o representante designado por Deus.

Hb.11:30 30. Pela fé, ruíram as muralhas de Jericó, depois de rodeadas por sete dias.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Muralhas de Jericó. Ver Js.6:1-24. Do ponto de vista militar, o procedimento tomado por Josué para subjugar Jericó era loucura, mas as ordens emitidas estavam de acordo com as instruções dadas por Deus. Como um general experiente, ele poderia muito bem ter mudado para o que teria parecido um plano melhor. No entanto, Josué era homem de grande experiência militar, bem como de muita fé, e estava pronto a confiar mais na vontade revelada de Deus do que em seu próprio conhecimento de guerra. Sua fidelidade no cumprimento do plano de batalha revelado por Deus testemunhou eloquentemente de sua destreza como homem de fé.

Hb.11:31 31. Pela fé, Raabe, a meretriz, não foi destruída com os desobedientes, porque acolheu com paz aos espias.

Pela fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Raabe. Ver Js.2:1-24; Js.6:23-25. À primeira vista, o nome de Raabe pode parecer fora de lugar nesta lista de heróis da fé, pois ela era pagã, além de prostituta. Mas esse fato torna seu ato de fé ainda mais notável (sobre as atitudes dela, ver Js.2:8-13). Seu nome também ocorre na genealogia de Mateus (ver com. de Mt.1:5) como uma entre os honrados antepassados de Cristo.

Hb.11:32 32. E que mais direi? Certamente, me faltará o tempo necessário para referir o que há a respeito de Gideão, de Baraque, de Sansão, de Jefté, de Davi, de Samuel e dos profetas,

Que mais direi? A lista poderia ser estendida indefinidamente, mas suficientes ilustrações foram apresentadas para provar o princípio de que a fé e a fidelidade são a essência da vida cristã.

Faltará o tempo. O propósito do escritor não era preparar um catálogo de todos os fiéis de Deus ao longo dos séculos, mas apenas ilustrar seu ponto de vista de que a fé e a fidelidade são essenciais para a paciente espera pela vinda do Senhor e o cumprimento de Suas promessas. A emocionante descrição pode ter tomado mais espaço do que ele pretendia a princípio, e ele percebe que o espaço não permitia uma extensão do que se provou um clímax digno para o tema do livro. Ele começou provando que temos um grande sumo sacerdote que ministra em nosso favor no santuário celestial, a fim de apelar a todos os cristãos para que entrem pela fé em Sua presença (ver Hb.4:14; Hb.4:16). No capítulo 11, ele mostra que, pela fé, os notáveis do passado viveram, por assim dizer, na própria presença de Deus. Visto que eles desfrutaram esse privilégio e foram capazes de se manter fiéis, nós também podemos.

Gideão. Ver Jz.6; Jz.7.

Baraque. Ver Jz.4; Jz.5.

Sansão. Ver Jz.13-16.

Jefté. Ver Jz.11.

Davi. As façanhas de Davi tomam grande parte dos livros históricos de 1 e 2 Samuel e parte de outros livros.

Samuel. O ministério de Samuel como sacerdote, profeta e juiz é registrado em 1Sm.2-25.

Dos profetas. Quase como se fossem um só homem, os profetas sofreram por causa de seu testemunho fiel sobre Deus (ver At.7:52).

Hb.11:33 33. os quais, por meio da fé, subjugaram reinos, praticaram a justiça, obtiveram promessas, fecharam a boca de leões,

Por meio da fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3. O escritor não se cansa de mencionar a fé como a essência da vitória sobre todos os obstáculos. Longas listas de heróis podem ser compiladas para quase todas as categorias de realização mencionadas nos v. Hb.11:33-37, mas basta dizer que cada categoria é um brilhante exemplo de vitória pela fé.

Subjugaram reinos. Como Josué e Davi.

Praticaram a justiça. Como Samuel e Elias. A expressão também pode ser traduzida como “produziram justiça” ou “impuseram a justiça”. Inúmeros juizes e reis poderiam ser incluídos nesta última categoria.

Obtiveram promessas. Como Abraão, Josué e Daniel.

Fecharam a boca de leões. Como Sansão, Davi e Daniel.

Hb.11:34 34. extinguiram a violência do fogo, escaparam ao fio da espada, da fraqueza tiraram força, fizeram-se poderosos em guerra, puseram em fuga exércitos de estrangeiros.

Extinguiram [...] fogo. Como os três hebreus valorosos em Babilônia.

Escaparam ao fio da espada. Como os dois espias em Jericó, e como Davi diante de Saul.

Da fraqueza. Reis como Ezequias e Josafá.

Tiraram força. Como Sansão.

Puseram em fuga. Como Josué, Débora e Baraque e Gideão.

Hb.11:35 35. Mulheres receberam, pela ressurreição, os seus mortos. Alguns foram torturados, não aceitando seu resgate, para obterem superior ressurreição;

Receberam [...] os seus mortos. Como a mulher sunamita e a viúva de Sarepta.

Torturados. Como o profeta Jeremias.

Não aceitando seu resgate. Isto é, para escapar da tortura, ao preço de serem desleais aos princípios.

Para obterem. Como um só homem, esses notáveis do passado se mostraram corajosos e fiéis em face de dificuldades e perigos, por causa da fé em seu coração de que Deus iria cumprir todas as Suas promessas. Eles creram que o futuro da herança dos justos é digno de todos os sacrifícios e de todo sofrimento que podiam enfrentar ou passar na vida presente.

Hb.11:36 36. outros, por sua vez, passaram pela prova de escárnios e açoites, sim, até de algemas e prisões.

Escárnios e açoites. Estes, juntamente com as “cadeias e prisões”, foram a experiência de homens como José, Jeremias e Paulo.

Hb.11:37 37. Foram apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos a fio de espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos, maltratados

Apedrejados. Como Nabote, de Jezreel, e Estêvão.

Provados. Ou, “testados”. Pode ser elaborada uma longa lista de homens e mulheres nobres que passaram com êxito pelas grandes provas de sua vida.

Serrados pelo meio. Segundo a tradição, este foi o destino de Isaías.

Mortos a fio da espada. Como Gedalias, os sacerdotes de Nobe e Tiago, irmão de João.

Andaram peregrinos. Como Elias e Davi.

Hb.11:38 38. (homens dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, pelos montes, pelas covas, pelos antros da terra.

O mundo não era digno. O mundo não percebe quanto deve a essas pessoas dignas, que são, na realidade, “o sal da terra” (ver com. de Mt.5:13). Hoje, o mundo não aprecia as contribuições feitas para o bem-estar da humanidade por pessoas que procuraram aplicar os princípios cristãos na solução de seus problemas.

Errantes. Ver com. do v. Hb.11:37.

Hb.11:39 39. Ora, todos estes que obtiveram bom testemunho por sua fé não obtiveram, contudo, a concretização da promessa,

Obtiveram bom testemunho. Ou, “embora bem comprovados” (ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:4).

Por sua fé. Ver com. dos v. Hb.11:1; Hb.11:3.

Não obtiveram [...J a concretização da promessa. Sua fidelidade nos momentos de crise, muitas vezes, proveu marcante ajuda ou libertação, mas não entraram na herança prometida a Abraão e aos pais (ver com. do v. Hb.11:13).

Hb.11:40 40. por haver Deus provido coisa superior a nosso respeito, para que eles, sem nós, não fossem aperfeiçoados.

Provido. Do gr. problepo, “prever”. A palavra “prover” também significa, literalmente, “prever”, sendo originária do latim pro, “antes”, e videre, “ver”. Deus previu o fim desde o começo. Ele sabia que em épocas futuras, haveria outras multidões de fiéis homens, mulheres, jovens e crianças. Em Sua infinita sabedoria, Ele ordenou que os fiéis de todas as épocas entrassem juntos na herança eterna (ver com. de 1Co.15:51-52; 1Ts.4:16-17; 2Tm.4:7-8). Quanto ao grande dom da vida eterna, ninguém teria vantagem ou prioridade, em detrimento de outros.

Coisa superior. Não é algo melhor do que Ele pretendia conceder aos fiéis dos séculos passados. Mas, do nosso ponto de vista, foi melhor que Deus nos tenha concedido a oportunidade de nos juntar a eles.

Sem nós. Na providência de Deus, foi-nos concedido tempo para desenvolver o caráter e nos preparar para a entrada na herança eterna dos santos. A oportunidade é nossa, como no passado foi deles. Na abertura do Hb.12, o escritor faz sua conclusão: “Desembaraçando-nos de todo peso [...] corramos, com perseverança...”

Aperfeiçoados. Do gr. teleioo, aqui, no passivo, “ser concluídos”, “ser levados à perfeição” (sobre o adjetivo relacionado teleios, ver com. de Mt.5:48). Aqui, ser “aperfeiçoados” é entrar na herança eterna prometida a Abraão e aos pais (ver com. de Hb.10:35-38).

Hb.12:1 1. Portanto, também nós, visto que temos a rodear-nos tão grande nuvem de testemunhas, desembaraçando-nos de todo peso e do pecado que tenazmente nos assedia, corramos, com perseverança, a carreira que nos está proposta,

Portanto. Hebreus 12:1 e 2 constitui a conclusão que o escritor faz do Hb.11. A divisão de capítulos deveria ocorrer entre os v. Hb.12:2-3.

Rodear-nos. Ou, “cercar-nos”. Em todas as épocas da história sagrada encontramos “testemunhas” do princípio de que a fé e a fidelidade triunfam sobre todos os obstáculos.

Nuvem de testemunhas. Ou, “hoste de testemunhas”. A metáfora do v. 1 mostra o cristão como um atleta fazendo os preparativos finais para uma corrida em um estádio antigo, com os espectadores sentados nas arquibancadas por todos os lados. O atleta, decidido a vencer a corrida, olha momentaneamente a massa de rostos que o rodeia como uma nuvem. Aqui, as “testemunhas” são os muitos notáveis da fé mencionados em Hb.11, cada um dos quais, apesar das dificuldades e obstáculos de todo tipo, completou a carreira. Sua fidelidade e resistência os levou, à vitória na corrida da fé. Consciente de que os olhos dos fiéis de todas as épocas estão atentamente fixos nele, por assim dizer, o atleta cristão tem um impulso urgente de fazer todo o esforço para vencer a corrida que lhe foi atribuída. As competições atléticas gregas tinham sido muito populares em todo o mundo mediterrâneo, e a ilustração de Hb.12:1 seria familiar a todos os leitores. O autor de Hebreus faz uso figurativo constante da corrida para representar sua carreira como missionário aos gentios (Gl.2:2; Fp.2:16; 2Tm.4:7) ou, como aqui, para representar a experiência da vida do cristão (ver 1Co.9:24-27).

Peso. Do gr. ogkos, “fardo”, “empecilho”, aqui, neste último sentido. Na metáfora do v. 1, ogkos se refere ao peso de qualquer coisa supérflua, como as roupas, que tenderiam a dificultar ou prejudicar o corredor. As pessoas motivadas pela fé não hesitam em abrir mão de qualquer coisa que as impeça de alcançar seu objetivo. O autor deixa a cada leitor a tarefa de descobrir o que pode estar impedindo seu progresso como corredor cristão. Nessa corrida, cada participante poderá vencer, pois não está competindo com os outros, mas consigo mesmo. Não é necessário se destacar dos concorrentes nem vencer uma marca alcançada por algum concorrente anterior. O eu é seu único concorrente, e a única exigência é que ele exerça fidelidade e paciência em sua competição com o próprio eu e, pela graça de Cristo, vença todo “peso” e toda tendência para o mal.

Pecado. Todos têm algum pecado que os assedia, alguma tendência para o mal, que os procura impedir enquanto seguem na corrida. Quando se obtém a vitória sobre uma propensão particular para o mal, outra toma seu lugar e tenta conquistar o domínio. É privilégio de cada cristão alcançar a vitória a cada passo do caminho. Assim, o caminho da salvação é marcado por uma batalha depois da outra. Independentemente do pecado que tão de perto nos assedia, devemos colocá-lo de lado, assim como o corredor antigo deixava de lado suas vestes esvoaçantes e se preparava para a corrida.

Tenazmente nos assedia. Ou, “facilmente nos distrai”. Alguns sugerem que “agarrar fortemente” pode ter sido o sentido original. Por mais que um pecado nos detenha e por mais doloroso que seja o processo de separação, ele deve ser deixado para trás, uma vez que a vitória na corrida da vida é o alvo a ser atingido.

Corramos. Ou seja, a corrida cristã, as experiências por meio das quais o caráter é desenvolvido.

Perseverança. Do gr. hupomone, “paciência”, “resistência”, “fortaleza”, “firmeza”. Sendo a corrida cristã uma experiência ao longo da vida, é necessário perseverança, diante das sucessivas dificuldades e decepções, e paciência para aguardar a recompensa no final do percurso. Advertências à paciência são recorrentes em Hebreus (ver Hb.3:6; Hb.4:14; Hb.6:1; Hb.6:11-12; Hb.10:23; Hb.10:36-39, etc.).

Hb.12:2 2. olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus.

Olhando [...] Jesus. Isto é, buscando graça e força para vencer as dificuldades e perseverar até o fim. Pedro descobriu, ao andar sobre as ondas agitadas pelos ventos da Galileia (ver Mt.14:24-32), que é perigoso desviar os olhos do Salvador, mesmo que por um momento. Manter os olhos da fé fixos em Jesus é manter contato ininterrupto com a fonte do poder que nos fortalece para resistir e vencer.

Autor. Do gr. archegos, “líder”, “fundador”, “pioneiro”. Archegos é traduzido como “autor” (At.3:15) e “príncipe” (At.5:31), com referência a Cristo. Ele é o centro do plano da salvação e a fonte de toda graça. Ele chama os caídos para sair das trevas do pecado para a gloriosa luz do evangelho. Ele os purifica de sua anterior vida de pecado e os qualifica para se tornarem filhos e filhas de Deus. Ele os justifica por Sua graça, em virtude de Sua expiação no Calvário. Ele firma seus pés no caminho para o Céu.

Consumador. Do gr. teleiotes, “aperfeiçoador”. O trabalho de justificação é apenas o início da experiência cristã. Não devemos apenas estabelecer a “base do arrependimento de obras mortas”, mas devemos “[deixarnos] levar para o que é perfeito” (ver com. de Hb.6:1). Devemos “[crescer] na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2Pe.3:18). Devemos obter vitória após vitória sobre “o pecado que tenazmente nos assedia” (ver com. de Hb.12:1) e “[crescer] em tudo nAquele que é a cabeça, Cristo” (Ef.4:15)”. Nosso caráter deve ser transformado “pela renovação da mente” (Rm.12:2). Esse é o trabalho de Cristo habitando em nós (Gl.2:20) como o “consumador” da fé. Essa é a obra da santificação (ver com. de Mt.5:48).

Fé. A fé como um princípio ativo na vida.

Em troca da. Do gr. anti, “em vez de”, “em oposição a”, “em consideração a”. Cristo suportou a cruz, em troca da perspectiva de um universo livre do pecado.

Alegria. Se for adotado, para anti, o significado “em consideração a”, o versículo seria entendido da seguinte forma: Olhando para a cruz do ponto de vista humano, podemos dizer que foi a fé no futuro resultado do sofrimento e da morte que deu a Cristo força para suportar a vergonha e ignomínia. Ele sabia que iria viver para ver os resultados do “penoso trabalho de Sua alma e [ficaria] satisfeito” (ls.53:11). Compartilhar a eternidade com os resgatados de todas as épocas e com os seres não caídos de outros mundos era uma perspectiva de alegria absoluta ao Senhor enquanto sofria no Getsêmani e na cruz (ver com. de Mt.5:12; Tg.1:2). Se, para anti, for adotado o significado de “em vez de”, a passagem diria que Cristo escolheu suportar a cruz em troca da alegria ao Seu alcance, seja a alegria da existência anterior à encarnação ou da existência encarnada após a cruz.

Suportou a cruz. Cristo “suportou a cruz” a fim de que tenhamos força para resistir em nossos conflitos individuais com os poderes das trevas. Ele suportou a cruz afim de obter a coroa. O Autor de nossa salvação foi aperfeiçoado “por meio de sofrimentos” (Hb.2:10); e, quando aprendemos a suportar a cruz que somos chamados a levar, também podemos ser encontrados perfeitos nEle, na Sua vinda. Assim como uma alegria futura inspirou Cristo a suportar a cruz, nas experiências difíceis e probantes da vida, é nosso privilégio viver pela expectativa da alegria da eternidade.

Não fazendo caso da ignomínia. Ou, “desconsiderando a vergonha”, “não levando em conta a vergonha”. “Os sofrimentos do tempo presente” não são nada em comparação com “a glória a ser revelada” (Rm.8:18); portanto, devem ser desconsiderados. Podemos “[exultar], embora, no presente, por breve tempo, se necessário, [sejamos] contristados por várias provações” (1Pe.1:6). Assim como Paulo, podemos contar como perda das coisas terrenas, “por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus” (ver Fp.3:8).

Está assentado. A forma verbal do grego sugere que Cristo não apenas Se assentou à destra do Pai, mas que preservou essa posição de honra desde então.

A destra. Ver com. de Hb.1:3.

Hb.12:3 3. Considerai, pois, atentamente, aquele que suportou tamanha oposição dos pecadores contra si mesmo, para que não vos fatigueis, desmaiando em vossa alma.

Considerai. Os v. 3 a 11 tratam da natureza, do propósito e dos resultados da disciplina divina. Nenhum cristão é chamado a se submeter a um processo de disciplina mais rigoroso do que Cristo foi. Quando se considera a maneira pela qual Ele experimentou as provas e tentações, pode-se evitar o cansaço ou a covardia. Cristo resistiu e, por Sua graça, também é possível resistir.

Suportou. Ver com. do v. Hb.12:1.

Oposição. Ou, “hostilidade”. A hostilidade dos sacerdotes e príncipes, escribas e fariseus perseguiu os passos de Cristo em todo o Seu ministério terrestre. Finalmente, a maré popular se voltou contra Ele, e Seu próprio povo exigiu Sua morte. A hostilidade dos líderes judeus foi dirigida com toda força do engenho diabólico sobre o Príncipe dos sofredores.

Para que não vos fatigueis. Um olhar sobre o fardo que Cristo levou fará nossos fardos parecerem comparativamente leves (ver Mt.11:28-30). Se olharmos para Jesus e considerarmos o que Ele suportou, as dificuldades e decepções serão suportadas mais facilmente.

Hb.12:4 4. Ora, na vossa luta contra o pecado, ainda não tendes resistido até ao sangue

Não tendes resistido até ao sangue. Ou seja, até a morte. Aqui, a metáfora dos v. Hb.12:1-2 muda um pouco. O cristão ainda está na arena com a figurativa “nuvem de testemunhas” olhando fixamente para ele; então, ele é confrontado por um oponente que espera envolvê-lo num combate mortal. O cristão ainda não experimentou tudo o que o mal pode fazer contra ele, nem deve pensar que está sofrendo mais na sua luta contra o pecado do que Deus pode legitimamente esperar dele (ver 1Co.10:13). No entanto, desembaraçando-se do pecado que o assedia, ele é chamado a resistir à tentação com toda a firmeza resoluta que empregaria para enfrentar um antagonista em uma batalha fatal. Cristo Se envolveu nesse combate com os poderes das trevas, uma luta que atingiu o clímax no Getsêmani e na cruz. Os mártires igualmente “resistiram até o sangue”. No entanto, aqueles a quem o livro de Hebreus foi escrito ainda não tinham sido chamados a cumprir o que Cristo e os mártires enfrentaram.

Hb.12:5 5. e estais esquecidos da exortação que, como a filhos, discorre convosco: Filho meu, não menosprezes a correção que vem do Senhor, nem desmaies quando por ele és reprovado;

Estais esquecidos. O texto grego pode ser tomado como uma pergunta ou como uma declaração. Uma pergunta parece ser mais forte e, ao mesmo tempo, menos severa. Uma criança pode perceber que seu castigo é justo e merecido, mas pode achar que não é aplicado por amor. Muitas vezes, os cristãos são propensos a ignorar o valor disciplinar das experiências difíceis, e esse descuido os priva de preciosas lições que poderiam aprender. Muitas vezes, eles se ressentem do fato de Deus permitir que essas experiências lhes sobrevenham e se queixam de sua situação.

Exortação. Do gr. paraklesis, “encorajamento”, “consolação” (sobre paraklesis e palavras relacionadas, ver com. de Mt.5:4; Jo.14:16).

Filhos. A instrução dos v. Hb.12:5-11 trata da relação pai-filho e está centrada no desejo do pai de que o filho aprenda certas lições necessárias para seu sucesso na vida.

Discorre. A citação nos v. 5 e 6 é de Pv.3:11-12.

Filho meu. Forma de tratamento comum em Provérbios, do qual a citação é tomada. Sugere a solicitude de um pai amoroso.

Menosprezes. Do gr. oligoreo, “pensar levianamente sobre”, “considerar algo levianamente”, isto é, não levar a sério. O objetivo da disciplina é causar uma impressão. A disciplina que causa pouca ou nenhuma impressão não serve a um propósito útil.

A correção. Do gr. paideia, “educação”, “treinamento”, “instrução”, “disciplina” (ver com. de Ef.6:4); de paidion, “criança”. Disciplina é o treinamento que corrige, molda, fortalece e aperfeiçoa o caráter. Muitas vezes, a palavra fica restrita ao significado limitado de punição ou castigo. A disciplina tem sido definida como a arte de fazer discípulos, na medida em que discípulo é aquele que se submete a determinado padrão de disciplina ou treinamento. A palavra grega paideia pode incluir, mas não especificamente denotar, a disciplina corretiva, como está implícito nas palavras “punição” e “castigo”. Paideia se refere a todo o processo pelo qual as crianças são preparadas para as responsabilidades da vida adulta.

Do Senhor. As experiências da vida são todas “do Senhor”, no sentido de que nada pode nos acontecer sem Sua permissão. Deus nunca é o autor do sofrimento e da tristeza, embora Ele possa permiti-los, às vezes (ver com. de 2Cr.18:18; Jó.42:5; SI.38:3; Sl.39:9).

Desmaies. Do gr. ekluo, “cansar-se”, “desistir”, “perder a coragem”. Um discípulo covarde nunca se formará na escola da experiência. Aquele que perde a coragem e pensa em desistir é convidado a voltar os olhos para Jesus e “considerá-Lo” (ver com. dos v. Hb.12:2-3). Acima de tudo, deve se lembrar de que Deus não está irado com ele, mas que o ama como um pai e que tenta ajudá-lo a aprender uma lição necessária. Muitas vezes, não é a disciplina em si, mas a atitude diante dela que dificulta a vida.

Reprovado. Do gr. elegcho, “corrigir”, “punir”, “disciplinar”. Não é bom ser repreendido ou corrigido e muito menos submeter- se à punição. A reação natural e mais fácil é de resistir e escapar. A atitude sábia é tirar proveito dela.

Hb.12:6 6. porque o Senhor corrige a quem ama e açoita a todo filho a quem recebe.

A quem ama. A disciplina paciente e persistente é uma expressão de afeição solícita. As experiências destinadas a enobrecer e aperfeiçoar o caráter constituem a melhor prova de que o Senhor nos ama. Quer se trate de uma criança ou de um cristão adulto, a disciplina é essencial para o caráter.

Açoita. Deus administra toda disciplina necessária para a formação do caráter, ou permite experiências que alcancem esse objetivo (ver com. do v. Hb.12:5). No entanto, a declaração não deve ser lida literalmente, como se Deus pessoalmente ou diretamente autorizasse ou ordenasse o sofrimento e a tristeza que acompanham as experiências disciplinares (ver com. do v. Hb.12:5).

Todo filho. O cristão se relaciona com Deus como filho do Pai celestial (ver com. de Mt.6:9; 1Jo.3:1).

A quem recebe. Ou seja, cada um a quem recebe como filho. Todo filho de Deus alcança esse status por adoção na família celestial.

Hb.12:7 7. É para disciplina que perseverais (Deus vos trata como filhos); pois que filho há que o pai não corrige?

É para disciplina que perseverais. Ver com. dos v. Hb.12:3; Hb.12:5. Evidências textuais (cf. p. xvi) apoiam a variante “perseverai até o castigo”, uma frase imperativa, sendo uma advertência com base no princípio afirmado no v. Hb.12:6. Frequentemente, oramos por vitória sobre pecados particulares; então, descobrimos que Deus permite certas circunstâncias para nos ajudar a desenvolver resistência nos próprios pontos em que estamos fracos. Devemos reconhecer a resposta de Deus às nossas orações e não vacilar diante das provas.

Deus vos trata como filhos. Geralmente, as pessoas são relutantes em administrar disciplina a quem não é filho. Porém, pais sábios não hesitam em disciplinar os próprios filhos, quando necessário. A disciplina é prerrogativa, dever e responsabilidade dos pais. Assim, em certo sentido, a administração da disciplina é uma prova de paternidade.

Que filho [...]? Ninguém nasce com caráter amadurecido. Portanto, todos precisam de disciplina, a fim de preencher um lugar útil no mundo e ser uma honra para a família.

Hb.12:8 8. Mas, se estais sem correção, de que todos se têm tornado participantes, logo, sois bastardos e não filhos.

Sem correção. Os filhos que não recebem disciplina ficam privados da preparação necessária para os deveres e responsabilidades da vida. Os pais que retêm a disciplina terão que prestar contas perante Deus. Não seria justo que o Pai celestial deixasse de disciplinar ou que protegesse de circunstâncias e situações que têm valor disciplinar.

Bastardos. Ou, “filhos ilegítimos".

Hb.12:9 9. Além disso, tínhamos os nossos pais segundo a carne, que nos corrigiam, e os respeitávamos; não havemos de estar em muito maior submissão ao Pai espiritual e, então, viveremos?

Além disso. Há ainda um ponto de comparação entre a disciplina dos pais terrenos e a do Pai celestial.

Pais segundo a carne. Ou seja, pais terrenos.

Respeitávamos. Este é o oposto de desprezar (ver com. do v. Hb.12:5). O respeito à autoridade devidamente constituída, seja do lar, seja da sociedade ou de Deus, é fundamental para a paz, harmonia e segurança.

Estar em [...] submissão. Ou, “submeter-se”. Por que não haveríamos de reconhecer, apreciar e nos beneficiar da disciplina do Senhor? Devemos ser menos receptivos à disciplina do Pai celestial do que as crianças devem ser para com seus pais terrenos?

Dos espíritos (ARC). Do gr. pneumata, “ser vivo” ou, possivelmente, “vida” (ver com. de Lc.8:55). “Pai dos espíritos” se refere a Deus como fonte de toda vida. Esta expressão está em contraste com “nossos pais segundo a carne” (ver Hb.12:10). O argumento é do menor para o maior: se respeitamos a disciplina de um pai terreno, a quem devemos o nascimento, quanto mais devemos estar em “submissão” à correção do Pai celestial, a quem devemos a própria vida? A palavra “espíritos” está em contraste com “carne”. Ambas se referem a seres humanos vivos, como deixa claro o contexto e a construção do texto grego. Todo o contexto trata com o modo de Deus, como Pai celestial, de disciplinar Seus filhos. O texto diz, literalmente: “os espíritos”, que, no grego idiomático, é equivalente a “nossos espíritos ”.

Hb.12:10 10. Pois eles nos corrigiam por pouco tempo, segundo melhor lhes parecia; Deus, porém, nos disciplina para aproveitamento, a fim de sermos participantes da sua santidade.

Corrigiam. Ou, “disciplinavam” (ver com. do v. Hb.12:5).

Por pouco tempo. Ou seja, durante a infância e a juventude. A correção de nosso Pai celestial continua ao longo da vida.

Segundo melhor lhes parecia. Isto é, como achavam apropriado.

Para aproveitamento. Os pais terrenos podem cometer erro de disciplina por julgamento imperfeito ou emoções egoístas, mas devem ser “respeitados”. Quanto mais se deve atender e apreciar a disciplina do Pai celestial, cuja sabedoria e amor ordenam apenas o que é para o bem?

Participantes da Sua santidade. O objetivo de toda disciplina divina é a transformação do caráter. A meta é a perfeição (ver com. de Mt.5:48).

Hb.12:11 11. Toda disciplina, com efeito, no momento não parece ser motivo de alegria, mas de tristeza; ao depois, entretanto, produz fruto pacífico aos que têm sido por ela exercitados, fruto de justiça.

Toda disciplina. Ver com. do v. Hb.12:5.

No momento. Normalmente, tempo e experiência são necessários para a compreensão completa da disciplina recebida. Só depois que atingem a maturidade é que as pessoas conseguem perceber como os pais, professores e amigos contribuíram para o desenvolvimento de seu caráter. Na verdade, esse reconhecimento é uma marca segura de maturidade. O cristão maduro percebe o valor disciplinar das diversas experiências da vida mesmo enquanto está passando por elas. Ele sabe que o ressentimento a respeito da disciplina divina é sinal de infantilidade e imaturidade.

Motivo de alegria. Ou, “agradável”.

Tristeza. Não no sentido de ser grave, intensa ou opressiva, mas de causar aflição, sofrimento ou dor.

Depois. De modo geral, os seres irracionais vivem apenas o presente e para o presente. Uma das características que distinguem os seres inteligentes é a capacidade de projetar-se para o passado ou para o futuro, por meio da memória e da imaginação. Assim, para eles, é possível ter uma estimativa da situação presente na perspectiva de tempo e experiência, e decidir e agir com inteligência. O grau em que uma pessoa é capaz de ver o presente em termos do passado e do futuro é uma medida extremamente valiosa de seu progresso, da infância para a maturidade. O mesmo é verdade quanto à maturidade cristã, particularmente no que diz respeito às experiências disciplinares da vida. Felizes os cristãos que aprendem a pesar as experiências temporais à luz da eternidade.

Produz. A disciplina tem sempre “um fruto pacífico”, caso seja aceita; raramente, se houver ressentimento; e nunca, se for rejeitada.

Fruto da justiça. A disciplina se torna necessária quando surge um conflito entre as tendências e os desejos naturais, por um lado, e o princípio correto, por outro. O propósito da disciplina é resolver esse conflito, submetendo tendências e desejos naturais ao princípio. Ao fazê-lo, a disciplina produz paz. Aquele que se submete à disciplina encontra paz com Deus, consigo mesmo e com os semelhantes.

Exercitados. Ou, “treinados”. Aqueles que aceitam a formação ministrada pelas experiências disciplinares da vida desfrutam “um fruto pacífico de justiça” que cresce pela obediência à vontade revelada de Deus.

Hb.12:12 12. Por isso, restabelecei as mãos descaídas e os joelhos trôpegos;

Por isso. Ou seja, tendo em vista que as experiências disciplinares da vida são ordenadas por um Pai celestial sábio e amoroso com a finalidade de produzir um “fruto pacífico de justiça” para a maturidade.

Restabelecei. Mãos descaídas e joelhos trôpegos indicam desânimo e inatividade. Representam a antítese da resistência (ver com. do v. Hb.12:2). O cristão maduro não fica “exausto e fraco” (v. Hb.12:3) ao passar pela disciplina, e suas mãos não descaem, nem os joelhos vacilam. Compreendendo a natureza e o propósito da disciplina, e tendo confiança na sabedoria e bondade do Pai celestial, ele afasta o ressentimento, o desânimo e a inação. Assim, pode superar as tarefas com coragem e confiança. Muitos cristãos têm os “joelhos trôpegos” e as mãos “descaídas”. Em vez de aceitar a disciplina do Céu, começam a culpar os outros pelas circunstâncias desfavoráveis. Assim, rejeitam as oportunidades de desenvolver o caráter providas pelo Pai celestial. Logo sua vida começa a dar os frutos contenciosos da amargura (ver com. dos v. Hb.12:13-15) em vez do “fruto pacífico de justiça” (v. Hb.12:11; comparar com Is.35:3).

Mãos. Comparar com “pés”, no v. Hb.12:13.

Descaídas. Ou seja, em decepção e desânimo.

Joelhos trôpegos. Estes não são um trunfo na corrida cristã (ver com. dos v. Hb.12:1-2).

Hb.12:13 13. e fazei caminhos retos para os pés, para que não se extravie o que é manco; antes, seja curado.

Caminhos retos. A relutância em aceitar a disciplina da vida, muitas vezes leva a pessoa a caminhos tortuosos. O cristão amadurecido avança em um caminho reto, com coragem e confiança, aceitando as experiências disciplinares necessárias à formação de um caráter cristão simétrico, sem hesitação nem pesar. Não busca atalho para evitar a disciplina, mas se conserva na estrada correta da vida, aproveitando ao máximo as oportunidades.

Para que não se extravie. Do gr. ektrepo, “virar”, “torcer”. O sentido em que ektrepo é usado aqui não é totalmente claro. As duas interpretações são possíveis: (1) Os pés mancos serão “desviados do caminho”, ou seja, desviam-se “do caminho reto” para “caminhos tortuosos”, onde os mancos têm mais probabilidade de tropeçar e cair. (2) Ektrepo deve ser entendido em sentido técnico médico: “deslocamento” ou “luxação”; a coxeadura dificultaria o caminhar e impossibilitaria o deslocamento. Assim entendida, a advertência seria de que, a menos que sejam oferecidos “caminhos retos” para os mancos, há perigo de que ocorra alguma luxação. O segundo sentido, “ser deslocado”, ou “ser posto fora do lugar”, concorda mais com o contexto. Há mais probabilidade de que “aquele que é manco” fique deslocado do que se desvie. Além disso, a advertência “antes, seja curado” constitui uma alternativa mais adequada para o que está deslocado do que para o que se desvia.

O que é manco. Referência ainda às pessoas com as mãos descaídas, joelhos trôpegos e pés que necessitam de “caminhos retos” (v. Hb.12:12-13). Sendo “mancos”, eles têm dificuldade para andar pelas experiências disciplinares desagradáveis ao longo da vida.

Antes, seja curado. A relutância em aceitar a disciplina o colocará em dificuldade ainda maior. Mas, em vez de permitir isso, o cristão sábio começa a aplicar o remédio apropriado. Quando as doenças físicas não recebem a atenção necessária, muitas vezes, tendem a piorar. As condições da mente e do coração, como a relutância em aceitar a disciplina, ou o ressentimento por causa dela, certamente se agravarão, a menos que se esforce para diagnosticar a situação e aplicar o remédio apropriado.

Hb.12:14 14. Segui a paz com todos e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor,

Segui a paz. Ou, “lutai pela paz”. Deixando os problemas pessoais do cristão, o escritor então se volta para a relação com os semelhantes (sobre a admoestação “segui a paz”, ver com. de Rm.12:18; 1Pe.3:11; SI.34:14).

Santificação. Só os puros de coração podem esperar ver a Deus (ver com. de Hb.5:8).

Verá o Senhor. Isto é, em paz.

Hb.12:15 15. atentando, diligentemente, por que ninguém seja faltoso, separando-se da graça de Deus; nem haja alguma raiz de amargura que, brotando, vos perturbe, e, por meio dela, muitos sejam contaminados;

Atentando, diligentemente. Ninguém vai entrar por acaso no Céu. “Através de muitas tribulações, nos importa entrar no reino de Deus” (At.14:22; ver com. de Mt.7:21-27; Mt.10:23). Devemos “nos esforçar” para entrar (Lc.13:24). Nenhum esforço pela metade haverá de alcançar o tesouro celestial (ver Mt.13:44-46).

Faltoso. Do gr. hustereo, “ser carente”, “estar destituído de”, “deixar de alcançar”, “ser excluído”. A forma do verbo grego implica fracasso contínuo, não uma única apostasia (sobre cair da graça, ver com. de Gl.5:4).

Raiz de amargura. A afirmação é baseada na LXX, de Dt.29:18. No contexto original, esse era um alerta contra a idolatria (ver com. ali). Aqui, parece ser uma advertência contra qualquer pessoa dada à queixa que deliberadamente fomenta má vontade e discórdia na igreja. Em geral, uma “raiz de amargura” cresce na mente mesquinha e floresce em crítica aberta e maliciosa aos líderes, despertando desacordo entre os crentes.

Muitos sejam contaminados. Os que alimentam a amargura procuram, tanto quanto possível, envolver outros em sua insatisfação e revolta.

Hb.12:16 16. nem haja algum impuro ou profano, como foi Esaú, o qual, por um repasto, vendeu o seu direito de primogenitura.

Impuro. Ou, “pessoa imoral”.

Profano. Do gr. bebelos, “mundano”, “sem Deus”, “sem religião”. No NT, bebelos descreve a pessoa sem apreço ou desejo pelas coisas sagradas, cujas ambições não se elevam das coisas deste mundo.

Esaú. Ver com. de Gn.25:27-34.

Um repasto. Ou, “uma refeição”.

Direito de primogenitura. Sobre a primogenitura, ver com. de Gn.25:31.

Hb.12:17 17. Pois sabeis também que, posteriormente, querendo herdar a bênção, foi rejeitado, pois não achou lugar de arrependimento, embora, com lágrimas, o tivesse buscado.

Querendo. Ou, “desejando”.

Rejeitado. Do gr. apodokimazo, “desaprovado” após teste, por não ser capaz de alcançar os padrões exigidos (ver Gn.27:1-40).

Não achou lugar de arrependimento. Os longos anos vivendo apenas para as atividades terrenas privaram Esaú da capacidade de suportar as mais pesadas responsabilidades da vida. Por escolha própria, sua mente e seu caráter se tornaram incorrigíveis. O autor de Hebreus não está sugerindo que Esaú realmente desejou se arrepender de seus maus caminhos, mas simplesmente que se arrependeu de ter vendido o direito de primogenitura. Desejou tê-lo de volta, mas percebeu que a situação era irrevogável. Ele o havia perdido para sempre. Nenhum ato arbitrário de Deus impediu Esaú de receber a herança que normalmente teria sido dele. Seu próprio caráter o incapacitou para tais privilégios e responsabilidades.

Com lágrimas. Quando Esaú percebeu o que havia perdido, “bradou com profundo amargor” (Gn.27:34).

Hb.12:18 18. Ora, não tendes chegado ao fogo palpável e ardente, e à escuridão, e às trevas, e à tempestade,

Não tendes chegado. Sobre o incidente referido nos v. 18-21, ver Ex.19:9-25. Assim como o antigo Israel chegou ao monte Sinai e ouviu a voz de Deus (Hb.12:18-21), os cristãos têm “chegado ao monte Sião” (v. Hb.12:22-23) e devem dar ouvidos à voz de Cristo (v. Hb.12:24-27).

Palpável. Isto é, não a alguma montanha literal aqui na Terra.

Ardente. Sobre a descrição dos v. 18, 19, ver Ex.19:16.

Hb.12:19 19. e ao clangor da trombeta, e ao som de palavras tais, que quantos o ouviram suplicaram que não se lhes falasse mais,

Som de palavras. Ou seja, a voz de Deus.

Suplicaram. Ver Ex.20:19; Dt.5:5.

Hb.12:20 20. pois já não suportavam o que lhes era ordenado: Até um animal, se tocar o monte, será apedrejado.

Sem comentário para este versículo.

Hb.12:21 21. Na verdade, de tal modo era horrível o espetáculo, que Moisés disse: Sinto-me aterrado e trêmulo!

De tal modo era horrível. A ênfase está na imponência do que foi visto e ouvido, principalmente a voz de Deus. Face a face com o Legislador e Juiz de toda a Terra, o povo experimentou algo do “temor do Senhor” (2Co.5:11). A promulgação da lei no Sinai foi seguida por impressionante exposição do poder e da majestade de Deus. Nunca antes nem depois o mundo presenciou algo que inspirasse tanto medo.

Hb.12:22 22. Mas tendes chegado ao monte Sião e à cidade do Deus vivo, a Jerusalém celestial, e a incontáveis hostes de anjos, e à universal assembleia

Mas tendes chegado. O autor se volta da experiência do antigo Israel para a dos cristãos. Ele fala em sentido figurado dos cristãos vivos reunidos ao redor do trono de Deus no Céu, uma grande reunião da igreja invisível.

Monte Sião. Uma das elevações sobre as quais a antiga Jerusalém estava localizada (ver com. do SI.48:2). Este se tornou um nome poético favorito para a cidade de Jerusalém. Aqui, trata-se da “Jerusalém celestial”.

Deus vivo. Ver com. de Hb.3:12; Hb.9:14; Hb.10:31.

Jerusalém celestial. O nome Jerusalém ou nova Jerusalém é aplicado à “cidade do Deus vivo” (ver com. de Ap.3:12; Ap.21:2).

Incontáveis hostes. Literalmente, “miríades” (ver com. de Ap.5:11).

Universal assembléia. Literalmente, “reunião festiva”. Aqui, o termo parece ser sinônimo de “igreja”.

Hb.12:23 23. e igreja dos primogênitos arrolados nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados,

Igreja dos primogênitos. Uma referência aos cristãos renascidos, ou toda a igreja invisível.

Arrolados nos céus. Ou, “gravados no Céu”, isto é, no Livro da Vida do Cordeiro (ver com. de Fp.4:3; Ap.3:5).

Deus, o Juiz. Deus foi o legislador no monte Sinai. No monte Sião, Ele é o “Juiz de todos” para julgá-los pela lei que proclamou do Sinai. Não será menos inspirador estar diante de Deus quando Ele julgar a todos, do que foi quando Ele proclamou a lei, a norma do juízo.

Espíritos. Do gr. pneumata (ver com. do v. Hb.12:9). A ideia de que a palavra pneuma (plural, pneumata) indica uma entidade consciente, capaz de existir fora do corpo, não é inerente à própria palavra, nem esse significado pode ser objetivamente derivado de seu uso no NT. Esse conceito se baseia na opinião preconcebida dos que acreditam que uma entidade imaterial consciente sobrevive por ocasião da morte, e que enxergam essa opinião em palavras como “espírito” e “alma” (sobre ruach, o equivalente hebraico do gr. pneuma, ver com. de Ec.12:7).

Justos aperfeiçoados. Estes são os cristãos amadurecidos (ver com. de Mt.5:48). As palavras “tendes chegado” (Hb.12:22) são dirigidas aos cristãos vivos, como o contexto torna evidente. O autor não está tratando dos justos mortos dos séculos passados, como se eles realmente estivessem reunidos diante do “Juiz de todos” no “Monte Sião”, na “Jerusalém celestial” (v. Hb.12:22-23). É em sentido figurado que os cristãos vivos podem se reunir diante do trono de Deus, como está descrito nos v. Hb.12:22-24. Nesse mesmo sentido, em Hb.4:16, ele os convida a “[achegar-se] confiadamente, junto ao trono da graça”. Neste mesmo sentido figurado, os cristãos vivos encontram todos os outros “justos aperfeiçoados” reunidos ali em espírito, não no suposto estado desencarnado. Insistir que a expressão “espíritos dos justos aperfeiçoados” se refere aos “espíritos” supostamente desencarnados seria colocar o autor de Hebreus em desacordo com as claras declarações das Escrituras sobre o estado do homem na morte (ver com. de Ec.3:21; Ec.12:7; Jo.11:11; Gn.2:7).

Hb.12:24 24. e a Jesus, o Mediador da nova aliança, e ao sangue da aspersão que fala coisas superiores ao que fala o próprio Abel.

Mediador. Sobre Cristo como mediador da nova aliança, ver com. de Hb.8:6; Hb.9:15.

Nova aliança. Ver com. de Hb.8:8-10.

Sangue da aspersão. Ver com. de Ex.24:6; Ex.24:8; Hb.9:19; Hb.9:21; Hb.10:22. Trata-se do sangue expiatório de Cristo, pelo qual a nova aliança foi ratificada e por meio do qual o pecado é perdoado.

Fala. Ver com. de Gn.4:10; cf. com. de Hb.11:4.

Coisas superiores. O sangue de Abel clama por vingança. O sangue de Cristo fala eloquentemente sobre a divina misericórdia e o perdão.

Hb.12:25 25. Tende cuidado, não recuseis ao que fala. Pois, se não escaparam aqueles que recusaram ouvir quem, divinamente, os advertia sobre a terra, muito menos nós, os que nos desviamos daquele que dos céus nos adverte,

Tende cuidado, não recuseis. Nos v. 25 a 29, o autor conecta sua conclusão à linha de argumentação nos v. Hb.12:18-24. O antigo Israel sentiu-se aterrorizado pela voz de Deus, que falou do monte Sinai (v. Hb.12:18-21). Entrando pela fé na presença de “Deus, o Juiz de todos”, e de “Jesus, o Mediador da nova aliança” (v. Hb.12:23-24), os cristãos não serão menos profundamente impressionados. No entanto, Israel se recusou a ouvir a voz de Deus (Ex.20:18-19), e essa recusa foi uma desobediência persistente (ver vol. 4, p. 19, 20). Os cristãos devem tomar cuidado para não cometer o mesmo erro do antigo Israel (ver com. de 1Co.10:1-12; Hb.3:11; Hb.4:1).

Que fala. Deus, o Pai, é apresentado (Hb.1:1-2) como se estivesse falando conosco por meio de Seu Filho. Não está claro se quem fala é o Pai ou o Filho.

Se não escaparam. Ver com. de Hb.2:2-3; Hb.4:1.

Quem [...] os advertia sobre a Terra. Ou seja, do monte Sinai.

Muito menos. Ver com. de Hb.2:3.

Dos céus. Isto é, aos cristãos na Terra, hoje.

Hb.12:26 26. aquele, cuja voz abalou, então, a terra; agora, porém, ele promete, dizendo: Ainda uma vez por todas, farei abalar não só a terra, mas também o céu.

Cuja voz abalou, então. Comparar com Ex.19:18. Ainda uma vez por todas. Uma citação adaptada da LXX, de Ag.2:6-7 (ver com. ali). Em seu contexto original, a profecia se aplicava ao templo restaurado após o cativeiro babilônico e ao primeiro advento de Cristo. Aqui, aplica-se à segunda vinda (ver Ap.16:17-18).

Hb.12:27 27. Ora, esta palavra: Ainda uma vez por todas significa a remoção dessas coisas abaladas, como tinham sido feitas, para que as coisas que não são abaladas permaneçam.

Significa a remoção. A expressão “ainda uma vez por todas” sugere que o segundo abalo deve ser final. Nenhuma sacudidura mais será necessária. Por conseguinte, tudo o que pode ser abalado será removido no momento do segundo abalo.

Coisas abaladas. Ou seja, que podem ser abaladas. O pecado e todas as suas obras serão “abalados”. O presente mundo com tudo que nele há vai passar.

Como tinham sido feitas. A relação desta frase com a linha de argumentação não é perceptível. O texto grego é breve e enigmático. O escritor pode estar se referindo ao fato de que, assim como Deus falou ao criar os céus e a Terra, no princípio (ver com. de Gn.1:3; Hb.11:3; SI.33:6; Sl.33:9), Ele falará novamente para remover tudo o que pode ser abalado.

Coisas que não são abaladas. Ou seja, o “reino inabalável” (v. Hb.12:28), incluindo todos os “justos aperfeiçoados” (v. Hb.12:23).

Permaneçam. Quando a voz de Deus sacudir novamente o céu e a terra, só o que é reto, puro e verdadeiro permanecerá.

Hb.12:28 28. Por isso, recebendo nós um reino inabalável, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor;

Um reino. O escritor descreve o povo de Deus na Terra como se já estivesse na posse da herança eterna (ver com. de Hb.11:1).

Retenhamos a graça. Ou, “sejamos gratos”, “vamos ser gratos”. Em outras passagens do NT (ver Lc.17:9; 1Tm.1:12; 2Tm.1:3) a mesma expressão grega é usada neste sentido, embora em 3Jo.1:4, seja usada no sentido de experimentar alegria.

Sirvamos a Deus de modo agradável. Nada pode ser mais agradável a Deus do que a gratidão pelas graciosas disposições do plano da salvação, pois a gratidão conduz inevitavelmente ao serviço leal.

Reverência e santo temor. Ver com. de SI.19:9; Hb.5:7. O temor reverente que os seres humanos sentem na presença de Deus é enfatizado em Hb.12:18-21; Hb.12:26-27.

Hb.12:29 29. porque o nosso Deus é fogo consumidor.

Fogo consumidor. Isto foi demonstrado no monte Sinai (ver Ex.24:17). O fogo do dia final destruirá tudo o que estiver contaminado pelo pecado (ver com. de Ml.4:1; 2Pe.3:7; 2Pe.3:10-12; Ap.20:9; Ap.20:15).

Hb.13:1 1. Seja constante o amor fraternal.

O amor fraternal. Ver com. de Rm.12:10. O capítulo final do livro de Hebreus é composto de uma série de advertências gerais sobre diversos assuntos (v. 1-17) e uma saudação pessoal (v. Hb.13:18-25).

Hb.13:2 2. Não negligencieis a hospitalidade, pois alguns, praticando-a, sem o saber acolheram anjos.

Negligencieis. Aparentemente, muitos tendiam a se absorver tanto em seus próprios negócios que não mostravam o devido interesse por seus irmãos de fé. À medida que a igreja progride em número, há um crescente perigo de que o mesmo ocorra hoje. Nosso próximo é aquele que precisa de amizade e hospitalidade.

Hospitalidade. Hospedarias não eram comuns e, muitas vezes, os estranhos eram considerados com desconfiança. A menos que as pessoas se interessassem pelos viajantes, muitas vezes, eles não tinham lugar para se hospedar. Nos tempos antigos, a hospitalidade requeria que se fizessem provisões para desconhecidos. Hoje, a realidade pode ser outra, visto que, geralmente, existem abundantes instalações para a acomodação dos viajantes. No entanto, o princípio permanece, e os cristãos devem procurar formas e meios de expressar hospitalidade, de acordo com as necessidades atuais.

Sem o saber. Ou seja, no primeiro momento, quando os estrangeiros foram convidados a entrar.

Acolheram anjos. Este foi o privilégio de Abraão (Gn.18:1-8), Ló (Gn.19:1-3), Gideão (Jz.6:11-20) e Manoá (Jz.13:2-4; Jz.13:9-21). A fidelidade em atender às necessidades dos estrangeiros será levada em consideração no juízo final (ver Mt.25:35).

Hb.13:3 3. Lembrai-vos dos encarcerados, como se presos com eles; dos que sofrem maus-tratos, como se, com efeito, vós mesmos em pessoa fôsseis os maltratados.

Encarcerados, como se presos. O ministério aos presos é outra atividade de importância suficiente para ser considerada no juízo final (ver Mt.25:36). Como em outras passagens (ver 1Co.9:22), aqui, o princípio estabelecido é que o cristão deve pensar em si mesmo como se estivesse na mesma situação de qualquer pessoa necessitada, e ministrar a elas, de acordo com a regra áurea (ver com. de Mt.7:12).

Sofrem maus tratos. Literalmente, “estão sendo maltratados”.

Vós mesmos em pessoa. Pense como se sentiria se estivesse na mesma situação dos que são maltratados; então, ministre às suas necessidades em conformidade com a situação. O princípio estabelecido na regra áurea é novamente aplicado a uma situação prática. Não cabe ao cristão questionar se aqueles que sofrem a adversidade merecem ajuda ou não. É suficiente saber que eles estão precisando de ajuda.

Hb.13:4 4. Digno de honra entre todos seja o matrimônio, bem como o leito sem mácula; porque Deus julgará os impuros e adúlteros.

Digno de honra entre todos. A primeira parte do versículo pode ser traduzida como: “o matrimônio deve ser mantido em honra por todos”, ou “todos nós respeitemos o matrimônio”. A instituição do casamento foi ordenada por um Criador sábio para que fosse grande bênção aos seres humanos; e quando a finalidade do Criador é cumprida na vida familiar, o resultado é um bem imensurável. Somente quando o casamento é pervertido para servir a propósitos indignos é que perde a qualidade de ser “digno de honra”.

Matrimônio. O relacionamento conjugal envolve responsabilidades e privilégios (ver com. de 1Co.7; Mt.5:28-32; Mt.19:5-10).

Leito sem mácula. Esta parte do versículo pode ser traduzida como: “que o leito seja sem mácula”. É possível o leito ser contaminado, daí que o apóstolo aconselha seus leitores a mantê-lo puro e honrado para não ser degradado como instrumento para a gratificação de Iuxúrias vis. Por outro lado, a ideia de que as intimidades da vida matrimonial são desonrosas ou que prejudicam a nobreza do caráter é um artifício do diabo, que desonra uma das providências ordenadas pelo Criador, também declarada como virtuosa (ver com. de 1Co.7:3-5).

Deus julgará. Isto é, no último dia, juntamente com todos os outros que vivem em persistente violação dos princípios de Sua santa lei (ver com. de Ap.21:8).

Impuros. Ou, “pessoas imorais” (ver com. de Mt.5:32).

Adúlteros. Ver com. de Ex.20:14; Mt.5:32.

Hb.13:5 5. Seja a vossa vida sem avareza. Contentai-vos com as coisas que tendes; porque ele tem dito: De maneira alguma te deixarei, nunca jamais te abandonarei.

Vossa vida. Do gr. tropos, “modo de vida”, “caráter”, “conduta”, “procedimento”.

Avareza. Ver com. de Lc.12:13-34.

Contentai-vos. Ver com. de Fp.4:11; 1Tm.6:6.

As coisas que tendes. Se as pessoas aprendessem a se contentar com o que têm e não cobiçassem o que pertence aos outros, a maioria dos problemas seria automaticamente resolvida. A atitude do cristão para com as coisas materiais evidencia sua condição espiritual (ver com. de Mt.6:19-34).

Ele. Ou seja, Deus. A citação é da LXX, de Dt.31:6; Dt.31:8.

De maneira alguma te deixarei. Deus faz provisão graciosa para as nossas necessidades (ver com. de Mt.6:26-34).

Hb.13:6 6. Assim, afirmemos confiantemente: O Senhor é o meu auxílio, não temerei; que me poderá fazer o homem?

Confiantemente. Ou, “ousadamente”. A citação é da LXX, do Sl.118:6 (ver com. ali).

Hb.13:7 7. Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram.

Guias. Literalmente, “guias”, “líderes”; ou seja, os líderes da igreja (sobre a lealdade à liderança da igreja, ver com. de 1Ts.5:12-13).

Pregaram. Literalmente, “falaram”. Os antigos líderes, que talvez já descansavam em Cristo, são aqui mencionados.

O fim da sua vida. A expressão diz, literalmente: “resultado de sua conduta”. O autor, sem dúvida, tinha em mente certas pessoas em particular, embora não as tenha nomeado.

A fé. Todos os heróis da fé mencionados em Hb.11 tinham vivido havia muito tempo. Entretanto, havia também aqueles fiéis de tempos mais recentes, cujo exemplo podia ser seguido com segurança.

A fé que tiveram. Do gr. anastrophe, “forma de vida”, “conduta”, “comportamento” (ver com. de Ef.4:22).

Hb.13:8 8. Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo e o será para sempre.

Jesus Cristo. Sobre os dois nomes usados juntos, ver com. de Mt.1:1.

O mesmo. O v. 8, aparentemente, devia preparar o caminho para o aviso do v. Hb.13:9. Tendo em vista que Cristo nunca muda, a mensagem sobre Ele nunca pode mudar. Os ensinamentos divergentes do evangelho puro já proclamado podem ser descartados sem análise aprofundada (ver com. de Gl.1:6-8).

Hb.13:9 9. Não vos deixeis envolver por doutrinas várias e estranhas, porquanto o que vale é estar o coração confirmado com graça e não com alimentos, pois nunca tiveram proveito os que com isto se preocuparam.

Não vos deixeis envolver. Alguns são facilmente influenciados por qualquer ensinamento novo ou estranho. Por falta de discernimento espiritual, eles são incapazes de diferenciar entre a verdade e o erro e de comparar o novo ensino com as Escrituras (ver com. de Ef.4:14; Cl.2:4; Cl.2:8).

Várias. Ou, “divergentes”, isto é, diferentes da mensagem do evangelho puro já recebidas.

Confirmado com graça. Ou seja, de modo a não ser “levados” pelos modismos na religião e na teologia. O poder estabilizador da graça de Cristo é a melhor proteção do cristão contra os ensinamentos errôneos (sobre “graça”, ver com. de Rm.1:7; Rm.3:24).

Não com alimentos. Algumas pessoas ansiosas por novidades religiosas iam além dos claros ensinos das Escrituras com relação à alimentação e faziam de seus critérios alimentares uma prova de fé (ver com. de Rm.14:17; 1Tm.4:3).

Nunca tiveram proveito. Mesmo as pessoas que apreciavam os modismos alimentares não haviam recebido deles nenhum benefício prático. Deviam ser facções judaizantes que perturbavam a igreja cristã apostólica, como os ebionitas e os nazarenos (ver vol. 6, p. 39-41).

Hb.13:10 10. Possuímos um altar do qual não têm direito de comer os que ministram no tabernáculo.

Possuímos um altar. O autor menciona que, aos sacerdotes e levitas, foram designadas certas partes dos sacrifícios levados ao antigo santuário (ver Lv.6:16-18; Lv.7:15-16; Lv.7:31-34; Nm.18:8-10; Nm.18:1; Dt.2; 1Co.9:13). Talvez as falsas doutrinas (Hb.13:9) enfatizassem a importância de os cristãos praticarem antigos ritos e cerimônias do judaísmo, que tinham que ver com alimentos e bebidas, como se, assim, pudessem alcançar santidade superior. Mas os cristãos têm um altar: a cruz do Calvário, e um sacrifício que, em valor e eficácia, supera de longe os antigos sacrifícios de animais (ver com. de Hb.9:14; Hb.9:24-28; Hb.10:10; Hb.10:12; Hb.10:14). Esse não é outro senão “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo.1:29). Além disso, Cristo convida os que nEle creem a comer de Sua carne (ver Jo.6:33-58).

Não têm direito de comer. No sistema judaico, os sacerdotes e levitas desfrutavam uma posição de honra e privilégios especiais. Mas, depois de terem rejeitado Jesus, apesar de Sua posição exaltada, eles eram indignos de participar daquilo a que todo verdadeiro cristão tem direito. Paulo também pode ter pensado no pão e no vinho da mesa do Senhor. De todo modo, os alardeados méritos do sistema religioso chamado de “doutrinas várias e estranhas” (v. Hb.13:9) eram infinitamente inferiores ao caminho da salvação pela fé em Jesus Cristo.

Os que ministram no tabernáculo. Ou seja, os sacerdotes e levitas.

Hb.13:11 11. Pois aqueles animais cujo sangue é trazido para dentro do Santo dos Santos, pelo sumo sacerdote, como oblação pelo pecado, têm o corpo queimado fora do acampamento.

Aqueles animais. Quando o sangue da oferta pelo pecado era levado para o santuário, como no caso do sacerdote ungido ou de toda a congregação, o sacerdote não devia comer da carne, mas queimá-la fora do arraial (Lv.6:30). Da mesma forma, Jesus “sofreu fora da porta” (Hb.13:12; Jo.19:17), depois disso, Ele ascendeu para ministrar Seu próprio sangue no santuário celestial (Hb.9:12). Ainda estando sob o antigo sistema sacrificial, os sacerdotes não teriam direito a comer sua porção usual desse sacrifício (Hb.13:10), mas Cristo disse: “Tomai, comei: isto é o Meu corpo que é dado por vós” (1Co.11:24, ARC).

Hb.13:12 12. Por isso, foi que também Jesus, para santificar o povo, pelo seu próprio sangue, sofreu fora da porta.

Para santificar. A fim de poder ministrar Seu próprio sangue em favor dos pecadores arrependidos, no santuário celestial, Cristo apropriadamente “sofreu fora da porta” de Jerusalém.

Hb.13:13 13. Saiamos, pois, a ele, fora do arraial, levando o seu vitupério.

Saiamos. Os cristãos judeus já não buscavam a salvação nos ritos e cerimônias da religião judaica. Eles ainda eram israelitas e, como tal, figurativamente falando, eram habitantes da cidade de Jerusalém. No entanto, se eles seguiam o Messias, deviam ir com Ele para além dos limites do judaísmo. No cenário do livro de Hebreus, essa situação constituía um apelo aos cristãos judeus para que afastassem os olhos dos ritos e cerimônias do judaísmo para fixá-los em Jesus Cristo e Seu ministério como o grande sumo sacerdote no santuário celestial (ver p. 417).

Levando o Seu vitupérío. Os que manifestaram simpatia por Jesus, quando Ele partiu para o Gólgota como um criminoso condenado, sofreram “vitupério” com Ele. Para os cristãos judeus, o ato de abraçar o cristianismo significava incorrer no ódio de seus compatriotas judeus. Para estes, virar as costas para o sistema sacrificial judaico, como um meio de salvação, significava incorrer na acusação de apostasia e traição.

Hb.13:14 14. Na verdade, não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir.

Não temos aqui cidade permanente. Os judeus consideravam Jerusalém como uma “cidade permanente”. Acreditavam que o plano divino estava intimamente ligado à cidade, que, portanto, era destinada a permanecer para sempre. Eles se sentiam seguros dentro do judaísmo. Todavia, os cristãos não têm essa “cidade permanente”. Suas esperanças e aspirações não estão associadas a qualquer cidade terrena ou sistema religioso. Era uma importante lembrança para os cristãos hebreus que, dentro em pouco, deveriam testemunhar a destruição de Jerusalém.

Buscamos a que há de vir. Ou seja, a nova Jerusalém (cf. Hb.12:22). Comparar com a experiência do patriarca Abraão (Hb.11:10).

Hb.13:15 15. Por meio de Jesus, pois, ofereçamos a Deus, sempre, sacrifício de louvor, que é o fruto de lábios que confessam o seu nome.

Por meio de Jesus. Isto é, em virtude do sacrifício que Ele já fez por nós “fora da porta” de Jerusalém.

Sacrifício de louvor. Em vez de levar ao templo uma oferta de gratidão, como prescrevia a lei mosaica (ver Lv.7:12-14), oferecemos um “sacrifício de louvor” contínuo ao Senhor.

Hb.13:16 16. Não negligencieis, igualmente, a prática do bem e a mútua cooperação; pois, com tais sacrifícios, Deus se compraz.

Não negligencieis. Talvez alguns estivessem se descuidando disso.

A prática do bem. Ou seja, ministrar às necessidades dos outros. Deus não Se agrada do sangue de touros e bodes (Ver com. de Hb.10:5-8), o qual não serve mais a nenhum propósito útil. Ele Se agrada do espírito de sacrifício pelos outros (ver com. de Mt.25:24-40). A prática da “religião pura e sem mácula” (Tg.1:27) é sempre aceitável aos olhos divinos.

Mútua cooperação. Ou, “partilhar”.

Deus Se compraz. Ritos e cerimônias formais não têm nenhum significado para Deus. Ele procura aqueles que O adorem em “espírito e em verdade” (Jo.4:23), ou seja, que reflitam Seu caráter e demonstrem amor e devoção em uma vida de serviço aos outros.

Hb.13:17 17. Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros.

Obedecei. Ver com. do v. Hb.13:7.

Sede submissos. Deus designou guias para que apascentem Seu rebanho. Ele admoesta os fiéis a serem submissos àqueles que foram indicados para liderá-los, enquanto esses próprios líderes obedecerem ao Mestre. Aqui, é feita referência aos líderes atuais, não aos líderes antigos mencionados no v. Hb.13:7.

Velam. Os líderes que Deus designou sobre a igreja são responsáveis diante dEle pelo bem-estar de Seu povo, e Ele vai exigir rigorosa prestação de contas deles.

Por vossa alma. Isto é, “por vós” (cf. com. de Hb.12:9; Hb.12:23).

Deve prestar contas. O mordomo é responsável perante seu senhor por todos os bens confiados a seus cuidados. A cooperação com os líderes indicados torna muito mais fácil aos membros da igreja prestar contas de sua mordomia fiel.

Com alegria. Ou seja, com a consciência de que cumpriram fielmente sua responsabilidade. Os servos fiéis são convocados a entrar no gozo do seu Senhor (ver Mt.25:21).

Não gemendo. Literalmente, “não com suspiros” (ver a experiência do servo infiel, em Mt.25:28-30).

Não aproveita. Os membros da igreja não obtêm nenhuma vantagem por dificultar aos líderes designados a boa prestação de contas de sua administração. Ambos irão compartilhar a “alegria” ou a “tristeza” no dia da prestação de contas.

Hb.13:18 18. Orai por nós, pois estamos persuadidos de termos boa consciência, desejando em todas as coisas viver condignamente.

Orai por nós. Ou, “continuem orando por nós” (comparar com Ef.6:19; Gl.4:12). Embora fosse de grande experiência e estatura espiritual, Paulo apreciava e buscava a oração de seus irmãos em Cristo. Todo verdadeiro líder aprecia o interesse e as orações daqueles pelos quais trabalha.

Estamos persuadidos. Do gr. peitho, que, na forma usada aqui, significa “estar convencido”, “ter certeza”.

Boa consciência. Ou seja, a consciência limpa. Paulo repete muitas vezes a importância de se ter a consciência limpa (ver At.23:1; At.24:16; Rm.9:1; 2Co.1:12; 2Tm.1:3).

Desejando. É propósito do autor refletir claramente os princípios do evangelho na própria vida (cf. 1Co.9:27).

Viver condignamente. Ou seja, conduzir-se honradamente.

Hb.13:19 19. Rogo-vos, com muito empenho, que assim façais, a fim de que eu vos seja restituído mais depressa.

Rogo-vos. A seriedade com que o autor apela para os leitores orarem por sua libertação de circunstâncias que impediam a comunhão com eles é tocante e reflete sua fé pessoal no poder da oração.

Com muito empenho. Ou, “intensamente”.

Eu vos seja restituído. O v. Hb.13:23 sugere que, na época, Timóteo estava na prisão e que o autor de Hebreus estava em liberdade. Outras circunstâncias, como doença ou pressão dos deveres missionários podem ter impedido o retorno de Paulo a esses crentes.

Hb.13:20 20. Ora, o Deus da paz, que tornou a trazer dentre os mortos a Jesus, nosso Senhor, o grande Pastor das ovelhas, pelo sangue da eterna aliança,

Ora. Os v. 20 e 21 constituem a bênção apostólica proferida pelo autor sobre os leitores em perspectiva. Ele os recomenda ao Deus da paz.

Deus da paz. Ver com. de Rm.15:33.

Tornou a trazer dentre os mortos. Ver com. de Rm.4:24. Como tantas vezes nas epístolas do NT, a ressurreição de Cristo é considerada o coração e o centro da esperança e da fé cristã.

Pastor das ovelhas. Ver com. do SI.23; Jo.10:10-11; 1Pe.2:25.

Pelo sangue. O eficaz agente ratificador da aliança eterna (ver com. de Hb.9:18-28).

Eterna aliança. Ver com. de Hb.8:8-12.

Hb.13:21 21. vos aperfeiçoe em todo o bem, para cumprirdes a sua vontade, operando em vós o que é agradável diante dele, por Jesus Cristo, a quem seja a glória para todo o sempre. Amém!

Aperfeiçoe. Do gr. katartizo (ver com. de 1Pe.5:10; Mt.5:48).

Todo o bem. As evidências textuais (cf. p. xvi) se dividem entre omitir e manter a palavra “obra” (ARC). Assim, o “bem” descreve o que Paulo deseja que seus leitores tenham e sejam, e não o que deseja que eles façam. O objetivo desse “bem”, no entanto, é que eles cumpram mais efetivamente “a Sua [de Deus] vontade”.

Operando em vós. Ver com. de Fp.2:13.

Por Jesus Cristo. Ver com. de Gl.2:20.

A quem seja a glória. Ver com. de Gl.1:5.

Para todo o sempre. Ver com. de Mt.25:41; Ap.1:6.

Amém. Ver com. de Mt.5:18; Rm.15:33.

Hb.13:22 22. Rogo-vos ainda, irmãos, que suporteis a presente palavra de exortação; tanto mais quanto vos escrevi resumidamente.

Suporteis. Ou também, “sustenteis”, “carregueis”.

Palavra de exortação. Ou seja, a mensagem contida em Hebreus (ver p. 417).

Resumidamente. Ele gostaria de ter dito muito mais sobre o assunto, mas o espaço não permitia.

Hb.13:23 23. Notifico-vos que o irmão Timóteo foi posto em liberdade; com ele, caso venha logo, vos verei.

Timóteo. Ver com. de At.16:1.

Posto em liberdade. A prisão aqui mencionada é desconhecida.

Caso venha. Nada mais se sabe da visita aqui proposta.

Hb.13:24 24. Saudai todos os vossos guias, bem como todos os santos. Os da Itália vos saúdam.

Saudai. Ou, “cumprimentai”.

Vossos guias. Ou seja, os líderes da igreja (ver com. do v. Hb.13:7).

Os da Itália. Isto é, os cristãos dessa região. Se estes crentes estavam na Itália na época, e se, assim, a epístola foi enviada da Itália, ou se eles tinham ido da Itália e estavam com o autor em algum outro lugar, não pode ser determinado a partir desta expressão.

Hb.13:25 25. A graça seja com todos vós.

A graça seja com todos vós. Ver com. de Tt.3:15.

Amém (ARC). Ver com. de Mt.5:18; Rm.15:33. Originalmente, o posfácio (KJV) que segue o v. 25 não fazia parte da epístola. Ele ocorre pela primeira vez em um manuscrito do 6º século.